{"id":156857,"date":"2020-02-04T01:18:00","date_gmt":"2020-02-04T04:18:00","guid":{"rendered":"https:\/\/noticias.ambientebrasil.com.br\/?p=156857"},"modified":"2020-02-03T20:23:29","modified_gmt":"2020-02-03T23:23:29","slug":"a-luta-pela-sobrevivencia-das-oncas-da-caatinga","status":"publish","type":"post","link":"http:\/\/localhost\/clipping\/2020\/02\/04\/156857-a-luta-pela-sobrevivencia-das-oncas-da-caatinga.html","title":{"rendered":"A luta pela sobreviv\u00eancia das on\u00e7as da Caatinga"},"content":{"rendered":"\n
\"On\u00e7a-parda
A on\u00e7a-parda da Caatinga \u00e9 uma das esp\u00e9cies da regi\u00e3o que est\u00e1 amea\u00e7ada de extin\u00e7\u00e3o<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

Encontrar on\u00e7as na Caatinga \u00e9 uma tarefa dific\u00edlima por alguns motivos: elas s\u00e3o animais raros vivendo em uma grande extens\u00e3o de terra; elas n\u00e3o gostam muito de se aproximar de humanos; e, mais importante, a presen\u00e7a das duas esp\u00e9cies t\u00edpicas da \u00e1rea, a parda e a pintada, tem diminu\u00eddo nos \u00faltimos anos, o que as colocou em s\u00e9rio risco de extin\u00e7\u00e3o.<\/p>\n\n\n\n

Hoje, estima-se que existam apenas 30 on\u00e7as-pintadas e 180 pardas na regi\u00e3o do Boqueir\u00e3o da On\u00e7a, no norte da Bahia, ponto com maior incid\u00eancia desses grandes felinos na Caatinga nordestina. Em 2008, data da estimativa anterior, havia 50 pintadas e 200 pardas na \u00e1rea \u2014 ou seja, houve uma queda de 40% no n\u00famero de indiv\u00edduos da primeira, e de 10% da segunda.<\/p>\n\n\n\n

Os dados s\u00e3o do Programa Amigos da On\u00e7a, projeto de estudo e conserva\u00e7\u00e3o dos felinos da Caatinga, filiado ao Instituto Pr\u00f3-Carn\u00edvoros.<\/p>\n\n\n\n

Para especialistas e bi\u00f3logos que atuam na regi\u00e3o, al\u00e9m da ca\u00e7a ilegal, as on\u00e7as enfrentam dois desafios: o conflito com o ser humano e o atual aumento de fazendas de gera\u00e7\u00e3o de energia e\u00f3lica \u2014 o recurso tem baixo impacto ambiental em compara\u00e7\u00e3o com as hidro e termoel\u00e9tricas, mas eles n\u00e3o s\u00e3o nulos. O Nordeste corresponde a 86% de toda energia e\u00f3lica produzida no Brasil.<\/p>\n\n\n\n

Conserva\u00e7\u00e3o x energia e\u00f3lica<\/h2>\n\n\n\n

H\u00e1 dois anos, uma \u00e1rea de 347 mil hectares do Boqueir\u00e3o da On\u00e7a foi transformada em parque nacional por um decreto do ent\u00e3o presidente Michel Temer (MDB). Isso significa que a fauna e a flora dentro dos limites do parque devem ser conservadas sem nenhum tipo de explora\u00e7\u00e3o.<\/p>\n\n\n\n

A cria\u00e7\u00e3o do parque foi vista como boa not\u00edcia para as esp\u00e9cies em extin\u00e7\u00e3o na Caatinga, como a pr\u00f3pria on\u00e7a, a arara-azul-de-lear e o tatu-bola.<\/p>\n\n\n\n

Por outro lado, uma \u00e1rea maior, de 505 mil hectares, foi transformada em \u00c1rea de Prote\u00e7\u00e3o Ambiental (APA) do Boqueir\u00e3o. Diferente do que acontece com o parque, essa classifica\u00e7\u00e3o permite explora\u00e7\u00e3o comercial desde que os planos de manejo sustent\u00e1vel sejam respeitados.<\/p>\n\n\n\n

\"Boqueir\u00e3o
O Boqueir\u00e3o da On\u00e7a, no norte da Bahia, tem cerca de 30 on\u00e7as-pintadas e 180 pardas, segundo estimativa de ONG<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

Inicialmente, a esperan\u00e7a dos ambientalistas era de que todo o Boqueir\u00e3o da On\u00e7a virasse um parque nacional \u2014 ou seja, isso garantiria mais espa\u00e7o para a preserva\u00e7\u00e3o total do bioma e dos animais.<\/p>\n\n\n\n

Mas a regi\u00e3o \u00e9 muito visada por empresas de gera\u00e7\u00e3o de energia e\u00f3lica, que t\u00eam cada vez mais instalado fazendas por ali. Portanto, a cria\u00e7\u00e3o da APA foi ben\u00e9fica para as companhias, que agora podem explorar o potencial energ\u00e9tico da \u00e1rea.<\/p>\n\n\n\n

“O Boqueir\u00e3o \u00e9 um fil\u00e9 mignon para essas empresas, pois ele tem um grande potencial de gera\u00e7\u00e3o de energia. H\u00e1 muitos pontos de morro, onde h\u00e1 uma incid\u00eancia constante de ventos de boa velocidade”, explica Felipe Melo, pesquisador em Ecologia da Universidade Federal de Pernambuco, que estuda os impactos ambientais da energia e\u00f3lica na Caatinga.<\/p>\n\n\n\n

Para se instalar em uma APA, as companhias precisam de licen\u00e7as ambientais e relat\u00f3rios de impactos, embora estudos mais aprofundados sobre como as on\u00e7as s\u00e3o afetadas pelas torres e linhas de transmiss\u00e3o ainda estejam em est\u00e1gio inicial.<\/p>\n\n\n\n

Por\u00e9m, pesquisadores j\u00e1 t\u00eam notado que a prolifera\u00e7\u00e3o das fazendas de energia e a maior presen\u00e7a de seres humanos no habitat est\u00e3o diminuindo o espa\u00e7o dispon\u00edvel para as on\u00e7as ca\u00e7arem suas presas naturais \u2014 obviamente, os animais n\u00e3o respeitam os limites burocr\u00e1ticos que separam a APA do parque nacional de conserva\u00e7\u00e3o. A longo prazo, dizem bi\u00f3logos, o encurtamento do territ\u00f3rio pode afetar o bem-estar e at\u00e9 a sobreviv\u00eancia desses grandes felinos.<\/p>\n\n\n\n

“As on\u00e7as da Caatinga s\u00e3o muito sens\u00edveis a qualquer altera\u00e7\u00e3o em seu habitat”, explica a bi\u00f3loga Claudia B. Campos, ex-coordenadora e atual colaboradora do projeto Amigos da On\u00e7a. “A parda at\u00e9 tolera um pouco mais a presen\u00e7a humana. J\u00e1 a pintada, n\u00e3o. Ela dificilmente vai at\u00e9 pontos onde h\u00e1 interven\u00e7\u00e3o ou presen\u00e7a do homem.”<\/p>\n\n\n\n

\"Fazendas
Nordeste \u00e9 respons\u00e1vel por 86% da produ\u00e7\u00e3o de energia e\u00f3lica do Brasil<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

A bi\u00f3loga Carolina Franco Esteves, tamb\u00e9m pesquisadora do Programa Amigos da On\u00e7a, conta que o projeto conseguiu monitorar as andan\u00e7as de uma on\u00e7a-parda, apelidada de Vit\u00f3ria, por meio de coleiras de rastreamento.<\/p>\n\n\n\n

“Em 10 meses de monitoramento, percebemos que em nenhum momento ela se aproximou das torres de gera\u00e7\u00e3o de energia”, afirmou \u00e0 BBC News Brasil. “Quando queria chegar em algum ponto para ca\u00e7ar ou beber \u00e1gua, ela dava uma volta por fora das torres, mesmo que n\u00e3o houvesse ningu\u00e9m por ali.”<\/p>\n\n\n\n

Para Melo, esses impactos negativos “poderiam ser minimizados” se as empresas que atuam na Caatinga “dialogassem” mais com entidades e \u00f3rg\u00e3os de conserva\u00e7\u00e3o. “A energia e\u00f3lica tem menos impacto ambiental, mas n\u00e3o significa que n\u00e3o exista. \u00c9 preciso saber exatamente como \u00e1reas sens\u00edveis s\u00e3o afetadas e tentar diminuir esses impactos, e n\u00e3o escond\u00ea-los”, diz.<\/p>\n\n\n\n

Em nota, a Associa\u00e7\u00e3o Brasileira de Energia E\u00f3lica (Abee\u00f3lica) afirmou que “tem monitorado constantemente” comunidades de animais silvestres nas regi\u00e3o do Boqueir\u00e3o.<\/p>\n\n\n\n

“Isso ajudar\u00e1, de forma bastante significativa a m\u00e9dio e longo prazo, a monitorar e compreender os reais fatores que podem contribuir com quaisquer altera\u00e7\u00f5es de riqueza das esp\u00e9cies”, diz a entidade.<\/p>\n\n\n\n

A associa\u00e7\u00e3o tamb\u00e9m afirma que as fazendas de gera\u00e7\u00e3o de energia, al\u00e9m de evitar inc\u00eandios e gerar renda para produtores rurais, tamb\u00e9m “inibem a presen\u00e7a de ca\u00e7adores e a supress\u00e3o ilegal (de vegeta\u00e7\u00e3o), amea\u00e7as concretas \u00e0 preserva\u00e7\u00e3o destes animais”.<\/p>\n\n\n\n

On\u00e7as x rebanhos<\/h2>\n\n\n\n

Al\u00e9m das torres de energia, as on\u00e7as da Caatinga enfrentam outro desafio, segundo pesquisadores: o conflito direto com o homem. A ca\u00e7a ilegal para a venda de pele, por exemplo, j\u00e1 matou muitos indiv\u00edduos, principalmente nos anos 1970, segundo a bi\u00f3loga Claudia B. Campos.<\/p>\n\n\n\n

\"A
A ONG Amigos da On\u00e7a construiu 18 currais para criadores da regi\u00e3o do Boqueir\u00e3o da On\u00e7a<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

J\u00e1 a ca\u00e7a de outros animais, como veados e porcos do mato, continua afetando os felinos diretamente, pois eles ficam com menos recursos para se alimentar.<\/p>\n\n\n\n

Outro tipo de conflito tamb\u00e9m tem atrapalhado a sobreviv\u00eancia das on\u00e7as na Caatinga: a competi\u00e7\u00e3o com criadores de ovinos e caprinos de seis pequenas cidades que est\u00e3o dentro do per\u00edmetro do Boqueir\u00e3o.<\/p>\n\n\n\n

“A Caatinga tem praticamente duas esta\u00e7\u00f5es no ano: chuva e seca. Na \u00e9poca da seca, os criadores t\u00eam dificuldade para alimentar e prover \u00e1gua para o rebanho. Por isso, os animais ficam soltos para encontrar alimento”, explica Campos. “Ent\u00e3o, h\u00e1 o encontro entre a on\u00e7a e o rebanho. E, obviamente, o predador vai atacar os animais.”<\/p>\n\n\n\n

Os pesquisadores notaram que a perda dos bichos fazia com que alguns criadores procurassem os felinos para abat\u00ea-los \u2014 muitas vezes com sucesso. A esperan\u00e7a deles era de que, sem on\u00e7as por perto, o rebanho ficasse livre de infort\u00fanios.<\/p>\n\n\n\n

A ca\u00e7a ilegal e o abate frequente s\u00e3o tr\u00e1gicos para a preserva\u00e7\u00e3o das duas esp\u00e9cies, pois a popula\u00e7\u00e3o n\u00e3o consegue se reproduzir no mesmo ritmo das mortes. Cada f\u00eamea s\u00f3 procria a cada dois anos, e tem uma gesta\u00e7\u00e3o de tr\u00eas meses \u2014 depois, ela ainda fica at\u00e9 um ano e meio cuidando do filhote.<\/p>\n\n\n\n

Para tentar diminuir esses conflitos, o Programa Amigos da On\u00e7a procurou os moradores para explicar a import\u00e2ncia da conserva\u00e7\u00e3o das esp\u00e9cies \u2014 parte deles j\u00e1 se engajou na prote\u00e7\u00e3o aos felinos. Nos \u00faltimos anos, a ONG construiu 18 currais para agricultores de duas comunidades da regi\u00e3o.<\/p>\n\n\n\n

\"On\u00e7a-parda
A on\u00e7a-parda tolera um pouco mais a presen\u00e7a humana na Caatinga, segundo bi\u00f3logos<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

“A ideia \u00e9 diminuir o tempo em que os rebanhos ficam expostos na Caatinga, principalmente \u00e0 noite, quando as on\u00e7as normalmente saem para ca\u00e7ar”, explica a bi\u00f3loga Carolina Franco Esteves.<\/p>\n\n\n\n

Um estudo da ONG apontou que as estruturas constru\u00eddas conseguiram reduzir em at\u00e9 23% o n\u00famero de perdas de animais de rebanhos \u2014 o que acaba tirando os felinos do foco dos agricultores.<\/p>\n\n\n\n

Por outro lado, a pobreza e a falta de servi\u00e7os p\u00fablicos na regi\u00e3o do Boqueir\u00e3o da On\u00e7a, como ocorre em praticamente toda a Caatinga, tornou-se um empecilho para a conserva\u00e7\u00e3o do bioma.<\/p>\n\n\n\n

“Percebemos que, muitas vezes, a revolta dos moradores n\u00e3o era necessariamente contra o bicho, mas contra a condi\u00e7\u00e3o de vida prec\u00e1ria e com pouca assist\u00eancia do Estado. A on\u00e7a acaba virando uma esp\u00e9cie de bode-expiat\u00f3rio para outras mazelas”, explica Claudia Martins, agr\u00f4noma do Instituto Pr\u00f3-Carn\u00edvoros e pesquisadora da Universidade Federal do Vale do S\u00e3o Francisco.<\/p>\n\n\n\n

\"On\u00e7a-pintada
Mais rara na Caatinga, on\u00e7a-pintada normalmente sai para ca\u00e7ar \u00e0 noite – imagens do animal s\u00e3o obtidas por meio de ‘armadilhas fotogr\u00e1ficas’<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

“\u00c9 um grande desafio voc\u00ea chegar em um lugar bastante carente e falar: ‘pessoal, vamos pensar na on\u00e7a’. As pessoas est\u00e3o mais preocupadas com as necessidades b\u00e1sicas: se v\u00e3o ter o que comer, se v\u00e3o conseguir passar no m\u00e9dico, se ter\u00e1 escola para o filho. Esse di\u00e1logo \u00e9 dif\u00edcil, mas aos poucos temos conseguido o apoio de muitos moradores”, diz Martins.<\/p>\n\n\n\n

‘Exerc\u00edcio de paci\u00eancia’<\/h2>\n\n\n\n

Estudar o comportamento das on\u00e7as e como elas s\u00e3o afetadas por esses problemas tamb\u00e9m n\u00e3o \u00e9 tarefa f\u00e1cil. A captura de um animal para monitoramento, por exemplo, exige uma equipe formada por bi\u00f3logos, veterin\u00e1rios e mateiros. Eles chegam a ficar 30 dias acampados na Caatinga.<\/p>\n\n\n\n

“O Boqueir\u00e3o \u00e9 uma \u00e1rea muito grande com poucos indiv\u00edduos de on\u00e7a. Em m\u00e9dia, uma campanha de 30 dias consegue capturar apenas um animal, usando armadilhas”, diz Claudia B. Campos.<\/p>\n\n\n\n

Segundo ela, um acampamento desses chega a custar R$ 60 mil em estrutura e pegamento de pessoal. “\u00c9 um exerc\u00edcio de paci\u00eancia, e nem sempre d\u00e1 certo. \u00c9 preciso conhecer bem a regi\u00e3o e ter um pouco de sorte, tamb\u00e9m”, afirma a bi\u00f3loga.<\/p>\n\n\n\n

Fonte: BBC<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

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