{"id":156766,"date":"2020-01-27T16:55:00","date_gmt":"2020-01-27T19:55:00","guid":{"rendered":"https:\/\/noticias.ambientebrasil.com.br\/?p=156766"},"modified":"2020-01-26T21:59:02","modified_gmt":"2020-01-27T00:59:02","slug":"como-uma-cidade-japonesa-se-prepara-para-chegar-ao-desperdicio-zero-neste-ano","status":"publish","type":"post","link":"http:\/\/localhost\/clipping\/2020\/01\/27\/156766-como-uma-cidade-japonesa-se-prepara-para-chegar-ao-desperdicio-zero-neste-ano.html","title":{"rendered":"Como uma cidade japonesa se prepara para chegar ao desperd\u00edcio zero neste ano"},"content":{"rendered":"\n
\"Crian\u00e7as
Crian\u00e7as visitam centro de coleta em Kamikatsu: cidade j\u00e1 recicla 81% de todos os res\u00edduos que produz
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Em Kamikatsu, descartar lixo n\u00e3o \u00e9 tarefa simples.<\/p>\n\n\n\n

A cidade localizada na prov\u00edncia japonesa de Tokushima n\u00e3o possui caminh\u00e3o de coleta, por isso seus 1.517 habitantes precisam lavar e secar todo o material que desejam descartar, antes de lev\u00e1-lo para uma central e l\u00e1 fazer a separa\u00e7\u00e3o em 45 categorias de lixo.<\/p>\n\n\n\n

No caso de uma garrafa PET, por exemplo, deve-se esvazi\u00e1-la totalmente, retirar a tampa, o inv\u00f3lucro e depositar cada item na caixa correspondente.<\/p>\n\n\n\n

Essa separa\u00e7\u00e3o minuciosa \u00e9 feita manualmente pela pr\u00f3pria popula\u00e7\u00e3o.<\/p>\n\n\n\n

Os projetos que seguem o conceito de 3R (reduzir, reaproveitar e reciclar) ajudaram o pequeno munic\u00edpio localizado entre montanhas e floresta alcan\u00e7ar um dos mais altos \u00edndices de reciclagem de res\u00edduos: 81%.<\/p>\n\n\n\n

Kamikatsu se tornou refer\u00eancia mundial, mas ainda n\u00e3o atingiu a meta que se prop\u00f4s sete anos atr\u00e1s: eliminar totalmente o desperd\u00edcio em 2020. Isso significa que, a partir deste ano, todo lixo que sair das 800 resid\u00eancias de Kamikatsu n\u00e3o ter\u00e1 o aterro ou o incinerador como destino final.<\/p>\n\n\n\n

Houve resist\u00eancia de parte da popula\u00e7\u00e3o quando o rigoroso programa de coleta seletiva foi adotado, duas d\u00e9cadas atr\u00e1s, ainda com 22 categorias de lixo. Agora s\u00e3o 45.<\/p>\n\n\n\n

“N\u00e3o existe nenhuma m\u00e1gica. Nem todos os moradores est\u00e3o totalmente conscientes e nem se esfor\u00e7am o suficiente para evitar o desperd\u00edcio, por isso precisamos mostrar sempre o porqu\u00ea e a import\u00e2ncia de certas medidas”, diz Akira Sakano, presidente do Conselho de Administra\u00e7\u00e3o da Academia Zero Waste, selecionada como Global Shapers (formadores globais) do F\u00f3rum Econ\u00f4mico Mundial do ano passado.<\/p>\n\n\n\n

A organiza\u00e7\u00e3o sem fins lucrativos foi criada para ajudar Kamikatsu a cumprir a meta do lixo zero.<\/p>\n\n\n\n

\"Arika
Arika Sakano explica a um grupo de estrangeiros sistema de separa\u00e7\u00e3o de recicl\u00e1veis: s\u00e3o 45 categorias<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

Para envolver a popula\u00e7\u00e3o, o grupo tem realizado v\u00e1rias abordagens, como aulas sobre educa\u00e7\u00e3o ambiental para crian\u00e7as, sistema de certifica\u00e7\u00e3o ao com\u00e9rcio com pouco desperd\u00edcio e cart\u00e3o de pontos.<\/p>\n\n\n\n

Na opini\u00e3o de Sakano, o sistema tamb\u00e9m colabora para o bem-estar social principalmente de idosos, a maioria da popula\u00e7\u00e3o. Para essas pessoas, o munic\u00edpio oferece o servi\u00e7o de transporte do lixo at\u00e9 o centro de coleta, o que possibilita monitorar as condi\u00e7\u00f5es de sa\u00fade do morador.<\/p>\n\n\n\n

Para conseguir o apoio da popula\u00e7\u00e3o, a NPO investe em informa\u00e7\u00e3o.<\/p>\n\n\n\n

“\u00c9 preciso fornecer dados para que a pessoa possa entender tudo aquilo. No lugar onde devem ser depositadas latas de alum\u00ednio, por exemplo, est\u00e3o afixados cartazes dizendo o quanto o processo de reciclagem vai custar ou beneficiar a comunidade”, diz Sakano.<\/p>\n\n\n\n

O custo anual de gerenciamento do programa de desperd\u00edcio zero em Kamikatsu \u00e9 de cerca de 6 milh\u00f5es de ienes (aproximadamente R$ 224 milh\u00f5es) e a reciclagem garante retorno de 1 milh\u00e3o de ienes (R$ 37 milh\u00f5es). Parece pouco, mas ele representa um ter\u00e7o do que era gasto anteriormente com a incinera\u00e7\u00e3o, sem contar o custo ambiental desse processo.<\/p>\n\n\n\n

\"Visitantes
Programa custa um ter\u00e7o do que era gasto antes com incinera\u00e7\u00e3o<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

Duas d\u00e9cadas atr\u00e1s, Kamikatsu n\u00e3o era diferente da maioria das cidades. Na \u00e9poca, o lixo era classificado em nove tipos e grande parte ia para os incineradores. Por\u00e9m, a queima de res\u00edduos gerava dioxinas e furanos, dois compostos prejudiciais \u00e0 sa\u00fade, em n\u00edveis al\u00e9m dos permitidos por lei nacional.<\/p>\n\n\n\n

A sa\u00edda foi criar o Programa de Res\u00edduos Zero, em 2003. Da\u00ed surgiram projetos como o Centro Kurukuru (circular, ou rod\u00edzio em japon\u00eas), que recebe 15 toneladas de materiais usados por ano para doa\u00e7\u00e3o. No caso de tecidos de quimonos e outros vestu\u00e1rios, um grupo de artes\u00e3s usa a mat\u00e9ria-prima para cria\u00e7\u00e3o de bolsas e brinquedos, e colocam o produto \u00e0 venda.<\/p>\n\n\n\n

O com\u00e9rcio tamb\u00e9m aderiu ao programa e passou a vender itens como arroz, \u00f3leo e molho de soja (shoyu) a granel, apenas o necess\u00e1rio para consumo, pensando em reduzir o lixo e evitar a perda de alimentos.<\/p>\n\n\n\n

O pr\u00e9dio vermelho da cervejaria Rise&Win \u00e9 outra refer\u00eancia de n\u00e3o-desperd\u00edcio. A obra foi feita totalmente de materiais recicl\u00e1veis e ganhou o WAN Sustainable Building Award 2016, que premia edif\u00edcios que aliam design e preocupa\u00e7\u00e3o ambiental. As janelas largas de casas abandonadas e os lustres feitos com garrafas de vidro reaproveitadas s\u00e3o a marca do local.<\/p>\n\n\n\n

Barreira do pl\u00e1stico<\/h2>\n\n\n\n

Sakano defende que \u00e9 preciso mudar o estilo de vida para ter menos desperd\u00edcio e mais sustentabilidade. Mas h\u00e1 certas mat\u00e9rias-primas que n\u00e3o podem ser totalmente eliminadas, como os pl\u00e1sticos. Embora produza menos lixo per capita em compara\u00e7\u00e3o a outros pa\u00edses desenvolvidos, o Jap\u00e3o \u00e9 o segundo que mais gera esse tipo de res\u00edduo, ficando atr\u00e1s apenas dos Estados Unidos.<\/p>\n\n\n\n

E de onde sai tanto pl\u00e1stico? \u00c9 s\u00f3 dar uma olhada nas prateleiras de comidas para encontrar a resposta.<\/p>\n\n\n\n

No Jap\u00e3o, biscoitos e doces costumam ser embalados por unidade e depois empacotados ou colocados em caixas que, por sua vez, tamb\u00e9m s\u00e3o envolvidas em papel ou outro pl\u00e1stico.<\/p>\n\n\n\n

\"Educa\u00e7\u00e3o
Educa\u00e7\u00e3o ambiental ajuda a disseminar conceito de desperd\u00edcio zero em Kamikatsu<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

Ao ser vendido, o produto \u00e9 colocado em sacolas e o vendedor ainda pergunta se \u00e9 preciso de um saco extra, caso seja para dar de presente. Esse excesso que alguns consideram parte do “omotenashi” (esp\u00edrito de zelo, cuidado e da hospitalidade) contrasta com o conceito de “mottainai” (n\u00e3o desperd\u00edcio).<\/p>\n\n\n\n

O uso de pl\u00e1stico em abund\u00e2ncia se tornou um problema mais s\u00e9rio no Jap\u00e3o a partir de 2018, quando a China resolveu proibir a entrada do produto para reciclagem. At\u00e9 ent\u00e3o, os chineses eram respons\u00e1veis pela importa\u00e7\u00e3o de mais de 50% desse tipo de material vindo de pa\u00edses como Jap\u00e3o, Estados Unidos, Alemanha e Reino Unido.<\/p>\n\n\n\n

O novo destino passou a ser vizinhos do Sudeste Asi\u00e1tico, mas a\u00ed tamb\u00e9m j\u00e1 h\u00e1 resist\u00eancia. Ap\u00f3s importar mais de 750 mil toneladas de pl\u00e1stico em apenas seis meses (volume equivalente \u00e0 soma de 2016 e 2017), a Mal\u00e1sia decidiu limitar sua entrada pelo fato de o material n\u00e3o chegar suficientemente reciclado. A cidade de Jenjarom hoje est\u00e1 sufocada por 17 mil toneladas do res\u00edduo pl\u00e1stico abandonado por 33 usinas de reciclagem que foram fechadas por irregularidades.<\/p>\n\n\n\n

No Jap\u00e3o, o governo anunciou um plano para reduzir em um quarto as 9,4 milh\u00f5es de toneladas de pl\u00e1stico produzidas no pa\u00eds at\u00e9 2030. Uma das medidas a ser implantada neste ano obriga supermercados e lojas de conveni\u00eancia a cobrarem por cada saquinho pl\u00e1stico de compra.<\/p>\n\n\n\n

\"No
No Kurukuru Craft Center, artes\u00e3s produzem bolsas e outros itens a partir de mat\u00e9ria-prima reciclada<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

Modelo Yokohama<\/h2>\n\n\n\n

O pl\u00e1stico n\u00e3o \u00e9 o \u00fanico res\u00edduo a poluir o meio ambiente. Relat\u00f3rio do Banco Mundial aponta crescimento do volume de lixo no mundo em ritmo maior do que o da urbaniza\u00e7\u00e3o, e estima para 2050 cerca de 3,4 bilh\u00f5es de toneladas de lixo, ou 70% mais do montante registrado em 2016, de 2,01 bilh\u00f5es de toneladas produzidas nas cidades.<\/p>\n\n\n\n

Segunda maior cidade do Jap\u00e3o, Yokohama tem compartilhado sua bem-sucedida pol\u00edtica de gerenciamento de lixo com a Tail\u00e2ndia, as Filipinas e a Indon\u00e9sia. A metr\u00f3pole japonesa conseguiu reduzir o volume anual de lixo dom\u00e9stico s\u00f3lido de 1,5 milh\u00e3o de toneladas em 2003 para 1,1 milh\u00e3o em 2005 por meio do Plano G30 de reciclagem.<\/p>\n\n\n\n

A meta foi alcan\u00e7ada cinco anos antes do prazo e possibilitou o fechamento de duas das sete usinas de incinera\u00e7\u00e3o.<\/p>\n\n\n\n

A atual m\u00e9dia de lixo dom\u00e9stico combust\u00edvel coletado na cidade se mant\u00e9m em 1,1 milh\u00e3o de toneladas por ano.<\/p>\n\n\n\n

\"Yokohama
Yokohama incinera o lixo combust\u00edvel e lan\u00e7a cinzas em cais<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

O material \u00e9 queimado a temperaturas de quase 950 graus cent\u00edgrados e gera energia para aquecer piscinas.<\/p>\n\n\n\n

Ap\u00f3s a queima, o volume do res\u00edduo s\u00f3lido \u00e9 reduzido em 40 vezes e depois de tratado, lan\u00e7ado no cais de Minami Honmoku, onde foram constru\u00eddos tanques de concreto com capacidade para cem mil metros c\u00fabicos cada (o equivalente a 280 piscinas de 25 metros). A previs\u00e3o \u00e9 que esse local possa receber as cinzas do lixo incinerado nos pr\u00f3ximos quarenta anos.<\/p>\n\n\n\n

Para conter o crescimento do lixo apesar da urbaniza\u00e7\u00e3o, Yokohama promove desde 2009 a campanha do 3R. Os 3,7 milh\u00f5es de habitantes da metr\u00f3pole precisam seguir regras rigorosas de separa\u00e7\u00e3o de lixo em 15 tipos divididos em 10 categorias.<\/p>\n\n\n\n

Segundo a Secretaria de Reciclagem de Recursos e Lixo da cidade, a separa\u00e7\u00e3o antes do descarte \u00e9 obrigat\u00f3ria e a reincid\u00eancia de n\u00e3o cumprimento mesmo ap\u00f3s repetidas advert\u00eancias pode render multa no valor de 2 mil ienes (R$ 4,50).<\/p>\n\n\n\n

Em compara\u00e7\u00e3o a Kamikatsu, com 45 categorias de lixo, a lista de Yokohama \u00e9 mais enxuta. Tem o lixo inciner\u00e1vel (restos de comida e fraldas descart\u00e1veis); o n\u00e3o inciner\u00e1vel; pilhas secas; frascos de spray; recipientes ou materiais de embrulho de pl\u00e1stico; latas, garrafas e garrafas PET; pequenos objetos met\u00e1licos; pap\u00e9is velhos; panos velhos; lixo de grande porte.<\/p>\n\n\n\n

Para entender tantas regras, a maioria das cidades japonesas distribui livretos a cada domic\u00edlio e em diversos idiomas. Al\u00e9m de observar a natureza do material, \u00e9 preciso prestar aten\u00e7\u00e3o ao tamanho do lixo, pois dependendo do porte haver\u00e1 cobran\u00e7a de taxa.<\/p>\n\n\n\n

No caso de ar-condicionado, televisores e m\u00e1quinas de lavar roupa, a coleta deve ser feita por lojas de eletrodom\u00e9sticos para os aparelhos serem reciclados pelo fabricante, mediante pagamento.<\/p>\n\n\n\n

A coleta seletiva \u00e9 um tema que gera muita intriga entre a vizinhan\u00e7a no Jap\u00e3o. No complexo habitacional Homi Danchi de Toyota (prov\u00edncia de Aichi), muitos problemas ocorrem por desconhecimento das regras. O conjunto foi constru\u00eddo a princ\u00edpio para abrigar trabalhadores da montadora de autom\u00f3veis de mesmo nome e tem atualmente 7.200 moradores, sendo mais da metade deles brasileiros.<\/p>\n\n\n\n

Paulo Fujita, de 74 anos, \u00e9 um deles. Chegou em 1990 e agora, aposentado, faz parte da Associa\u00e7\u00e3o dos Moradores do Homi Danchi, ajudando na comunica\u00e7\u00e3o entre moradores japoneses e brasileiros, e muitas vezes resolvendo atritos, atuando inclusive como “xerife do lixo”.<\/p>\n\n\n\n

Ele costuma verificar sacos de lixo que ficam amontoados perto do bloco de apartamentos onde mora, na inten\u00e7\u00e3o de corrigir poss\u00edveis separa\u00e7\u00f5es irregulares. “Hoje \u00e9 menos (comum), mas ainda acontece de misturarem lixo inciner\u00e1vel com n\u00e3o-inciner\u00e1vel, ou ent\u00e3o colocarem em sacos de cor errada”, explica Fujita.<\/p>\n\n\n\n

No Jap\u00e3o, a separa\u00e7\u00e3o \u00e9 diferente em cada cidade, mas h\u00e1 a regra b\u00e1sica que n\u00e3o muda: levar o lixo ao dep\u00f3sito at\u00e9 as 8h da manh\u00e3, obedecer aos dias de coleta e colocar o res\u00edduo em sacos semitransparentes.<\/p>\n\n\n\n

“Com o tempo, todo mundo aprende”, diz Fujita.<\/p>\n\n\n\n

Fonte: BBC<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"