{"id":171559,"date":"2021-06-25T16:58:09","date_gmt":"2021-06-25T19:58:09","guid":{"rendered":"https:\/\/noticias.ambientebrasil.com.br\/?p=171559"},"modified":"2021-06-25T16:58:11","modified_gmt":"2021-06-25T19:58:11","slug":"solos-da-antartida-podem-nao-conter-vida-uma-descoberta-inedita","status":"publish","type":"post","link":"http:\/\/localhost\/clipping\/2021\/06\/25\/171559-solos-da-antartida-podem-nao-conter-vida-uma-descoberta-inedita.html","title":{"rendered":"Solos da Ant\u00e1rtida podem n\u00e3o conter vida \u2014 uma descoberta in\u00e9dita"},"content":{"rendered":"\n
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Dois membros da equipe de pesquisa de solos saem para coletar amostras na regi\u00e3o da geleira Shackleton.
FOTO DE\u00a0NOAH FIERER<\/strong><\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

Pela primeira vez, cientistas encontraram camadas de solo na superf\u00edcie da Terra<\/a> que parecem n\u00e3o abrigar nenhum tipo de vida. Os solos prov\u00eam de duas cordilheiras rochosas varridas pelo vento no interior da Ant\u00e1rtida, a 480 quil\u00f4metros do Polo Sul, onde montanhas atravessam faixas de gelo com milhares de metros de espessura.<\/p>\n\n\n\n

\u201cPartimos do princ\u00edpio de que os micr\u00f3bios s\u00e3o resistentes e podem viver em qualquer lugar\u201d, afirma Noah Fierer, ecologista microbiano da Universidade do Colorado, em Boulder, e chefe da equipe que estudou os solos. Organismos unicelulares j\u00e1 foram encontrados vivendo at\u00e9 mesmo em fontes hidrotermais com temperaturas acima de 93 graus Celsius; retidos em lagos formados sob quase um quil\u00f4metro de gelo na Ant\u00e1rtida<\/a>; e a 36 mil metros de altura na estratosfera da Terra. Mas depois de um ano de pesquisas, Fierer e seu aluno de doutorado Nicholas Dragone ainda n\u00e3o encontraram vida em alguns solos da Ant\u00e1rtida.<\/p>\n\n\n\n

Fierer e Dragone estudaram 11 montanhas, que apresentavam condi\u00e7\u00f5es amplamente diferentes de solo. Os pesquisadores chegaram a encontrar bact\u00e9rias e fungos nas montanhas mais baixas e menos geladas, mas nas montanhas mais altas, secas e frias, n\u00e3o encontraram nenhum sinal de vida<\/a>.<\/p>\n\n\n\n

\u201cN\u00e3o podemos dizer que s\u00e3o est\u00e9reis\u201d, afirma Fierer. \u00c9 comum que os microbiologistas detectem milh\u00f5es de c\u00e9lulas em pequenos fragmentos de solo. Por isso, um n\u00famero realmente baixo \u2014 100 c\u00e9lulas vivas, por exemplo \u2014 pode acabar n\u00e3o sendo detectado. \u201cMas, at\u00e9 onde sabemos, esses solos n\u00e3o abrigam nenhuma vida microbiana.\u201d<\/p>\n\n\n\n

Procurando por sinais de vida<\/h3>\n\n\n\n

Independentemente de alguns desses solos realmente n\u00e3o abrigarem vida ou mesmo que futuramente seja constatado um n\u00famero baixo de c\u00e9lulas vivas, esta nova descoberta \u2014 publicada recentemente no peri\u00f3dico JGR Biogeosciences <\/em>\u2014 pode auxiliar na busca por vida em Marte. Os solos da Ant\u00e1rtida est\u00e3o congelados, saturados de sais t\u00f3xicos e n\u00e3o entram em contato com quantidades significativas de \u00e1gua em estado l\u00edquido h\u00e1 pelo menos dois milh\u00f5es de anos \u2014 como ocorre tamb\u00e9m com os solos marcianos.<\/p>\n\n\n\n

As amostras foram coletadas durante uma expedi\u00e7\u00e3o de janeiro de 2018, financiada pela US National Science Foundation, a uma se\u00e7\u00e3o remota das Montanhas Transant\u00e1rticas. As montanhas dividem o interior do continente, separando o alto planalto polar, a leste, do gelo mais baixo, a oeste. Os cientistas acamparam na geleira Shackleton, uma esteira de gelo de 96 quil\u00f4metros que se estende atrav\u00e9s de uma fenda nas montanhas. Para chegarem aos pontos mais altos e coletarem amostras acima e abaixo da geleira, os cientistas utilizaram um helic\u00f3ptero.<\/p>\n\n\n\n

Nas montanhas mais quentes e \u00famidas que ficam ao p\u00e9 da geleira, a apenas algumas centenas de metros acima do n\u00edvel do mar, foram encontrados solos habitados por animais menores do que sementes de gergelim, como vermes microsc\u00f3picos, tard\u00edgrados, rot\u00edferos e um tipo de inseto sem asa chamado col\u00eambolo. Esses solos arenosos abrigavam menos de um mil\u00e9simo do n\u00famero de bact\u00e9rias que poderiam ser encontradas em um gramado bem cuidado \u2014 o que \u00e9 suficiente para fornecer comida para os pequenos animais que vivem debaixo da superf\u00edcie.<\/p>\n\n\n\n

J\u00e1 em visita \u00e0s montanhas em pontos mais altos da geleira, os microbiologistas perceberam que os sinais de vida foram gradualmente diminuindo. No topo da geleira, eles visitaram duas montanhas: Schroeder e Roberts Massif. Essas montanhas se elevam a mais de 2,5 mil metros acima do n\u00edvel do mar.<\/p>\n\n\n\n

Byron Adams, bi\u00f3logo da Universidade Brigham Young em Provo, Utah, que liderou o projeto, relembra que a visita ao monte Schroeder foi uma experi\u00eancia chocante. A temperatura neste dia de ver\u00e3o estava perto de 18 graus Celsius negativos. Ventos uivantes, que lentamente evaporavam a neve e o gelo, mantendo as montanhas despidas, amea\u00e7avam levar as p\u00e1s de jardim utilizadas para recolher as amostras. O solo estava coberto de rochas vulc\u00e2nicas avermelhadas, perfuradas e polidas por s\u00e9culos de desgaste causado pelo vento.<\/p>\n\n\n\n

Ao levantarem as rochas, os cientistas encontraram sais brancos encrustados na parte inferior. Eram cristais t\u00f3xicos de percloratos, cloratos e nitratos. Percloratos e cloratos s\u00e3o sais c\u00e1usticos e reativos usados em combust\u00edveis de foguetes e alvejantes industriais, abundantes na superf\u00edcie de Marte. Esses sais se acumulam em montanhas ressecadas da Ant\u00e1rtida porque n\u00e3o h\u00e1 \u00e1gua para esco\u00e1-los.<\/p>\n\n\n\n

\u201cParecia uma amostra do solo de Marte\u201d, afirma Adams. O cientista tamb\u00e9m conta que, ao empurrar a p\u00e1, \u201cfoi poss\u00edvel perceber que aquele solo n\u00e3o era movido h\u00e1 muito tempo \u2014 talvez h\u00e1 milh\u00f5es de anos\u201d.<\/p>\n\n\n\n

Os pesquisadores acreditavam que mesmo nesses lugares mais elevados e in\u00f3spitos, eles ainda encontrariam alguns micr\u00f3bios vivos no solo. Mas as expectativas foram diminuindo a partir do final de 2018, quando Dragone usou um m\u00e9todo chamado \u201crea\u00e7\u00e3o em cadeia da polimerase\u201d (PCR, na sigla em ingl\u00eas) para detectar DNA microbiano na terra. Dragone analisou 204 amostras de solos de montanhas acima e abaixo da geleira. As amostras das montanhas mais baixas e quentes produziram DNA abundante; mas 20% das amostras dos solos retirados de localidades mais elevadas, sendo a maioria delas dos montes Schroeder e Roberts Massif, n\u00e3o renderam absolutamente nada, sugerindo que continham poucos ou, at\u00e9 mesmo, nenhum micr\u00f3bio.<\/p>\n\n\n\n

\u201cQuando Nicholas come\u00e7ou a me mostrar alguns dos resultados, pensei: ‘tem alguma coisa errada’<\/em>\u201d, disse Fierer. Ele pensou que poderia haver algo errado com as amostras ou com os pr\u00f3prios equipamentos do laborat\u00f3rio.<\/p>\n\n\n\n

Dragone fez uma bateria de experimentos adicionais em busca de sinais de vida nas amostras. O cientista incubou o solo com glicose para ver se alguma forma de vida possivelmente presente no solo poderia convert\u00ea-la em di\u00f3xido de carbono. Tentou detectar uma subst\u00e2ncia qu\u00edmica chamada ATP, usada por todos os tipos de vida na Terra para armazenar energia. Por meses, Dragone incubou peda\u00e7os de solo em variados coquet\u00e9is de nutrientes, tentando fazer com que qualquer micr\u00f3bio presente crescesse em col\u00f4nias.<\/p>\n\n\n\n

\u201cNick tentou de tudo com essas amostras\u201d, diz Fierer. Apesar de todos os testes, ele ainda n\u00e3o encontrou nada em algumas amostras de solo. \u201cIsso foi realmente surpreendente\u201d, conclui o microbiologista.<\/p>\n\n\n\n

BRASIL INAUGURA NOVA BASE DE PESQUISAS NA ANT\u00c1RTIDA
Com constru\u00e7\u00e3o imponente, a nova esta\u00e7\u00e3o Comandante Ferraz substitui pr\u00e9dio destru\u00eddo em inc\u00eandio de 2012.<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

Realmente n\u00e3o h\u00e1 vida no solo?<\/h3>\n\n\n\n

Jacqueline Goordial, microbiologista ambiental da Universidade de Guelph, no Canad\u00e1, considera os resultados \u201cinteressantes\u201d, especialmente pelos esfor\u00e7os de Dragone para descobrir os fatores que influenciam a probabilidade de encontrar micr\u00f3bios em determinado local. Ele constatou que a altitude elevada e os altos n\u00edveis de sais de clorato eram os principais indicadores da n\u00e3o exist\u00eancia de vida detect\u00e1vel. \u201c\u00c9 uma descoberta bastante interessante\u201d, diz Goordial. \u201cIsso nos diz muito sobre os limites da vida na Terra\u201d.<\/p>\n\n\n\n

Mas Goordial n\u00e3o est\u00e1 totalmente convencida de que realmente n\u00e3o haja vida nos solos devido \u00e0 sua pr\u00f3pria experi\u00eancia em outra regi\u00e3o da Ant\u00e1rtida.<\/p>\n\n\n\n

H\u00e1 alguns anos, ela estudou solos de um ambiente semelhante nas Montanhas Transant\u00e1rticas \u2014 um lugar a mais de 800 quil\u00f4metros a noroeste da geleira Shackleton, chamado University Valley, em que provavelmente n\u00e3o h\u00e1 umidade significativa ou temperaturas de degelo h\u00e1 120 mil anos. Goordial n\u00e3o encontrou sinais de vida nas amostras do solo desse local nem mesmo ao incub\u00e1-las por 20 meses a 5 graus Celsius negativos \u2014 temperatura t\u00edpica de ver\u00e3o naquele vale. Por\u00e9m, quando aqueceu as amostras a alguns graus acima do ponto de congelamento, v\u00e1rias delas mostraram crescimento bacteriano.<\/p>\n\n\n\n

Determinar a exist\u00eancia de vida nesses solos depende de como definimos vida.<\/p>\n\n\n\n

J\u00e1 foram encontradas, por exemplo, c\u00e9lulas bacterianas ainda vivas ap\u00f3s ficarem retidas por milhares de anos no gelo glacial. Nessa condi\u00e7\u00e3o, as c\u00e9lulas podem desacelerar seu metabolismo em at\u00e9 um milh\u00e3o de vezes. Elas entram em um estado de dorm\u00eancia e n\u00e3o fazem mais nada al\u00e9m de reparar danos ao DNA causados pela penetra\u00e7\u00e3o de raios c\u00f3smicos no gelo. Goordial especula que esses \u201csobreviventes lentos\u201d podem ser o que ela detectou em University Valley \u2014 e suspeita que se Dragone e Fierer analisassem dez vezes mais o solo, tamb\u00e9m poderiam encontr\u00e1-los nos montes Roberts Massif ou Schroeder.<\/p>\n\n\n\n

Ajudando a procurar vida em Marte<\/h3>\n\n\n\n

Brent Christner, que estuda micr\u00f3bios ant\u00e1rticos na Universidade da Fl\u00f3rida, em Gainesville, acredita que esses solos secos de grandes eleva\u00e7\u00f5es podem ajudar a refinar a busca por vida em Marte.<\/p>\n\n\n\n

Ele ressalta que as sondas Viking I e II, que pousaram em Marte em 1976, realizaram experimentos de detec\u00e7\u00e3o de vida baseados parcialmente em estudos de solos baixos pr\u00f3ximos \u00e0 costa da Ant\u00e1rtida \u2014 uma regi\u00e3o chamada Vales Secos. Alguns desses solos ficam \u00famidos com o gelo derretido durante o ver\u00e3o. Eles abrigam n\u00e3o apenas micr\u00f3bios mas, em alguns lugares, min\u00fasculos vermes e tamb\u00e9m outros animais.<\/p>\n\n\n\n

Os solos mais altos e secos dos montes Roberts Massif e Schroeder podem ser um campo de provas ainda melhor para instrumentos destinados a pesquisas em Marte.<\/p>\n\n\n\n

\u201cAs camadas superficiais de Marte s\u00e3o terr\u00edveis\u201d, afirma Christner. \u201cN\u00e3o temos um organismo na Terra que consiga sobreviver naquela superf\u00edcie\u201d \u2014 pelo menos n\u00e3o nos primeiros cinco cent\u00edmetros da superf\u00edcie. Qualquer sonda que v\u00e1 a Marte em busca de vida deve utilizar o local mais in\u00f3spito da Terra para se preparar.<\/p>\n\n\n\n

Fonte: National Geographic Brasil<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"