{"id":143911,"date":"2018-05-30T00:05:30","date_gmt":"2018-05-30T03:05:30","guid":{"rendered":"http:\/\/noticias.ambientebrasil.com.br\/?p=143911"},"modified":"2018-05-29T21:03:39","modified_gmt":"2018-05-30T00:03:39","slug":"o-resort-onde-os-hospedes-pagam-para-tomar-banho-em-aguas-radioativas","status":"publish","type":"post","link":"http:\/\/localhost\/clipping\/2018\/05\/30\/143911-o-resort-onde-os-hospedes-pagam-para-tomar-banho-em-aguas-radioativas.html","title":{"rendered":"O resort onde os h\u00f3spedes pagam para tomar banho em \u00e1guas radioativas"},"content":{"rendered":"

\"RadiumImage caption<\/span><\/h1>\n

Adesivos de advert\u00eancia com s\u00edmbolo radioativo se espalham pelo local (Cr\u00e9dito: Matthew Vickery)<\/span><\/h1>\n
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“Lembro-me de que, fizesse frio ou calor l\u00e1 fora, era sempre muito quente l\u00e1 dentro”, diz Zdenek Mandrholec, apoiando-se em uma bengala enquanto fala do lado de fora da entrada da mina na cidade de Jachymov, na Rep\u00fablica Tcheca, na fronteira com a Alemanha.<\/p>\n

“Eles [os sovi\u00e9ticos] podiam fazer o que quisessem conosco.”<\/p>\n

A idade avan\u00e7ada – Mandrholec tem 87 anos – j\u00e1 n\u00e3o lhe permite mais entrar na mina, mas ele sabe muito bem como \u00e9 seu interior. Foram sete anos como prisioneiro pol\u00edtico sovi\u00e9tico, for\u00e7ado a buscar ur\u00e2nio para alimentar a corrida armamentista durante a Guerra Fria.<\/p>\n

As colinas que cercam Jachymov est\u00e3o repletas de ur\u00e2nio. Foi ali que o min\u00e9rio contendo uraninita foi descoberto pela primeira vez, no final do s\u00e9culo 19, por Marie Curie, a cientista polonesa naturalizada francesa que fez pesquisas pioneiras sobre radioatividade.<\/p>\n

Mas foi na esteira da 2\u00aa Guerra Mundial, quando os comunistas tomaram a Tchecoslov\u00e1quia, que a minera\u00e7\u00e3o de ur\u00e2nio realmente decolou – com a for\u00e7a laboral de milhares de presos pol\u00edticos como Mandrholec.<\/p>\n

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Sovi\u00e9ticos usavam checos para garimpar ur\u00e2nio (Cr\u00e9dito: Matthew Vickery)<\/div>\n

No seu auge, na d\u00e9cada de 1950, 12 minas de ur\u00e2nio estavam operando dentro e ao redor do vilarejo, transformando as colinas em um perigoso labirinto subterr\u00e2neo e Jachymov, em um grande campo de concentra\u00e7\u00e3o sovi\u00e9tico (a Uni\u00e3o Sovi\u00e9tica exercia grande influ\u00eancia pol\u00edtica sobre os pa\u00edses da chamada Cortina de Ferro).<\/p>\n

Usados como m\u00e3o de obra descart\u00e1vel, os prisioneiros eram expostos a material nuclear com poucas m\u00e1scaras e macac\u00f5es de prote\u00e7\u00e3o. Perto da entrada do vilarejo, uma torre de tijolos vermelhos ainda permanece de p\u00e9 – a “Torre da Morte”, observa Mandrholec, um local onde o min\u00e9rio de ur\u00e2nio era reduzido a p\u00f3 e os prisioneiros obrigados a trabalhar sem qualquer prote\u00e7\u00e3o.<\/p>\n

Dentro das minas, acidentes eram comuns, com seus t\u00faneis ocos desmoronando com frequ\u00eancia por cima dos homens.<\/p>\n

“Me lembro de uma vez que o teto desabou sobre um homem. O corpo acabou arrastado para um dos t\u00faneis verticais da mina; ficamos coletando peda\u00e7os dele por dias”, diz Mandrholec, enxugando as l\u00e1grimas. Ele foi capturado e aprisionado ap\u00f3s tentar fugir do pa\u00eds em 1953.<\/p>\n

\"Jachymov\"Image caption<\/div>\n
Ur\u00e2nio foi descoberto nas colinas de Jachymov no s\u00e9culo 19 (Cr\u00e9dito: Martin Trabalik)<\/div>\n

“Poder\u00edamos conversar sobre esse tipo de acidente a noite toda”, acrescenta ele.<\/p>\n

Enquanto as mesmas minas nas quais Mandrholec trabalhou durante anos foram fechadas d\u00e9cadas atr\u00e1s, uma mina de ur\u00e2nio permanece curiosamente aberto no vilarejo.<\/p>\n

Mas o ur\u00e2nio n\u00e3o \u00e9 mais garimpado l\u00e1 – a economia agora gira em torno da \u00e1gua radioativa.<\/p>\n

In\u00fameros edif\u00edcios est\u00e3o abandonados, dilapidados ou desmoronados em Jachymov, mas um complexo de spa imenso e branco, o Radium Palace, domina a entrada do vilarejo.<\/p>\n

No interior do pr\u00e9dio, inaugurado em 1912, clientes abastados com roup\u00f5es brancos percorrem tapetes vermelhos atrav\u00e9s de grandes corredores. Alguns deles buscam aqui um tratamento muito alternativo – um banho em \u00e1gua radioativa com rad\u00f4nio, um subproduto do ur\u00e2nio. Durante anos, nascentes flu\u00edram por essas minas.<\/p>\n

Embora imergir o corpo em \u00e1gua proveniente de uma mina de ur\u00e2nio desativada n\u00e3o pare\u00e7a \u00e0 primeira vista uma ideia muito esperta, os m\u00e9dicos do Radium Palace insistem no contr\u00e1rio.<\/p>\n

“Existem dois benef\u00edcios cl\u00ednicos da \u00e1gua do rad\u00f4nio. O primeiro \u00e9 que ela tem efeito anti-inflamat\u00f3rio – sabemos que reduz a inflama\u00e7\u00e3o. O segundo \u00e9 que tem um efeito analg\u00e9sico direto, podendo funcionar como um analg\u00e9sico com efeito semelhante \u00e0 morfina, mas de maior dura\u00e7\u00e3o”, argumenta Jindrich Masik, m\u00e9dico-chefe do Radium Palace, \u00e0 BBC Future, de seu consult\u00f3rio impec\u00e1vel.<\/p>\n

“Temos limites diferentes de radia\u00e7\u00e3o. N\u00e3o h\u00e1 limites para os clientes; podemos usar o que queremos, mas, na verdade, usamos o que \u00e9 risco-benef\u00edcio adequado – n\u00e3o queremos causar nenhum problema; queremos ajudar, \u00e9 claro. Usamos dosagens muito pequenas”, diz.<\/p>\n

Os visitantes buscam al\u00edvio para uma s\u00e9rie de dores, de dist\u00farbios neurol\u00f3gicos a artrite e gota.<\/p>\n

Vaclav Pucelik sofre de uma condi\u00e7\u00e3o inflamat\u00f3ria cr\u00f4nica que afeta as articula\u00e7\u00f5es axiais e \u00e9 um dos pacientes de Masik. Ele diz que os benef\u00edcios superam em muito os malef\u00edcios. Pucelik frequenta o spa h\u00e1 30 anos consecutivos, especificamente pelo tratamento com \u00e1gua com rad\u00f4nio.<\/p>\n

“Nada funcionava para a minha dor. Algu\u00e9m me recomendou os banhos de rad\u00f4nio e agora eu venho aqui e tomos esses banhos durante 20 minutos por dia. Mas eu s\u00f3 posso vir e fazer o tratamento uma vez por ano porque \u00e9 radioativo”, diz Pucelik.<\/p>\n

“Cada spa deve ter um material natural ou fonte que eles usam – aqui \u00e9 rad\u00f4nio.”<\/p>\n

Com cada estadia de tratamento no spa durando 24 dias, Pucelik \u00e9 um rosto bem conhecido entre os funcion\u00e1rios do hotel de luxo, sendo saudado calorosamente \u00e0 medida que faz suas sess\u00f5es di\u00e1rias. H\u00f3spedes \u00e1rabes ricos sentam-se no amplo restaurante do local, enquanto russos e tchecos parecem preferir o bar do jardim de inverno, com vista para o impec\u00e1vel gramado. No lobby, uma estatueta com os seios \u00e0 mostra est\u00e1 posicionada ao lado de escadas com carpete vermelho-escuro que levam aos luxuosos quartos.<\/p>\n

\u00c9 no subsolo, no entanto, que se localiza o material radioativo.<\/p>\n

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Vintrova Mandrholec posa com fotos de sat\u00e9lite do campo de trabalhos for\u00e7ados onde ficou preso (Cr\u00e9dito: Martin Trabalik)<\/div>\n

Atuando como guia tur\u00edstico, Pucelik empurra alegremente as portas de madeira e vidro com adesivos de advert\u00eancia com o infame s\u00edmbolo radioativo. Passadas as portas, enfermeiras andam de roup\u00e3o branco. \u00c0 direita delas, salas individuais separadas por cortinas hospitalares, cada uma com uma grande banheira de hidromassagem no centro – os banhos de rad\u00f4nio nos quais os pacientes mergulham em \u00e1gua radioativa recolhida das colinas pr\u00f3ximas.<\/p>\n

No entanto, em meio \u00e0s colinas densamente exploradas pelo complexo extravagante para seu tratamento de sa\u00fade bizarro e caro, n\u00e3o h\u00e1 como fugir da impressionante justaposi\u00e7\u00e3o entre a riqueza e o (suposto) bem-estar proporcionado pelos banhos e os tr\u00e1gicos anos dos trabalhos for\u00e7ados dos prisioneiros.<\/p>\n

\u00c9 um tipo de associa\u00e7\u00e3o que os h\u00f3spedes e a equipe do spa n\u00e3o parecem fazer quando questionados, ou talvez prefiram evit\u00e1-la.<\/p>\n

Mandrholec diz n\u00e3o guardar ressentimentos contra o spa por lucrar com a exist\u00eancia das minas nem contra os pacientes que, sem op\u00e7\u00f5es m\u00e9dicas, decidiram mergulhar nesse mundo estranho para buscar uma terapia alternativa.<\/p>\n

Na verdade, ele parece impressionado, e at\u00e9 orgulhoso, quando entra no sagu\u00e3o do Radium Palace pouco depois de dar um tour \u00e0 BBC por Jachymov.<\/p>\n

“Foi um desperd\u00edcio que o material n\u00e3o tenha sido usado antes para o pa\u00eds – se tivesse, poder\u00edamos ter sido como a Su\u00ed\u00e7a, poder\u00edamos ter rodovias, escolas, ser mais desenvolvidos”, diz Mandrholec.<\/p>\n

“Em vez disso, foi dado de gra\u00e7a para a Uni\u00e3o Sovi\u00e9tica, com ajuda do trabalho de escravos tchecos”, acrescenta.<\/p>\n

Sentados no amplo lounge do hotel, adornado com piano, Mandrholec e Pucelic – prisioneiro pol\u00edtico e h\u00f3spede – se re\u00fanem rapidamente.<\/p>\n

Quando Mandrholec se apresenta ao rico magnata checo, Pucelik estende a m\u00e3o – um breve reconhecimento de ambos os pap\u00e9is na exist\u00eancia de trabalho, passado e presente, das minas de ur\u00e2nio de Jachymov.<\/p>\n

Fonte: BBC<\/p>\n<\/div>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

A \u00e1gua escorre do teto \u00famido e rochoso da mina, formando pequenas gotas, cujo barulho ecoa ao atingir os trilhos enferrujados usados d\u00e9cadas atr\u00e1s para transportar pedras, algumas das quais carregadas com min\u00e9rio de ur\u00e2nio, para fora da colina coberta de \u00e1rvores at\u00e9 os vag\u00f5es de trem sovi\u00e9ticos. <\/a><\/p>\n<\/div>","protected":false},"author":3,"featured_media":0,"comment_status":"closed","ping_status":"closed","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":{"footnotes":""},"categories":[4],"tags":[3062,3064,3063,3065],"_links":{"self":[{"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/143911"}],"collection":[{"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/posts"}],"about":[{"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/types\/post"}],"author":[{"embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/users\/3"}],"replies":[{"embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/comments?post=143911"}],"version-history":[{"count":1,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/143911\/revisions"}],"predecessor-version":[{"id":143912,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/143911\/revisions\/143912"}],"wp:attachment":[{"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/media?parent=143911"}],"wp:term":[{"taxonomy":"category","embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/categories?post=143911"},{"taxonomy":"post_tag","embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/tags?post=143911"}],"curies":[{"name":"wp","href":"https:\/\/api.w.org\/{rel}","templated":true}]}}