{"id":160259,"date":"2020-06-05T12:30:00","date_gmt":"2020-06-05T15:30:00","guid":{"rendered":"https:\/\/noticias.ambientebrasil.com.br\/?p=160259"},"modified":"2020-06-04T22:38:56","modified_gmt":"2020-06-05T01:38:56","slug":"nas-reentrancias-amazonicas-comunidades-equilibram-conservacao-e-extrativismo","status":"publish","type":"post","link":"http:\/\/localhost\/clipping\/2020\/06\/05\/160259-nas-reentrancias-amazonicas-comunidades-equilibram-conservacao-e-extrativismo.html","title":{"rendered":"Nas reentr\u00e2ncias amaz\u00f4nicas, comunidades equilibram conserva\u00e7\u00e3o e extrativismo"},"content":{"rendered":"\n

A leste da foz do rio Amazonas, no encontro da floresta tropical com o Oceano Atl\u00e2ntico, um mosaico de paisagens naturais que se estende por centenas de quil\u00f4metros \u00e9 protegido por pescadores e coletores.<\/p>\n\n\n\n

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Aloizio do Ros\u00e1rio Blanco e o filho, Aloizio do Ros\u00e1rio Junior, pescam camar\u00e3o-branco com rede de tarrafa em Pacamorema, na Resex M\u00e3e Grande de Curu\u00e7a, no Par\u00e1. A fim de preservar as popula\u00e7\u00f5es da iguaria, um s\u00edmbolo da culin\u00e1ria paraense, e garantir a produ\u00e7\u00e3o a longo prazo, pescadores v\u00eam utilizando redes com tamanhos de malha mais adequados \u2013 o m\u00ednimo sugerido \u00e9 10 mil\u00edmetros.
FOTO DE ENRICO MARONE<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n
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Regi\u00e3o pr\u00f3xima \u00e0 comunidade Furo da Deol\u00e2ndia, na Resex S\u00e3o Jo\u00e3o da Ponta, Par\u00e1. As reentr\u00e2ncias paraenses e amaz\u00f4nicas se estendem por centenas de quil\u00f4metros \u00e0 leste da foz do rio Amazonas e formam uma mosaico de mangues, mar, praias, dunas, restingas, ba\u00edas, enseadas, ilhas, rios, furos e igarap\u00e9s.
FOTO DE ENRICO MARONE<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

O Nordeste paraense \u00e9 a regi\u00e3o de maior densidade demogr\u00e1fica de toda a Amaz\u00f4nia brasileira. Enquanto a m\u00e9dia geral do territ\u00f3rio gira em torno de 5 habitantes\/ km2, a \u00e1rea a leste de Bel\u00e9m abriga, pelo menos, quatro vezes mais pessoas.<\/p>\n\n\n\n

Menos de 90% da vegeta\u00e7\u00e3o nativa amaz\u00f4nica persiste nesse solo, gra\u00e7as \u00e0 ocupa\u00e7\u00e3o hist\u00f3rica de mais de tr\u00eas s\u00e9culos, quando ali se estabeleceu o principal polo provedor da capital com produtos madeireiros, pesqueiros e agr\u00edcolas, desde o Ciclo da Borracha e da estrada de ferro Bel\u00e9m-Bragan\u00e7a. \u00c9 uma \u00e1rea altamente antropizada, com centros urbanos din\u00e2micos e agropecu\u00e1ria consolidada. No entanto, um trecho de floresta na parte litor\u00e2nea do estado ainda resiste ao avan\u00e7o do desenvolvimento econ\u00f4mico, pastagens e monoculturas. <\/p>\n\n\n\n

Conhecida como reentr\u00e2ncias paraenses, a paisagem recortada da costa, que encanta ge\u00f3grafos e cart\u00f3grafos, est\u00e1 a poucos graus ao sul da Linha do Equador e \u00e9 resguardada por um conjunto de 12 reservas extrativistas (Resex) Marinhas federais. Essas \u00e1reas protegidas abrangem 56% dos 2,9 mil km2 de manguezais do Par\u00e1. Mas o mangue n\u00e3o termina ali, ele se estende por mais 5 mil km2 no Maranh\u00e3o (que tem 3,6 mil km2 protegidos por Resex), formando o maior manguezal cont\u00ednuo do mundo. <\/p>\n\n\n\n

Paraenses e maranhenses, as reentr\u00e2ncias amaz\u00f4nicas s\u00e3o forma\u00e7\u00f5es \u00fanicas na costa brasileira, estendendo-se por centenas de quil\u00f4metros a leste da foz do rio Amazonas, com uma extens\u00e3o de costa que apenas no ano passado come\u00e7ou a ser efetivamente mapeada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estat\u00edstica (IBGE). Vistas de cima, parecem pontas de dedos humanos unidos, ou uma sequ\u00eancia de d\u00fazias de pen\u00ednsulas enfileiradas e costuradas por canais de contato entre mangue, mar, praias, dunas, restingas, ba\u00edas, enseadas, ilhas, rios, furos e igarap\u00e9s.<\/p>\n\n\n\n

Quando preservadas, s\u00e3o consideradas a segunda melhor \u00e1rea de invernada para aves migrat\u00f3rias, que preferem a regi\u00e3o para alimenta\u00e7\u00e3o e reprodu\u00e7\u00e3o pelo clima e pela densidade e variedade de esp\u00e9cies marinhas e costeiras dispon\u00edveis. A\u00ed est\u00e3o concentra\u00e7\u00f5es ainda n\u00e3o estimadas de caranguejos, moluscos, mariscos, mam\u00edferos aqu\u00e1ticos e peixes de \u00e1gua doce e salgada importantes para o ecossistema, a cultura e a alimenta\u00e7\u00e3o regional.<\/p>\n\n\n\n

Cerca de 80 mil pessoas, ou 1% da popula\u00e7\u00e3o paraense, vivem em reservas extrativistas da Amaz\u00f4nia Atl\u00e2ntica \u2013 na fina e pouco conhecida camada que restou entre a \u00e1rea de desenvolvimento econ\u00f4mico e o mar. Em sua maioria, s\u00e3o agricultores familiares, extrativistas e, principalmente, pescadores e pescadoras artesanais \u2013 coletores de caranguejo e marisqueiras que realizam um trabalho altamente especializado para abastecer principalmente a popula\u00e7\u00e3o de Bel\u00e9m \u2013 mas tamb\u00e9m de outros estados e pa\u00edses \u2013 com pescado, frutos do mar e mat\u00e9rias-primas exclusivas.<\/p>\n\n\n\n

Ci\u00eancia do manguezal<\/h3>\n\n\n\n

N\u00e3o foi f\u00e1cil assegurar, at\u00e9 aqui, a conserva\u00e7\u00e3o desse territ\u00f3rio ao longo de s\u00e9culos de ocupa\u00e7\u00e3o. Estabelecidas nos \u00faltimos 20 anos, as Resex Marinhas desempenham papel fundamental na prote\u00e7\u00e3o do ecossistema e s\u00f3 existem gra\u00e7as \u00e0 luta de lideran\u00e7as e comunidades que conquistaram o direito a proteger suas terras, mares e modos de vida.<\/p>\n\n\n\n

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Luan Vitor Fonseca \u00e9 filho de pescadores da Resex Marinha de Cururupu, no Maranh\u00e3o.
FOTO DE ENRICO MARONE<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n
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Camar\u00e3o \u00e9 secado no sol na comunidade de Len\u00e7\u00f3is, dentro da Resex Marinha de Cururupu, no Maranh\u00e3o.
FOTO DE ENRICO MARONE<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

\u201cO manguezal \u00e9 uma coisa muito importante para todos n\u00f3s, n\u00e3o s\u00f3 para os pescadores, mas para todos que tiram esse ar para a gente respirar, que \u00e9 um ar que a gente pode dizer que \u00e9 um ar puro, que vem dos oceanos e de dentro dos manguezais\u201d, explica o caranguejeiro Jo\u00e3o de Lima Coelho, 57, conselheiro da Resex de S\u00e3o Jo\u00e3o da Ponta, uma das mais pr\u00f3ximas a Bel\u00e9m.<\/p><\/blockquote>\n\n\n\n

De fato, o conhecimento tradicional dos caranguejeiros \u00e9 corroborado pelas pesquisas sobre estoques de carbono que mostram que o manguezal tem papel fundamental nas mudan\u00e7as clim\u00e1ticas globais, uma vez que sua vegeta\u00e7\u00e3o armazena at\u00e9 quatro vezes mais carbono que outras florestas tropicais do mundo. Na regi\u00e3o amaz\u00f4nica, cada hectare de manguezal cont\u00e9m uma quantidade de carbono duas vezes maior que a mesma \u00e1rea de floresta, principalmente por conta do solo rico em material org\u00e2nico.<\/p>\n\n\n\n

\u201cO manguezal n\u00e3o traz s\u00f3 coisa boa para a gente, mas tamb\u00e9m para as aves, os peixes, muitos p\u00e1ssaros que se alimentam e dormem dentro do manguezal, onde tem v\u00e1rios crust\u00e1ceos, v\u00e1rios moluscos que se alimentam ali, v\u00e1rios peixes que comem marisco dentro do manguezal\u201d, diz Jo\u00e3o. \u201cEnt\u00e3o, \u00e9 muito \u00fatil, n\u00e3o s\u00f3 para a gente, homens e mulheres pescadores, como tamb\u00e9m para as aves, os p\u00e1ssaros e os peixes.\u201d<\/p>\n\n\n\n

Pescador desde os 10 anos, o conselheiro aprendeu com amigos a tirar caranguejo, apostando que seria uma forma mais f\u00e1cil de gerar renda do que a lida di\u00e1ria que observava em seu pai, tamb\u00e9m pescador. \u201cEu conquistei uma fam\u00edlia e criei tudo com esses mariscos e com caranguejo, com peixe e com camar\u00e3o, com o peixe e com o siri, s\u00f3 com esses mariscos do mar eu constru\u00ed uma fam\u00edlia linda, gra\u00e7as a Deus\u201d, conta Jo\u00e3o, pai de nove filhos.<\/p>\n\n\n\n

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Foi apenas em 2009, sete anos depois da cria\u00e7\u00e3o da Resex, que ele se tornou membro da Associa\u00e7\u00e3o dos Usu\u00e1rios da Resex de S\u00e3o Jo\u00e3o da Ponta (Mocajuim) e passou a colaborar com seu conhecimento e energia na defesa das atividades extrativistas que desempenha desde a inf\u00e2ncia. \u201c\u00c9 um trabalho, sim, sacrificado, muito sacrificado, e a gente n\u00e3o tem muito estudo, mas a gente v\u00ea, mesmo as pessoas que t\u00eam muito estudo, gente formada e concursada, sem emprego.\u201d<\/p>\n\n\n\n

Com trabalho garantido para si e para os filhos, pelo menos enquanto durarem os estoques de caranguejo-u\u00e7\u00e1, Jo\u00e3o compartilha com os decanos das reentr\u00e2ncias paraenses esfor\u00e7os e f\u00f3runs de constru\u00e7\u00e3o de pol\u00edticas para promover a longevidade do mangue e de suas fontes de renda. \u201cEu digo que esse mar \u00e9 o nosso banco, esse manguezal onde a gente vai tirar o marisco, o sustento para a gente comprar outras mercadorias para as necessidades da casa.\u201d<\/p>\n\n\n\n

Garantir que esse \u2018banco\u2019 n\u00e3o abra fal\u00eancia tamb\u00e9m \u00e9 a miss\u00e3o de Zacarias Bandeira, 61, membro do conselho deliberativo da Resex Gurupi-Piri\u00e1. Lideran\u00e7a hist\u00f3rica na regi\u00e3o, ele fomentou a cria\u00e7\u00e3o das reservas extrativistas marinhas do Par\u00e1 e \u00e9 um dos maiores entusiastas do modelo de gest\u00e3o compartilhada dos territ\u00f3rios e maret\u00f3rios dos quais suas fam\u00edlias s\u00e3o benefici\u00e1rias.<\/p>\n\n\n\n

Modelos de engajamento<\/h3>\n\n\n\n

\u201cQuando eu comecei a fazer alguns cursos t\u00e9cnicos com organiza\u00e7\u00f5es parceiras e a ver novos horizontes, me deparei com o tamanho que a gente era explorado na pesca, e isso acabou me incomodando\u201d, lembra Zacarias.<\/p>\n\n\n\n

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Guar\u00e1s-vermelhos sobrevoam a Resex Marinha de Arapiranga-Troma\u00ed, no Maranh\u00e3o. O turismo \u00e9 outra potencial fonte de renda para os moradores da regi\u00e3o.
FOTO DE ENRICO MARONE<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n
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Pescador checa curral de pesca durante a mar\u00e9 baixa na Resex Marinha de Caet\u00e9-Tapera\u00e7u no Par\u00e1.
FOTO DE ENRICO MARONE<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

Natural de uma vila solapada pela a\u00e7\u00e3o marinha, o pescador conta como a mudan\u00e7a de localidade permitiu que transformasse em a\u00e7\u00e3o concreta o inc\u00f4modo que sentia quanto \u00e0 condi\u00e7\u00e3o de trabalho de seus parentes e vizinhos.<\/p>\n\n\n\n

\u201cN\u00f3s usamos essa mudan\u00e7a de praia para mudar de comportamento tamb\u00e9m. J\u00e1 que n\u00f3s estamos mudando, vamos tentar fazer uma experi\u00eancia diferente aqui\u201d, relembra. \u201cL\u00e1, a gente era explorado pelo patr\u00e3o, ent\u00e3o vamos come\u00e7ar uma vida nova. Depois de muito debate e muita conversa, o grupo come\u00e7ou a entender e a gente criou uma associa\u00e7\u00e3o e passou a comercializar o nosso peixe diretamente em Bragan\u00e7a. A gente se livrou do atravessador, da \u2018geleira\u2019.\u201d<\/p>\n\n\n\n

A experi\u00eancia bem-sucedida come\u00e7ou em 1987, quando um grupo de 16 fam\u00edlias se uniu em uma nova praia e estabeleceu um sistema cooperativo para a produ\u00e7\u00e3o e comercializa\u00e7\u00e3o do pescado. Um dos quatro barcos de que dispunham foi dedicado com exclusividade para o transporte at\u00e9 Bragan\u00e7a, e a renda da venda realizada nos mercados locais era dividida de forma bastante pr\u00f3pria. \u201cA gente divida o lucro em partes iguais, o que era uma novidade tamb\u00e9m, e deu muito certo\u201d, conta Zacarias. \u201cA gente tirou uma porcentagem do que produzia para ficar como reserva para manuten\u00e7\u00e3o da pesca, outra parte era para as despesas da pescaria, 5% era para dividir entre as crian\u00e7as e 70% era dividido em partes iguais, entre quem trabalhava.\u201d<\/p>\n\n\n\n

O sistema de trabalho que eliminou a figura do patr\u00e3o e retirou o privil\u00e9gio do arrais \u2013 piloto do barco que ganhava mais que os pescadores \u2013 durou alguns anos, mas n\u00e3o \u00e9 mais adotado na localidade. \u201cTivemos que sair para administrar a reserva, que era uma coisa maior, mas essa ideia continua ainda para a gente retomar ela de novo.\u201d<\/p>\n\n\n\n

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Imagem \u00e1erea mostra pequeno barco de pesca no rio Mojuim, regi\u00e3o do Salgado Paraense.
FOTO DE ENRICO MARONE<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n
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Pescadores artesanais da Resex Marinha Caet\u00e9-Tapera\u00e7u, no Par\u00e1, analisam o resultado de um dia pescando bagres bandeirados, esp\u00e9cie apreciada na culin\u00e1ria paraense.
FOTO DE ENRICO MARONE<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

Depois de testemunhar a cria\u00e7\u00e3o de 12 reservas extrativistas marinhas no Par\u00e1, Zacarias viu, em mar\u00e7o de 2018, a foz do rio Amazonas e seus manguezais, do Amap\u00e1 ao Maranh\u00e3o, entrarem na Lista das Zonas \u00damidas de Import\u00e2ncia Internacional como s\u00edtios da Conven\u00e7\u00e3o de Ramsar \u2013 um acordo internacional entre mais de 150 pa\u00edses firmado na d\u00e9cada de 1970 que visa \u201cevitar a degrada\u00e7\u00e3o das zonas \u00famidas e promover sua conserva\u00e7\u00e3o, reconhecendo suas fun\u00e7\u00f5es ecol\u00f3gicas fundamentais e seu valor econ\u00f4mico, cultural, cient\u00edfico e recreativo\u201d, segundo estatuto. Entre os benef\u00edcios que o t\u00edtulo pode trazer ao Brasil est\u00e3o a obten\u00e7\u00e3o de apoio para o desenvolvimento de pesquisas sobre o funcionamento e a conserva\u00e7\u00e3o dos manguezais, al\u00e9m do acesso a fundos internacionais para a viabiliza\u00e7\u00e3o de projetos.<\/p>\n\n\n\n

Enquanto isso, com a parceria de algumas organiza\u00e7\u00f5es, institutos de refer\u00eancia e modesta presen\u00e7a dos \u00f3rg\u00e3os gestores, os moradores das Resex buscam formas de garantir a sustentabilidade das cadeias do caranguejo, camar\u00e3o, pescada-amarela e outras esp\u00e9cies-chave para a economia e a alimenta\u00e7\u00e3o local. \u201cOs caranguejeiros s\u00e3o praticamente invis\u00edveis para a sociedade e, infelizmente, o Estado brasileiro n\u00e3o tem uma pol\u00edtica definitiva, na verdade, para a \u00e1rea da pesca como um todo\u201d, explica Zacarias.<\/p>\n\n\n\n

Em busca da sustentabilidade<\/h3>\n\n\n\n

Uma das a\u00e7\u00f5es recentes mais promissoras na regi\u00e3o \u00e9 o rod\u00edzio da captura da pescada-amarela na Resex de Cururupu, na por\u00e7\u00e3o maranhense das reentr\u00e2ncias. Ap\u00f3s o levantamento e a demarca\u00e7\u00e3o de po\u00e7os usados pela esp\u00e9cie, foi estabelecido um calend\u00e1rio de revezamento dos locais para resguardo. \u201cA cada m\u00eas, \u00e9 separado um po\u00e7o para que o pescador n\u00e3o pesque dentro, e, com essa metodologia, a gente vem ajudando na recupera\u00e7\u00e3o do estoque\u201d, explica Josenilde Ferreira, 45, conhecida como Mocinha, membro do conselho deliberativo da Resex.<\/p>\n\n\n\n

Em parceria com o Instituto Chico Mendes de Conserva\u00e7\u00e3o da Biodiversidade (ICMBio), as associa\u00e7\u00f5es de moradores, entidades de classe, a organiza\u00e7\u00e3o Rare Brasil e a Universidade Estadual do Maranh\u00e3o (Uema), foram desenvolvidos estudos para atestar a efic\u00e1cia do m\u00e9todo de rod\u00edzio concebido localmente. A comprova\u00e7\u00e3o cient\u00edfica \u00e9 um dos primeiros passos para o estabelecimento oficial de \u00c1reas de Conserva\u00e7\u00e3o e Recupera\u00e7\u00e3o dos Estoques (Acres), metodologia internacional que delimita espa\u00e7os naturais de ber\u00e7\u00e1rios e de reprodu\u00e7\u00e3o, onde \u00e9 proibida a captura, permanentemente.<\/p>\n\n\n\n

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Pescadores da comunidade de Guajerutiua, na Reserva Extrativista Marinha de Cururupu, onde a precipita\u00e7\u00e3o anual chega a 2.250 mil\u00edmetros. Ap\u00f3s os per\u00edodos chuvosos, o rendimento da pesca quase triplica na regi\u00e3o.\u00a0
FOTO DE\u00a0ENRICO MARONE<\/strong> <\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n
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Josenilde Ferreira, a Mocinha, segura uma pescada-amarela. Mocinha \u00e9 pescadora e conselheira da Resex Marinha de Cururupu, no Maranh\u00e3o, e foi uma das lideran\u00e7as da comunidade na mobiliza\u00e7\u00e3o de pescadores artesanais para estabelecer o rod\u00edzio de po\u00e7os e colaborar na conserva\u00e7\u00e3o da pescada-amarela, esp\u00e9cie que pode atingir at\u00e9 1,1 m de comprimento.
FOTO – ENRICO MARONE<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

Realizada entre 2015 e 2019, a atividade faz parte do programa Pesca para Sempre, que gerou estudos capazes de subsidiar tamb\u00e9m o estabelecimento de um per\u00edodo de defeso para a pescada-amarela n\u00e3o apenas nas 15 ilhas da Resex de Cururupu, mas em todo o Brasil.<\/p>\n\n\n\n

Esteve a cargo de Mocinha uma mobiliza\u00e7\u00e3o in\u00e9dita na regi\u00e3o para articular os pescadores em torno de debates e a\u00e7\u00f5es que resultaram na defini\u00e7\u00e3o do rod\u00edzio de po\u00e7os. \u201cQuando esses locais ficam um m\u00eas sem nenhuma pesca, a gente v\u00ea a abund\u00e2ncia. S\u00e3o \u00e1reas de descanso, \u00e1reas que d\u00e3o certo, e esse \u00e9 um modelo que a gente est\u00e1 querendo fazer e espera que venha ajudar a recuperar a pescada-amarela\u201d, conta Mocinha.<\/p>\n\n\n\n

Realizado em sete Resex das reentr\u00e2ncias, o Pesca para Sempre trouxe uma perspectiva renovada para o desenvolvimento local, promovendo o protagonismo dos moradores na defini\u00e7\u00e3o e ado\u00e7\u00e3o de pr\u00e1ticas de manejo sustent\u00e1vel das principais esp\u00e9cies de uso econ\u00f4mico local.<\/p>\n\n\n\n

\u201cMeu sonho para o futuro \u00e9 ver a minha Resex sustent\u00e1vel, com energia sustent\u00e1vel, sistema de capta\u00e7\u00e3o de \u00e1gua pot\u00e1vel, com o mercado da cadeia produtiva do pescado, com os comunit\u00e1rios empoderados, orgulhosos de ser extrativistas, de ser pescador, e ver as crian\u00e7as tendo o que eu vi quando eu era crian\u00e7a, com os manguezais em 90% da \u00e1rea e os guar\u00e1s sobrevoando\u201d, conta Mocinha.<\/p><\/blockquote>\n\n\n\n

Outras comunidades v\u00eam promovendo medidas de manejo das esp\u00e9cies-alvo, como a ado\u00e7\u00e3o de tamanhos de rede adequados para a pesca do camar\u00e3o-branco, na Resex M\u00e3e Grande de Curu\u00e7\u00e1, e a campanha de respeito ao per\u00edodo de defeso do caranguejo-u\u00e7\u00e1. A conscientiza\u00e7\u00e3o \u00e9 importante porque, durante as luas cheias e novas dos meses de janeiro a mar\u00e7o, os crust\u00e1ceos saem das tocas em massa para se reproduzir \u2013 um fen\u00f4meno conhecido no Brasil como andada, ou suat\u00e1, no Par\u00e1.<\/p>\n\n\n\n

Outra parceria com as comunidades costeiras que pode colaborar para a melhoria do manejo e da cadeia produtiva de esp\u00e9cies \u00e9 o projeto-piloto Pesca Mais Sustent\u00e1vel, conduzido pela organiza\u00e7\u00e3o Conserva\u00e7\u00e3o Internacional Brasil, com recursos de incentivo do Google Brasil. O projeto, testado com resultados promissores, desenvolveu um sistema num\u00e9rico de etiquetagem da produ\u00e7\u00e3o pesqueira que permite a rastreabilidade do pescado, desde o mangue at\u00e9 a mesa.<\/p>\n\n\n\n

Protagonismo local<\/h3>\n\n\n\n

Experi\u00eancias participativas que valorizam o protagonismo dos pescadores e pescadoras artesanais est\u00e3o influenciando tamb\u00e9m a abordagem dos \u00f3rg\u00e3os estaduais e federais respons\u00e1veis pela administra\u00e7\u00e3o de unidades de conserva\u00e7\u00e3o de uso sustent\u00e1vel. \u201cEstamos conseguindo colaborar para superar o desafio do engajamento que era muito dif\u00edcil nessa regi\u00e3o, mas, com as pessoas e parcerias certas, que est\u00e3o trazendo bons resultados, esperamos levar o programa para todas as Resex do litoral paraense\u201d, explica Monique Galv\u00e3o, representante da Rare Brasil.<\/p>\n\n\n\n

Comunidades de tr\u00eas Resex que receberam assist\u00eancia para melhoria da cadeia de produ\u00e7\u00e3o do caranguejo, por exemplo, estudam a ado\u00e7\u00e3o de tecnologias menos impactantes no transporte dos animais vivos para os mercados. Com a ado\u00e7\u00e3o da basqueta, que \u00e9 uma caixa pl\u00e1stica retorn\u00e1vel, a mortalidade dos indiv\u00edduos capturados diminui de 45% para apenas 5% durante os deslocamentos. Al\u00e9m disso, o respeito ao tamanho m\u00ednimo de captura, de 7 cent\u00edmetros de carapa\u00e7a, e a proibi\u00e7\u00e3o da retirada de f\u00eameas tamb\u00e9m s\u00e3o atitudes capazes de proteger a renova\u00e7\u00e3o dos estoques, que, segundo os caranguejeiros locais, j\u00e1 foram maiores. Escolhendo os indiv\u00edduos certos, os coletores podem tirar menor quantidade e ser melhor remunerados, com um produto de melhor qualidade.<\/p>\n\n\n\n

A Universidade Federal do Par\u00e1 (UFPA) \u00e9 respons\u00e1vel por realizar o monitoramento biol\u00f3gico e ecol\u00f3gico do caranguejo-u\u00e7\u00e1 em algumas Resex do litoral paraense, al\u00e9m de analisar os dados de automonitoramento gerados pelos pr\u00f3prios pescadores. O modelo subsidiou a defini\u00e7\u00e3o de protocolos de monitoramento da pesca do programa Monitora, do ICMBio, que busca restabelecer o defasado sistema de estat\u00edstica pesqueira brasileiro, realizado pela \u00faltima vez em 2011.<\/p>\n\n\n\n

A Comiss\u00e3o Nacional para o Fortalecimento das Reservas Extrativistas e dos Povos Extrativistas Costeiros-Marinhos (Cofrem) \u00e9 parceira do programa Monitora e promove a participa\u00e7\u00e3o ativa das comunidades na defini\u00e7\u00e3o das pol\u00edticas e tamb\u00e9m dos projetos acad\u00eamicos e sociais dentro das reservas. \u201cNo ano passado, um pescador perguntou: \u2018Quando \u00e9 que esse processo vai chegar at\u00e9 a minha comunidade? Eu tamb\u00e9m sou pescador, eu pesco o peixe, eu pesco o camar\u00e3o, eu pesco o caranguejo, e eu quero ser enxergado tamb\u00e9m\u2019\u201d, conta Sandra Regina Gon\u00e7alves, representante estadual da Confrem no Par\u00e1.<\/p>\n\n\n\n

\u00c0 frente da conserva\u00e7\u00e3o dos manguezais amaz\u00f4nicos, a Cofrem desempenha papel fundamental na articula\u00e7\u00e3o de esfor\u00e7os para desenvolver o manejo sustent\u00e1vel dos recursos pesqueiros em todo o pa\u00eds. Ao lado de pescadores, pescadoras, marisqueiras, caranguejeiros e tamb\u00e9m de pesquisadores, lideran\u00e7as hist\u00f3ricas e cada vez mais jovens seguem lapidando um modo de vida ditado pelas amplas mar\u00e9s da zona equatorial. Evitando queimadas e desmatamento nas reservas extrativistas, buscam assegurar a conserva\u00e7\u00e3o dos territ\u00f3rios e maret\u00f3rios onde a floresta mergulha no mar.<\/p>\n\n\n\n

Fonte: National Geographic Brasil<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

A leste da foz do rio Amazonas, no encontro da floresta tropical com o Oceano Atl\u00e2ntico, um mosaico de paisagens naturais que se estende por centenas de quil\u00f4metros \u00e9 protegido por pescadores e coletores. <\/a><\/p>\n<\/div>","protected":false},"author":3,"featured_media":160260,"comment_status":"closed","ping_status":"closed","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":{"footnotes":""},"categories":[4],"tags":[4438,872,76,1988,30],"_links":{"self":[{"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/160259"}],"collection":[{"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/posts"}],"about":[{"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/types\/post"}],"author":[{"embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/users\/3"}],"replies":[{"embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/comments?post=160259"}],"version-history":[{"count":1,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/160259\/revisions"}],"predecessor-version":[{"id":160271,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/160259\/revisions\/160271"}],"wp:featuredmedia":[{"embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/media\/160260"}],"wp:attachment":[{"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/media?parent=160259"}],"wp:term":[{"taxonomy":"category","embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/categories?post=160259"},{"taxonomy":"post_tag","embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/tags?post=160259"}],"curies":[{"name":"wp","href":"https:\/\/api.w.org\/{rel}","templated":true}]}}