{"id":140709,"date":"2017-12-11T00:01:24","date_gmt":"2017-12-11T02:01:24","guid":{"rendered":"http:\/\/noticias.ambientebrasil.com.br\/?p=140709"},"modified":"2017-12-10T21:31:34","modified_gmt":"2017-12-10T23:31:34","slug":"o-petroleo-esta-matando-criancas-na-nigeria","status":"publish","type":"post","link":"http:\/\/localhost\/clipping\/2017\/12\/11\/140709-o-petroleo-esta-matando-criancas-na-nigeria.html","title":{"rendered":"O petr\u00f3leo est\u00e1 matando crian\u00e7as na Nig\u00e9ria?"},"content":{"rendered":"

Em meio ao temporal, uma mulher corre para um restaurante em busca de abrigo, na cidade de Kogbara Dere, conhecida como K Dere, na Nig\u00e9ria.<\/p>\n

As garrafas de pl\u00e1stico com gasolina caseira que ela estava vendendo ficam para tr\u00e1s e s\u00e3o danificados pela forte chuva.<\/p>\n

O cheiro de gasolina exala do ch\u00e3o e paira brevemente no ar, antes de se misturar \u00e0 estrada enlameada.<\/p>\n

Ao seguir o rastro escorregadio do \u00f3leo derramado, por um labirinto de moradias de concreto, chegamos \u00e0 casa de Love Sunday.<\/p>\n

Cidade de l\u00e1grimas<\/h2>\n

Love teve seu quinto filho h\u00e1 pouco mais de um m\u00eas. Por duas semanas, estava tudo bem.<\/p>\n

“Quando o beb\u00ea nasceu, n\u00e3o houve problema nenhum”, diz ela.<\/p>\n

“Mas um dia, quando o peguei no colo, ele deu tr\u00eas suspiros e se foi”, recorda.<\/p>\n

“Eu ainda estou de luto, choro todos os dias.”<\/p>\n

Love n\u00e3o sabe a causa da morte do filho, porque n\u00e3o chegou a procurar um m\u00e9dico. Mas ela n\u00e3o \u00e9 a \u00fanica m\u00e3e na comunidade a enfrentar esse tipo de luto.<\/p>\n

Patience Sunday e o marido Batom, que vivem do outro lado da cidade, tamb\u00e9m tiveram seu primeiro filho em outubro. E ele viveu por apenas poucas horas.<\/p>\n

“Quando o beb\u00ea nasceu, ele n\u00e3o estava respirando. A enfermeira come\u00e7ou a cuidar dele e ele passou a respirar”, conta Patience.<\/p>\n

“Ent\u00e3o, levaram o beb\u00ea para dar banho, e ele faleceu.”<\/p>\n

Barinaadaa Saturday e Chief Bira Saturday t\u00eam uma hist\u00f3ria parecida.<\/p>\n

“Eu dei \u00e0 luz e o beb\u00ea morreu na mesma hora”, afirma Barinaadaa, que guarda um retrato emoldurado do filho. Com um gorro de l\u00e3 azul e rosa, ele parece estar dormindo.<\/p>\n

O epis\u00f3dio ocorreu em 2014, mas Barinaada e o marido n\u00e3o conseguiram ter outro filho.<\/p>\n

A propriedade do casal fica no local onde aconteceu o \u00faltimo grande derramamento de petr\u00f3leo em K Dere, ocorrido no mesmo ano da morte da crian\u00e7a.<\/p>\n

“Nossa \u00e1rea de cultivo est\u00e1 sempre cheia de \u00f3leo. Quando voc\u00ea vai l\u00e1, pode sentir o cheiro”, relata Chief Bira Saturday, que passou a sofrer de asma ap\u00f3s o vazamento.<\/p>\n

“O m\u00e9dico disse que esse \u00f3leo prejudicou o beb\u00ea no meu \u00fatero”, completa sua mulher.<\/p>\n

Patience Sunday ouviu algo semelhante dos m\u00e9dicos quando estava gr\u00e1vida.<\/p>\n

“O m\u00e9dico disse que eu n\u00e3o deveria sair na chuva ou usar \u00e1gua da chuva, porque a \u00e1gua da chuva cont\u00e9m \u00f3leo”, diz.<\/p>\n

Todos os pais com quem a reportagem da BBC conversou citaram outros casos de casais que tamb\u00e9m perderam beb\u00eas rec\u00e9m-nascidos.<\/p>\n

Assassino oculto?<\/h2>\n

Um estudo recente feito por um grupo de cientistas da Universidade de St Gallen, na Su\u00ed\u00e7a, pode dar algumas pistas sobre o que est\u00e1 ocorrendo com os beb\u00eas da regi\u00e3o.<\/p>\n

Segundo a pesquisa, crian\u00e7as nascidas a um raio de 10 quil\u00f4metros de um derramamento de petr\u00f3leo t\u00eam duas vezes mais chances de morrer no primeiro m\u00eas de vida.<\/p>\n

O estudo \u00e9 baseado inteiramente em dados. Foram usadas duas bases de informa\u00e7\u00e3o – o monitor de derramamento de \u00f3leo da Nig\u00e9ria, que registra a hora e o local dos vazamentos, e a pesquisa demogr\u00e1fica de sa\u00fade, que compila os nascimentos no pa\u00eds.<\/p>\n

Os cientistas buscaram dados de crian\u00e7as concebidas ap\u00f3s um derramamento. Em seguida, compararam seus indicadores de sa\u00fade com os de seus respectivos irm\u00e3os nascidos antes do vazamento.<\/p>\n

Na compara\u00e7\u00e3o, os pesquisadores exclu\u00edram algumas vari\u00e1veis, como pobreza, dieta alimentar e sa\u00fade dos pais, uma vez que irm\u00e3os encontram-se inseridos na mesma realidade.<\/p>\n

O resultado mostrou que as crian\u00e7as concebidas ap\u00f3s derramamentos de petr\u00f3leo tinham duas vezes mais chance de morrer no primeiro m\u00eas de vida.<\/p>\n

“O efeito (do derramamento de petr\u00f3leo na sa\u00fade dos rec\u00e9m-nascidos) foi muito maior do que o esperado – mais abrangente e duradouro”, explica Roland Hodler, professor de economia na Universidade de St Gallen e coautor do estudo.<\/p>\n

“Descobrimos que mesmo quando h\u00e1 um vazamento de \u00f3leo tr\u00eas ou quatro anos antes da concep\u00e7\u00e3o, ele ainda tem forte impacto em um futuro rec\u00e9m-nascido”, acrescenta.<\/p>\n

O estudo n\u00e3o aborda, no entanto, o que exatamente pode estar provocando essas mortes. Surpreendentemente, h\u00e1 pouca pesquisa sobre os efeitos da exposi\u00e7\u00e3o ao petr\u00f3leo n\u00e3o processado na sa\u00fade humana.<\/p>\n

Quando o petr\u00f3leo bruto \u00e9 derramado na terra, ele se infiltra no solo, vai para os len\u00e7\u00f3is fre\u00e1ticos e contamina o ar. Al\u00e9m disso, libera subst\u00e2ncias qu\u00edmicas que s\u00e3o nocivas – como benzeno e tolueno. O benzeno tem propriedades cancer\u00edgenas conhecidas, enquanto o tolueno pode causar danos ao rim e ao f\u00edgado.<\/p>\n

Al\u00e9m disso, muitos vazamentos em campos de petr\u00f3leo terrestres provocam inc\u00eandios, liberando uma fuma\u00e7a t\u00f3xica que pode gerar problemas respirat\u00f3rios.<\/p>\n

“Quando o sistema respirat\u00f3rio est\u00e1 bloqueado por essas part\u00edculas, causa problemas de sa\u00fade como asma, bronquite, enfisema. Sentimos sonol\u00eancia, falta de concentra\u00e7\u00e3o”, explica Vincent Weli, especialista em polui\u00e7\u00e3o do ar na Universidade de Port Harcourt, na Nig\u00e9ria.<\/p>\n

“Se mulheres gr\u00e1vidas forem expostas ao petr\u00f3leo bruto e inalarem essas emiss\u00f5es, a forma\u00e7\u00e3o do feto ser\u00e1 afetada”, completa.<\/p>\n

\u00c9 imposs\u00edvel saber se o petr\u00f3leo foi a causa da morte das crian\u00e7as citadas nesta reportagem. Mas n\u00e3o \u00e9 dif\u00edcil de acreditar que isso possa estar acontecendo em K Dere.<\/p>\n

A poucos quil\u00f4metros das casas dos pais entrevistados pela BBC, avistamos um dos locais em que houve vazamento. At\u00e9 onde a vista alcan\u00e7a, a terra verde est\u00e1 coberta de manchas chamuscadas e escuras, repleta de piscinas de petr\u00f3leo bruto, com seu inconfund\u00edvel brilho negro e pegajoso.<\/p>\n

H\u00e1 centenas de derramamentos de petr\u00f3leo todos os anos na Nig\u00e9ria, provenientes de oleodutos de diferentes companhias. Mas os vazamentos ocorridos especificamente nessa regi\u00e3o do pa\u00eds s\u00e3o origin\u00e1rios de dutos operados pela Shell.<\/p>\n

Posicionamento da Shell<\/h2>\n

A empresa assumiu a responsabilidade por dois derramamentos em K Dere – em 2009 e 2012. Mas, quando foi procurada para se posicionar sobre o conte\u00fado desta reportagem, a companhia informou que n\u00e3o tinha nada a comentar.<\/p>\n

Em rela\u00e7\u00e3o ao vazamento de 2009, a Shell afirmou que foram feitos esfor\u00e7os para limpar a \u00e1rea, mas foram suspensos devido ao “grande desafio de acesso \u00e0 regi\u00e3o de Ogoniland”.<\/p>\n

Ogoniland \u00e9 onde fica K Dere, palco de diversos protestos da popula\u00e7\u00e3o contra os danos ambientais provocados pela ind\u00fastria petroleira na regi\u00e3o.<\/p>\n

A Shell disse ainda que a ag\u00eancia governamental nigeriana de detec\u00e7\u00e3o e controle de derramamentos de petr\u00f3leo certificou a \u00e1rea onde os trabalhos de recupera\u00e7\u00e3o ocorreram e afirmou que as pessoas afetadas foram indenizadas.<\/p>\n

J\u00e1 sobre o vazamento de 2012, a petroleira disse que n\u00e3o pagou indeniza\u00e7\u00e3o porque “terceiros n\u00e3o foram afetados”.<\/p>\n

Em rela\u00e7\u00e3o a ambos os derramamentos, a empresa declarou que “est\u00e1 sendo feita uma an\u00e1lise detalhada para encerrar qualquer assunto pendente o mais r\u00e1pido poss\u00edvel”.<\/p>\n

Legalmente, \u00e9 responsabilidade da empresa respons\u00e1vel pelo oleoduto limpar qualquer vazamento dentro de 24 horas.<\/p>\n

Segundo a Shell, a impopularidade da empresa em Ogoniland tem dificultado a realiza\u00e7\u00e3o do trabalho de limpeza com seguran\u00e7a. A companhia tamb\u00e9m tem dito que muitos derramamentos foram criminosos.<\/p>\n

“O governo nigeriano falhou em regular essas empresas de petr\u00f3leo”, afirma Hodler.<\/p>\n

“As mesmas companhias internacionais que atuam na Nig\u00e9ria se comportam de forma diferente na Noruega ou no Texas”, completa.<\/p>\n

Mas a popula\u00e7\u00e3o local tamb\u00e9m tem um papel nessa hist\u00f3ria. Muitos moradores est\u00e3o envolvidos no refino caseiro de petr\u00f3leo – e vendem gasolina feita a partir de \u00f3leo bruto roubado de tubula\u00e7\u00f5es rompidas. \u00c9 o caso da vizinha de Love Sunday, mencionada no in\u00edcio desta reportagem.<\/p>\n

O novo estudo n\u00e3o foca as causas – ou os respons\u00e1veis – pelos derramamentos. Mas destaca que h\u00e1 uma necessidade urgente de se pesquisar mais a fundo o impacto do petr\u00f3leo na sa\u00fade das pessoas.<\/p>\n

At\u00e9 que isso aconte\u00e7a, centenas, talvez milhares, de crian\u00e7as podem estar correndo perigo. E muitos outros pais, que vivem o luto da perda dos filhos rec\u00e9m-nascidos, v\u00e3o continuar sem respostas.<\/p>\n

Fonte: BBC<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

Quando um trov\u00e3o ecoa no Delta do N\u00edger, \u00e9 sinal de que uma chuva forte se aproxima. <\/a><\/p>\n<\/div>","protected":false},"author":3,"featured_media":0,"comment_status":"closed","ping_status":"closed","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":{"footnotes":""},"categories":[4],"tags":[1411,1410,474],"_links":{"self":[{"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/140709"}],"collection":[{"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/posts"}],"about":[{"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/types\/post"}],"author":[{"embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/users\/3"}],"replies":[{"embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/comments?post=140709"}],"version-history":[{"count":1,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/140709\/revisions"}],"predecessor-version":[{"id":140710,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/140709\/revisions\/140710"}],"wp:attachment":[{"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/media?parent=140709"}],"wp:term":[{"taxonomy":"category","embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/categories?post=140709"},{"taxonomy":"post_tag","embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/tags?post=140709"}],"curies":[{"name":"wp","href":"https:\/\/api.w.org\/{rel}","templated":true}]}}