{"id":150699,"date":"2019-02-28T12:00:46","date_gmt":"2019-02-28T15:00:46","guid":{"rendered":"http:\/\/noticias.ambientebrasil.com.br\/?p=150699"},"modified":"2019-02-27T22:22:02","modified_gmt":"2019-02-28T01:22:02","slug":"gatos-voltam-a-vida-selvagem-e-ameacam-especies-nativas-de-fernando-de-noronha","status":"publish","type":"post","link":"http:\/\/localhost\/clipping\/2019\/02\/28\/150699-gatos-voltam-a-vida-selvagem-e-ameacam-especies-nativas-de-fernando-de-noronha.html","title":{"rendered":"Gatos voltam \u00e0 vida selvagem e amea\u00e7am esp\u00e9cies nativas de Fernando de Noronha"},"content":{"rendered":"
\"Gato
Gato feral predando uma mabuia, lagarto que s\u00f3 existe em Fernando de Noronha<\/figcaption><\/figure>\n

Eles come\u00e7aram a ser domesticados h\u00e1 cerca de 10 mil anos e hoje s\u00e3o os animais de estima\u00e7\u00e3o mais difundidos e populares do planeta.<\/p>\n

Estima-se que existam mais de 600 milh\u00f5es de\u00a0gatos<\/a>\u00a0vivendo nos ambientes dos humanos. Muita gente se pergunta, no entanto, como o felino atingiu esse status se n\u00e3o tem nenhuma utilidade pr\u00e1tica para a sobreviv\u00eancia das pessoas, pois n\u00e3o s\u00e3o usados para trabalho, nem fornecem leite, carne, l\u00e3 ou ovos.<\/p>\n

Al\u00e9m disso, eles podem transmitir doen\u00e7as, como a toxoplasmose, e causar desastres ecol\u00f3gicos, dizimando outras esp\u00e9cies quando soltos em ambientes fr\u00e1geis, como ilhas. \u00c9 o que est\u00e1 acontecendo em Fernando de Noronha, onde gatos dom\u00e9sticos voltaram a ser selvagens e est\u00e3o colocando em risco a sobreviv\u00eancia de aves e r\u00e9pteis.<\/p>\n

Atualmente, vivem em Fernando de Noronha mais de 1.300 gatos, para uma popula\u00e7\u00e3o humana de entre 4.500 e 6.000 habitantes – ningu\u00e9m sabe ao certo.<\/p>\n

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Arquip\u00e9lago de Fernando de Noronha foi descoberto em 1503 pelo navegador italiano Am\u00e9rico Vesp\u00facio<\/figcaption><\/figure>\n

“Isso representa uma das maiores densidades de gatos j\u00e1 registradas em ambientes insulares em todo o mundo”, diz a pesquisadora Tatiana Micheletti, do Instituto Brasileiro para Medicina da Conserva\u00e7\u00e3o (Tr\u00edade), uma associa\u00e7\u00e3o civil sem fins lucrativos, que trabalha para o controle de esp\u00e9cies ex\u00f3ticas na ilha.<\/p>\n

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“A falta de cuidado por parte dos propriet\u00e1rios, associada ao instinto de autossufici\u00eancia, \u00e0 alta capacidade reprodutiva, e \u00e0 oferta de recursos, possibilita a esses animais ca\u00e7arem esp\u00e9cies end\u00eamicas e amea\u00e7adas.”<\/p>\n

Problema crescente<\/h2>\n

Al\u00e9m dos felinos, h\u00e1 outras esp\u00e9cies invasoras em Fernando de Noronha, que tamb\u00e9m est\u00e3o causando danos, mas em menor escala. “Da fauna, temos um grande n\u00famero delas, como, por exemplo, a gar\u00e7a-vaqueira (Bulbucus ibis<\/i>), o lagarto tei\u00fa (Salvator merianae<\/i>), lagartixas (Hemidactylus mabouia<\/i>), o sapo-boi (Rhinella jimmi<\/i>), pererecas (Scinaxsp<\/i>.), ratos (Rattus rattus<\/i>\u00a0e\u00a0R. norvegicus<\/i>) e camundongos (Mus musculus<\/i>)”, conta o analista ambiental Ricardo Ara\u00fajo, do Instituto Chico Mendes de Conserva\u00e7\u00e3o da Biodiversidade (ICMBio), coordenador de Pesquisa e Manejo de Ex\u00f3ticas do Parque Nacional Marinho de Fernando de Noronha.<\/p>\n

Entre as plantas, a leucena (Leucaena leucocephala<\/i>), tamb\u00e9m conhecida como linha\u00e7a, \u00e9 a que causa mais problemas. “Ela \u00e9 bastante eficiente, resistente e est\u00e1 muito disseminada na ilha”, diz Ara\u00fajo.<\/p>\n

“Essa planta compete de forma bastante agressiva com as nativas e, em alguns lugares, como as praias da \u00c1rea de Prote\u00e7\u00e3o Ambiental (APA) de Fernando de Noronha, ela j\u00e1 \u00e9 predominante. Em outros locais, s\u00f3 encontramos leucenas na vegeta\u00e7\u00e3o.”<\/p>\n

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Ave rabo-de-junco-de-bico-laranja, esp\u00e9cie end\u00eamica de Fernando de Noronha, ca\u00e7ada por gato feral<\/figcaption><\/figure>\n<\/div>\n
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Mas a esp\u00e9cie invasora que mais preocupa \u00e9 mesmo o gato. Segundo a pesquisadora Tainah Guimar\u00e3es, do Centro Nacional de Avalia\u00e7\u00e3o da Biodiversidade e de Pesquisa e Conserva\u00e7\u00e3o do Cerrado (CBC), tamb\u00e9m do ICMBio, h\u00e1 tr\u00eas tipos deles no arquip\u00e9lago: dom\u00e9sticos ou domiciliados (aqueles que t\u00eam dono e casa); animais errantes ou peri-domiciliados (que n\u00e3o possuem donos e vivem nas vilas perto de pousadas e restaurantes, e s\u00e3o alimentados por todos); e o ferais ou asselvajados (sem donos e que vivem na mata, sem intera\u00e7\u00e3o com humanos).<\/p>\n

Esses \u00faltimos s\u00e3o a demonstra\u00e7\u00e3o clara de uma das caracter\u00edsticas da esp\u00e9cie. Mesmo domesticados e convivendo com seres humanos, eles nunca perderam totalmente seus instintos naturais. Se forem soltos na natureza, eles se viram muito bem sem a ajuda das pessoas.<\/p>\n

Por isso, h\u00e1 quem diga que ele \u00e9 o mais selvagem dos animais dom\u00e9sticos e nunca chegou a ser domesticado totalmente. Outros acreditam que foram eles que escolheram os humanos para conviver, e n\u00e3o o contr\u00e1rio.<\/p>\n

Seja como for, de acordo com Tainah, os dom\u00e9sticos e os errantes predam diversos lagartos e aves nativas todos os dias. “Algumas pessoas residentes e visitantes n\u00e3o percebem esse impacto, porque s\u00e3o predadores pequenos, mas as popula\u00e7\u00f5es de animais abatidas o sentem.”<\/p>\n

“No caso dos ferais, eles vivem e se alimentam basicamente da natureza. Em Fernando de Noronha, est\u00e3o nas \u00e1reas do parque, que s\u00e3o as mais preservadas. Entre suas presas favoritas est\u00e1 a mabuia (Trachelepys atlantica<\/i>), uma esp\u00e9cie de lagarto end\u00eamica do arquip\u00e9lago.”<\/p>\n

Esses gatos tamb\u00e9m t\u00eam colocado em risco a sobreviv\u00eancias de v\u00e1rias esp\u00e9cies de aves. “Eles causam danos diretos por meio da preda\u00e7\u00e3o de indiv\u00edduos adultos ou filhotes de cinco delas listadas como amea\u00e7adas de extin\u00e7\u00e3o”, conta Ara\u00fajo.<\/p>\n

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Gato com lagarto mabuia na boca; plano pretende controlar a popula\u00e7\u00e3o de felinos em Fernando de Noronha<\/figcaption><\/figure>\n

“Dessas, duas s\u00e3o terrestres end\u00eamicas do arquip\u00e9lago, o sebito (Vireo gracilirostris<\/i>) e a cocoruta (Elaenia ridleyana<\/i>), e tr\u00eas marinhas, o rabo-de-junco-de-bico-laranja (Phaethon lepturus<\/i>), o atob\u00e1-de-p\u00e9s-vermelhos (Sula sula<\/i>) e a noivinha (Gygis alba<\/i>).”<\/p>\n

Aves em perigo<\/h2>\n

Segundo Ara\u00fajo, foram observados, em diferentes ocasi\u00f5es entre os anos de 2014 e 2016, por pesquisadores do Instituto Tr\u00edade, repetidos ataques de gatos ao rabo-de-junco-de-bico-laranja, principalmente em \u00e1reas de nidifica\u00e7\u00e3o da ave no parque nacional na ilha principal do arquip\u00e9lago.<\/p>\n

“Esse impacto \u00e9 um agravante significativo ao estado de conserva\u00e7\u00e3o dessa esp\u00e9cie no Brasil, pois Fernando de Noronha \u00e9 o principal local de reprodu\u00e7\u00e3o dela, assim como tamb\u00e9m do atob\u00e1-de-p\u00e9s-vermelhos e da noivinha no Atl\u00e2ntico Sul.”<\/p>\n

Para a m\u00e9dica veterin\u00e1ria Patr\u00edcia Pereira Serafini, do Centro Nacional de Pesquisa e Conserva\u00e7\u00e3o das Aves Silvestres (CEMAVE), do ICMBio, n\u00e3o se deve menosprezar esses eventos.<\/p>\n

“O impacto de gatos dom\u00e9sticos sobre as aves marinhas em ilhas \u00e9 um problema mundial e tem sido exaustivamente demonstrado”, diz. “Se n\u00e3o for feito nada agora, Fernando de Noronha ser\u00e1 o exemplo mais recente de desastre ecol\u00f3gico e extin\u00e7\u00e3o de esp\u00e9cies em ilhas causadas por esses felinos, como historicamente j\u00e1 ocorreu em outras 120 ao redor do mundo.”<\/p>\n

Exemplos desse tipo n\u00e3o faltam. Tatiana, do Instituto Tr\u00edade, cita v\u00e1rios deles. “Pesquisadores estimaram que na ilha Marion, pertencente \u00e0 \u00c1frica do Sul, os gatos mataram mais de 455 mil aves marinhas, por ano, durante a d\u00e9cada de 1970”, diz.<\/p>\n

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Gato predando mabuia; popula\u00e7\u00e3o da ave trinta-r\u00e9is-das-rocas foi reduzida a pouco mais de 10% entre as d\u00e9cadas de 1940 e 1990 por conta da preda\u00e7\u00e3o por felinos na ilha de Ascens\u00e3o<\/figcaption><\/figure>\n

“No mesmo local, o petrel-mergulhador (Pelecanoides urinatrix<\/i>) tamb\u00e9m foi extinto ap\u00f3s intensa preda\u00e7\u00e3o, assim como o m\u00e9rgulo-sombrio (Ptychoramphus aleuticus<\/i>), das ilhas Coronados, no M\u00e9xico.”<\/p>\n

Outro exemplo vem da ilha Kerguelen, pertencente \u00e0 Fran\u00e7a, onde aproximadamente 1,2 milh\u00e3o de aves marinhas foram mortas anualmente tamb\u00e9m na d\u00e9cada de 1970.<\/p>\n

“Na ilha Ascens\u00e3o, a popula\u00e7\u00e3o do trinta-r\u00e9is-das-rocas (Onychoprion fuscatus<\/i>), que tamb\u00e9m vive em Fernando de Noronha, foi reduzida a pouco mais de 10% entre as d\u00e9cadas de 1940 e 1990 por conta da preda\u00e7\u00e3o por gatos”, acrescenta.<\/p>\n

“Em uma situa\u00e7\u00e3o extrema, esses felinos levaram o petrel-das-tormentas-de-Guadalupe \u00e0 extin\u00e7\u00e3o global, visto que essa esp\u00e9cie era restrita \u00e0 ilha Guadalupe, no M\u00e9xico.”<\/p>\n

Plano de controle<\/h2>\n

Da mesma forma, diz Tatiana, diversas popula\u00e7\u00f5es de aves chegaram a ser extintas localmente devido \u00e0 intensa preda\u00e7\u00e3o por gatos, como a pardela-de-ventre-preto (Puffinus opisthomelas<\/i>), da ilha Natividade, no M\u00e9xico, onde os felinos chegaram a matar 1 mil delas por m\u00eas.<\/p>\n

“Considerando que Noronha \u00e9 um\u00a0hotspot<\/i>\u00a0de nidifica\u00e7\u00e3o para aves end\u00eamicas e marinhas amea\u00e7adas, al\u00e9m de ser o \u00fanico habitat no mundo onde encontramos o mabuia de Noronha, o impacto do gato pode ser considerado muito grande e uma verdadeira amea\u00e7a \u00e0 conserva\u00e7\u00e3o da biodiversidade.”<\/p>\n

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Estima-se que 1.300 gatos vivam em Fernando de Noronha, onde a popula\u00e7\u00e3o humana alcan\u00e7a entre 4.500 a 6.000 pessoas<\/figcaption><\/figure>\n

Devido \u00e0 gravidade dos problemas causados pelos gatos, o governo federal, por meio do ICMBio, a Autarquia Territorial Distrito Estadual de Fernando de Noronha, que \u00e9 a administra\u00e7\u00e3o local, universidades, organiza\u00e7\u00f5es n\u00e3o governamentais e os minist\u00e9rios p\u00fablicos federal e estadual v\u00eam procurando solu\u00e7\u00f5es.<\/p>\n

Uma delas seria a captura e devolu\u00e7\u00e3o deles ao continente. O problema \u00e9 que os felinos de Fernando de Noronha t\u00eam uma cepa de toxoplasmose diferente da que os do continente carregam, e os pesquisadores n\u00e3o aconselham a transfer\u00eancia.<\/p>\n

A castra\u00e7\u00e3o e a esteriliza\u00e7\u00e3o dos felinos da ilha \u00e9 outra solu\u00e7\u00e3o, que j\u00e1 vem sendo adotada. A dificuldade \u00e9 que a curto e m\u00e9dio prazo ela n\u00e3o resolve o problema, pois os animais castrados e esterilizados tamb\u00e9m continuam se alimentando e predando as esp\u00e9cies nativas.<\/p>\n

Por isso, foi elaborado o Plano de A\u00e7\u00e3o para o Controle de Gatos (Felis catus<\/i>) na \u00c1rea de Prote\u00e7\u00e3o Ambiental de Fernando de Noronha – Rocas – S\u00e3o Pedro e S\u00e3o Paulo e no Parque Nacional Marinho de Fernando de Noronha, que foi institu\u00eddo pela Portaria n\u00ba 58, de 4 de fevereiro de 2019.<\/p>\n

O objetivo \u00e9 “reduzir os impactos dos gatos sobre a fauna nativa e o risco de zoonoses [doen\u00e7as transmitidas por eles] em Fernando de Noronha.”<\/p>\n

Para atingir essa meta, o plano, com prazo de vig\u00eancia at\u00e9 mar\u00e7o de 2023, pretende reduzir a popula\u00e7\u00e3o de gatos ferais em Noronha, por meio da castra\u00e7\u00e3o; controlar o n\u00famero de domiciliados e peridomiciliados; fazer campanhas para sensibilizar a sociedade sobre os impactos desses animais \u00e0 biodiversidade e o risco \u00e0 sa\u00fade p\u00fablica; e realizar monitoramentos que subsidiem estrat\u00e9gias para o manejo adaptativo e integrado dos felinos e outros predadores ex\u00f3ticos.<\/p>\n

Fonte: BBC<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

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