{"id":174470,"date":"2021-10-28T12:09:31","date_gmt":"2021-10-28T15:09:31","guid":{"rendered":"https:\/\/noticias.ambientebrasil.com.br\/?p=174470"},"modified":"2021-10-28T12:09:34","modified_gmt":"2021-10-28T15:09:34","slug":"os-desafios-e-as-oportunidades-do-brasil-na-decada-da-ciencia-oceanica","status":"publish","type":"post","link":"http:\/\/localhost\/clipping\/2021\/10\/28\/174470-os-desafios-e-as-oportunidades-do-brasil-na-decada-da-ciencia-oceanica.html","title":{"rendered":"Os desafios e as oportunidades do Brasil na D\u00e9cada da Ci\u00eancia Oce\u00e2nica"},"content":{"rendered":"\n
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Saiba quais s\u00e3o os desafios e as oportunidades do Brasil na D\u00e9cada da Ci\u00eancia Oce\u00e2nica (Foto: Gettyimages)<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

H\u00e1 2,5 bilh\u00f5es de anos, processos de\u00a0fotoss\u00edntese\u00a0inauguraram o chamado Grande Evento de Oxigena\u00e7\u00e3o. Alguns milh\u00f5es de anos depois, isso levou ao surgimento de micr\u00f3bios unicelulares, as primeiras formas de\u00a0vida. Passado mais algum tempo, h\u00e1 cerca de 1,2 bilh\u00e3o de anos,\u00a0organismos\u00a0multicelulares e complexos come\u00e7aram a se desenvolver. E aqui estamos n\u00f3s.<\/p>\n\n\n\n

Foi no\u00a0oceano\u00a0onde tudo isso aconteceu. Mas n\u00e3o \u00e9 porque humanos e outras esp\u00e9cies conquistaram terra e ar que esses imensos corpos d\u2019\u00e1gua deixaram de ser essenciais \u00e0 nossa sobreviv\u00eancia e de outros seres vivos \u2014 ao contr\u00e1rio. \u00c9 das \u00e1guas marinhas que vem mais da metade do\u00a0oxig\u00eanio\u00a0que respiramos, tarefa que fica a cargo das algas. Ocupando mais de 70% do planeta, o oceano \u00e9 capaz de absorver um ter\u00e7o do\u00a0di\u00f3xido de carbono\u00a0(CO2) emitido pela queima de combust\u00edveis f\u00f3sseis e, assim, atuar como sumidouro de um dos principais gases que contribuem para o aumento da temperatura global. Al\u00e9m disso, ele regula o\u00a0clima\u00a0por meio das correntes mar\u00edtimas, que levam o excesso de calor dos tr\u00f3picos para as regi\u00f5es polares. \u00c9 tamb\u00e9m das \u00e1guas salgadas que prov\u00eam US$ 1,5 trilh\u00e3o da economia global, segundo a\u00a0Organiza\u00e7\u00e3o para a Coopera\u00e7\u00e3o e Desenvolvimento Econ\u00f4mico\u00a0(OCDE). Todos esses benef\u00edcios, por\u00e9m, t\u00eam um pre\u00e7o.<\/p>\n\n\n\n

Os mares da\u00a0Terra\u00a0v\u00eam pedindo socorro h\u00e1 muito tempo. \u201cO oceano est\u00e1 vivendo os momentos mais cr\u00edticos desde que a nossa rela\u00e7\u00e3o de demanda e consumo ultrapassou a capacidade dele se renovar, de suprir as nossas necessidades e continuar com condi\u00e7\u00f5es adequadas para manter a pr\u00f3pria din\u00e2mica\u201d, constata a\u00a0bi\u00f3loga\u00a0Camila Domit, coordenadora do Laborat\u00f3rio de Ecologia e Conserva\u00e7\u00e3o do Centro de Estudos do Mar, da Universidade Federal do Paran\u00e1 (UFPR). O processo de\u00a0degrada\u00e7\u00e3o\u00a0do ambiente marinho se fortaleceu mundialmente com a Revolu\u00e7\u00e3o Industrial, no s\u00e9culo 18, e vem se agravando junto ao crescimento desenfreado das popula\u00e7\u00f5es humanas e o uso insustent\u00e1vel dos recursos naturais. A\u00a0Segunda Avalia\u00e7\u00e3o Global do Oceano, publicada pela Organiza\u00e7\u00e3o das Na\u00e7\u00f5es Unidas (ONU) em 2021, revela que as \u00e1guas marinhas est\u00e3o perdendo oxig\u00eanio \u00e0 medida que ficam mais \u00e1cidas, polu\u00eddas e quentes. Para ter ideia, elas armazenam mais de 90% do calor do\u00a0aquecimento global, de acordo com o documento.<\/p>\n\n\n\n

N\u00e3o bastasse a explora\u00e7\u00e3o incontrolada, a\u00a0ci\u00eancia\u00a0ainda sabe muito pouco sobre as profundezas desse\u00a0bioma\u00a0\u2014 e trabalha com recursos escassos: os pa\u00edses investem, em m\u00e9dia, somente 1,7% de seus or\u00e7amentos de pesquisa no ramo do conhecimento oce\u00e2nico, segundo o\u00a0Relat\u00f3rio Mundial sobre a Ci\u00eancia Oce\u00e2nica 2020\u00a0da Organiza\u00e7\u00e3o das Na\u00e7\u00f5es Unidas para a Educa\u00e7\u00e3o, a Ci\u00eancia e a Cultura (Unesco). E, se nada for feito para proteger o ambiente marinho, provavelmente n\u00e3o dar\u00e1 tempo de conhecer muita coisa.<\/p>\n\n\n\n

Foi essa a motiva\u00e7\u00e3o da\u00a0ONU\u00a0para declarar o per\u00edodo entre 2021 e 2030 como a D\u00e9cada da Ci\u00eancia Oce\u00e2nica para o Desenvolvimento Sustent\u00e1vel. Com o mote \u201ca ci\u00eancia que precisamos para o oceano que queremos\u201d, a a\u00e7\u00e3o tem o objetivo de impulsionar\u00a0pesquisas\u00a0acad\u00eamicas e apoiar a elabora\u00e7\u00e3o de inova\u00e7\u00f5es tecnol\u00f3gicas para proteger os mares da Terra. A iniciativa busca engajar\u00a0cientistas, governos, acad\u00eamicos, formuladores de pol\u00edticas, empresas, ind\u00fastria e sociedade civil na empreitada coordenada pela Comiss\u00e3o Oceanogr\u00e1fica Intergovernamental da Unesco. A D\u00e9cada da Ci\u00eancia Oce\u00e2nica prop\u00f5e ainda que, com a coopera\u00e7\u00e3o entre\u00a0pa\u00edses, seja poss\u00edvel ter \u00e1guas marinhas limpas, saud\u00e1veis, resilientes, produtivas e valorizadas por todos. E, assim como em todo o mundo, o Brasil tem muito trabalho a ser feito para que as metas sejam alcan\u00e7adas.<\/p>\n\n\n\n

Desafios da costa brasileira<\/strong><\/p>\n\n\n\n

O que acontece em terra firme n\u00e3o fica em terra firme: estima-se que 80% da polui\u00e7\u00e3o marinha tenha origem em \u00e1reas terrestres, e boa parte disso s\u00e3o materiais pl\u00e1sticos. No\u00a0Brasil, aproximadamente 325 mil toneladas de\u00a0lixo\u00a0lan\u00e7adas ao mar todos os anos s\u00e3o constitu\u00eddas por sacolas, garrafas, embalagens e recipientes descart\u00e1veis, como mostra um\u00a0relat\u00f3rio\u00a0da ONG Oceana divulgado em 2020. Esses dejetos v\u00e3o para o mar e, n\u00e3o raro, acabam no est\u00f4mago de esp\u00e9cies que habitam ecossistemas aqu\u00e1ticos.<\/p>\n\n\n\n

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Saiba quais s\u00e3o os desafios e as oportunidades do Brasil na D\u00e9cada da Ci\u00eancia Oce\u00e2nica (Foto: Gettyimages)<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

Mas os\u00a0pl\u00e1sticos\u00a0est\u00e3o longe de ser os \u00fanicos vil\u00f5es da vida marinha. \u00c9 preciso pensar tamb\u00e9m em tipos de\u00a0polui\u00e7\u00e3o\u00a0que n\u00e3o s\u00e3o vis\u00edveis, como a ac\u00fastica (gerada por obras de dragagem, derrocagem e tr\u00e1fego de navios, por exemplo) e a qu\u00edmica. Essa \u00faltima, inclusive, torna-se mais prejudicial \u00e0 sa\u00fade oce\u00e2nica em um pa\u00eds onde somente 49% do esgoto \u00e9 tratado, segundo o Sistema Nacional de Informa\u00e7\u00f5es sobre Saneamento. \u201cMesmo com tratamento, n\u00e3o \u00e9 poss\u00edvel filtrar qu\u00edmicos e micropl\u00e1sticos\u201d, pontua Camila Domit. Isso significa que res\u00edduos microsc\u00f3picos de f\u00e1rmacos, alimentos cultivados com\u00a0agrot\u00f3xicos\u00a0e roupas, por exemplo, conseguem chegar \u00e0s zonas costeiras e marinhas. \u201cEsses elementos s\u00e3o biodisponibilizados, entram na cadeia tr\u00f3fica\u00a0[alimentar]<\/em>\u00a0e n\u00f3s os ingerimos novamente\u201d, detalha a pesquisadora da UFPR. O cen\u00e1rio se agrava diante da falta de solu\u00e7\u00f5es: n\u00e3o se sabe como remover os poluentes desses\u00a0ecossistemas\u00a0e nem quanto tempo seria necess\u00e1rio para isso.<\/p>\n\n\n\n

A esses obst\u00e1culos soma-se a\u00a0pesca\u00a0predat\u00f3ria. \u201cHoje, n\u00e3o h\u00e1 controle sobre quais s\u00e3o os recursos sendo retirados e em que quantidade isso est\u00e1 ocorrendo\u201d, acrescenta Domit. No Brasil, somente 6% dos estoques pescados s\u00e3o conhecidos, ou seja, n\u00e3o se tem informa\u00e7\u00f5es sobre a situa\u00e7\u00e3o populacional de quase nenhuma das esp\u00e9cies capturadas comercialmente, segundo a\u00a0Auditoria da Pesca 2020\u00a0realizada pela Oceana. Entre os poucos estoques conhecidos, em 43% dos casos h\u00e1 registro de sobrepesca, quando o volume capturado est\u00e1 acima da capacidade de reposi\u00e7\u00e3o natural das\u00a0esp\u00e9cies.<\/p>\n\n\n\n

Todos esses fatores levam a outro ponto para o qual a comunidade cient\u00edfica est\u00e1 atenta, mas boa parte da sociedade ainda n\u00e3o \u2014 as\u00a0doen\u00e7as\u00a0emergentes. Veja: quando voc\u00ea passa muito tempo sob uma condi\u00e7\u00e3o estressante, logo sua\u00a0sa\u00fade\u00a0fica debilitada de alguma forma, certo? Com a fauna marinha n\u00e3o \u00e9 diferente. \u201cA degrada\u00e7\u00e3o do oceano altera o sistema imunol\u00f3gico e a capacidade de defesa dos animais\u201d, afirma Domit. Como consequ\u00eancia das altera\u00e7\u00f5es causadas pelas\u00a0mudan\u00e7as clim\u00e1ticas, muitos v\u00edrus, bact\u00e9rias e novas doen\u00e7as est\u00e3o surgindo nos ecossistemas. Sinais de alerta j\u00e1 come\u00e7aram a surgir em \u00e1guas brasileiras. Entre o fim de 2017 e o in\u00edcio de 2018, mais de 200 botos-cinza foram encontrados mortos na Ba\u00eda de Sepetiba, no\u00a0Rio de Janeiro. Os \u00f3bitos s\u00e3o atribu\u00eddos ao efeito do morbiliv\u00edrus nos sistemas respirat\u00f3rio e nervoso dos golfinhos e tamb\u00e9m \u00e0 queda da imunidade dos mam\u00edferos, que pode ser resultado do excesso de estresse ecossist\u00eamico. Segundo Camila Domit, esse \u00e9 um\u00a0v\u00edrus\u00a0j\u00e1 circulante, mas que precisa de um fator que gere instabilidade em toda a popula\u00e7\u00e3o para causar um dano em massa.<\/p>\n\n\n\n

Novos tempos, mesmas regras<\/strong><\/p>\n\n\n\n

Para enfrentar todos esses\u00a0desafios\u00a0que, aos poucos, a ci\u00eancia vai conhecendo mais a fundo, o ideal seria que o Brasil dispusesse de um conjunto de normas legislativas e marcos regulat\u00f3rios que garantissem a viabilidade da manuten\u00e7\u00e3o e de medidas protetivas \u00e0s nossas \u00e1guas marinhas. Mas essa n\u00e3o \u00e9 a realidade do pa\u00eds. \u201cNosso arcabou\u00e7o pol\u00edtico normativo para\u00a0preserva\u00e7\u00e3o\u00a0e gest\u00e3o da zona costeira \u00e9 relativamente antigo\u201d, constata a bi\u00f3loga Leandra Gon\u00e7alves, pesquisadora de p\u00f3s-doutorado no Instituto Oceanogr\u00e1fico da Universidade de S\u00e3o Paulo (IOUSP) e cofundadora da Liga das\u00a0Mulheres\u00a0pelos Oceanos.<\/p>\n\n\n\n

A atual situa\u00e7\u00e3o do\u00a0mar\u00a0brasileiro n\u00e3o \u00e9 igual \u00e0 de 30 anos atr\u00e1s, quando foi promulgada a Constitui\u00e7\u00e3o de 1988 e o bioma litor\u00e2neo passou a ser considerado patrim\u00f4nio nacional. \u201cNa \u00e9poca, a gente n\u00e3o tinha grande parte do\u00a0petr\u00f3leo\u00a0sendo explorado em \u00e1reas offshore\u00a0[em alto-mar]<\/em>, n\u00e3o havia tantos brasileiros vivendo na zona costeira e n\u00e3o existia a\u00a0tecnologia\u00a0que hoje possibilita que a ind\u00fastria pesqueira permane\u00e7a tantos dias no mar realizando capturas\u201d, justifica Gon\u00e7alves. Frente \u00e0 intensifica\u00e7\u00e3o e ao avan\u00e7o de diversas atividades, passou da hora de os instrumentos de gest\u00e3o do oceano no Brasil serem aperfei\u00e7oados.<\/p>\n\n\n\n

Na vis\u00e3o da pesquisadora do IOUSP, o primeiro passo \u00e9 reconhecer a fragmenta\u00e7\u00e3o excessiva nas\u00a0legisla\u00e7\u00f5es\u00a0brasileiras voltadas para os ecossistemas marinhos. Um dos principais mecanismos nesse \u00e2mbito \u00e9 a Lei de Gerenciamento Costeiro (7.661\/1988), que falha ao focar somente na\u00a0zona costeira\u00a0e n\u00e3o contemplar a grande integra\u00e7\u00e3o existente com a regi\u00e3o marinha. A conex\u00e3o se d\u00e1 por processos naturais que conferem dinamicidade ao oceano, como as\u00a0correntes mar\u00edtimas\u00a0e a migra\u00e7\u00e3o de esp\u00e9cies, mas tamb\u00e9m a partir de atividades humanas, a exemplo do tr\u00e1fego de embarca\u00e7\u00f5es.<\/p>\n\n\n\n

Sem alinhamento e di\u00e1logo entre normas que dizem respeito ao mar, as a\u00e7\u00f5es se desencontram. \u201cLeis\u00a0andando em paralelo podem fazer, por exemplo, com que o plano de expans\u00e3o de \u00f3leo e g\u00e1s coloque uma plataforma em um local importante para a\u00a0diversidade\u00a0marinha\u201d, exemplifica a cofundadora da Liga das Mulheres pelos Oceanos. \u201cOu ent\u00e3o pode ser solicitado um licenciamento para um porto em uma \u00e1rea permanente de\u00a0manguezais\u00a0que contribui para conter impactos da eleva\u00e7\u00e3o do n\u00edvel do mar.\u201d<\/p>\n\n\n\n

Esse desencontro tamb\u00e9m se reflete na Lei da Pesca (11.959\/2009). \u201cEla tem bons componentes, mas falha ao n\u00e3o contemplar o\u00a0conhecimento\u00a0tradicional na gest\u00e3o de pol\u00edticas e n\u00e3o ter provis\u00f5es de estabelecimento de cotas de captura para algumas\u00a0esp\u00e9cies\u201d, opina Gon\u00e7alves. A Pol\u00edtica Nacional de Desenvolvimento Sustent\u00e1vel da Aquicultura e da Pesca n\u00e3o determina de forma expl\u00edcita, por exemplo, a manuten\u00e7\u00e3o dos estoques em n\u00edveis biologicamente seguros e a recupera\u00e7\u00e3o de sobrepescados.<\/p>\n\n\n\n

Al\u00e9m das lacunas observadas em diversas normas, h\u00e1 ainda um gargalo nas a\u00e7\u00f5es que buscam conter a polui\u00e7\u00e3o por pl\u00e1stico no Brasil. Apesar de importante, a\u00a0reciclagem\u00a0n\u00e3o d\u00e1 conta do problema. De acordo com a ONG Oceana, o pl\u00e1stico s\u00f3 pode ser reciclado duas vezes at\u00e9 perder totalmente sua utilidade e nem todos os materiais podem passar por esse processo. Por isso, a organiza\u00e7\u00e3o defende que haja uma lei nacional espec\u00edfica para reduzir a oferta e o uso de pl\u00e1stico. Aos poucos, o pa\u00eds avan\u00e7a nesse sentido. Cidades como Rio de Janeiro e\u00a0S\u00e3o Paulo\u00a0j\u00e1 contam com medidas que restringem o uso de\u00a0pl\u00e1sticos\u00a0descart\u00e1veis em bares e restaurantes. Em tramita\u00e7\u00e3o na C\u00e2mara dos Deputados, o Projeto de Lei (PL) 4186\/20, de autoria do deputado Deuzinho Filho (Republicanos-CE), prev\u00ea\u00a0a proibi\u00e7\u00e3o da comercializa\u00e7\u00e3o de materiais pl\u00e1sticos de uso \u00fanico em todo o Brasil j\u00e1 a partir de 2022. A exce\u00e7\u00e3o seriam produtos essenciais a sa\u00fade p\u00fablica,\u00a0alimenta\u00e7\u00e3o\u00a0e produ\u00e7\u00e3o industrial.<\/p>\n\n\n\n

Esse \u00e9 um exemplo de como a\u00a0conserva\u00e7\u00e3o\u00a0oce\u00e2nica pode ser favorecida nas casas legislativas. \u201cEmbora sejamos um pa\u00eds com\u00a0uma das maiores zonas costeiras do mundo, com mais de 8 mil quil\u00f4metros de extens\u00e3o, a prioridade \u00e9 muito baixa na agenda pol\u00edtica\u201d, opina Leandra. O impulso inicial para mudar esse cen\u00e1rio pode ser a aprova\u00e7\u00e3o do PL 6969\/2013. Conhecido como Lei do\u00a0Mar, ele tramita no Congresso Nacional h\u00e1 quase dez anos e tem como objetivo instituir a Pol\u00edtica Nacional para Uso e Conserva\u00e7\u00e3o do Bioma Marinho. A medida prop\u00f5e meios de realizar o chamado planejamento espacial marinho, integrando trabalhos de conserva\u00e7\u00e3o das \u00e1reas oce\u00e2nicas junto aos interesses econ\u00f4micos e de seguran\u00e7a. Esse sistema de\u00a0gest\u00e3o\u00a0\u00e9 bastante debatido pela comunidade internacional, mas por aqui ainda falta uma compreens\u00e3o da import\u00e2ncia de uma administra\u00e7\u00e3o integrada. \u201cAcredito que o n\u00edvel de conserva\u00e7\u00e3o e adequa\u00e7\u00e3o das\u00a0normas\u00a0seria melhor por meio de um planejamento \u00fanico\u201d, considera Mariana Schiavetti, doutoranda em Direito e Economia do Mar pela Universidade da Bretanha Ocidental, na Fran\u00e7a.<\/p>\n\n\n\n

A Lei do Mar procura ainda aumentar a participa\u00e7\u00e3o social e incluir comunidades pesqueiras, usu\u00e1rios do\u00a0oceano\u00a0e setores privados para construir uma gest\u00e3o mais horizontal. Atualmente, a gest\u00e3o costeira marinha brasileira \u00e9 concentrada no\u00a0governo, com muitas das a\u00e7\u00f5es partindo da Comiss\u00e3o Interministerial para os Recursos do Mar (CIRM), por exemplo. Sendo assim, os cidad\u00e3os t\u00eam pouca participa\u00e7\u00e3o nas decis\u00f5es tomadas, ainda que elas possam ser ben\u00e9ficas. \u201cFazer com que a\u00a0sociedade\u00a0participe e se sinta mais representada nos instrumentos de lei resulta em uma melhor implementa\u00e7\u00e3o\u201d, diz Leandra Gon\u00e7alves.<\/p>\n\n\n\n

Al\u00e9m disso, \u00e9 preciso que o pa\u00eds avance no cumprimento das metas referentes ao Objetivo de Desenvolvimento Sustent\u00e1vel (ODS) 14 da Agenda 2030 da ONU. Intitulado \u201cVida na\u00a0\u00c1gua\u201d, esse item pretende garantir o gerenciamento sustent\u00e1vel e a prote\u00e7\u00e3o dos ecossistemas marinhos e costeiros. \u201cN\u00f3s contamos com mais de 60 normas diretamente relacionadas \u00e0 conserva\u00e7\u00e3o e \u00e0 promo\u00e7\u00e3o do uso\u00a0sustent\u00e1vel\u00a0do oceano e dos recursos marinhos, e tivemos a cria\u00e7\u00e3o dos indicadores para acompanhar a\u00a0evolu\u00e7\u00e3o\u00a0do pa\u00eds\u201d, analisa Schiavetti. Contudo, houve poucos avan\u00e7os nos \u00faltimos anos. Concebidos pelo Instituto de Pesquisa Econ\u00f4mica Aplicada (Ipea) em 2018, seis dos dez indicadores ainda est\u00e3o em constru\u00e7\u00e3o e, desde ent\u00e3o, n\u00e3o foram colocados em pr\u00e1tica. \u201cO\u00a0Brasil\u00a0come\u00e7ou muito bem tentando colocar indicadores, mas agora houve uma estagna\u00e7\u00e3o e, em compara\u00e7\u00e3o com outros pa\u00edses, diminu\u00edmos o ritmo.\u201d<\/p>\n\n\n\n

Mar\u00e9 de esperan\u00e7a<\/strong><\/p>\n\n\n\n

Na aus\u00eancia de leis efetivas, diversas\u00a0iniciativas\u00a0trabalham para salvar o oceano que permeia nosso pa\u00eds. Na esfera p\u00fablica, est\u00e1 sendo desenvolvido o Plano Nacional para Implementa\u00e7\u00e3o da D\u00e9cada da Ci\u00eancia Oce\u00e2nica no Brasil. Elaborado pelo Programa Ci\u00eancia No Mar, do Minist\u00e9rio de\u00a0Ci\u00eancia, Tecnologia e Inova\u00e7\u00f5es (MCTI), o documento deve ser conclu\u00eddo at\u00e9 o fim de 2021 e contempla macrodiretrizes para os pr\u00f3ximos dez anos voltados ao oceano.<\/p>\n\n\n\n

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Saiba quais s\u00e3o os desafios e as oportunidades do Brasil na D\u00e9cada da Ci\u00eancia Oce\u00e2nica (Foto: Gettyimages)<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

O\u00a0bi\u00f3logo\u00a0Ronaldo Christofoletti, professor adjunto do Instituto do Mar da Universidade Federal de S\u00e3o Paulo (Unifesp), foi o respons\u00e1vel por coordenar cinco oficinas realizadas em todas as regi\u00f5es do pa\u00eds, cujas discuss\u00f5es est\u00e3o subsidiando o Plano Nacional. \u201cCada evento regional contou com representantes de diferentes setores da sociedade: empresas,\u00a0academia, sociedade civil, gestores locais e pessoas que trabalham na \u00e1rea\u201d, conta Christofoletti, que \u00e9 membro do Comit\u00ea de Assessoramento para Gest\u00e3o da D\u00e9cada. \u201cComo prioridades foram pontuadas as necessidades de se mapear as fontes de poluentes, aumentar o conhecimento sobre a nossa\u00a0biodiversidade, ter programas de monitoramento com bases de dados organizadas e construir espa\u00e7os de gerenciamento que entendam as dimens\u00f5es biol\u00f3gicas, econ\u00f4micas, humanas e sociais em conjunto.\u201d<\/p>\n\n\n\n

Outra constata\u00e7\u00e3o das oficinas \u00e9 a necessidade de se pensar na promo\u00e7\u00e3o da\u00a0cultura\u00a0oce\u00e2nica, que ser\u00e1 um pilar importante do Plano Nacional. A ideia \u00e9 engajar indiv\u00edduos e institui\u00e7\u00f5es para que todos entendam o papel do oceano na nossa vida e o impacto das nossas a\u00e7\u00f5es nas \u00e1guas marinhas. \u201cJ\u00e1 estamos trabalhando esses conceitos em\u00a0escolas\u00a0e pretendemos lev\u00e1-los para locais de ensino n\u00e3o formal, como empresas e associa\u00e7\u00f5es\u201d, explica Glauco Kimura, oficial de projetos de Ci\u00eancias Naturais da Unesco no Brasil e membro do Comit\u00ea de Assessoramento. Um eixo que tamb\u00e9m deve ser incentivado \u00e9 o da\u00a0economia\u00a0azul, que tem o objetivo de fomentar a participa\u00e7\u00e3o de\u00a0empresas\u00a0na D\u00e9cada Oce\u00e2nica. \u201cQueremos que o setor privado se engaje em a\u00e7\u00f5es concretas e inova\u00e7\u00f5es para diminuir os efeitos negativos e aumentar a prote\u00e7\u00e3o dos ecossistemas marinhos\u201d, comenta Kimura.<\/p>\n\n\n\n

No \u00e2mbito legislativo, a Frente Parlamentar Ambientalista anunciou a cria\u00e7\u00e3o do Grupo de Trabalho para Uso e Conserva\u00e7\u00e3o Marinha (GT-Mar) no \u00faltimo dia 9 de junho. A ideia \u00e9 que o poder de decis\u00e3o fique concentrado na m\u00e3o de\u00a0pol\u00edticos, mas o acompanhamento e aconselhamento seja a cargo da sociedade e de acad\u00eamicos. \u201cA participa\u00e7\u00e3o da sociedade civil tem sido reduzida, ent\u00e3o ter um canal aberto de\u00a0di\u00e1logo\u00a0para trabalhar as quest\u00f5es marinhas no Congresso Nacional \u00e9 um grande ganho\u201d, comenta Simone Madalosso, analista de Governan\u00e7a e Desenvolvimento da ONG Rare Brasil.<\/p>\n\n\n\n

Apesar de as leis serem essenciais, elas n\u00e3o s\u00e3o capazes de sustentar a conserva\u00e7\u00e3o do oceano sozinhas. Por isso, mobiliza\u00e7\u00f5es do terceiro setor s\u00e3o essenciais. Um exemplo \u00e9 a parceria entre a Rare e o Programa Monitora, do Instituto Chico Mendes de Conserva\u00e7\u00e3o da Biodiversidade (ICMBio), que atua na coleta de dados por meio do aplicativo Nosso\u00a0Peixe. \u201cA ideia \u00e9 que haja informa\u00e7\u00f5es espec\u00edficas para verificarmos onde podem ser estabelecidas regi\u00f5es de n\u00e3o\u00a0pesca, as chamadas \u00c1reas de Conserva\u00e7\u00e3o e Recupera\u00e7\u00e3o de Estoque (ACRES)\u201d, explica Madalosso. Al\u00e9m disso, a organiza\u00e7\u00e3o tem buscado aproximar a gest\u00e3o p\u00fablica municipal da pesca sustent\u00e1vel por meio do Coastal 500. \u201c\u00c9 uma rede de prefeitos para fomentar a gest\u00e3o pesqueira nos munic\u00edpios e atender as demandas das comunidades costeiras\u201d, conta. A coaliz\u00e3o envolve ainda membros de\u00a0governos\u00a0de outros pa\u00edses e tem o intuito de promover a troca de saberes e suporte t\u00e9cnico e jur\u00eddico para l\u00edderes costeiros do mundo todo.<\/p>\n\n\n\n

“A participa\u00e7\u00e3o da sociedade civil tem sido reduzida, ent\u00e3o ter um canal aberto de di\u00e1logo para trabalhar as quest\u00f5es marinhas no Congresso Nacional \u00e9 um grande ganho” <\/p>

Simone Madalosso<\/p><\/blockquote>\n\n\n\n

J\u00e1 para incentivar a participa\u00e7\u00e3o do setor privado na conserva\u00e7\u00e3o dos ecossistemas marinhos, a ONG Oce\u00e2nica promove a campanha Abrace o Mar. \u201cA inten\u00e7\u00e3o \u00e9 fazer com que as empresas tenham responsabilidade com o\u00a0meio ambiente\u201d, afirma Mauro Lima, analista socioambiental da Oce\u00e2nica. As entidades que doam valores mensais ou uma porcentagem das vendas para causas ambientais do\u00a0litoral\u00a0s\u00e3o divulgadas pela Oce\u00e2nica nas redes sociais e ganham um selo simb\u00f3lico de apoio \u00e0 sustentabilidade. \u201cQueremos aproximar a sociedade e o setor privado, porque essa integra\u00e7\u00e3o \u00e9 fundamental para realizar\u00a0projetos\u00a0que trazem melhorias na conserva\u00e7\u00e3o do mar\u201d, constata Lima.<\/p>\n\n\n\n

Outra frente de trabalho da ONG tem como objetivo estimular a participa\u00e7\u00e3o social por meio do\u00a0aplicativo\u00a0Mar Limpo, que mapeia os res\u00edduos s\u00f3lidos das\u00a0praias\u00a0brasileiras com base nos registros fotogr\u00e1ficos feitos por cidad\u00e3os. No entanto, a Oce\u00e2nica est\u00e1 com poucos recursos financeiros e, nesse sentido, a plataforma digital\u00a0Eu Apoio Oceano<\/a>, que facilita doa\u00e7\u00f5es a institui\u00e7\u00f5es que trabalham com as \u00e1guas marinhas, \u00e9 uma luz no fim do t\u00fanel (veja abaixo como doar). \u201cMelhorar a qualidade ambiental \u00e9, por consequ\u00eancia, melhorar o\u00a0bem-estar\u00a0social\u201d, pontua Mauro Lima.<\/p>\n\n\n\n

O caminho a ser percorrido ainda \u00e9 longo, mas n\u00e3o imposs\u00edvel. E, se as metas n\u00e3o forem alcan\u00e7adas at\u00e9 o fim da D\u00e9cada da Ci\u00eancia Oce\u00e2nica, espera-se que ao menos os pr\u00f3ximos dez anos mobilizem a sociedade para que se d\u00ea in\u00edcio a um processo de\u00a0transforma\u00e7\u00e3o\u00a0rumo a um\u00a0oceano\u00a0melhor conservado e protegido. Caso contr\u00e1rio, seguiremos \u00e0 deriva.<\/p>\n\n\n\n

Segue o pix!<\/strong><\/p>\n\n\n\n

Lan\u00e7ada junto ao in\u00edcio da D\u00e9cada da Ci\u00eancia Oce\u00e2nica, da ONU, a campanha Eu Apoio Oceano tem o objetivo de arrecadar doa\u00e7\u00f5es para contribuir com o trabalho de institui\u00e7\u00f5es que promovem prote\u00e7\u00e3o,\u00a0educa\u00e7\u00e3o\u00a0ambiental e conserva\u00e7\u00e3o de ecossistemas marinhos. Todo o valor obtido ser\u00e1 distribu\u00eddo de forma equitativa entre oito organiza\u00e7\u00f5es: Route Institute, Tamar, SOS Mata Atl\u00e2ntica, ECOSURF, Instituto BiomaBrasil, Oce\u00e2nica, Sea Shepherd e Viva Instituto Verde Azul. Para ajudar, basta acessar o site\u00a0euapoio.com.br<\/a>\u00a0ou realizar transfer\u00eancia via pix para o e-mail pixoceano@euapoio.com.br.<\/p>\n\n\n\n

Fonte: Galileu<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"

Entenda os principais problemas e saiba quais s\u00e3o os caminhos propostos por especialistas para que o pa\u00eds fortale\u00e7a a conserva\u00e7\u00e3o das \u00e1guas marinhas at\u00e9 2030. <\/a><\/p>\n<\/div>","protected":false},"author":3,"featured_media":174471,"comment_status":"closed","ping_status":"closed","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":{"footnotes":""},"categories":[4],"tags":[476,46,1298],"_links":{"self":[{"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/174470"}],"collection":[{"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/posts"}],"about":[{"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/types\/post"}],"author":[{"embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/users\/3"}],"replies":[{"embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/comments?post=174470"}],"version-history":[{"count":1,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/174470\/revisions"}],"predecessor-version":[{"id":174474,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/posts\/174470\/revisions\/174474"}],"wp:featuredmedia":[{"embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/media\/174471"}],"wp:attachment":[{"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/media?parent=174470"}],"wp:term":[{"taxonomy":"category","embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/categories?post=174470"},{"taxonomy":"post_tag","embeddable":true,"href":"http:\/\/localhost\/wp-json\/wp\/v2\/tags?post=174470"}],"curies":[{"name":"wp","href":"https:\/\/api.w.org\/{rel}","templated":true}]}}