{"id":154978,"date":"2019-10-30T01:00:16","date_gmt":"2019-10-30T04:00:16","guid":{"rendered":"http:\/\/noticias.ambientebrasil.com.br\/?p=154978"},"modified":"2019-10-29T21:54:54","modified_gmt":"2019-10-30T00:54:54","slug":"a-operacao-de-guerra-montada-por-pescadores-para-conter-avanco-de-oleo-em-abrolhos","status":"publish","type":"post","link":"http:\/\/localhost\/clipping\/2019\/10\/30\/154978-a-operacao-de-guerra-montada-por-pescadores-para-conter-avanco-de-oleo-em-abrolhos.html","title":{"rendered":"A ‘opera\u00e7\u00e3o de guerra’ montada por pescadores para conter avan\u00e7o de \u00f3leo em Abrolhos"},"content":{"rendered":"\n
\"Pescadores

Pescadores se mobilizaram para retirar aproximadamente 80 kg de \u00f3leo do mar
<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

“A conversa era que iam tomar uma atitude quando o \u00f3leo chegasse a\u00a0Abrolhos. Pronto, chegou. Se isso passar daqui pra baixo, j\u00e1 foi. E agora, v\u00e3o fazer o qu\u00ea? Qual \u00e9 o plano? Algu\u00e9m sabe?”, questiona o pescador Carlos Alberto Pinto.<\/p>\n\n\n\n

Ele \u00e9 membro da Associa\u00e7\u00e3o M\u00e3e da Reserva Extrativista (Resex) de Canavieiras, uma \u00e1rea de aproximadamente 100 mil hectares no sul da Bahia. A reserva \u00e9 o que d\u00e1 limite, ao norte, \u00e0 chamada Regi\u00e3o dos Abrolhos, onde est\u00e1 a maior biodiversidade marinha do Atl\u00e2ntico Sul, com mais de 1,3 mil esp\u00e9cies registradas entre fauna e flora.<\/p>\n\n\n\n

Na segunda-feira (28\/10), foi na Resex de Canavieiras que, usando redes de malha bem fina, pescadores conseguiram “capturar” uma mancha em alto mar, tirando da \u00e1gua, de uma s\u00f3 vez, aproximadamente 80 kg de petr\u00f3leo.<\/p>\n\n\n\n

Nesta ter\u00e7a-feira, mais de 600 kg foram coletados nas praias que integram a Resex. Al\u00e9m disso, o material j\u00e1 foi detectado, em pequenas manchas ou pelotas solidificadas, em praias das cidades de Belmonte e Santa Cruz Cabr\u00e1lia, que est\u00e3o ao sul de Canavieiras e ainda mais pr\u00f3ximas do n\u00facleo do Parque Nacional Marinho dos Abrolhos, criado em 1983.<\/p>\n\n\n\n

Sentindo que o desastre ganha cada vez mais volume, Pinto faz outros questionamentos. “Espero que nossa organiza\u00e7\u00e3o cause algum constrangimento no governo, pra sair da zona de conforto e se mobilizar de verdade. Como \u00e9 que pode ficar s\u00f3 esperando o \u00f3leo na praia? Se um barco de pesca pegou uma mancha de 80 kg no mar, cad\u00ea os navios grandes da Petrobras, das empresas que prestam servi\u00e7o? Cad\u00ea?”<\/p>\n\n\n\n

A mobiliza\u00e7\u00e3o a que ele se refere come\u00e7ou semanas atr\u00e1s, quando o \u00f3leo atingia praias de Sergipe e ainda ensaiava entrar na Bahia \u2014 ou seja, estava a mais de 600 km de Canavieiras.<\/p>\n\n\n\n

Em compara\u00e7\u00e3o, o Comando Unificado de Incidentes, que re\u00fane os mais diversos \u00f3rg\u00e3os governamentais envolvidos no combate ao \u00f3leo, realizou sua primeira reuni\u00e3o na Bahia no dia 11 de outubro, uma semana depois de a subst\u00e2ncia t\u00f3xica ter chegado \u00e0s praias do Estado.<\/p>\n\n\n\n

Esquema de guerra<\/h2>\n\n\n\n

Atentos ao \u00f3leo que navegava livremente em sua dire\u00e7\u00e3o, os pescadores que atuam na Resex de Canavieiras montaram um esquema de guerra: dividiram o per\u00edmetro em nove \u00e1reas, criaram uma tabela de monitoramento e estabeleceram grupos respons\u00e1veis por checar, todos os dias, a presen\u00e7a de manchas na \u00e1gua, nas praias e nos estu\u00e1rios e manguezais.<\/p>\n\n\n\n

“S\u00f3 aqui temos noves barras de rio que levam o \u00f3leo direto pros manguezais. Se isso entrar forte, vai ser ca\u00f3tico, ent\u00e3o, estamos fazendo o que est\u00e1 ao nosso alcance”, diz Pinto.<\/p>\n\n\n\n

Todo o sistema de defesa foi montado com doa\u00e7\u00f5es e apoio de empresas da regi\u00e3o, organiza\u00e7\u00f5es n\u00e3o governamentais e pesquisadores.<\/p>\n\n\n\n

\"Regi\u00e3o
O arquip\u00e9lago de Abrolhos \u00e9 formado por cinco ilhas<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

Sem recursos emergenciais ou equipamentos do poder p\u00fablico, o jeito foi apostar em materiais dos pr\u00f3prios pescadores ou dispon\u00edveis no ambiente, como barcos de variados tamanhos, pu\u00e7\u00e1s, redes e cortinas feitas com siripoias e galhos de casuarina. Isso sem falar na for\u00e7a humana.<\/p>\n\n\n\n

J\u00e1 s\u00e3o aproximadamente 600 pessoas envolvidas no trabalho, entre pescadores, marisqueiras, t\u00e9cnicos do Instituto Chico Mendes de Conserva\u00e7\u00e3o da Biodiversidade (ICMBio) que j\u00e1 atuam na Resex e moradores da regi\u00e3o que se apresentam como volunt\u00e1rios. Encorpada, a opera\u00e7\u00e3o ganhou nome: SOS Mangue Mar Canes.<\/p>\n\n\n\n

Antes de pescar o \u00f3leo no mar, o grupo chegou a fazer tr\u00eas simula\u00e7\u00f5es. “\u00c9 um trabalho minucioso, porque esse \u00f3leo vai mudando de caracter\u00edstica. Na \u00e1gua, tem uma textura, quando tira, j\u00e1 muda e, quando esquenta, derrete r\u00e1pido”, diz o professor do Instituto de Biologia da Universidade Federal da Bahia (UFBA) Miguel Accioly, que acompanhou as simula\u00e7\u00f5es e tem dado apoio t\u00e9cnico aos pescadores desde o in\u00edcio da crise.<\/p>\n\n\n\n

“Estamos tentando direcionar os esfor\u00e7os para o que \u00e9 poss\u00edvel fazer. E essa captura do \u00f3leo no mar d\u00e1 algum \u00e2nimo. N\u00e3o d\u00e1 s\u00f3 para esperar chegar na praia e limpar”, afirma Accioly.<\/p>\n\n\n\n

Desde que foi formado o Comando Unificado de Incidentes, grupo formado por representantes de \u00f3rg\u00e3os ambientais, prefeituras, Estado e outras entidades para lidar com a crise, o pesquisador defende a inclus\u00e3o de representantes dos pescadores entre seus membros, para que pudessem somar seu conhecimento sobre as \u00e1reas afetadas \u00e0s discuss\u00f5es sobre poss\u00edveis a\u00e7\u00f5es a serem tomadas.<\/p>\n\n\n\n

Em tese, a sugest\u00e3o foi aceita, mas nenhum pescador foi convidado para as reuni\u00f5es di\u00e1rias at\u00e9 agora.<\/p>\n\n\n\n

“N\u00f3s montamos nosso plano. N\u00e3o \u00e9 quest\u00e3o s\u00f3 de proteger o meio ambiente, mas as pessoas. Nossa vida \u00e9 isso aqui. N\u00e3o d\u00e1 pra dissociar a natureza da gente. A regi\u00e3o somos n\u00f3s”, afirma Pinto.<\/p>\n\n\n\n

“Quem for de orar, ore, quem for de rezar, reze, porque, se bater aqui o \u00f3leo que j\u00e1 chegou em Boipeba, acaba com a gente.”<\/p>\n\n\n\n

Abrolhos sob amea\u00e7a<\/h2>\n\n\n\n

A Resex de Canavieiras est\u00e1 dentro da Regi\u00e3o dos Abrolhos, mas ainda n\u00e3o faz parte do Parque Nacional. Por isso, o esquema de defesa montado pelos pescadores pode atenuar os impactos do \u00f3leo na \u00e1rea.<\/p>\n\n\n\n

Aquela regi\u00e3o abriga a mais extensa bancada de corais do Brasil e do Atl\u00e2ntico Sul, que resguarda, justamente por causa disso, a maior biodiversidade marinha da por\u00e7\u00e3o sul do Atl\u00e2ntico.<\/p>\n\n\n\n

Entrando pelos estu\u00e1rios, est\u00e3o alguns dos maiores manguezais do pa\u00eds, protegidos por Resexs como a de Canavieiras e a de Cassurub\u00e1.<\/p>\n\n\n\n

A regi\u00e3o possui ainda a maior produ\u00e7\u00e3o pesqueira da Bahia, movimentando aproximadamente R$ 100 milh\u00f5es por ano e provendo sustento a mais de 20 mil fam\u00edlias.<\/p>\n\n\n\n

\u00c9 este conjunto de ecossistemas e atividades econ\u00f4micas que pesquisadores tanto temiam que fosse alcan\u00e7ado pelo \u00f3leo, como a BBC News Brasil mostrou em\u00a0reportagem publicada no dia 26.<\/p>\n\n\n\n

“Apesar de ter sido menos \u00f3leo, em compara\u00e7\u00e3o \u00e0s toneladas que j\u00e1 foram removidas em outras praias, teve essa coleta volumosa em alto mar. \u00c9 um sinal que tem mais \u00f3leo na \u00e1gua, e isso \u00e9 muito preocupante”, diz Guilherme Dutra, diretor da estrat\u00e9gia costeira e marinha da Conserva\u00e7\u00e3o Internacional (CI), organiza\u00e7\u00e3o sem fins lucrativos que atua na regi\u00e3o.<\/p>\n\n\n\n

A pesquisadora em ecotoxicologia Let\u00edcia Aguilar n\u00e3o est\u00e1 otimista. “Tirar a mancha n\u00e3o significa que a \u00e1gua est\u00e1 livre de contamina\u00e7\u00e3o. Tem uma parte que j\u00e1 dissolveu e fica na \u00e1gua. Ent\u00e3o, a toxicidade vai atingir tudo que estiver na \u00e1gua, todos os organismos”, afirma.<\/p>\n\n\n\n

Ela defende nesta quarta-feira sua tese de doutorado, feita a partir de uma pesquisa no Golfo do M\u00e9xico sobre derramamento de petr\u00f3leo, e teme pelo equil\u00edbrio de todos os ecossistemas atingidos pelo \u00f3leo, especialmente em Abrolhos.<\/p>\n\n\n\n

“As pesquisas mostram uma diminui\u00e7\u00e3o das popula\u00e7\u00f5es de todos os organismos do ecossistema ao longo dos anos ap\u00f3s o derramamento, porque a contamina\u00e7\u00e3o persiste no ambiente. Abrolhos tem muitas esp\u00e9cies end\u00eamicas, que s\u00f3 existem ali. Ent\u00e3o, se elas morrerem, significa que desaparecer\u00e3o da face da Terra.”<\/p>\n\n\n\n

Caso uma esp\u00e9cie morra, h\u00e1 um desfalque na cadeia do ecossistema, ent\u00e3o, outras esp\u00e9cies que dependem daquela primeira sofrer\u00e3o as consequ\u00eancias. “\u00c9 morte que gera morte que gera morte”, diz Aguilar.<\/p>\n\n\n\n

E os seres humanos? “N\u00e3o se recomenda de jeito nenhum comer pescados e mariscos dessas regi\u00f5es atingidas. \u00c9 triste dizer, mas as comunidades que vivem da pesca est\u00e3o arruinadas.”<\/p>\n\n\n\n

“Ali\u00e1s, n\u00e3o se deveria nem entrar na \u00e1gua at\u00e9 que existam an\u00e1lises precisas que apontem que j\u00e1 n\u00e3o existe contamina\u00e7\u00e3o. Isso \u00e9 muito s\u00e9rio. As pessoas podem desenvolver doen\u00e7as que v\u00e3o de alergias a c\u00e2ncer”, afirma a pesquisadora.<\/p>\n\n\n\n

Sem conclus\u00f5es<\/h2>\n\n\n\n

A BBC News Brasil questionou o Grupo de Acompanhamento e Avalia\u00e7\u00e3o (GAA) do incidente de polui\u00e7\u00e3o por \u00f3leo no litoral do Nordeste, liderado pela Marinha, pedindo informa\u00e7\u00f5es sobre as estrat\u00e9gias para conter a subst\u00e2ncia na Regi\u00e3o dos Abrolhos, j\u00e1 que pescadores conseguiram capturar 80 kg no mar.<\/p>\n\n\n\n

\"Tonel
J\u00e1 s\u00e3o aproximadamente 600 pessoas envolvidas no trabalho<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

Ainda que as ocorr\u00eancias estejam registradas em fotos e v\u00eddeos, nesta ter\u00e7a, o Departamento de Imprensa da Marinha afirmou que, “at\u00e9 o momento, n\u00e3o foram localizados vest\u00edgios de \u00f3leo na \u00e1rea da reserva ambiental de Abrolhos-BA”.<\/p>\n\n\n\n

“O navio hidrogr\u00e1fico balizador Tenente Boanerges que se encontra nas redondezas e os militares que guarnecem o Farol de Abrolhos realizam constante monitoramento em fun\u00e7\u00e3o da import\u00e2ncia ambiental e cient\u00edfica da regi\u00e3o”, disse a Marinha em nota.<\/p>\n\n\n\n

O Instituto do Meio Ambiente e Recursos H\u00eddricos (Inema), \u00f3rg\u00e3o da secretaria do Meio Ambiente da Bahia, tamb\u00e9m foi questionado sobre a possibilidade de se oferecer apoio aos pescadores da Resex de Canavieras, mas n\u00e3o respondeu at\u00e9 a publica\u00e7\u00e3o desta reportagem.<\/p>\n\n\n\n

Na segunda-feira, o Minist\u00e9rio P\u00fablico Federal entrou com um recurso no Tribunal Federal da 5\u00aa Regi\u00e3o (TRF-5) pedindo que a Uni\u00e3o cumpra integralmente o Plano Nacional de Conting\u00eancia para Incidentes de Polui\u00e7\u00e3o por \u00d3leo (PNC) no combate ao desastre, que completa dois meses nesta quarta-feira.<\/p>\n\n\n\n

Procuradores dos nove Estados nordestinos alegam que o PNC n\u00e3o foi acionado segundo rege a legisla\u00e7\u00e3o e os par\u00e2metros t\u00e9cnicos e cient\u00edficos do pr\u00f3prio plano. Em primeira inst\u00e2ncia, a Justi\u00e7a Federal entendeu que a Uni\u00e3o acionou o PNC da maneira adequada.<\/p>\n\n\n\n

De acordo com a atualiza\u00e7\u00e3o mais recente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renov\u00e1veis (Ibama), 268 localidades j\u00e1 foram atingidas pelo \u00f3leo, que voltou a aparecer nesta semana no Rio Grande do Norte, um dos primeiros Estados atingidos.<\/p>\n\n\n\n

A investiga\u00e7\u00e3o para apontar o causador do derramamento \u2014 e se ele j\u00e1 cessou \u2014 \u00e9 de responsabilidade da Marinha, que ainda n\u00e3o chegou a qualquer conclus\u00e3o.<\/p>\n\n\n\n

Fonte: BBC<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

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