{"id":173075,"date":"2021-08-25T15:20:25","date_gmt":"2021-08-25T18:20:25","guid":{"rendered":"https:\/\/noticias.ambientebrasil.com.br\/?p=173075"},"modified":"2021-08-25T15:20:28","modified_gmt":"2021-08-25T18:20:28","slug":"como-devastacao-e-aquecimento-podem-fazer-brasil-deixar-de-ser-potencia-agricola-global","status":"publish","type":"post","link":"http:\/\/localhost\/clipping\/2021\/08\/25\/173075-como-devastacao-e-aquecimento-podem-fazer-brasil-deixar-de-ser-potencia-agricola-global.html","title":{"rendered":"Como devasta\u00e7\u00e3o e aquecimento podem fazer Brasil deixar de ser pot\u00eancia agr\u00edcola global"},"content":{"rendered":"\n
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Fuma\u00e7a em Bras\u00edlia, em meio \u00e0 baixa umidade, em foto de junho; maior parte do Brasil poder\u00e1 ter secas mais longas e chuvas mais curtas – REUTERS<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

O Brasil viver\u00e1, nas pr\u00f3ximas d\u00e9cadas, secas cada vez mais prolongadas, temperaturas mais altas e extremos clim\u00e1ticos que ter\u00e3o um profundo impacto na forma como sobrevivemos e produzimos energia e comida.<\/strong><\/p>\n\n\n\n

Na pr\u00e1tica, o clima vai mudar tanto a vida nas cidades grandes quanto a produ\u00e7\u00e3o agr\u00edcola – causando o risco de o Brasil perder o status de gigante global na produ\u00e7\u00e3o de alimentos.<\/p>\n\n\n\n

E a responsabilidade disso recai sobre o avan\u00e7o do desmatamento, aliado \u00e0s (e potencializado pelas) mudan\u00e7as clim\u00e1ticas no mundo inteiro.<\/p>\n\n\n\n

A avalia\u00e7\u00e3o \u00e9 do cientista do clima Carlos Nobre, que j\u00e1 foi pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), coordena o Instituto Nacional de Tecnologia para Mudan\u00e7as Clim\u00e1ticas e \u00e9 um dos principais especialistas do tema no Brasil.<\/p>\n\n\n\n

Nobre conversou com a BBC News Brasil para comentar os dados rec\u00e9m-divulgados pela organiza\u00e7\u00e3o MapBiomas, que mostram que a superf\u00edcie de \u00e1rea com \u00e1gua no Brasil ficou 15% menor desde o in\u00edcio dos anos 1990 – esses 3,1 milh\u00f5es de hectares perdidos equivalem a uma vez e meia \u00e0 superf\u00edcie de \u00e1gua de todo o Nordeste.<\/p>\n\n\n\n

A maior perda (absoluta e proporcional) de superf\u00edcie de \u00e1gua na s\u00e9rie hist\u00f3rica analisada pelo MapBiomas ocorreu no Mato Grosso do Sul, com uma redu\u00e7\u00e3o de 57%.<\/p>\n\n\n\n

Enquanto isso, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais identificou que os focos de inc\u00eandio neste ano at\u00e9 agora cresceram, em rela\u00e7\u00e3o ao mesmo per\u00edodo no ano passado, na Mata Atl\u00e2ntica, no Cerrado e na Caatinga – neste \u00faltimo, o aumento foi mais de 100%.<\/p>\n\n\n\n

Na Amaz\u00f4nia, o Instituto Imazon aponta que o acumulado do desmatamento na floresta nos \u00faltimos 12 meses at\u00e9 julho atingiu a pior marca dos \u00faltimos dez anos.<\/p>\n\n\n\n

Todos esses dados est\u00e3o interligados: quanto mais avan\u00e7a o desmatamento – em conjunto com o aumento das temperaturas globais -, menores ficam as temporadas de chuva no Brasil.<\/p>\n\n\n\n

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Inc\u00eandio no Cerrado, em foto de 2020; focos de inc\u00eandio t\u00eam aumentado neste ano – REUTERS<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

“H\u00e1 estudos que mostram claramente que as chuvas est\u00e3o diminuindo em \u00e1reas altamente desmatadas, e as esta\u00e7\u00f5es secas est\u00e3o mais longas”, explica Nobre.<\/p>\n\n\n\n

“No sul da Amaz\u00f4nia, as secas j\u00e1 est\u00e3o de tr\u00eas a quatro semanas mais longas, com menos chuvas e temperaturas cerca de 3\u00b0C mais altas.”<\/p>\n\n\n\n

O grande problema \u00e9 que, em \u00e1reas desmatadas, perde-se a capacidade de reciclar \u00e1gua, o que intensifica as secas. “H\u00e1 menos vegeta\u00e7\u00e3o e ra\u00edzes para absorver a \u00e1gua, transpir\u00e1-la e jog\u00e1-la de volta \u00e0 atmosfera”, diz o cientista.<\/p>\n\n\n\n

Portanto, quanto mais inc\u00eandios e florestas derrubadas, mais seco e quente o clima ficar\u00e1 no curto e no longo prazo.<\/p>\n\n\n\n

Embora ainda n\u00e3o seja poss\u00edvel saber se esses efeitos ser\u00e3o permanentes, a secura do clima vivida neste momento em grande parte do Brasil – parte de uma tend\u00eancia j\u00e1 observada nos \u00faltimos anos – \u00e9 uma esp\u00e9cie de “fotografia do que ser\u00e1 o clima do Brasil no futuro”, observa Nobre.<\/p>\n\n\n\n

No “melhor dos cen\u00e1rios”, diz ele, a redu\u00e7\u00e3o das chuvas ser\u00e1 de 10%.<\/p>\n\n\n\n

“Mesmo que consigamos manter o m\u00e1ximo de aumento da temperatura (global) em 1,5\u00b0C, que \u00e9 o plano mais ambicioso da Conven\u00e7\u00e3o das Mudan\u00e7as Clim\u00e1ticas (o chamado Acordo de Paris), devemos estar preparados para uma esta\u00e7\u00e3o de chuvas mais curta e uma esta\u00e7\u00e3o de secas mais longa na maior parte do Brasil.”<\/p>\n\n\n\n

Os impactos disso foram observados pelo coordenador do MapBiomas \u00e1gua, Carlos Souza Jr.<\/p>\n\n\n\n

“As evid\u00eancias vindas do campo j\u00e1 indicam que as pessoas j\u00e1 come\u00e7aram a sentir o impacto negativo com o aumento de queimadas, impacto na produ\u00e7\u00e3o de alimentos, e na produ\u00e7\u00e3o de energia, e at\u00e9 mesmo com o racionamento de \u00e1gua em grandes centros urbanos”, afirmou Souza no comunicado emitido pela organiza\u00e7\u00e3o.<\/p>\n\n\n\n

Semi-deserto no Nordeste e savana na Amaz\u00f4nia<\/h2>\n\n\n\n

As regi\u00f5es do Brasil a serem mais afetadas pelas secas prolongadas ser\u00e3o o Norte, o Centro-Oeste e o Nordeste, segundo Nobre.<\/p>\n\n\n\n

No Nordeste, caso a temperatura global continue aumentando, o perigo \u00e9 “mais de 50% da regi\u00e3o virar um semi-deserto”, em vez do semi\u00e1rido atual, explica o cientista.<\/p>\n\n\n\n

O\u00a0alerta j\u00e1 havia sido dado, no in\u00edcio de agosto, pelo relat\u00f3rio mais recente do Painel Intergovernamental sobre Mudan\u00e7as Clim\u00e1ticas\u00a0(IPCC na sigla em ingl\u00eas):<\/p>\n\n\n\n

“O Nordeste brasileiro \u00e9 a \u00e1rea seca mais densamente povoada do mundo e \u00e9 recorrentemente afetado por extremos clim\u00e1ticos”, destacou o texto.<\/p>\n\n\n\n

O impacto ser\u00e1 direto na vida de ao menos 10 milh\u00f5es de pessoas que vivem atualmente na agricultura e pecu\u00e1ria nordestinas. Isso porque um Nordeste semi-des\u00e9rtico “n\u00e3o ter\u00e1 agricultura como se pratica hoje. Poderia haver s\u00f3 um pouco de agricultura \u00e0 beira do rio S\u00e3o Francisco, mas mesmo a vaz\u00e3o do S\u00e3o Francisco vai diminuir, afetando tamb\u00e9m o potencial de gera\u00e7\u00e3o de energia el\u00e9trica”, diz Nobre.<\/p>\n\n\n\n

\u00c9 um exemplo da crise h\u00eddrica vivida em todo o Brasil e que j\u00e1 impacta a produ\u00e7\u00e3o de energia pelas hidrel\u00e9tricas do pa\u00eds, leva a aumento nos custos das contas de luz pagas pelos consumidores e for\u00e7a o uso de usinas termel\u00e9tricas – que, por sua vez, s\u00e3o mais poluentes e contribuem para mais emiss\u00e3o de gases do efeito estufa.<\/p>\n\n\n\n

Enquanto isso, na Amaz\u00f4nia, o perigo identificado por pesquisadores como Carlos Nobre \u00e9 com o iminente risco de a regi\u00e3o virar uma savana – perdendo, portanto, as caracter\u00edsticas \u00fanicas de uma floresta tropical.<\/p>\n\n\n\n

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Seca em regi\u00e3o amaz\u00f4nica, em foto de 2010; estudos apontam que regi\u00e3o est\u00e1 sob risco de savaniza\u00e7\u00e3o – REUTERS<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

“V\u00e1rios estudos mostram que se continuarmos a desmatar, vamos passar do que chamamos de ponto de n\u00e3o retorno – um ponto irrevers\u00edvel de savaniza\u00e7\u00e3o”, diz Nobre. Esp\u00e9cies animais e vegetais \u00fanicas do Brasil ser\u00e3o perdidas no processo. “Antes, v\u00edamos uma mega-seca a cada 20 anos na Amaz\u00f4nia; agora s\u00e3o duas secas por d\u00e9cada.”<\/p>\n\n\n\n

Em julho, um estudo publicado na revista Nature, que teve participa\u00e7\u00e3o do Inpe, apontou que, por conta do desmatamento e das queimadas, a Amaz\u00f4nia j\u00e1 est\u00e1 emitindo mais CO2 do que consegue absorver.<\/p>\n\n\n\n

“Precisamos zerar o desmatamento a jato (rapidamente), em poucos anos, no que talvez seja o maior desafio que o Brasil pode enfrentar”, opina Nobre.<\/p>\n\n\n\n

Sa\u00fade humana e agricultura<\/h2>\n\n\n\n

Se sentimos (literalmente) no corpo os efeitos do clima mais seco na sa\u00fade, a produ\u00e7\u00e3o agr\u00edcola tamb\u00e9m vai viver os impactos da escassez de \u00e1gua, explica Nobre.<\/p>\n\n\n\n

“(Produ\u00e7\u00e3o de) gr\u00e3os, pecu\u00e1ria – toda essa estrutura que s\u00e3o importantes elementos econ\u00f4micos (do Brasil) j\u00e1 est\u00e1 sendo prejudicada pelo aumento dos extremos clim\u00e1ticos”, afirma.<\/p>\n\n\n\n

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Colheita de soja, em foto de arquivo; segundo Carlos Nobre, for\u00e7a agr\u00edcola brasileira \u00e9 amea\u00e7ada pelas mudan\u00e7as clim\u00e1ticas e pelo desmatamento – REUTERS<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

“Por mais que empresas de pesquisas, universidades e Embrapa (ag\u00eancia de pesquisas agr\u00edcolas) tentem desenvolver variedades de gr\u00e3os mais adaptadas a secas prolongadas e a temperaturas mais elevadas, o clima est\u00e1 ganhando a guerra. A agricultura tem que se preparar para isso”, prossegue.<\/p>\n\n\n\n

“E temos que torcer para (o aumento global da) temperatura n\u00e3o passar de 1,5\u00b0C, porque se n\u00f3s continuarmos com este ritmo de emiss\u00f5es e n\u00e3o tivermos sucesso em zer\u00e1-las at\u00e9 2050, na segunda metade do s\u00e9culo, o Brasil tropical deixar\u00e1 de ser uma pot\u00eancia agr\u00edcola – ficar\u00e1 muito quente e seco e inapropriado para esse tipo de agricultura”, prossegue.<\/p>\n\n\n\n

Ele cita como exemplo a queda na produtividade da soja na regi\u00e3o conhecida como Matopiba (que re\u00fane Maranh\u00e3o, Tocantins, Piau\u00ed e Bahia) em decorr\u00eancia do ar mais quente que tem sido soprado da Amaz\u00f4nia.<\/p>\n\n\n\n

Boletim de julho da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) apontou efeitos mistos da crise h\u00eddrica no m\u00eas passado: de um lado, prejudicou a irriga\u00e7\u00e3o de lavouras; de outro, ajudou na matura\u00e7\u00e3o das safras de milho e algod\u00e3o.<\/p>\n\n\n\n

Eventos clim\u00e1ticos extremos<\/h2>\n\n\n\n

E se no centro e no norte do Brasil as chuvas ficar\u00e3o mais escassas, a tend\u00eancia \u00e9 de que o mesmo n\u00e3o se repita em parte do Sudeste e Sul do pa\u00eds – que podem, na verdade, ver sua quantidade de chuvas aumentar nas pr\u00f3ximas d\u00e9cadas, diz o pesquisador.<\/p>\n\n\n\n

Com isso, essas regi\u00f5es (onde o clima \u00e9, por si s\u00f3, mais ameno que no restante do pa\u00eds, por sua localiza\u00e7\u00e3o geogr\u00e1fica) podem acabar ganhando for\u00e7a na produ\u00e7\u00e3o agr\u00edcola nacional.<\/p>\n\n\n\n

O que n\u00e3o significa, por\u00e9m, que n\u00e3o sofrer\u00e3o com os devastadores efeitos dos chamados eventos clim\u00e1ticos extremos, como chuvas torrenciais, secas prolongadas e ondas de calor.<\/p>\n\n\n\n

Esses eventos clim\u00e1ticos\u00a0t\u00eam se tornado mais frequentes em todo o mundo s\u00e3o tamb\u00e9m consequ\u00eancia direta do aquecimento global, como apontou o relat\u00f3rio do IPCC divulgado no in\u00edcio de agosto.<\/p>\n\n\n\n

“Com o aumento gradual do n\u00edvel do mar, os eventos extremos que ocorreram no passado apenas uma vez por s\u00e9culo ocorrer\u00e3o com mais frequ\u00eancia no futuro”, disse, na ocasi\u00e3o do lan\u00e7amento do relat\u00f3rio, Val\u00e9rie Masson-Delmotte, copresidente do grupo de trabalho do IPCC que produziu o texto.<\/p>\n\n\n\n

No Brasil, segundo Carlos Nobre, mesmo que – hipoteticamente – n\u00e3o houvesse um aquecimento global em curso no mundo, os sucessivos recordes de desmatamento na Amaz\u00f4nia e no Pantanal j\u00e1 estariam tendo impactos nocivos sobre o clima brasileiro.<\/p>\n\n\n\n

Na pr\u00e1tica, os dois fen\u00f4menos – desmatamento e aumento das temperaturas – t\u00eam ocorrido juntos, potencializando um ao outro.<\/p>\n\n\n\n

“Mesmo no ano passado, quando a maioria dos pa\u00edses reduziu suas emiss\u00f5es (de gases do efeito estufa) por conta da pandemia, o Brasil aumentou suas emiss\u00f5es por culpa do desmatamento”, diz Nobre.<\/p>\n\n\n\n

Embora ele destaque que, nos \u00faltimos anos, o Brasil avan\u00e7ou em construir uma matriz energ\u00e9tica mais limpa – cerca de 11% da nossa energia vem de fontes e\u00f3licas ou solares, diz ele -, o Brasil, at\u00e9 o momento, “est\u00e1 na contram\u00e3o dos compromissos assumidos” de participar do esfor\u00e7o contra o aquecimento global.<\/p>\n\n\n\n

Fonte: BBC<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

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