{"id":172497,"date":"2021-08-05T16:54:56","date_gmt":"2021-08-05T19:54:56","guid":{"rendered":"https:\/\/noticias.ambientebrasil.com.br\/?p=172497"},"modified":"2021-08-05T16:54:59","modified_gmt":"2021-08-05T19:54:59","slug":"cao-selvagem-pre-historico-encontrado-em-iconico-sitio-de-fosseis-humanos","status":"publish","type":"post","link":"http:\/\/localhost\/clipping\/2021\/08\/05\/172497-cao-selvagem-pre-historico-encontrado-em-iconico-sitio-de-fosseis-humanos.html","title":{"rendered":"C\u00e3o selvagem pr\u00e9-hist\u00f3rico encontrado em ic\u00f4nico s\u00edtio de f\u00f3sseis humanos"},"content":{"rendered":"\n
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Estes fragmentos de dentes e mand\u00edbula de 1,8 milh\u00e3o de anos, encontrados no s\u00edtio arqueol\u00f3gico de Dmanisi, na Ge\u00f3rgia, pertencem a um can\u00eddeo extinto conhecido como c\u00e3o-de-ca\u00e7a-eurasi\u00e1tico. O f\u00f3ssil \u00e9 o mais antigo do tipo j\u00e1 encontrado.
FOTO DE\u00a0IMAGE BY S. BARTOLINI-LUCENTI<\/strong><\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

A vila medieval georgiana de Dmanisi \u00e9 a meca da paleoantropologia. Ela cont\u00e9m os\u00a0registros mais antigos conhecidos de ancestrais humanos fora da \u00c1frica, desvendando como o homin\u00edneo\u00a0Homo erectus\u00a0<\/em>viveu na separa\u00e7\u00e3o entre a Europa e a \u00c1sia h\u00e1 cerca de 1,8 milh\u00e3o de anos.<\/p>\n\n\n\n

Os restos rec\u00e9m-escavados parecem indicar que os homin\u00edneos de Dmanisi encontraram no C\u00e1ucaso um viajante de quatro patas vindo do leste: um c\u00e3o selvagem enorme \u2014 e bastante soci\u00e1vel \u2014 com dentes ideais para fatiar carne.<\/p>\n\n\n\n

Os restos mortais pertencem \u00e0 esp\u00e9cie Canis (Xenocyon) lycaonoides, <\/em>ou c\u00e3o-de-ca\u00e7a-eurasi\u00e1tico, que provavelmente evoluiu pela primeira vez no Leste Asi\u00e1tico h\u00e1 cerca de 1,8 milh\u00e3o de anos e morreu por volta de 800 mil anos atr\u00e1s. Com base nos fragmentos \u00f3sseos encontrados em Dmanisi (alguns dentes e se\u00e7\u00f5es de uma mand\u00edbula), o c\u00e3o primitivo pesava cerca de 30 quilos quando morreu, provavelmente na idade adulta.<\/p>\n\n\n\n

Os autores do estudo afirmam que os restos de Dmanisi s\u00e3o os f\u00f3sseis<\/a> mais antigos j\u00e1 identificados da esp\u00e9cie\u00a0C. (Xenocyon) lycaonoides<\/em>. Alguns pesquisadores, incluindo os coautores do estudo, tamb\u00e9m argumentam que pode haver parentesco pr\u00f3ximo entre a esp\u00e9cie\u00a0C. (Xenocyon) lycaonoides<\/em>\u00a0e a esp\u00e9cie\u00a0Lycaon pictus<\/em>, o atual c\u00e3o-selvagem-africano. Se confirmada a hip\u00f3tese, o novo f\u00f3ssil \u00e9 o primeiro dessa linhagem espec\u00edfica encontrado em Dmanisi.<\/p>\n\n\n\n

Para deixar claro, a descoberta n\u00e3o sugere de forma alguma a coopera\u00e7\u00e3o entre humanos e c\u00e3es<\/a> em Dmanisi h\u00e1 quase dois milh\u00f5es de anos. As primeiras evid\u00eancias de qualquer tipo de domestica\u00e7\u00e3o canina\u00a0remontam a no m\u00e1ximo 40 mil anos atr\u00e1s. Em vez disso, a descoberta, descrita em 29 de julho de 2021\u00a0no peri\u00f3dico\u00a0Scientific Reports,<\/em>\u00a0deve adicionar detalhes importantes ao atual cen\u00e1rio complexo da evolu\u00e7\u00e3o canina.<\/p>\n\n\n\n

C\u00e3o com uma ampla \u00e1rea de distribui\u00e7\u00e3o<\/h3>\n\n\n\n

Restos mortais de\u00a0Canis (Xenocyon) lycaonoides\u00a0<\/em>j\u00e1 haviam sido encontrados na Sib\u00e9ria, Espanha e at\u00e9 na \u00c1frica do Sul. Considerando sua ampla distribui\u00e7\u00e3o geogr\u00e1fica, a aus\u00eancia do c\u00e3o-de-ca\u00e7a-eurasi\u00e1tico ou de seus parentes imediatos em Dmanisi era algo que incomodava os pesquisadores. Os sedimentos ricos em f\u00f3sseis do local j\u00e1 revelaram restos de dezenas de diferentes esp\u00e9cies de mam\u00edferos que viveram ao lado de nossos ancestrais humanos,\u00a0incluindo hienas, ursos, guepardos e felinos dentes-de-sabre, bem como alguns parentes distantes dos lobos e c\u00e3es da atualidade.<\/p>\n\n\n\n

\u201cFoi extremamente incomum \u2014muito estranho mesmo \u2014 n\u00e3o encontrar um\u00a0Lycaon\u00a0<\/em>em Dmanisi depois de mais de 30 anos de escava\u00e7\u00e3o\u201d, afirma\u00a0Bienvenido Mart\u00ednez Navarro, coautor do estudo e paleont\u00f3logo do Instituto Catal\u00e3o de Pesquisa e Estudos Avan\u00e7ados da Espanha. \u201cFinalmente foi encontrado! Tivemos sorte.\u201d<\/p>\n\n\n\n

At\u00e9 mesmo com as novas evid\u00eancias dispon\u00edveis, \u00e9 excepcionalmente dif\u00edcil determinar onde carn\u00edvoros semelhantes a c\u00e3es (can\u00eddeos) se encaixam na \u00e1rvore geneal\u00f3gica do grupo, afirma\u00a0Saverio Bartolini Lucenti, autor do estudo e paleont\u00f3logo da Universidade de Floren\u00e7a, na It\u00e1lia.<\/p>\n\n\n\n

Como grupo, a evolu\u00e7\u00e3o dos can\u00eddeos se revela bastante conservadora, apresentando menos altera\u00e7\u00f5es morfol\u00f3gicas do que fel\u00eddeos\u00a0como os felinos dentes-de-sabre. Para dificultar ainda mais, linhagens de can\u00eddeos com parentesco distante algumas vezes evolu\u00edram de forma a exibir caracter\u00edsticas f\u00edsicas semelhantes, tornando complexa a identifica\u00e7\u00e3o de parentesco apenas por meio de ossos e dentes.

Bartolini Lucenti e seus colegas ainda n\u00e3o sabem se o c\u00e3o de Dmanisi pertence ao g\u00eanero\u00a0Canis<\/em>, o dos atuais lobos e c\u00e3es domesticados, ou ao g\u00eanero separado\u00a0Xenocyon<\/em>. \u00c9 por isso que a equipe optou pela denomina\u00e7\u00e3o de\u00a0Canis (Xenocyon)<\/em>, deixando margem para a possibilidade de que o c\u00e3o pudesse pertencer a qualquer um dos g\u00eaneros.

A designa\u00e7\u00e3o neutra pode parecer engra\u00e7ada, mas \u00e9 preciso ter cautela. No in\u00edcio deste ano, pesquisadores descobriram que o extinto lobo-pr\u00e9-hist\u00f3rico \u2014 h\u00e1 muito considerado uma esp\u00e9cie irm\u00e3 dos lobos modernos \u2014 nem sequer pertencia ao g\u00eanero\u00a0Canis.<\/em><\/p>\n\n\n\n

A equipe pode determinar razoavelmente a dieta alimentar do c\u00e3o. Os pesquisadores compararam as medidas dos dentes antigos com as de outros can\u00eddeos para testar a quantidade de carne provavelmente consumida pelo c\u00e3o. As propor\u00e7\u00f5es de seus dentes corresponderam \u00e0s dos \u201chipercarn\u00edvoros\u201d, que englobam can\u00eddeos vivos e extintos, incluindo o c\u00e3o-selvagem-africano dos dias atuais, cuja dieta alimentar era formada por no m\u00ednimo 70% de carne.<\/p>\n\n\n\n

Animais sociais<\/h3>\n\n\n\n

O estudo tamb\u00e9m destaca paralelos intrigantes entre o C. (Xenocyon) lycaonoides<\/em> e o H. erectus<\/em>. Ambos conseguiram se distribuir por v\u00e1rios continentes: o H. erectus<\/em> evoluiu na \u00c1frica e seguiu para o leste nas ilhas do Sudeste Asi\u00e1tico ao passo que o c\u00e3o-de-ca\u00e7a-eurasi\u00e1tico provavelmente evoluiu na \u00c1sia e se deslocou para o oeste, na Europa e na \u00c1frica.<\/p>\n\n\n\n

Ambos eram mam\u00edferos bastante sociais (at\u00e9 mesmo altru\u00edstas), argumentam os pesquisadores. Mas como determinar o comportamento de um c\u00e3o a partir de ossos f\u00f3sseis de mais de um milh\u00e3o de anos? Um importante indicativo de altru\u00edsmo \u00e9 a presen\u00e7a de patologias n\u00edtidas no cr\u00e2nio \u2014 como a falta de dentes e mand\u00edbulas deformadas \u2014 que quase impossibilitariam que um animal se alimentasse sozinho. Se aquele animal<\/a> claramente viveu muito ap\u00f3s o surgimento de suas patologias, raciocinam os cientistas, deve ter recebido ajuda de outros para obter alimento.<\/p>\n\n\n\n

Um s\u00edtio arqueol\u00f3gico na Espanha preserva esse tipo de evid\u00eancias de\u00a0C. (Xenocyon) lycaonoides,\u00a0<\/em>na forma de\u00a0um cr\u00e2nio assim\u00e9trico com v\u00e1rias afec\u00e7\u00f5es dent\u00e1rias, incluindo um dente canino ausente. O c\u00e3o parece ter vivido por sete ou oito anos, sugerindo que foi ajudado na obten\u00e7\u00e3o de alimentos por outros ca\u00e7adores da matilha (o pr\u00f3prio s\u00edtio de Dmanisi possui evid\u00eancias semelhantes de partilha de alimentos entre\u00a0H. erectus<\/em>: o cr\u00e2nio de um homin\u00edneo idoso indica que o indiv\u00edduo morreu anos\u00a0ap\u00f3s perder todos os dentes, exceto um).<\/p>\n\n\n\n

A ci\u00eancia tamb\u00e9m demonstra que, quando a massa corporal m\u00e9dia de uma esp\u00e9cie de can\u00eddeo ultrapassa cerca de 20 quilos, a matem\u00e1tica cal\u00f3rica exige o abate de presas ainda maiores, uma tarefa que favorece a ca\u00e7a cooperativa em matilha. As medidas do cr\u00e2nio e dos dentes em Dmanisi e em outros locais sugerem que o C. (Xenocyon) lycaonoides <\/em>estava bem acima do limite de ca\u00e7a em matilha.<\/p>\n\n\n\n

No entanto n\u00e3o h\u00e1 nenhuma evid\u00eancia direta de que os c\u00e3es-de-ca\u00e7a-eurasi\u00e1ticos fossem sociais em Dmanisi. \u201cNos carn\u00edvoros modernos, a sociabilidade pode variar at\u00e9 mesmo dentro de uma mesma esp\u00e9cie\u201d, afirma\u00a0Mairin Balisi, paleont\u00f3loga, pesquisadora de p\u00f3s-doutorado do Museu e Po\u00e7o de Piche La Brea, na Calif\u00f3rnia, que n\u00e3o participou do estudo. \u201cTenho certeza de que tamb\u00e9m poderia haver varia\u00e7\u00e3o nos registros f\u00f3sseis, mas \u00e9 dif\u00edcil identific\u00e1-la.\u201d<\/p>\n\n\n\n

F\u00f3sseis que ainda ser\u00e3o descobertos em Dmanisi devem ajudar a confirmar a sociabilidade do c\u00e3o no local \u2014 e novos tipos de evid\u00eancias moleculares podem confirmar a localiza\u00e7\u00e3o do c\u00e3o-de-ca\u00e7a-eurasi\u00e1tico na \u00e1rvore geneal\u00f3gica dos can\u00eddeos. Em 2019, os pesquisadores conseguiram extrair e sequenciar prote\u00ednas\u00a0de um dente de rinoceronte encontrado em Dmanisi. Bartolini Lucenti conta que sua equipe tamb\u00e9m tentou extrair prote\u00ednas antigas dos restos mortais do c\u00e3o rec\u00e9m-descoberto, mas n\u00e3o tiveram \u00eaxito.<\/p>\n\n\n\n

Balisi, por exemplo, est\u00e1 animada para saber o que o futuro reserva e para poder desvendar a complexa hist\u00f3ria evolutiva dos c\u00e3es. \u201cQuanto mais pe\u00e7as do quebra-cabe\u00e7a forem encontradas, melhor\u201d, afirma ela.<\/p>\n\n\n\n

Fonte: National Geographic Brasil<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

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