{"id":156175,"date":"2019-12-20T21:40:17","date_gmt":"2019-12-21T00:40:17","guid":{"rendered":"https:\/\/noticias.ambientebrasil.com.br\/?p=156175"},"modified":"2019-12-20T21:40:19","modified_gmt":"2019-12-21T00:40:19","slug":"por-que-capturar-um-inseto-pode-acabar-em-multa","status":"publish","type":"post","link":"http:\/\/localhost\/clipping\/2019\/12\/20\/156175-por-que-capturar-um-inseto-pode-acabar-em-multa.html","title":{"rendered":"Por que capturar um inseto pode acabar em multa"},"content":{"rendered":"\n
\"Pesquisa
Enquanto em casa podemos eliminar os insetos indesejados, em ambientes naturais esses bichinhos s\u00e3o protegidos por lei, que pro\u00edbe a coleta para pesquisas sem autoriza\u00e7\u00e3o pr\u00e9via <\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

Em 21 de junho, Lu\u00eds Paulo dos Santos Pereira, estudante de Engenharia Florestal da Universidade de Bras\u00edlia (UnB), andava por uma \u00e1rea do Servi\u00e7o Florestal Brasileiro, ao lado do campus universit\u00e1rio, com uma rede coletando insetos para uma tarefa de aula, quando foi abordado e multado por um fiscal do Ibama.<\/p>\n\n\n\n

Ele foi autuado por coletar esp\u00e9cimes da\u00a0fauna\u00a0silvestre sem autoriza\u00e7\u00e3o, e a multa aplicada foi de R$ 500 por cada inseto. Como ele estava com cinco na mochila, foi multado em R$ 2,5 mil, al\u00e9m de ter sua rede apreendida.<\/p>\n\n\n\n

Na defesa que apresentou contra a autua\u00e7\u00e3o, o estudante afirmou que n\u00e3o coletava insetos no local, apenas carregava o equipamento para coleta. Segundo Pereira, os animais encontrados com ele teriam sido recolhidos em outro local.<\/p>\n\n\n\n

Multas como a imposta ao estudante s\u00e3o raras, mas, ao menos em tese, \u00e9 proibido coletar insetos sem autoriza\u00e7\u00e3o em todo o territ\u00f3rio nacional (e n\u00e3o apenas em \u00e1reas de prote\u00e7\u00e3o), por conta de uma legisla\u00e7\u00e3o que causa pol\u00eamica entre cientistas brasileiros \u2014 alguns a consideram um “exagero regulat\u00f3rio”.<\/p>\n\n\n\n

Enquanto em casa devemos exterminar insetos indesejados, de mosquitos a baratas, em ambientes naturais externos \u00e9 proibido coletar animais para pesquisa sem autoriza\u00e7\u00e3o pr\u00e9via.<\/p>\n\n\n\n

As restri\u00e7\u00f5es se aplicam tamb\u00e9m a empresas que usem insetos para atividades de pesquisa e de desenvolvimento tecnol\u00f3gico (explora\u00e7\u00f5es econ\u00f4micas em cima da fauna n\u00e3o s\u00e3o abrangidas pela legisla\u00e7\u00e3o).<\/p>\n\n\n\n

Al\u00e9m disso, “se uma delas retira material da nossa natureza, mas n\u00e3o estuda nem desenvolve novos produtos, ela n\u00e3o se enquadra no conceito de acesso ao patrim\u00f4nio gen\u00e9tico e n\u00e3o necessita atender \u00e0 legisla\u00e7\u00e3o”, explica a bi\u00f3loga Juliane Borba Minotto, do Departamento de Meio Ambiente e Licenciamento da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.<\/p>\n\n\n\n

A lei em quest\u00e3o \u00e9 a Lei 13.123 de 20 de maio de 2015, a chamada Lei da Biodiversidade, regulamentada pelo Decreto n\u00ba 8.772, de 11 de maio de 2016, definindo o que pode ou n\u00e3o ser feito em rela\u00e7\u00e3o \u00e0s pesquisas com a biodiversidade brasileira. A legisla\u00e7\u00e3o tamb\u00e9m criou uma plataforma online para que os estudos com o patrim\u00f4nio gen\u00e9tico nacional sejam obrigatoriamente cadastrados.<\/p>\n\n\n\n

‘Fortes restri\u00e7\u00f5es’ a pesquisas<\/h2>\n\n\n\n
\"Insetos
Insetos coletados pelo estudante de biologia Lu\u00eds Paulo dos Santos Pereira; ele acabou multado em R$ 2,5 mil por um fiscal do Ibama<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

A legisla\u00e7\u00e3o \u00e9 apontada por alguns cientistas brasileiros como um dos motivos pelos quais est\u00e3o desistindo de suas pesquisas.<\/p>\n\n\n\n

“H\u00e1 muito venho deixando \u00e1reas de estudos no Brasil devido as fortes restri\u00e7\u00f5es a nosso trabalho”, conta a bi\u00f3loga Alpina Begossi, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), que em outubro passado enviou uma carta ao ent\u00e3o candidato \u00e0 Presid\u00eancia, Jair Bolsonaro, solicitando a suspens\u00e3o do decreto 8.772.<\/p>\n\n\n\n

Pesquisadora que “estuda o Brasil h\u00e1 cerca de 30 anos, especialmente pesca, peixes e pescadores de rios da Amaz\u00f4nia e da costa da Mata Atl\u00e2ntica”, Alpina justifica o pedido dizendo que o “decreto obrigou cientistas das universidades brasileiras a ter que cadastrar no Minist\u00e9rio do Meio Ambiente (preenchendo assim in\u00fameros formul\u00e1rios, por esp\u00e9cie estudada), sob pena de multas de mais de R$ 100 mil, as esp\u00e9cies nativas que s\u00e3o pesquisadas por eles”.<\/p>\n\n\n\n

Por isso, Alpina disse no texto que se tornou invi\u00e1vel continuar trabalhando no Brasil, com esp\u00e9cies nativas, devido “\u00e0 alt\u00edssima burocracia de autoriza\u00e7\u00f5es, licen\u00e7as e formul\u00e1rios”.<\/p>\n\n\n\n

“\u00c9 ent\u00e3o uma quest\u00e3o de patriotismo a revis\u00e3o desse decreto, j\u00e1 que, apesar da boa inten\u00e7\u00e3o de trabalharmos em nosso pa\u00eds, hoje sofremos o risco de multas altas”, escreveu. “Ou teremos que estudar esp\u00e9cies n\u00e3o-brasileiras, ex\u00f3genas; ou ainda ir realizar coletas em outros pa\u00edses que tem mais amor pela pesquisa e pelo seu solo.”<\/p>\n\n\n\n

‘Intransig\u00eancia’<\/h2>\n\n\n\n

Nesse contexto, o caso de Pereira \u00e9 um exemplo extremo da aplica\u00e7\u00e3o da legisla\u00e7\u00e3o ambiental e de prote\u00e7\u00e3o ao patrim\u00f4nio gen\u00e9tico nacional e o conhecimento tradicional a ele associado, ou seja, os saberes das popula\u00e7\u00f5es ind\u00edgenas sobre a biodiversidade. “Esses casos n\u00e3o s\u00e3o muito comuns, porque existe pouca fiscaliza\u00e7\u00e3o e a maioria dos fiscais tem um pouco de bom senso e razoabilidade”, opina Reginaldo Constantino, professor de Pereira na \u00e9poca da sua autua\u00e7\u00e3o.<\/p>\n\n\n\n

\"Lu\u00eds
‘Uma coisa \u00e9 uma pessoa est\u00e1 capturando insetos para o com\u00e9rcio ou tr\u00e1fico, o que quer que seja, outra \u00e9 um estudante estar coletando material para uma determinada disciplina em uma universidade’, opina Lu\u00eds Paulo dos Santos Pereira <\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

“Mas basta aparecer um mais radical e intransigente para causar problemas s\u00e9rios. Por isso, pelo menos temporariamente, algumas dessas atividades est\u00e3o suspensas, o que certamente vai prejudicar a forma\u00e7\u00e3o de uma gera\u00e7\u00e3o de estudantes.”<\/p>\n\n\n\n

Procurados pela BBC News Brasil, o Ibama e o ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conserva\u00e7\u00e3o da Biodiversidade) disseram que quem poderia falar sobre o assunto era o Minist\u00e9rio do Meio Ambiente. Este por sua, procurado diversas vezes, por e-mail e telefone, desde 12 de novembro, n\u00e3o atendeu a solicita\u00e7\u00e3o de entrevista.<\/p>\n\n\n\n

De acordo com Constantino, “h\u00e1 um bom tempo temos que lidar com esse exagero regulat\u00f3rio, o que tem gerado muita dor de cabe\u00e7a para quem pesquisa qualquer coisa ligada \u00e0 biodiversidade, com impacto negativo sobre ci\u00eancias biol\u00f3gicas, agr\u00e1rias e biom\u00e9dicas”.<\/p>\n\n\n\n

“As normas s\u00e3o confusas, complexas e excessivamente restritivas em muitos casos”, diz. “Cientistas e estudantes ficam amea\u00e7ados de pesadas multas e at\u00e9 mesmo pris\u00e3o apenas por n\u00e3o cumprir formalidades burocr\u00e1ticas, que tem pouco efeito pr\u00e1tico. Atualmente est\u00e1 imposs\u00edvel realizar algumas atividades pr\u00e1ticas de ensino em zoologia, porque as regras n\u00e3o permitem.”<\/p>\n\n\n\n

Outra consequ\u00eancia disso, de acordo com Constantino, \u00e9 que colabora\u00e7\u00f5es com pesquisadores estrangeiros s\u00e3o especialmente mal vistas e est\u00e3o quase inviabilizadas. “Enviar e receber esp\u00e9cimes de um pa\u00eds para outro virou um tormento, com normas cada vez mais restritivas em muitos deles”, reclama. “A multa para brasileiro que enviar para o exterior amostras de material biol\u00f3gico em desacordo com as normas vigentes \u00e9 bem alta, algo como R$ 25 mil.”<\/p>\n\n\n\n

Desburocratiza\u00e7\u00e3o<\/h2>\n\n\n\n

Nem todo mundo pensa assim, no entanto. H\u00e1 tamb\u00e9m aqueles que veem aspectos positivos na Lei da Biodiversidade. O advogado Alexandre Jos\u00e9 Fran\u00e7a Carvalho, especialista em Direito Ambiental e mestrando em Propriedade Intelectual e Transfer\u00eancia de Tecnologia para a Inova\u00e7\u00e3o do Instituto Federal do Par\u00e1 (IFPA), por exemplo, diz que, de certa maneira, ela trouxe uma regulamenta\u00e7\u00e3o definitiva sobre a quest\u00e3o, o que facilita a pesquisa cient\u00edfica e a explora\u00e7\u00e3o econ\u00f4mica da biodiversidade brasileira.<\/p>\n\n\n\n

\"Laborat\u00f3rio
Alguns especialistas dizem que a legisla\u00e7\u00e3o desburocratizou a explora\u00e7\u00e3o da biodiversidade econ\u00f4mica brasileira; para outros, por\u00e9m, ela tem inviabilizado pesquisas cient\u00edficas<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

Antes, diz ele, o acesso ao patrim\u00f4nio gen\u00e9tico e ao conhecimento associado era regulado por uma medida provis\u00f3ria de 2000 que foi reeditada 16 vezes. “Ela era mais burocr\u00e1tica”, opina, porque exigia que estudos cient\u00edficos e atividades de explora\u00e7\u00e3o econ\u00f4mica da biodiversidade tivessem autoriza\u00e7\u00e3o pr\u00e9via de um \u00f3rg\u00e3o chamado Conselho de Gest\u00e3o do Patrim\u00f4nio Gen\u00e9tico, ligado ao Minist\u00e9rio do Meio Ambiente.<\/p>\n\n\n\n

“Isso era ruim para quem pesquisava e para quem explorava a produ\u00e7\u00e3o de produtos oriundos da biodiversidade, uma vez que havia pouca seguran\u00e7a jur\u00eddica sobre a quest\u00e3o”, diz Carvalho. Essa autoriza\u00e7\u00e3o tornava o processo muito lento, o que n\u00e3o era compat\u00edvel com a demanda crescente tanto de cientistas quanto de empresas.<\/p>\n\n\n\n

A Lei da Biodiversidade, diz ele, desburocratizou isso ao criar uma plataforma online para cadastrar pesquisas com o patrim\u00f4nio gen\u00e9tico brasileiro.<\/p>\n\n\n\n

Mas n\u00e3o resolveu o problema. “Os cientistas continuam questionando o Minist\u00e9rio do Meio Ambiente quanto ao tempo para cadastro e regulariza\u00e7\u00e3o dos trabalhos”, reconhece Carvalho.<\/p>\n\n\n\n

Constantino cita ainda o descompasso entre o rigor da lei em rela\u00e7\u00e3o \u00e0s pesquisas e a leni\u00eancia com empreendimentos comerciais.<\/p>\n\n\n\n

“Uma pessoa n\u00e3o precisa de nenhuma autoriza\u00e7\u00e3o para pulverizar inseticidas sobre \u00e1reas enormes e matar milh\u00f5es e milh\u00f5es de insetos”, explica. “Mas um aluno de Entomologia n\u00e3o pode coletar um \u00fanico inseto legalmente. As normas (infralegais) definidas pelo Ibama e pelo ICMBio n\u00e3o permitem conceder licen\u00e7a de coleta para estudantes. \u00c9 preciso ser profissional formado.”<\/p>\n\n\n\n

Apesar da multa que levou, Pereira diz que a lei n\u00e3o est\u00e1 errada. “Tem sim que preservar o meio ambiente, com sua fauna e flora, por\u00e9m \u00e9 preciso bom senso e tratar cada situa\u00e7\u00e3o de forma diferente”, defende.<\/p>\n\n\n\n

“Uma coisa \u00e9 uma pessoa est\u00e1 capturando insetos para o com\u00e9rcio ou tr\u00e1fico, o que quer que seja, outra \u00e9 um estudante estar coletando material para uma determinada disciplina em uma universidade. Tem tantas coisas pelo Brasil afora para o Ibama fiscalizar – desmatamento da Amaz\u00f4nia, tr\u00e1fico ilegal de aves, madeiras e ele vai logo se preocupar com um aluno que est\u00e1 em um meio de pesquisa e ensino e cumprindo uma tarefa dada por um professor.”<\/p>\n\n\n\n

Fonte: BBC<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

Em 21 de junho, Lu\u00eds Paulo dos Santos Pereira, estudante de Engenharia Florestal da Universidade de Bras\u00edlia (UnB), andava por uma \u00e1rea do Servi\u00e7o Florestal Brasileiro, ao lado do campus universit\u00e1rio, com uma rede coletando insetos para uma tarefa de aula, quando foi abordado e multado por um fiscal do Ibama. <\/a><\/p>\n<\/div>","protected":false},"author":3,"featured_media":156176,"comment_status":"closed","ping_status":"closed","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":{"footnotes":""},"categories":[4],"tags":[66,384,2030],"_links":{"self":[{"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/156175"}],"collection":[{"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/posts"}],"about":[{"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/types\/post"}],"author":[{"embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/users\/3"}],"replies":[{"embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/comments?post=156175"}],"version-history":[{"count":1,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/156175\/revisions"}],"predecessor-version":[{"id":156177,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/156175\/revisions\/156177"}],"wp:featuredmedia":[{"embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/media\/156176"}],"wp:attachment":[{"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/media?parent=156175"}],"wp:term":[{"taxonomy":"category","embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/categories?post=156175"},{"taxonomy":"post_tag","embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/tags?post=156175"}],"curies":[{"name":"wp","href":"https:\/\/api.w.org\/{rel}","templated":true}]}}