{"id":151734,"date":"2019-04-29T12:00:44","date_gmt":"2019-04-29T15:00:44","guid":{"rendered":"https:\/\/noticias.ambientebrasil.com.br\/?p=151734"},"modified":"2019-04-28T22:31:57","modified_gmt":"2019-04-29T01:31:57","slug":"a-australia-lancou-um-plano-para-matar-milhoes-de-gatos-e-o-esta-levando-a-serio","status":"publish","type":"post","link":"http:\/\/localhost\/clipping\/2019\/04\/29\/151734-a-australia-lancou-um-plano-para-matar-milhoes-de-gatos-e-o-esta-levando-a-serio.html","title":{"rendered":"A Austr\u00e1lia lan\u00e7ou um plano para matar milh\u00f5es de gatos, e o est\u00e1 levando a s\u00e9rio"},"content":{"rendered":"

<\/p>\n

O governo nacional da Austr\u00e1lia decidiu em 2015 que tentaria matar dois milh\u00f5es de gatos selvagens at\u00e9 2020.<\/span><\/p>\n

Por qu\u00ea?<\/p>\n

Devido \u00e0 grande preocupa\u00e7\u00e3o pela fauna nativa do pa\u00eds \u2013 em particular, grupos de pequenos roedores e marsupiais amea\u00e7ados para os quais os gatos se tornaram predadores mortais.<\/span><\/p>\n

O plano<\/h2>\n

Segundo o Instituto Real de Tecnologia de Melbourne, 211.560 gatos foram mortos nos primeiros 12 meses ap\u00f3s o an\u00fancio do plano.<\/p>\n

Um dos m\u00e9todos utilizados \u00e9 uma receita de salsicha desenvolvida pelo Dr. Dave Algar, principal pesquisador do Departamento de Conserva\u00e7\u00e3o da Biodiversidade e Atra\u00e7\u00f5es do estado da Austr\u00e1lia Ocidental: carne de canguru, gordura de frango, uma mistura de ervas e especiarias e um veneno chamado 1080, derivado de plantas de Gastrolobium altamente letal para alguns animais como gatos, cujos caminhos evolutivos n\u00e3o exigiram que desenvolvessem toler\u00e2ncia a ele.<\/p>\n

As salsichas s\u00e3o espalhadas por avi\u00e3o, cobrindo milhares de hectares de terra. Em m\u00e9dia, quase meio milh\u00e3o de iscas s\u00e3o plantadas no curso de um m\u00eas.<\/p>\n

Mas soltar salsichas letais do c\u00e9u \u00e9 apenas uma parte dos esfor\u00e7os do pa\u00eds para erradicar os gatos selvagens, que tamb\u00e9m incluem armadilhas e ca\u00e7a com arcos e armas (sim, voc\u00ea leu certo).<\/p>\n

Pol\u00eamica<\/h2>\n

Quando a pol\u00edtica foi anunciada, foi recebida em alguns lugares com muita pol\u00eamica. Os advers\u00e1rios mais ardorosos da ideia eram, em geral, estrangeiros. Antes mesmo de a estrat\u00e9gia ser anunciada, os jornais australianos aplaudiram o \u201cplano audacioso para resgatar nossos pequenos emblemas\u201d.<\/p>\n

Greg Hunt, ministro do Meio Ambiente da \u00e9poca, anunciou o programa em um zool\u00f3gico: a quest\u00e3o foi enquadrada como um grande esquema para proteger a vida selvagem da Austr\u00e1lia. A guerra contra os gatos \u2013 como qualquer outra \u2013 foi expressa em linguagem sobre miss\u00e3o e valores. Algo exclusivamente australiano estava sob amea\u00e7a, e \u00e9 isso que seria necess\u00e1rio para salv\u00e1-lo. Patriotas se uniram \u00e0 causa.<\/span><\/p>\n

Ao mesmo tempo, Brigitte Bardot escreveu uma carta suplicando ao ministro que parasse com o que ela chamou de genoc\u00eddio animal. Apesar da raiva de alguns grupos de direitos dos animais e preocupa\u00e7\u00f5es sobre os efeitos potenciais sobre os gatos de estima\u00e7\u00e3o, a Austr\u00e1lia prosseguiu com seu plano.<\/span><\/p>\n

A quest\u00e3o n\u00e3o \u00e9 nada simples. Claro que n\u00e3o \u00e9 legal matar gatos. Mas, na Austr\u00e1lia, gatos est\u00e3o matando \u2013 e extinguindo \u2013 centenas de esp\u00e9cies. Seriam essas esp\u00e9cies menos importantes que os gatos? E agora?<\/p>\n

<\/span>Os gatos da Austr\u00e1lia<\/h2>\n

<\/span>Ao contr\u00e1rio de lugares como a Am\u00e9rica do Norte, a Austr\u00e1lia n\u00e3o tem esp\u00e9cies nativas de gatos. Ao longo de milh\u00f5es de anos de isolamento, os animais nativos do pa\u00eds se acostumaram com uma ordem predat\u00f3ria diferente, de modo que, embora os gatos n\u00e3o sejam necessariamente mais predominantes l\u00e1 do que em qualquer outro lugar, sua presen\u00e7a \u00e9 mais ruinosa para a na\u00e7\u00e3o da Oceania.<\/p>\n

Eles tamb\u00e9m se tornaram quase onipresentes: de acordo com as estimativas dos conservacionistas locais, os gatos selvagens estabeleceram uma posi\u00e7\u00e3o permanente em 99,8% do pa\u00eds, com sua densidade chegando a 100 por quil\u00f4metro quadrado em algumas \u00e1reas \u2013 mesmo em lugares quase desprovidos de assentamentos humanos, como a remota e escarpada regi\u00e3o de Kimberley.<\/span><\/p>\n

O esfor\u00e7o de controle da popula\u00e7\u00e3o felina, como o programa de \u201csalsichas letais\u201d da Austr\u00e1lia Ocidental, foi feito para aliviar a press\u00e3o da preda\u00e7\u00e3o que os gatos exercem. Diante de uma escolha entre uma esp\u00e9cie considerada como um animal de estima\u00e7\u00e3o precioso e as muitas criaturas pequenas de sua terra \u00fanica, os australianos parecem ter decidido que a guarda dos animais selvagens remanescentes poderia significar um pouco de derramamento de sangue.<\/p>\n

Esp\u00e9cie invasiva?<\/h2>\n

Gatos apareceram em assentamentos humanos de forma aparentemente espont\u00e2nea, provavelmente em busca de alimento. Restos arqueol\u00f3gicos do Crescente F\u00e9rtil no atual L\u00edbano, Israel e territ\u00f3rios palestinos j\u00e1 apontam para a presen\u00e7a de\u00a0Felis silvestris<\/em>, o predecessor selvagem de\u00a0Felis catus<\/em>.<\/span><\/p>\n

Sua utilidade em torno dos dep\u00f3sitos de gr\u00e3os que atra\u00edam pequenos roedores provavelmente fez as pessoas se encantarem com os animais. A primeira evid\u00eancia de sua domestica\u00e7\u00e3o \u00e9 um conjunto de restos mortais em Chipre datando por volta de 7500 aC.<\/p>\n

Alguns milhares de anos depois, nas proximidades do Egito e da Gr\u00e9cia, eles se tornaram associados a deusas e elevados a objetos simb\u00f3licos de venera\u00e7\u00e3o. Ao contr\u00e1rio de outros animais, criados especificamente para o consumo ou para ajudar nas tarefas, os gatos nunca foram submetidos a um processo de domestica\u00e7\u00e3o direcionado.<\/span><\/p>\n

<\/span>E como o Felis catus chegou pela primeira vez na Austr\u00e1lia? Ningu\u00e9m sabe realmente. Testes gen\u00e9ticos mostraram que os gatos australianos descendem dos europeus. Talvez eles tenham vindo com a Primeira Frota para Sydney em 1788 \u2013 a flotilha de navios que transportavam condenados e fuzileiros navais que iniciariam a coloniza\u00e7\u00e3o da Austr\u00e1lia pelos ingleses. Tendo sido trazidos para lidar com os ratos nos navios, estabeleceram-se na costa sudeste e se espalharam com velocidade surpreendente.<\/p>\n

Preda\u00e7\u00e3o<\/h2>\n

No pa\u00eds, os gatos predam pequenos animais como o \u201cboodie\u201d, parente do canguru do tamanho de um coelho, e o \u201cbandicoot\u201d, um pequeno marsupial. Antes dos felinos, os boodies eram um dos mais difundidos mam\u00edferos liliputianos do continente. Sua prodigiosa escava\u00e7\u00e3o quase desestabilizou os trilhos de uma ferrovia em 1908. Em meados do s\u00e9culo XX, uma subesp\u00e9cie foi declarada extinta no continente australiano.<\/p>\n

<\/p>\n

 <\/p>\n

Ali\u00e1s, desde a chegada da Primeira Frota, 34 esp\u00e9cies de mam\u00edferos foram extintas na Austr\u00e1lia. Estas n\u00e3o existiam em nenhum outro lugar na Terra. Considera-se que os gatos foram a amea\u00e7a principal para 22 das esp\u00e9cies extintas, como o potoroo e o wallaby-rabo-de-prego-crescente.<\/span><\/p>\n

E, hoje, mais de 100 esp\u00e9cies de mam\u00edferos est\u00e3o listadas entre \u201cquase amea\u00e7adas\u201d e \u201ccr\u00edticas\u201d pela Uni\u00e3o Internacional para a Conserva\u00e7\u00e3o da Natureza. A regi\u00e3o tem a maior taxa de extin\u00e7\u00e3o de mam\u00edferos do mundo. \u201cAs recentes taxas de extin\u00e7\u00e3o na Austr\u00e1lia s\u00e3o incompar\u00e1veis\u201d, disse John Woinarski, um dos principais pesquisadores de conserva\u00e7\u00e3o da Austr\u00e1lia. \u201c\u00c9 calamitoso\u201d.<\/span><\/p>\n

O que \u00e9 incomum nas extin\u00e7\u00f5es de mam\u00edferos na Austr\u00e1lia \u00e9 que, em contraste com quase todos os outros lugares, os animais menores s\u00e3o os mais atingidos. Depois que a onda de desaparecimentos de esp\u00e9cies do Pleistoceno levou enormes criaturas como tigres-dentes-de-sabre e mamutes-lanudos, grandes mam\u00edferos em todo o mundo continuaram a sofrer press\u00f5es, principalmente de humanos. Globalmente, s\u00e3o rinocerontes, elefantes e gorilas que est\u00e3o entre os mais amea\u00e7ados. N\u00e3o na Austr\u00e1lia. L\u00e1, animais que s\u00e3o do tamanho de uma refei\u00e7\u00e3o perfeita para um gato ou uma raposa (outra esp\u00e9cie \u201cinvasora\u201d predadora no pa\u00eds) \u00e9 que est\u00e3o desaparecendo.<\/p>\n

O que vale mais: os gatos ou diversas esp\u00e9cies nativas \u00e0 beira da extin\u00e7\u00e3o?<\/h2>\n

Al\u00e9m dos mam\u00edferos, pesquisas australianas descobriram que gatos matam cerca de 377 milh\u00f5es de aves e 649 milh\u00f5es de r\u00e9pteis a cada ano na Austr\u00e1lia. Sua presen\u00e7a representa uma das maiores amea\u00e7as \u00e0 exist\u00eancia continuada de certos pequenos animais.<\/p>\n

No come\u00e7o, a PETA Austr\u00e1lia tinha suas reservas com o plano governamental, mas em princ\u00edpio reconhecia que os gatos selvagens ca\u00e7avam esp\u00e9cies at\u00e9 um ponto em que elas n\u00e3o podiam mais sobreviver.<\/p>\n

Peti\u00e7\u00f5es protestando contra o abate, organizadas nos Estados Unidos e na Europa, foram recebidas com desd\u00e9m. Inclusive, o gato n\u00e3o foi o primeiro predador a ser considerado t\u00e3o destrutivo que precisava ser eliminado, e a Austr\u00e1lia j\u00e1 iniciou esfor\u00e7os para controlar outros animais introduzidos, como coelhos e raposas.<\/p>\n

Apesar disso, muitos dos propriet\u00e1rios de gatos do pa\u00eds n\u00e3o ficaram felizes. Segundo a ecologista Katherine Moseby, isso ocorre porque as pessoas t\u00eam uma conex\u00e3o mais forte com os gatos do que com criaturas selvagens desconhecidas.<\/span><\/p>\n

\u201cOs gatos realmente provocam as emo\u00e7\u00f5es das pessoas. As pessoas n\u00e3o sabem o que \u00e9 um bandicoot, porque n\u00e3o passam tempo com animais nativos. Mas realmente amam e se preocupam com seus gatos, o que \u00e9 compreens\u00edvel\u201d, esclarece.<\/p>\n

Excelentes ca\u00e7adores<\/h2>\n

Moseby acredita que a an\u00e1lise forense deveria ser aplicada para descobrir os h\u00e1bitos dos gatos. Em seu trabalho acad\u00eamico, ela sugeriu o uso de perfis de predadores \u2013 geralmente empregados para identificar ursos polares ou tigres que desenvolveram a disposi\u00e7\u00e3o de atacar seres humanos \u2013 para se concentrar em gatos individuais que s\u00e3o especialmente bons em ca\u00e7ar animais selvagens nativos: os chamados gatos \u201ccatastr\u00f3ficos\u201d, geralmente machos grandes, que dominam a arte de ca\u00e7ar animais como os quolls e saem em \u201cmatan\u00e7as esbanjadoras\u201d.<\/p>\n

Ao colocar colares de GPS e VHF em gatos, cientistas de toda a Austr\u00e1lia perceberam o pouco que entendem sobre as criaturas que est\u00e3o tentando controlar. Pat Hodgens, um ecologista da Ilha Kangaroo, chegou a localizar dezenas de gatos que aprenderam a ca\u00e7ar wallabies iguais a ele em peso.<\/span><\/p>\n

Gatos ca\u00e7am sempre, n\u00e3o importa o qu\u00ea. Mesmo que n\u00e3o precisem comer, s\u00e3o programados para perseguir presa dispon\u00edvel. Se matam quando n\u00e3o est\u00e3o com fome, comem apenas a parte mais atraente da presa, geralmente o tecido mole, tentam guard\u00e1-la para mais tarde ou simplesmente abandonam a carca\u00e7a.<\/span><\/p>\n

Pr\u00f3s e contras, nenhuma conclus\u00e3o<\/h2>\n

Mesmo que as iscas em larga escala, como as salsichas que caem dos avi\u00f5es, tenham sido eficazes na redu\u00e7\u00e3o do n\u00famero de gatos, muitas vezes pela metade ou mais, foram os agricultores e ca\u00e7adores que mais contribu\u00edram para a causa: dados do Instituto Real de Tecnologia de Melbourne mostraram que atiradores foram respons\u00e1veis \u200b\u200bpor 83% das mortes de gatos selvagens em todo o pa\u00eds no primeiro ano dos esfor\u00e7os da Austr\u00e1lia.<\/p>\n

A maioria dos ca\u00e7adores carrega armas, \u00e0s vezes arcos. Mas o fato de essas mortes n\u00e3o parecerem nada \u201chumanas\u201d (no sentido de que o animal sofre) \u00e9 um dos piores \u201ccontras\u201d dessa pol\u00edtica australiana.<\/p>\n

<\/p>\n

E h\u00e1 ainda um outro argumento a se considerar: Daniel Ramp, diretor do Centro de Conserva\u00e7\u00e3o Compassiva em Sydney, afirma que o programa \u00e9 baseado em estigmas contra esp\u00e9cies introduzidas. Os adeptos da conserva\u00e7\u00e3o compassiva dizem que a Austr\u00e1lia deve abra\u00e7ar os gatos como um elemento de seu ambiente, em vez de tentar restaurar os ecossistemas a um ponto arbitr\u00e1rio na hist\u00f3ria. Para Ramp, animais nativos como boodies s\u00e3o alvos f\u00e1ceis para gatos n\u00e3o porque evolu\u00edram sem tal predador; na verdade, s\u00e3o mais vulner\u00e1veis \u200b\u200baos predadores mais fortes por causa das tentativas de salv\u00e1-los.<\/p>\n

Mas Moseby e a maioria dos cientistas acreditam que j\u00e1 est\u00e3o considerando o complicado equil\u00edbrio das coisas. A in\u00e9rcia sobre a quest\u00e3o dos gatos levar\u00e1 a novas extin\u00e7\u00f5es. Se a escolha \u00e9 entre nutrir as vidas de animais individuais e lutar para impedir que esp\u00e9cies inteiras sejam devastadas, ent\u00e3o, a vis\u00e3o infeliz de algum sangue \u00e9, para eles, inevit\u00e1vel. [NYTimes]<\/p>\n

Fonte: Hypescience<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"