{"id":142049,"date":"2018-02-26T00:00:45","date_gmt":"2018-02-26T03:00:45","guid":{"rendered":"http:\/\/noticias.ambientebrasil.com.br\/?p=142049"},"modified":"2018-02-25T22:14:33","modified_gmt":"2018-02-26T01:14:33","slug":"a-ilha-do-litoral-de-sao-paulo-com-a-segunda-maior-concentracao-de-cobras-do-planeta","status":"publish","type":"post","link":"http:\/\/localhost\/clipping\/2018\/02\/26\/142049-a-ilha-do-litoral-de-sao-paulo-com-a-segunda-maior-concentracao-de-cobras-do-planeta.html","title":{"rendered":"A ilha do litoral de S\u00e3o Paulo com a segunda maior concentra\u00e7\u00e3o de cobras do planeta"},"content":{"rendered":"
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Uma pequena ilha rochosa, escarpada, sem praias e de dif\u00edcil acesso, localizada a 35 km do litoral de S\u00e3o Paulo, entre as cidades de Peru\u00edbe e Itanha\u00e9m, tem chamado a aten\u00e7\u00e3o ao longo dos \u00faltimo cinco s\u00e9culos por uma caracter\u00edstica ins\u00f3lita: \u00e9 habitada quase que exclusivamente por uma esp\u00e9cie de cobra, a jararaca-ilhoa (Bothrops insularis).<\/p>\n<\/div>\n

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A Ilha da Queimada Grande, conhecida como Ilha das Cobras, se destaca ainda por ter a segunda maior concentra\u00e7\u00e3o desses animais por \u00e1rea no mundo: cerca de 45 cobras por hectare \u2013 mais ou menos equivalente ao tamanho de um campo de futebol \u2013, perdendo apenas para a Ilha de Shedao, na China.<\/p>\n<\/div>\n

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Com comprimento e largura m\u00e1ximos de 1.500 e 500 metros, respectivamente, e altitude que n\u00e3o supera os 200 metros, a Ilha das Cobras, de 43 hectares, foi descoberta em 1532, pela expedi\u00e7\u00e3o colonizadora de Martim Afonso de Souza.<\/p>\n<\/div>\n

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De acordo com as bi\u00f3logas Karina Nunes Kasperoviczus, hoje na Universidade de Sydney, na Austr\u00e1lia, e Selma Maria de Almeida-Santos, do Instituto Butantan, provavelmente Afonso de Souza e seus oficiais protagonizaram o primeiro caso de depreda\u00e7\u00e3o do local.<\/p>\n<\/div>\n

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No artigo cient\u00edfico Instituto Butantan e a jararaca-ilhoa: cem anos de hist\u00f3ria, mitos e ci\u00eancia, publicado nos Cadernos de Hist\u00f3ria da Ci\u00eancia, do Instituto Butantan, elas contam que, de passagem pela costa sudeste do Brasil, os navegadores aportaram na ilha, ca\u00e7aram diversas fragatas e mergulh\u00f5es e, antes de voltarem aos navios, receosos de m\u00e1 sorte, atearam fogo no local.<\/p>\n<\/div>\n

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N\u00e3o existe, no entanto, registro de que durante a perman\u00eancia por l\u00e1 Martim Afonso de Souza e seus homens tenham tido qualquer contato com a Bothrops insularis.<\/p>\n<\/div>\n

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Segundo Karina e Selma, a pr\u00e1tica de atear fogo \u00e0 ilha se tornou corriqueira algum tempo depois. “No final do s\u00e9culo 19, a Marinha do Brasil implantou um farol l\u00e1, cuja manuten\u00e7\u00e3o era realizada por faroleiros que residiam no local”, escrevem.<\/p>\n

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“Com medo das serpentes, a pr\u00f3pria Marinha colocou por diversas vezes fogo na mata na tentativa de acabar com a popula\u00e7\u00e3o excessiva delas. O nome ‘Queimada Grande’ \u00e9 resultado dessas recorrentes queimadas, que, por vezes, eram t\u00e3o fortes que podiam ser avistadas do continente.”<\/p>\n<\/div>\n

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Evolu\u00e7\u00e3o<\/h2>\n<\/div>\n<\/div>\n
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A hist\u00f3ria da Ilha das Cobras \u00e9 bem mais antiga, no entanto. Ela se formou no final da \u00faltima era glacial, h\u00e1 cerca de 11 mil anos, quando o n\u00edvel do mar subiu, separando aquele morro (que fazia parte da Serra do Mar) do continente, transformando-o numa ilha e isolando uma popula\u00e7\u00e3o de jararacas comuns (Bothrops jararaca).<\/p>\n<\/div>\n

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Ao longo dos milhares de anos seguintes, a esp\u00e9cie se diferenciou de suas parentes de terra firme e se transformou na Bothrops insularis.<\/p>\n<\/div>\n

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Segundo o pesquisador e especialista em animais pe\u00e7onhentos Vidal Haddad J\u00fanior, da Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade Estadual Paulista (Unesp), o isolamento e as condi\u00e7\u00f5es geogr\u00e1ficas da ilha lentamente modificaram as caracter\u00edsticas das cobras em rela\u00e7\u00e3o \u00e0s jararacas continentais, criando a nova esp\u00e9cie.<\/p>\n

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“Ela \u00e9 menor e menos pesada, para facilitar sua locomo\u00e7\u00e3o e a ca\u00e7ada diurna nas \u00e1rvores”, explica. “Sua cauda adquiriu capacidade pre\u00eansil (ou seja, de se agarrar a algo) e a denti\u00e7\u00e3o ganhou um aspecto mais curvo, para prender as aves mais facilmente e n\u00e3o solt\u00e1-las enquanto o veneno age.”<\/p>\n<\/div>\n

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Para se tornar uma cobra que vive sobretudo em \u00e1rvores (ou arbor\u00edcola), a jararaca-ilhoa desenvolveu outras caracter\u00edsticas evolutivas \u00fanicas.<\/p>\n<\/div>\n

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“Para subir em \u00e1rvores, sua pele se tornou mais el\u00e1stica do que a de suas parentes do continente”, explica Ot\u00e1vio Marques, pesquisador e diretor do Laborat\u00f3rio de Ecologia e Evolu\u00e7\u00e3o do Instituto Butantan, que realizou v\u00e1rias pesquisas com essa serpente.<\/p>\n<\/div>\n

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“Al\u00e9m disso, como ela ergue mais a cabe\u00e7a, seu cora\u00e7\u00e3o ficou mais pr\u00f3ximo dessa parte de sua anatomia, para bombear com mais facilidade o sangue para o c\u00e9rebro.”<\/p>\n<\/div>\n

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Nova esp\u00e9cie<\/h2>\n<\/div>\n<\/div>\n
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N\u00e3o \u00e9 de hoje que o Instituto Butantan estuda a ilha e a jararaca-ilhoa. O primeiro lote dessa esp\u00e9cie foi recebido pela institui\u00e7\u00e3o em 1911, enviado pelo zelador do farol, que residia no local, Ant\u00f4nio Esperidi\u00e3o da Silva. Elas logo come\u00e7aram a ser estudadas pelo herpet\u00f3logo Jo\u00e3o Flor\u00eancio Gomes, que n\u00e3o chegou a concluir o trabalho, pois morreu em 1919, aos 33 anos.<\/p>\n<\/div>\n

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O pesquisador Afr\u00e2nio do Amaral deu continuidade \u00e0s pesquisas e, em 1922, descreveu cientificamente a nova esp\u00e9cie. “Ele logo descobriu que ela se alimentava quase exclusivamente de p\u00e1ssaros, ao contr\u00e1rio das esp\u00e9cies do continente, que predam pequenos mam\u00edferos e r\u00e9pteis”, conta Vidal Haddad.<\/p>\n<\/div>\n

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Amaral descobriu ainda que a pe\u00e7onha destas jararacas era muito mais ativa em aves e altamente potente, o que despertou o interesse sobre a esp\u00e9cie, que s\u00f3 existe na ilha.<\/p>\n<\/div>\n

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“O veneno da jararaca-ilhoa \u00e9 mais t\u00f3xico para aves do que para mam\u00edferos”, explica o bi\u00f3logo Marcelo Ribeiro Duarte, do Laborat\u00f3rio de Cole\u00e7\u00f5es Zool\u00f3gicas do Instituto Butantan. “O que prova a grande adaptabilidade da esp\u00e9cie.”<\/p>\n<\/div>\n

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A Bothrops insularis mede entre meio metro e um metro, com as f\u00eameas sendo ligeiramente maiores. “Como a fauna da ilha \u00e9 muito escassa, n\u00e3o existindo roedores nem outros mam\u00edferos (com exce\u00e7\u00e3o de morcegos), os adultos da esp\u00e9cie se alimentam de aves migrat\u00f3rias (os p\u00e1ssaros residentes n\u00e3o s\u00e3o predados)”, diz Haddad. “Os filhotes comem pequenos lagartos, anf\u00edbios e artr\u00f3podes, como as lacraias, por exemplo.”<\/p>\n<\/div>\n

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Outra caracter\u00edstica dessa serpente \u00e9 que ela \u00e9 viv\u00edpara (n\u00e3o p\u00f5e ovos, mas gesta a prole de maneira semelhantes aos mam\u00edferos) e d\u00e1 \u00e0 luz 10 filhotes no per\u00edodo quente do ano.<\/p>\n<\/div>\n

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Mitos e lendas<\/h2>\n<\/div>\n<\/div>\n
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Talvez por ser muito numerosa e altamente venenosa, a jararaca-ilhoa \u00e9 objeto de diversos mitos e lendas. Uma delas diz que as cobras foram colocadas l\u00e1 por piratas, para proteger um tesouro escondido.<\/p>\n<\/div>\n

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De acordo com outra, um faroleiro e sua fam\u00edlia foram mortos por suas picadas. Mas isso n\u00e3o ocorreu. No m\u00e1ximo foram mortos alguns animais dom\u00e9sticos, como c\u00e3es, gatos e galinhas.<\/p>\n

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De qualquer forma, n\u00e3o existe mais o risco de algum faroleiro ser morto por uma picada da jararaca-ilhoa. O farol foi automatizado em 1925 e sua manuten\u00e7\u00e3o \u00e9 feita uma vez por ano por uma equipe da Marinha do Brasil. O acesso \u00e0 ilha \u00e9 estritamente controlado e requer de autoriza\u00e7\u00e3o do Governo Federal. Esta \u00e9 dada principalmente para pesquisadores.<\/p>\n<\/div>\n

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“Apesar do \u00f3bvio risco que as cobras representam para quem entrar no local desavisado, ele quase n\u00e3o existe na pr\u00e1tica”, tranquiliza Haddad. “(A ilha) \u00e9 desabitada e quem a visita est\u00e1 ciente dos cuidados que deve tomar para evitar picadas.”<\/p>\n<\/div>\n

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Amea\u00e7a de extin\u00e7\u00e3o<\/h2>\n<\/div>\n<\/div>\n
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De acordo com ele, hoje quem tem que ter cuidado s\u00e3o as cobras. Apesar de a Ilha da Queimada Grande ser uma \u00c1rea de Relevante Interesse Ecol\u00f3gico (ARIE) e pertencer \u00e0 \u00c1rea de Prote\u00e7\u00e3o Ambiental (APA) de Canan\u00e9ia-Iguape-Peru\u00edbe, a jararaca-ilhoa est\u00e1 criticamente amea\u00e7ada de Extin\u00e7\u00e3o.<\/p>\n<\/div>\n

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A esp\u00e9cie faz parte da Lista Nacional das Esp\u00e9cies da Fauna Brasileira Amea\u00e7ada de Extin\u00e7\u00e3o e da Lista Vermelha das Esp\u00e9cies Amea\u00e7adas da organiza\u00e7\u00e3o Uni\u00e3o Internacional pela Conserva\u00e7\u00e3o da Natureza (IUCN, na sigla em ingl\u00eas).<\/p>\n<\/div>\n

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A amea\u00e7a de extin\u00e7\u00e3o decorre das queimadas, feitas por pescadores que querem desembarcar no local, e pela biopirataria, ou seja, a captura ilegal para venda. Um exemplar da cobra pode alcan\u00e7ar R$ 30 mil no mercado negro.<\/p>\n<\/div>\n

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“Se pensarmos na capacidade de venenos serem a base de medicamentos e na fant\u00e1stica evolu\u00e7\u00e3o e adapta\u00e7\u00e3o das cobras em um ambiente isolado, elas s\u00e3o mais um tesouro a ser preservado do que uma amea\u00e7a aos humanos”, diz Haddad.<\/p>\n<\/div>\n

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S\u00f3 isso j\u00e1 justificaria o interesse cient\u00edfico na Bothrops insularis. Mas h\u00e1 outras raz\u00f5es. “O isolamento de cobras a partir das grandes massas continentais \u00e9 uma oportunidade \u00fanica para se estabelecerem rela\u00e7\u00f5es evolutivas sob condi\u00e7\u00f5es severas na maioria das vezes, como, por exemplo, falta de fontes de \u00e1gua e escassez de presas”, explica Duarte.<\/p>\n<\/div>\n

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“Al\u00e9m disso, a presen\u00e7a dessa esp\u00e9cie isolada \u00e9 um testemunho dos fen\u00f4menos de flutua\u00e7\u00e3o do n\u00edvel dos oceanos no per\u00edodo Pleistoceno (1,8 milh\u00e3o a 11 mil anos atr\u00e1s).”<\/p>\n

Fonte: BBC<\/p>\n<\/div>\n<\/div>\n<\/div>\n<\/div>\n

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