{"id":137994,"date":"2017-07-31T00:00:23","date_gmt":"2017-07-31T03:00:23","guid":{"rendered":"http:\/\/noticias.ambientebrasil.com.br\/?p=137994"},"modified":"2017-07-30T19:27:50","modified_gmt":"2017-07-30T22:27:50","slug":"amazonia-desmatada-concentra-9-em-cada-10-mortes-de-ativistas-por-conflito-no-campo-2","status":"publish","type":"post","link":"http:\/\/localhost\/clipping\/2017\/07\/31\/137994-amazonia-desmatada-concentra-9-em-cada-10-mortes-de-ativistas-por-conflito-no-campo-2.html","title":{"rendered":"Amaz\u00f4nia desmatada concentra 9 em cada 10 mortes de ativistas por conflito no campo"},"content":{"rendered":"

O Brasil vem se mantendo no primeiro lugar de um ranking nada honroso: h\u00e1 cinco anos consecutivos, \u00e9 o pa\u00eds em que mais se mata ativistas que lutam por terra e defesa do meio ambiente, de acordo com a organiza\u00e7\u00e3o internacional Global Witness, que anualmente lista os lugares do mundo onde h\u00e1 mais mortes em conflitos no campo.<\/p>\n

Mas um mapeamento feito pela BBC Brasil em dados da ONG referentes ao per\u00edodo compreendido entre janeiro de 2015 e maio deste ano vai al\u00e9m: mostra que a Amaz\u00f4nia Legal, a \u00e1rea que engloba os oito Estados e parte do Maranh\u00e3o, \u00e9 palco de nove entre dez desses crimes (87%). As demais mortes ocorrem em outros lugares, principalmente no Nordeste.<\/p>\n

O levantamento mostra ainda que quase n\u00e3o h\u00e1 mortes no cora\u00e7\u00e3o da floresta, onde est\u00e1 grande parte da mata preservada, mas sim em um arco de zonas desmatadas na periferia da Amaz\u00f4nia, localizadas principalmente em Rond\u00f4nia e no leste do Par\u00e1. Entre 2016 e 2017, dois de cada tr\u00eas mortos ali eram sem-terra, posseiros ou trabalhadores rurais – a lista tamb\u00e9m inclui ind\u00edgenas e quilombolas.<\/p>\n

A Amaz\u00f4nia Legal abriga 24 milh\u00f5es de pessoas, 13% da popula\u00e7\u00e3o brasileira, em um espa\u00e7o que corresponde a cerca de 60% do pa\u00eds. E segundo os dados gerais da Global Witness, a viol\u00eancia contra ativistas est\u00e1 aumentando: foram 32 v\u00edtimas em 2013, 29 em 2014, 50 em 2015 e 49 em 2016. Nos primeiros cinco meses deste anos, j\u00e1 morreram 33.<\/p>\n

A ONG investiga abusos ambientais e contra os direitos humanos, e define como “ativistas” indiv\u00edduos engajados, voluntariamente ou profissionalmente, na luta pac\u00edfica por terras e pela defesa do meio ambiente. Na sua vis\u00e3o, esse grupo re\u00fane ind\u00edgenas, l\u00edderes camponeses ou mesmo advogados, jornalistas e funcion\u00e1rios de organiza\u00e7\u00f5es.<\/p>\n

Os dados compilados pela Global Witness s\u00e3o baseados em informa\u00e7\u00f5es coletadas pela Comiss\u00e3o Pastoral da Terra – ambas as organiza\u00e7\u00f5es alertam que a quantidade de mortos pode ainda estar subestimada. Cr\u00edticos, por sua vez, dizem que a lista pode estar incluindo crimes sem rela\u00e7\u00e3o com ativismo.<\/p>\n

Procurado pela BBC Brasil para comentar os n\u00fameros, o Minist\u00e9rio da Justi\u00e7a afirmou em nota que “o governo brasileiro \u00e9 um dos mais atuantes nas pol\u00edticas de erradica\u00e7\u00e3o de conflitos agr\u00e1rios”. Argumentou ainda que o ranking global considera a quantidade total de mortes, sem levar em conta a popula\u00e7\u00e3o do pa\u00eds. “Sendo o Brasil o maior pa\u00eds da regi\u00e3o, esses dados podem ter outras leituras.”<\/p>\n

No entanto, se considerada isoladamente, a Amaz\u00f4nia Legal tem uma taxa de mortes em rela\u00e7\u00e3o \u00e0 popula\u00e7\u00e3o que supera a de Honduras – o que a torna o territ\u00f3rio mais perigoso do mundo.<\/p>\n

“H\u00e1 um agravamento da viol\u00eancia no campo”, avalia Darci Frigo, presidente do Conselho Nacional de Direitos Humanos.<\/p>\n

“Em outros momentos, quem era assassinado eram as lideran\u00e7as. Agora, h\u00e1 uma generaliza\u00e7\u00e3o. No caso de Colniza (o massacre em abril de trabalhadores rurais no MT), por exemplo, ficou evidente que mataram todo mundo que viram pelo caminho, n\u00e3o procuraram os l\u00edderes. Tamb\u00e9m h\u00e1 um aumento da brutalidade dos assassinatos, com requinte de crueldade, tortura, execu\u00e7\u00f5es muito b\u00e1rbaras.”<\/p>\n

Hist\u00f3ria de viol\u00eancia<\/strong> – As 33 v\u00edtimas registradas no pa\u00eds at\u00e9 maio representam um ter\u00e7o do total de ativistas mortos em todo o mundo em 2017 – em segundo lugar est\u00e1 a Col\u00f4mbia, com 22 pessoas assassinadas. Entre os brasileiros assassinados, 28 eram trabalhadores ou militantes rurais da regi\u00e3o amaz\u00f4nica.<\/p>\n

\u00c9 o caso de Roberto Santos Ara\u00fajo, integrante de um movimento campon\u00eas de Rond\u00f4nia, assassinado a tiros em 1\u00ba de fevereiro. E o de Waldomiro Costa Pereira, do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), morto em 20 de mar\u00e7o no hospital de Paraupebas (PA), onde se recuperava de outro atentado.<\/p>\n

Em 19 de abril, foi a vez do massacre de Colniza (MT), \u00e1rea de disputa por madeira. Foi o pior no Brasil em mais de vinte anos, com nove mortos.<\/p>\n

Dias depois, em 4 de maio, K\u00e1tia Martins, de 43 anos, foi assassinada dentro de casa, na frente do neto, em Castanhal, nordeste do Par\u00e1. Era presidente de uma associa\u00e7\u00e3o de moradores de um assentamento rural. No mesmo dia e Estado, Etevaldo Soares Costa, membro do MST, foi morto a tiros e teve os dedos decepados, ind\u00edcio de tortura.<\/p>\n

Vinte dias depois, outra chacina: o massacre de Pau D’Arco (PA), com dez mortos, durante uma opera\u00e7\u00e3o policial que cumpria mandados de pris\u00e3o contra suspeitos de envolvimento na morte do seguran\u00e7a de uma fazenda.<\/p>\n

As regi\u00f5es que concentram as mortes tem um hist\u00f3rico de conflitos entre grandes e pequenos posseiros. Em 1995, 12 pessoas foram assassinadas de uma s\u00f3 vez em Curumbiara (RO), entre elas dois policiais. No ano seguinte, 19 sem-terra foram mortos pela pol\u00edcia militar no massacre de Eldorado dos Caraj\u00e1s (PA).<\/p>\n

Casos de assassinato de propriet\u00e1rios rurais ou seus funcion\u00e1rios s\u00e3o raros, mas tamb\u00e9m ocorrem, explica o delegado Mario Jorge Pinto Sobrinho, da delegacia de conflitos agr\u00e1rios de Rond\u00f4nia: “Morrem pessoas dos dois lados. Mas a maior parte das mortes \u00e9 do lado dos movimentos sociais”.<\/p>\n

No Estado, ainda h\u00e1 epis\u00f3dios de viol\u00eancia n\u00e3o letal supostamente praticada por grupos sem-terra, como destrui\u00e7\u00e3o de propriedade privada.<\/p>\n

O mapa das mortes mostra que elas se concentram em regi\u00f5es marcadas pelo avan\u00e7o da explora\u00e7\u00e3o de madeira, pecu\u00e1ria e agricultura.<\/p>\n

“A terra na Amaz\u00f4nia est\u00e1 sendo tomada para agricultura e outros grandes neg\u00f3cios, bem como para explora\u00e7\u00e3o madeireira. O fato comum \u00e9 que as comunidades n\u00e3o d\u00e3o o seu consentimento sobre o uso da sua terra e de seus recursos naturais. Isso as coloca em rota de colis\u00e3o com interesses poderosos, que leva \u00e0 viol\u00eancia”, diz Ben Leather, da Global Witness.<\/p>\n

Ocupa\u00e7\u00e3o desordenada<\/strong> – Especialistas ouvidos pela BBC Brasil apontam as disputas pela posse da terra como a principal causa da viol\u00eancia no campo na Amaz\u00f4nia.<\/p>\n

“H\u00e1 50 anos, o Brasil ocupa a Amaz\u00f4nia de forma desordenada. Falta uma pol\u00edtica perene de regulariza\u00e7\u00e3o das terras. Enquanto n\u00e3o houver isso, os conflitos v\u00e3o continuar”, afirma Marco Antonio Delfino de Almeida, procurador da Rep\u00fablica e coordenador de grupo de trabalho sobre terras p\u00fablicas.<\/p>\n

A ocupa\u00e7\u00e3o da Amaz\u00f4nia foi estimulada nos anos 1970, pelo governo militar. \u00c9 dessa \u00e9poca o slogan “terras sem homens para homens sem terra”. Mas, at\u00e9 hoje, grande parte das \u00e1reas ocupadas nessa regi\u00e3o pertence \u00e0 Uni\u00e3o ou aos Estados. S\u00e3o terrenos p\u00fablicos, que n\u00e3o foram transferidos oficialmente a um propriet\u00e1rio, o que eleva a tens\u00e3o na disputa por eles.<\/p>\n

O tamanho impressiona: s\u00e3o 43 milh\u00f5es de hectares de terras p\u00fablicas federais sem destina\u00e7\u00e3o na regi\u00e3o amaz\u00f4nica, segundo estimativas do governo federal. Isso sem contar as \u00e1reas p\u00fablicas estaduais.<\/p>\n

Segundo a Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agr\u00e1rio (antigo Minist\u00e9rio do Desenvolvimento Agr\u00e1rio), nos \u00faltimos oito anos o governo federal j\u00e1 concedeu t\u00edtulos de propriedade de 13 milh\u00f5es de hectares na Amaz\u00f4nia. Ou seja, essas terras deixaram de pertencer ao Estado e passaram para as m\u00e3os de algum propriet\u00e1rio que j\u00e1 ocupava o local.<\/p>\n

Imagens de sat\u00e9lite mostram a evolu\u00e7\u00e3o do processo de ocupa\u00e7\u00e3o da periferia da Amaz\u00f4nia. At\u00e9 meados da d\u00e9cada de 1980, as zonas desmatadas estavam concentradas em torno de estradas. Ao longo do tempo, pastos e planta\u00e7\u00f5es foram avan\u00e7ando sobre a floresta. A expans\u00e3o s\u00f3 \u00e9 interrompida nos limites de terras ind\u00edgenas e \u00e1reas de preserva\u00e7\u00e3o ambiental.<\/p>\n

Em Rond\u00f4nia e no Par\u00e1, desde 1988 foram desmatados 200 mil quil\u00f4metros quadrados de floresta nativa, de acordo com a medi\u00e7\u00e3o do Prodes, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. \u00c9 uma \u00e1rea equivalente \u00e0 do Paran\u00e1.<\/p>\n

Para Josep Iborra Plans, da Articula\u00e7\u00e3o Amaz\u00f4nia da Comiss\u00e3o Pastoral da Terra, “a maior parte das mortes s\u00e3o de pessoas lutando pela distribui\u00e7\u00e3o da terra em \u00e1reas de terra p\u00fablica griladas no passado por grandes fazendeiros”.<\/p>\n

Futuro<\/strong> – H\u00e1 uma preocupa\u00e7\u00e3o com o agravamento da viol\u00eancia, retratado pelas chacinas ocorridas neste ano. Pessoas ligadas ao tema entrevistadas pela BBC Brasil est\u00e3o pessimistas e apontam fatores que podem ampliar a disputa pelas terras na Amaz\u00f4nia.<\/p>\n

Entre eles, a queda dr\u00e1stica na reforma agr\u00e1ria. No ano passado, a quantidade de terras destinadas a este fim foi a menor j\u00e1 registrada: 27 mil hectares, de acordo com dados do Incra. Para compara\u00e7\u00e3o, em 2011 foram 1,9 milh\u00e3o de hectares.<\/p>\n

“O assentamento de reforma agr\u00e1ria parou desde os \u00faltimos anos do governo Dilma Rousseff. Al\u00e9m disso, com a crise econ\u00f4mica, a demanda por terras aumentou. H\u00e1 muita gente que est\u00e1 tentando voltar para o campo. O pessoal que tinha um pequeno neg\u00f3cio na cidade, por exemplo, e perdeu clientes. Tamb\u00e9m fecharam usinas hidrel\u00e9tricas, deixando gente desempregada”, aponta Plans, da Comiss\u00e3o Pastoral da Terra.<\/p>\n

Outro fator de preocupa\u00e7\u00e3o \u00e9 o desmatamento em alta. A quantidade de \u00e1reas desmatadas na Amaz\u00f4nia Legal voltou a crescer em 2015, de acordo com o Prodes.<\/p>\n

Medidas recentes tomadas pelo governo de Michel Temer tamb\u00e9m s\u00e3o vistas com preocupa\u00e7\u00e3o. Entre elas, a aprova\u00e7\u00e3o da MP 759, apelidada por grupos ambientalistas de “MP da grilagem” e sancionada pelo presidente em julho. Essa legisla\u00e7\u00e3o permite que sejam regularizadas vastas \u00e1reas localizadas em terras p\u00fablicas da Uni\u00e3o.<\/p>\n

“O presidente Temer est\u00e1 deixando as comunidades e as suas lideran\u00e7as expostas a amea\u00e7as e at\u00e9 mesmo a morte. Se o governo quiser garantir que os neg\u00f3cios beneficiem todos os brasileiros – e n\u00e3o apenas alguns – ent\u00e3o \u00e9 preciso regular melhor as empresas, proteger ativistas, julgar assassinos e garantir que as comunidades possam ter voz sobre o uso das terras”, opina Bem Leathe, da Global Witness.<\/p>\n

Procurada pela BBC Brasil, a Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agr\u00e1rio, respons\u00e1vel pelo Terra Legal, programa de regulariza\u00e7\u00e3o de terras p\u00fablicas federais na Amaz\u00f4nia, informou que a MP 759 n\u00e3o altera o objetivo principal do programa, “promover a governan\u00e7a fundi\u00e1ria da regi\u00e3o amaz\u00f4nica, tendo como consequ\u00eancia o desenvolvimento sustent\u00e1vel, a redu\u00e7\u00e3o do desmatamento, o combate a grilagem de terras e a redu\u00e7\u00e3o dos conflitos agr\u00e1rios”.<\/p>\n

“Cabe ainda esclarecer que somente ser\u00e3o regularizadas \u00e1reas onde exista ocupa\u00e7\u00e3o consolidada, mansa e pac\u00edfica”, completa.<\/p>\n

Em nota, a Secretaria de Seguran\u00e7a de Rond\u00f4nia diz que “vem atuando no Estado com a Patrulha Rural e priorizando a investiga\u00e7\u00e3o dos crimes relacionados ao conflito de terras buscando sempre uma pronta resposta”.<\/p>\n

J\u00e1 a Secretaria de Seguran\u00e7a do Par\u00e1 informa que “entende que o governo federal deve agilizar, efetivamente, as a\u00e7\u00f5es relacionadas \u00e0 reforma agr\u00e1ria a fim de prevenir os conflitos provocados pela posse da terra”. E acrescenta que tem realizado “v\u00e1rias reintegra\u00e7\u00f5es de posse” para prevenir a viol\u00eancia no campo. (Fonte: G1)<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

Mapeamento com base em dados da ONG Global Witness mostra que 87% das v\u00edtimas, em sua maioria sem-terra e trabalhadores rurais, morrem na Amaz\u00f4nia Legal.
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