{"id":157243,"date":"2020-02-26T12:18:00","date_gmt":"2020-02-26T15:18:00","guid":{"rendered":"https:\/\/noticias.ambientebrasil.com.br\/?p=157243"},"modified":"2020-02-25T21:22:01","modified_gmt":"2020-02-26T00:22:01","slug":"como-as-faixas-da-morte-que-dividiram-europa-na-guerra-fria-se-tornaram-santuarios-de-vida-selvagem","status":"publish","type":"post","link":"http:\/\/localhost\/clipping\/2020\/02\/26\/157243-como-as-faixas-da-morte-que-dividiram-europa-na-guerra-fria-se-tornaram-santuarios-de-vida-selvagem.html","title":{"rendered":"Como as ‘faixas da morte’ que dividiram Europa na Guerra Fria se tornaram santu\u00e1rios de vida selvagem"},"content":{"rendered":"\n
\"\u00c1rea
O Cintur\u00e3o Verde Europeu se tornou uma t\u00e1bua de salva\u00e7\u00e3o para muitas esp\u00e9cies amea\u00e7adas de extin\u00e7\u00e3o<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

P\u00e1ssaros raros cantam \u00e0 sombra das antigas torres da Alemanha Oriental. Renas selvagens percorrem a fronteira entre a Finl\u00e2ndia e a R\u00fassia. Linces se esgueiram por bunkers comunistas nas montanhas da Alb\u00e2nia e norte da Maced\u00f4nia. Em toda a Europa, esp\u00e9cies amea\u00e7adas est\u00e3o encontrando uma casa improv\u00e1vel nas terras onde a antiga Cortina de Ferro dividiu a regi\u00e3o durante a Guerra Fria.<\/p>\n\n\n\n

Durante d\u00e9cadas, a fronteira que cortou a Europa foi um s\u00edmbolo da hostilidade entre os blocos socialista e capitalista. At\u00e9 a queda do Muro de Berlim, h\u00e1 30 anos, que dividia a Alemanha, entre o lado Ocidental, da Rep\u00fablica Federal da Alemanha (RFA), e o Oriental, da Rep\u00fablica Democr\u00e1tica Alem\u00e3 (RDA).<\/p>\n\n\n\n

Muitos perderam a vida tentando atravessar para o Ocidente, mortos por atiradores ou minas terrestres, na zona proibida entre as duas na\u00e7\u00f5es. Este corredor fortemente vigiado ficou conhecido como “faixa da morte”.<\/p>\n\n\n\n

Mas nesta regi\u00e3o onde nenhum homem podia pisar, plantas e animais prosperavam.<\/p>\n\n\n\n

Hoje, grande parte da faixa de terra ao longo da antiga Cortina de Ferro foi transformada em um “Cintur\u00e3o Verde Europeu”. Essa faixa de 12,5 mil km de extens\u00e3o liga parques nacionais e santu\u00e1rios de vida selvagem do Oceano \u00c1rtico ao Mar Adri\u00e1tico, com um bra\u00e7o se conectando ao Mar Negro.<\/p>\n\n\n\n

Como a mudan\u00e7a clim\u00e1tica afeta os padr\u00f5es de migra\u00e7\u00e3o de p\u00e1ssaros e outros animais, ela tamb\u00e9m se tornou uma rota de fuga vital para esp\u00e9cies que fogem para o norte \u2014 as \u00e1reas mais frias. E tudo come\u00e7ou com alguns intr\u00e9pidos observadores de p\u00e1ssaros.<\/p>\n\n\n\n

Torres de vigia<\/h2>\n\n\n\n

“Quando eu tinha 14 anos, comecei a registrar as esp\u00e9cies de aves da regi\u00e3o”, diz Kai Frobel, ecologista que cresceu no lado ocidental da fronteira da Alemanha na d\u00e9cada de 1970. “Percebi muito rapidamente que a maioria das esp\u00e9cies raras, como o cartaxo-nortenho, o noitib\u00f3-da-europa, e a estamenha-de-milho, estavam todos se reproduzindo na ‘faixa da morte’ da RDA, em todos os lugares”.<\/p>\n\n\n\n

Frobel foi o primeiro a documentar publicamente este surpreendente ref\u00fagio de vida selvagem, o que o levou \u00e0 carreira de conservacionista. Hoje, ele trabalha para uma organiza\u00e7\u00e3o ambiental alem\u00e3 (Bund) que come\u00e7ou a comprar e proteger terras ao longo do lado ocidental da fronteira nos anos 1980.<\/p>\n\n\n\n

\"Lince-dos-balc\u00e3s\"\/
O lince-dos-balc\u00e3s, amea\u00e7ado de extin\u00e7\u00e3o, \u00e9 uma subesp\u00e9cie de lince-da-eur\u00e1sia que percorre \u00e1reas de ca\u00e7a na Alb\u00e2nia, Kosovo, Maced\u00f4nia do Norte e Montenegro<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

Ap\u00f3s a queda do Muro de Berlim em 1989, Frobel sugeriu transformar a faixa de fronteira interna da Alemanha em um “cintur\u00e3o verde” de 1,4 mil km de comprimento. A Alemanha se reunificou em 1990, tornando isso poss\u00edvel. No centro do plano de Frobel estava esta faixa de terra, que antes pertencera oficialmente \u00e0 RDA. Por estar no lado oriental das cercas e muros da fronteira, ela mal havia sido tocada durante os 40 anos em que leste e oeste ficaram divididos.<\/p>\n\n\n\n

“As patrulhas de fronteira s\u00f3 chegavam l\u00e1 de poucos em poucos anos. Elas retiravam arbustos, limpavam um pouco a \u00e1rea, que n\u00e3o era usada de jeito nenhum”, diz Melanie Kreutz, l\u00edder de projeto em Bund. “Portanto, sem agricultura, sem pesticidas, sem fertilizantes. E esta \u00e1rea, essa terra de ningu\u00e9m, \u00e9 realmente a espinha dorsal ecol\u00f3gica do cintur\u00e3o verde (alem\u00e3o) hoje. “<\/p>\n\n\n\n

Mais de 80% da antiga fronteira interna da Alemanha agora faz parte desse cintur\u00e3o verde protegido. Seu legado hist\u00f3rico foi preservado junto com plantas e animais. Os visitantes podem avistar orqu\u00eddeas, lontras e cegonhas, mas tamb\u00e9m explorar a hist\u00f3ria da Guerra Fria atrav\u00e9s de museus, exposi\u00e7\u00f5es e caminhadas guiadas, al\u00e9m de passeios de bicicleta.<\/p>\n\n\n\n

Ao longo da antiga Cortina de Ferro, bols\u00f5es semelhantes de \u00e1rea selvagem foram mantidos intocados durante o impasse Leste-Oeste. No norte, as florestas da Noruega, Finl\u00e2ndia e R\u00fassia abrigavam alces e ursos e, no extremo sul, nas montanhas e lagos dos B\u00e1lc\u00e3s, linces e pelicanos prosperavam.<\/p>\n\n\n\n

Ap\u00f3s o fim da Guerra Fria, os pa\u00edses ao longo da fronteira gradualmente uniram for\u00e7as para preservar esse corredor acidental e compartilhado de vida selvagem.<\/p>\n\n\n\n

O Cintur\u00e3o Verde Europeu agora percorre 24 pa\u00edses, cobrindo uma enorme variedade de habitats, incluindo costas, lagos, florestas e montanhas. Embora ainda existam lacunas, o cintur\u00e3o verde se tornou uma linha de salva\u00e7\u00e3o para muitas esp\u00e9cies amea\u00e7adas de extin\u00e7\u00e3o.<\/p>\n\n\n\n

Trampolins para renas<\/h2>\n\n\n\n

“Esses corredores s\u00e3o complexos ecossistemas que permitem que as esp\u00e9cies mantenham suas fortalezas, troquem genes e migrem”, diz Aimo Saano, gerente de conserva\u00e7\u00e3o da natureza da Mets\u00e4hallitus, uma ag\u00eancia governamental que administra as principais \u00e1reas da parte finlandesa do Cintur\u00e3o Verde da Europa.<\/p>\n\n\n\n

\"Renas
As renas silvestres, altamente amea\u00e7adas de extin\u00e7\u00e3o, se beneficiaram das \u00e1reas de cintur\u00e3o verde no norte da Europa<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

“Como sabemos da Europa densamente habitada, esse \u00e9 o perigo \u00f3bvio: que os ecossistemas foram minimizados e cortados em pequenos peda\u00e7os, separados um do outro.”<\/p>\n\n\n\n

A liga\u00e7\u00e3o por meio de fronteiras pode ajudar a combater essa tend\u00eancia e apoiar esp\u00e9cies como as renas florestais, altamente amea\u00e7adas de extin\u00e7\u00e3o. Na d\u00e9cada de 1990, uma das poucas popula\u00e7\u00f5es remanescentes de renas silvestres da floresta vivia na Car\u00e9lia, uma regi\u00e3o russa na fronteira com a Finl\u00e2ndia.<\/p>\n\n\n\n

Diferentemente da fronteira entre as Alemanhas, a divisa entre a R\u00fassia e a Finl\u00e2ndia n\u00e3o desapareceu. Mas os conservacionistas russos e finlandeses transferiram algumas das renas da floresta selvagem russa para um parque nacional finland\u00eas, estabelecendo uma segunda popula\u00e7\u00e3o menor a oeste do cintur\u00e3o verde. As renas podem se mover para frente e para tr\u00e1s atrav\u00e9s da fronteira, e a troca gen\u00e9tica resultante \u00e9 vital para a sa\u00fade futura da esp\u00e9cie, diz Saano.<\/p>\n\n\n\n

Algumas esp\u00e9cies, como p\u00e1ssaros, borboletas e outros insetos, est\u00e3o migrando para o norte ao longo do Cintur\u00e3o Verde Europeu para escapar dos efeitos do aquecimento global.<\/p>\n\n\n\n

“Pelo menos aqui elas ter\u00e3o um corredor para se mover”, diz Saano.<\/p>\n\n\n\n

Paz e pelicanos<\/h2>\n\n\n\n

No extremo sul do Cintur\u00e3o Verde Europeu, nos B\u00e1lc\u00e3s, o fim da Guerra Fria foi seguido por uma s\u00e9rie de guerras sangrentas. Quando a ex-Iugosl\u00e1via se desfez, poucas pessoas viram a prote\u00e7\u00e3o da vida selvagem como prioridade. Com a paz, no entanto, surgiu uma crescente conscientiza\u00e7\u00e3o sobre os tesouros naturais da regi\u00e3o e uma vontade de cruzar as fronteiras para proteg\u00ea-los.<\/p>\n\n\n\n

“Nosso foco principal \u00e9 obviamente a prote\u00e7\u00e3o do meio ambiente, mas nos B\u00e1lc\u00e3s isso vai al\u00e9m”, diz Sandra Wigger, gerente de projetos da EuroNatur, funda\u00e7\u00e3o ambiental que coordena organiza\u00e7\u00f5es locais ao longo da se\u00e7\u00e3o balc\u00e2nica do cintur\u00e3o verde.<\/p>\n\n\n\n

“Trata-se tamb\u00e9m de interc\u00e2mbio transfronteiri\u00e7o e desenvolvimento regional. \u00c9 sobre deixar as pessoas verem que podem agir juntas. Porque elas passaram por aqueles anos de guerra que nem sequer faz tanto tempo.”<\/p>\n\n\n\n

\"Cintur\u00e3o
Mais de 80% da antiga fronteira interna da Alemanha agora faz parte do Cintur\u00e3o Verde Europeu protegido<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

As condi\u00e7\u00f5es naturais nesta \u00e1rea montanhosa e escassamente povoada, e sua hist\u00f3ria da Guerra Fria, resultaram em habitats selvagens intocados. A Alb\u00e2nia, por exemplo, ficou particularmente isolada durante o regime comunista. Suas fronteiras ainda est\u00e3o pontilhadas de bunkers. Na Bulg\u00e1ria, uma zona de proibi\u00e7\u00e3o de at\u00e9 25 km de largura em alguns lugares delimitava a fronteira.<\/p>\n\n\n\n

“Ainda existem grandes \u00e1reas de natureza intocada, grandes \u00e1reas florestais que foram usadas apenas pelas poucas pessoas que vivem nessas regi\u00f5es montanhosas”, diz Wigger. “As cidades geralmente est\u00e3o muito distantes. Isso significa que realmente temos uma enorme biodiversidade aqui que foi preservada.”<\/p>\n\n\n\n

Pelicanos-d\u00e1lmatas est\u00e3o entre as esp\u00e9cies que prosperaram nesta regi\u00e3o selvagem. A maior col\u00f4nia do mundo se reproduz nos campos de junco dos lagos Prespa, entre Gr\u00e9cia, Alb\u00e2nia e Maced\u00f4nia do Norte.<\/p>\n\n\n\n

Outra esp\u00e9cie da fronteira \u00e9 o lince-dos-balc\u00e3s, amea\u00e7ado de extin\u00e7\u00e3o, que perambula entre diferentes \u00e1reas de ca\u00e7a dentro e ao longo do cintur\u00e3o verde, como o Parque Nacional Mavrovo, no norte da Maced\u00f4nia. Mas tamb\u00e9m nas montanhas da Alb\u00e2nia, Kosovo e Montenegro.<\/p>\n\n\n\n

Para os conservacionistas que trabalham ao longo do Cintur\u00e3o Verde Europeu, a conex\u00e3o com outros pa\u00edses tamb\u00e9m cria oportunidades para trocar informa\u00e7\u00f5es e aprender uns com os outros.<\/p>\n\n\n\n

“Essa abordagem europeia d\u00e1 uma dimens\u00e3o t\u00e3o grande, onde voc\u00ea realmente v\u00ea, OK, existem pessoas, organiza\u00e7\u00f5es, ag\u00eancias governamentais em todo o continente que trabalham juntas al\u00e9m das fronteiras”, diz Wigger. “Existe esse apoio, esse sentimento de fazer parte de uma comunidade em que voc\u00ea percebe que n\u00e3o est\u00e1 sozinho”.<\/p>\n\n\n\n

‘Um monumento vivo’<\/h2>\n\n\n\n

Nem todo mundo \u00e9 a favor do cintur\u00e3o verde, no entanto. Na Alemanha, onde os conservacionistas gostariam de fechar as lacunas no cintur\u00e3o, associa\u00e7\u00f5es de agricultores t\u00eam protestado contra sua expans\u00e3o.<\/p>\n\n\n\n

Eles temem a perda de terras agr\u00edcolas. O aumento do pre\u00e7o da terra, a demanda por culturas de biocombust\u00edveis e a constru\u00e7\u00e3o de estradas tamb\u00e9m est\u00e3o pressionando o cintur\u00e3o verde.<\/p>\n\n\n\n

Para Frobel, que passou a inf\u00e2ncia perto de uma fronteira que parecia ser imposs\u00edvel de cruzar na \u00e9poca, n\u00e3o se trata apenas de proteger o meio ambiente, como tamb\u00e9m de preservar uma mem\u00f3ria.<\/p>\n\n\n\n

“\u00c9 um monumento ecol\u00f3gico vivo para uma gera\u00e7\u00e3o que n\u00e3o testemunhou a fronteira”, diz ele. “Nossa expectativa b\u00e1sica era de que essa monstruosa fronteira interior da Alemanha fosse constru\u00edda para a eternidade. Quase ningu\u00e9m pensou que, um dia, n\u00e3o estaria mais l\u00e1.”<\/p>\n\n\n\n

Como diz seu colega Kreutz: “Para as pessoas, era uma zona de morte. Mas a natureza conseguiu realmente florescer livremente l\u00e1.”<\/p>\n\n\n\n

Fonte: BBC<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

P\u00e1ssaros raros cantam \u00e0 sombra das antigas torres da Alemanha Oriental. Renas selvagens percorrem a fronteira entre a Finl\u00e2ndia e a R\u00fassia. Linces se esgueiram por bunkers comunistas nas montanhas da Alb\u00e2nia e norte da Maced\u00f4nia. Em toda a Europa, esp\u00e9cies amea\u00e7adas est\u00e3o encontrando uma casa improv\u00e1vel nas terras onde a antiga Cortina de Ferro dividiu a regi\u00e3o durante a Guerra Fria. <\/a><\/p>\n<\/div>","protected":false},"author":3,"featured_media":157244,"comment_status":"closed","ping_status":"closed","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":{"footnotes":""},"categories":[4],"tags":[2612,46,702],"_links":{"self":[{"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/157243"}],"collection":[{"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/posts"}],"about":[{"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/types\/post"}],"author":[{"embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/users\/3"}],"replies":[{"embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/comments?post=157243"}],"version-history":[{"count":1,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/157243\/revisions"}],"predecessor-version":[{"id":157245,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/157243\/revisions\/157245"}],"wp:featuredmedia":[{"embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/media\/157244"}],"wp:attachment":[{"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/media?parent=157243"}],"wp:term":[{"taxonomy":"category","embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/categories?post=157243"},{"taxonomy":"post_tag","embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/tags?post=157243"}],"curies":[{"name":"wp","href":"https:\/\/api.w.org\/{rel}","templated":true}]}}