{"id":143110,"date":"2018-04-16T00:04:20","date_gmt":"2018-04-16T03:04:20","guid":{"rendered":"http:\/\/noticias.ambientebrasil.com.br\/?p=143110"},"modified":"2018-04-15T21:37:16","modified_gmt":"2018-04-16T00:37:16","slug":"conservar-a-natureza-tirar-partido-dos-recursos","status":"publish","type":"post","link":"http:\/\/localhost\/clipping\/2018\/04\/16\/143110-conservar-a-natureza-tirar-partido-dos-recursos.html","title":{"rendered":"Conservar a natureza, tirar partido dos recursos"},"content":{"rendered":"
N\u00e3o \u00e9 uma descoberta recente. A oferta tur\u00edstica cabo-verdiana n\u00e3o se resume a sol, praia,\u00a0resorts<\/em> e\u00a0all inclusive<\/em>. Apesar de pequeno, o pa\u00eds tem uma grande diversidade paisag\u00edstica, que se reflecte na possibilidade de agradar a diferentes p\u00fablicos. Ao longo dos anos, as sucessivas tutelas t\u00eam real\u00e7ado essas muitas possibilidades e, com maior ou menor compet\u00eancia, promovido o Cabo Verde plural. Nesta equa\u00e7\u00e3o cabe um destino menos prov\u00e1vel: Santa Luzia.<\/p>\n Reserva natural, classificada desde 2003, formada, al\u00e9m da ilha principal, pelos ilh\u00e9us Branco e Raso, Santa Luzia tem potencial tur\u00edstico por explorar. Pelo menos, \u00e9 essa a convic\u00e7\u00e3o de quem conhece de perto cada recanto de um verdadeiro para\u00edso na terra.<\/p>\n Poucos saber\u00e3o t\u00e3o bem do que falam como Tommy Melo, presidente da Biosfera I, organiza\u00e7\u00e3o n\u00e3o-governamental ligada \u00e0 protec\u00e7\u00e3o ambiental, com sede em S\u00e3o Vicente, e que desde 2006 desenvolve actividades de conserva\u00e7\u00e3o do ecossistema de Santa Luzia e seus ilh\u00e9us.<\/p>\n \u201cSe um dia ganhasse, pelo menos, uns tr\u00eas Euromilh\u00f5es pediria para comprar a reserva, fechava aquilo e deixava que ficasse um para\u00edso ed\u00edlico para sempre. \u00c9 isso que os conservacionistas sempre querem. S\u00f3 que isso n\u00e3o \u00e9 poss\u00edvel de acontecer e nem \u00e9 desej\u00e1vel, do ponto de vista social. As pessoas precisam de conhecer aquilo que querem proteger. Portanto, acho que sim. \u00c9 preciso e deixar\u00e1 falta, sim, implementar actividades tur\u00edsticas, n\u00e3o s\u00f3 para os cabo-verdianos, como para estrangeiros que queiram conhecer a riqueza daquilo que \u00e9 a maior reserva natural do pa\u00eds\u201d, comenta.<\/p>\n Para que se passe da teoria \u00e0 pr\u00e1tica, \u00e9 necess\u00e1rio que tudo esteja enquadrado, planeado, previsto. A reserva apresenta um ecossistema fr\u00e1gil, com esp\u00e9cies end\u00e9micas e outras de alto valor ecol\u00f3gico, sujeitas a m\u00faltiplas amea\u00e7as.<\/p>\n O plano de gest\u00e3o da reserva de Santa Luzia, elaborado h\u00e1 alguns anos sujeito a altera\u00e7\u00f5es ao longo do tempo – e \u00e0 espera de aprova\u00e7\u00e3o, para ganhar for\u00e7a legal, torna-se um documento central. Sem ele, n\u00e3o s\u00f3 os esfor\u00e7os de conserva\u00e7\u00e3o da biodiversidade ficam condicionados, como o aproveitamento econ\u00f3mico do destino, pela via do turismo, e actividades indirectas por ele geradas, torna-se praticamente imposs\u00edvel.<\/p>\n \u201cMuitas das actividades que est\u00e3o contempladas neste plano de gest\u00e3o j\u00e1 v\u00eam sendo implementadas pela Biosfera, juntamente com os seus parceiros nacionais e internacionais. Por exemplo, toda a conserva\u00e7\u00e3o de aves marinhas, das tartarugas, os v\u00e1rios estudos cient\u00edficos que s\u00e3o feitos em parceria com universidades estrangeiras e nacionais, tudo isso de forma a tentar antecipar um bocadinho a aprova\u00e7\u00e3o do plano de gest\u00e3o, refere Tommy Melo.<\/p>\n \u201cObviamente, o plano de gest\u00e3o \u00e9 uma ferramenta muito importante, porque ir\u00e1 guiar partes muito importantes da conserva\u00e7\u00e3o da reserva, nomeadamente, a fiscaliza\u00e7\u00e3o e implementa\u00e7\u00e3o de actividades de turismo\u201d, acrescenta.<\/p>\n Zoneamento<\/p>\n A explora\u00e7\u00e3o tur\u00edstica de zonas classificadas como reservas naturais n\u00e3o \u00e9 uma novidade, sequer \u00e9 algo raro. Pelo contr\u00e1rio, tem sido uma op\u00e7\u00e3o assumida internacionalmente por quem gere estas \u00e1reas, com diferentes objectivos.<\/p>\n Desde logo, permite envolver as comunidades locais na vida da pr\u00f3pria reserva, centrando a aten\u00e7\u00e3o na preserva\u00e7\u00e3o. Por outro lado, garante a cria\u00e7\u00e3o de riqueza que, al\u00e9m de agradar ao Estado (que n\u00e3o rejeita uma fonte de rendimento), ajuda a financiar os pr\u00f3prios esfor\u00e7os de conserva\u00e7\u00e3o e a dinamizar a economia.<\/p>\n No plano de gest\u00e3o de Santa Luzia avan\u00e7ou-se para uma solu\u00e7\u00e3o de zoneamento, ou seja, para a defini\u00e7\u00e3o de \u00e1reas com diferentes tipos de classifica\u00e7\u00f5es, a que correspondem diferentes tipos de actividades permitidas. Ou seja, n\u00e3o se pro\u00edbe a pesca tradicional, n\u00e3o se pro\u00edbem os desportos n\u00e1uticos, n\u00e3o se pro\u00edbem outros tipos de actividades tur\u00edsticas. Apenas se estabelecem zonas pr\u00f3prias para o efeito, para que Natureza, comunidades, economia e Estado saiam todos a ganhar.<\/p>\n \u201cNeste momento, 90% ou mais dos pescadores que utilizam a reserva para pescar, utilizam-na com o seu saber e utilizam artes de pescas tradicionais e essas comunidades est\u00e3o muit\u00edssimo chateadas com aqueles outros 10% que cometem infrac\u00e7\u00f5es, que utilizam artes de pesca que servem pura e simplesmente para degradar\u201d, exemplifica o presidente da Biosfera.<\/p>\n Professor da Universidade de Cabo Verde, o bi\u00f3logo marinho Rui Freitas subscreve a ideia de uma reserva tamb\u00e9m virada para o turismo. O investigador fala-nos da possibilidade de se trabalhar economicamente a \u00e1rea protegida, sem que com isso se comprometa o equil\u00edbrio ambiental.<\/p>\n \u201cOs turistas que visitam estes s\u00edtios de forma organizada j\u00e1 est\u00e3o informados dos procedimentos, por exemplo, por onde andar. Obviamente, ter\u00e3o sempre um guia treinado e n\u00e3o se pode fugir a uma s\u00e9rie de regras. No caso de Santa Luzia, penso que ter\u00e3o que desenvolver trilhos pr\u00f3prios para a movimenta\u00e7\u00e3o humana\u201d, explica.<\/p>\n \u201cA Madeira \u00e9 extraordin\u00e1ria nesse sentido. Com o ganho que tiveram com o turismo nas \u00e1reas protegidas, conseguem provar que se ganha mais, do ponto de vista de rendimento, tendo uma \u00e1rea protegida, do que n\u00e3o tendo essa classifica\u00e7\u00e3o\u201d, ilustra.<\/p>\n Nem de prop\u00f3sito, Paulo Oliveira, vice-presidente do Instituto de Conserva\u00e7\u00e3o da Natureza da Madeira (ICNM) tem trabalhado nas chamadas desertas, um conjunto de ilhas n\u00e3o habitadas, pertencentes ao arquip\u00e9lago da Madeira, e que t\u00eam tamb\u00e9m, \u00e0 semelhan\u00e7a de Santa Luzia, uma riqueza natural significativa. S\u00e3o precisos cuidados, sim, mas \u00e9 poss\u00edvel conciliar interesses.<\/p>\n \u201cDurante muito tempo era um tema tabu. Era quase como se fossem coisas inconcili\u00e1veis. Ou a \u00e1rea protegida existia ou existia o turismo. Hoje em dia, temos uma maneira de ver completamente diferente. Acho que h\u00e1 aqui um processo demorado de consolida\u00e7\u00e3o das \u00e1reas protegidas. Quando uma \u00e1rea protegida \u00e9 criada e come\u00e7a-se o seu processo de implementa\u00e7\u00e3o e a sua gest\u00e3o, n\u00e3o podemos logo pensar em ter ali um turismo consolidado. H\u00e1 que, primeiro, consolidar aquilo que \u00e9 a gest\u00e3o e consolida\u00e7\u00e3o da \u00e1rea protegida e, aos poucos, de acordo com a resposta do p\u00fablico, dos\u00a0stakeholders<\/em>, ir criando esse segmento, como um dos factores importantes a desenvolver\u201d, defende.<\/p>\n As Ilhas Desertas est\u00e3o classificadas como Zona Especial de Conserva\u00e7\u00e3o e Zona de Protec\u00e7\u00e3o Especial. Em 2016, dados do ICNM, cerca de 5.000 pessoas visitaram as Desertas, distribu\u00eddas pelas seis empresas que organizam as viagens \u00e0quela reserva natural.<\/p>\n Da sua experi\u00eancia no terreno, Paulo Oliveira considera que, de uma maneira geral, o comportamento do turista est\u00e1 adequado \u00e0 singularidade da experi\u00eancia que lhe \u00e9 oferecida. Em caso de incumprimento, h\u00e1 responsabiliza\u00e7\u00e3o, n\u00e3o s\u00f3 de quem prevarica, como da pr\u00f3pria ag\u00eancia que ofereceu o servi\u00e7o.<\/p>\n \u201cTodas as embarca\u00e7\u00f5es que levam pessoas \u00e0s Desertas t\u00eam a bordo um\u00a0skipper<\/em> ou uma segunda pessoa que tiveram forma\u00e7\u00e3o dada por n\u00f3s, que durante a viagem explicam o que \u00e9 que as pessoas v\u00e3o encontrar, o que podem e n\u00e3o podem fazer. Se o turista se porta mal, n\u00e3o \u00e9 o turista que \u00e9 penalizado, \u00e9 a empresa e o skipper\u201d, nota.<\/p>\n Possibilidades<\/p>\n O perfil do turista de natureza \u00e9 habitualmente distinto daquele que procura o\u00a0all inclusive<\/em>. A literatura cient\u00edfica identifica o p\u00fablico-alvo como algu\u00e9m que, vivendo durante o ano em zonas urbanas, ocupa o tempo livre com actividades no exterior. Nalguns casos, este tipo de turista est\u00e1 mesmo dispon\u00edvel para viajar longas dist\u00e2ncias ao encontro de algo muito espec\u00edfico como uma ave, um peixe, uma planta. Espera uma experi\u00eancia cultural forte, de interac\u00e7\u00e3o com a comunidade local, sem deixar de ser exigente com a qualidade do destino e dos servi\u00e7os prestados.<\/p>\n O bi\u00f3logo Pedro Geraldes, da Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA), exemplifica.<\/p>\n \u201cNo caso concreto das aves, Santa Luzia tem a Cagarra de Cabo Verde – o Raso e o Branco t\u00eam das maiores col\u00f3nias que existem em todo o arquip\u00e9lago. A Calhandra do Raso, no mundo inteiro, s\u00f3 existe no Raso e \u00e9 uma das esp\u00e9cies mais raras do mundo. H\u00e1 pessoas que gastam milhares de euros s\u00f3 para irem ver esta esp\u00e9cie e acrescent\u00e1-la \u00e0 sua lista. N\u00e3o temos ideia, mas h\u00e1 pessoas de pa\u00edses como Inglaterra, Su\u00e9cia, EUA que viajam o mundo inteiro para fazer uma colec\u00e7\u00e3o de uma esp\u00e9cie nova. Gastam muito dinheiro para ver essas esp\u00e9cies, porque atribuem-lhes mais valor do que n\u00f3s mesmos, que as vemos todos os dias\u201d.<\/p>\n Al\u00e9m da observa\u00e7\u00e3o de p\u00e1ssaros, as possibilidades s\u00e3o v\u00e1rias. Sem esfor\u00e7o, Tommy Melo identifica actividades que poder\u00e3o vir a ser desenvolvidas.<\/p>\n \u201cDo que eu conhe\u00e7o e j\u00e1 conheci de outras partes do mundo, com algum tipo de explora\u00e7\u00e3o a esse n\u00edvel, imagino [em Santa Luzia] o turismo vocacionado para actividades marinhas, como mergulho recreativo bem regulamentado, observa\u00e7\u00e3o de tartarugas, observa\u00e7\u00e3o de cet\u00e1ceos. Em certas \u00e9pocas do ano, o turismo de estrelas, o campismo selvagem, em que o turista poder\u00e1 comprar o peixe directamente dos pescadores artesanais, bem como o trekking, j\u00e1 praticado noutras ilhas\u201d, lista o presidente da Biosfera I.<\/p>\n Qualificar Santa Luzia enquanto destino tur\u00edstico, sem colocar em causa o fr\u00e1gil ecossistema, com todas as suas especificidades, obrigar\u00e1 a um trabalho conjunto de diferentes actores, cujo balizamento e linhas orientadoras dependem do Estado e das autoridades ligadas ao ambiente. Mais uma vez, a implementa\u00e7\u00e3o de um plano de gest\u00e3o \u00e9 fundamental, para que se avance em qualquer uma das direc\u00e7\u00f5es poss\u00edveis.<\/p>\n Para esta reportagem, realizada em conjunto com a R\u00e1dio Morabeza, tent\u00e1mos chegar \u00e0 fala com a Direc\u00e7\u00e3o Nacional do Ambiente (DNA) e com a directora da Reserva de Santa Luzia. Na DNA foi-nos pedido que envi\u00e1ssemos um email, o que fizemos, e ao qual n\u00e3o obtivemos resposta. A directora da reserva escusou-se a dar entrevista, por n\u00e3o estar autorizada a falar.<\/p>\n Fonte: Expresso das Ilhas<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":" O turismo em \u00e1reas protegidas \u00e9 poss\u00edvel e desej\u00e1vel, dizem os conservacionistas. Santa Luzia oferece oportunidades \u00fanicas.<\/p>\n