{"id":176293,"date":"2022-02-08T19:09:27","date_gmt":"2022-02-08T22:09:27","guid":{"rendered":"https:\/\/noticias.ambientebrasil.com.br\/?p=176293"},"modified":"2022-02-08T19:09:29","modified_gmt":"2022-02-08T22:09:29","slug":"jovens-jornalistas-indigenas-combatem-fake-news-na-amazonia","status":"publish","type":"post","link":"http:\/\/localhost\/clipping\/2022\/02\/08\/176293-jovens-jornalistas-indigenas-combatem-fake-news-na-amazonia.html","title":{"rendered":"Jovens jornalistas ind\u00edgenas combatem fake news na Amaz\u00f4nia"},"content":{"rendered":"\n
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No alto rio Negro, jovens de v\u00e1rias etnias levam informa\u00e7\u00e3o a aldeias para fazer frente a not\u00edcias falsas, grande parte propagada via WhatsApp \u2013 de vacinas que seriam “doses de serpente” a mentiras sobre garimpo.<\/p>\n\n\n\n

Na Amaz\u00f4nia, quando o sol se p\u00f5e \u00e0s margens do alto rio Negro, uma deslumbrante paisagem com tons de rosa forma-se no horizonte. Ao longe, quase sempre surgem pequenas embarca\u00e7\u00f5es. Desta vez, elas traziam os comunicadores ind\u00edgenas das \u00e1reas mais distantes da bacia do rio Negro at\u00e9 o munic\u00edpio de S\u00e3o Gabriel da Cachoeira, uma cidade em plena floresta.<\/p>\n\n\n\n

A regi\u00e3o, ainda extensamente preservada e amea\u00e7ada h\u00e1 d\u00e9cadas pela devasta\u00e7\u00e3o e pelo garimpo ilegal, enfrenta agora tamb\u00e9m fake news difundidas em meio \u00e0 pandemia de covid-19. Usar a informa\u00e7\u00e3o para combat\u00ea-las em plena floresta \u00e9 a miss\u00e3o de comunicadores ind\u00edgenas do alto rio Negro.<\/p>\n\n\n\n

Quem conhece a regi\u00e3o sabe que a locomo\u00e7\u00e3o s\u00f3 \u00e9 poss\u00edvel pelos rios. Se uma “voadeira” \u2013 como s\u00e3o chamados os barcos locais \u2013 vira, \u00e9 muito dif\u00edcil sobreviver \u00e0s fortes correntezas. Mas isso n\u00e3o impediu jovens da etnia Tukano, por exemplo, de sair das proximidades da fronteira com a Col\u00f4mbia, numa viagem de cerca de quatro dias pelos rios, para participar do maior encontro de comunicadores ind\u00edgenas da hist\u00f3ria da Rede Wayuri, realizado em janeiro de 2022.<\/p>\n\n\n\n

A Rede “Wayuri”, que na l\u00edngua Nheengatu significa “trabalho coletivo”, nasceu em 2017 e re\u00fane jovens de v\u00e1rias etnias da regi\u00e3o. Eles t\u00eam, em m\u00e9dia, de 17 a 37 anos de idade e tentam conter o avan\u00e7o do desmatamento, dao garimpo ilegal e das fake news que chegam cada vez mais \u00e0s aldeias e comunidades atrav\u00e9s do WhatsApp.<\/p>\n\n\n\n

Durante a pandemia, “quando percebemos que as pessoas acreditavam nas mentiras que chegavam pelo WhatsApp, e tamb\u00e9m passavam de parente a parente, come\u00e7amos a pensar em estrat\u00e9gias de comunica\u00e7\u00e3o para combater essas informa\u00e7\u00f5es falsas nas comunidades”, explica Raimundo Baniwa, coordenador da comunica\u00e7\u00e3o da Federa\u00e7\u00e3o das Organiza\u00e7\u00f5es Ind\u00edgenas do Rio Negro (Foirn), uma das maiores organiza\u00e7\u00f5es ind\u00edgenas do pa\u00eds e que \u00e9 respons\u00e1vel pela Rede Wayuri.<\/p>\n\n\n\n

“Vacina era uma dose de serpente”<\/h2>\n\n\n\n

Mois\u00e9s Baniwa \u00e9 operador de c\u00e2mera e membro da Rede Wayuri. Ele conta que ouviu a palavra fake news pela primeira vez de\u00a0grupos evang\u00e9licos dizendo que a vacina\u00a0contra o coronav\u00edrus “era uma dose de serpente” e que quem a tomasse “viraria Satan\u00e1s”.<\/p>\n\n\n\n

Foi no encontro dos comunicadores ind\u00edgenas, em janeiro \u00faltimo, que ele descobriu que a express\u00e3o inglesa fake news<\/em> significa Ixaattikhaa<\/em> em Baniwa, uma das muitas l\u00ednguas locais. Ele pretende usar essa tradu\u00e7\u00e3o para facilitar as explica\u00e7\u00f5es sobre as not\u00edcias falsas aos membros da sua comunidade.<\/p>\n\n\n\n

Como em muitas terras ind\u00edgenas brasileiras, a tecnologia e o uso dos celulares s\u00e3o comuns nas comunidades do alto rio Negro, principalmente entre os jovens.  Mesmo com a internet inst\u00e1vel, mensagens de WhatsApp s\u00e3o cada vez mais difundidas. Foi atrav\u00e9s delas que se disseminou muita informa\u00e7\u00e3o falsa durante a pandemia.<\/p>\n\n\n\n

“Nas comunidades baniwa, a vacina\u00e7\u00e3o foi muito dif\u00edcil. Boatos diziam que, no Instituto Butant\u00e3, em S\u00e3o Paulo, as pessoas tiravam o veneno da cobra para produzir as vacinas. Isso gerava muito medo entre os parentes”, conta Mois\u00e9s Baniwa.<\/p>\n\n\n\n

Mois\u00e9s come\u00e7ou a usar c\u00e2meras aos 13 anos. “Era uma daquelas m\u00e1quinas de revelar” que ganhou do pai, conta. \u00c0s vezes, esperava semanas para ter seus filmes revelados em viagens entre a cidade e a aldeia. Em 2010, j\u00e1 adulto, trabalhou no projeto de constru\u00e7\u00e3o de uma maloca na sua comunidade, para a qual foram comprados novos equipamentos fotogr\u00e1ficos. “Foi assim que pudemos desenvolver mais o tema do audiovisual com a galera”, explica.<\/p>\n\n\n\n

Hoje, ele filma para a Rede Wayuri, mas tamb\u00e9m leva not\u00edcias apuradas \u00e0 sua comunidade e diz que, l\u00e1, os jovens da comunica\u00e7\u00e3o preocupam-se cada vez mais em checar informa\u00e7\u00f5es. “Chamamos os jovens e formamos um grupo com celular, c\u00e2mera. Ensinamos e depois contamos hist\u00f3rias para o grupo.”<\/p>\n\n\n\n

Encontro de jovens comunicadores<\/h2>\n\n\n\n

Durante a\u00a04\u00aa oficina de comunica\u00e7\u00e3o da Rede Wayuri, em janeiro, ele ouviu que textos e imagens podem ser falsos. E que h\u00e1 tamb\u00e9m as\u00a0deepfakes, quando as vozes s\u00e3o manipuladas em\u00a0v\u00eddeos e uma pessoa pode aparecer dizendo algo que, de fato, ela nunca afirmou.<\/p>\n\n\n\n

Foi por isso tamb\u00e9m que os comunicadores ind\u00edgenas debateram como as fake news e as deepfakes podem ser preocupantes no contexto das elei\u00e7\u00f5es de outubro, no Brasil. “Muito bom entender esta palavra chique, em ingl\u00eas – as fake news”, disse uma das comunicadoras locais durante a oficina.<\/p>\n\n\n\n

O encontro reuniu cerca de 50 jovens ind\u00edgenas quase todas as 23 etnias da regi\u00e3o do alto rio Negro, entre os 10 a 18 de janeiro. Foi assessorado pelo Instituto Socioambiental (ISA) e teve apoio do Instituto para Democracia, M\u00eddia e Interc\u00e2mbio Cultural (IDEM), com sede na Alemanha.<\/p>\n\n\n\n

Inclus\u00e3o digital na Amaz\u00f4nia<\/h2>\n\n\n\n

Na Amaz\u00f4nia, grande parte da comunica\u00e7\u00e3o \u00e9 feita por r\u00e1dio, e atualmente h\u00e1 cerca 400 aparelhos instalados nas comunidades. Cada um deles pode ser sintonizado em qualquer ponto do pa\u00eds.<\/p>\n\n\n\n

“Quem sintoniza na mesma frequ\u00eancia, ouve o que todos falam, como um grupo de WhatsApp. Mas s\u00f3 \u00e9 poss\u00edvel ligar o r\u00e1dio no hor\u00e1rio em que a frequ\u00eancia foi contratada”, explica Cl\u00e1udia Ferraz no quarto podcast produzido pelos comunicadores durante o \u00faltimo encontro do grupo.<\/p>\n\n\n\n

Mas as lideran\u00e7as ind\u00edgenas da regi\u00e3o sabem que o melhor jeito de checar informa\u00e7\u00f5es falsas \u00e9 via internet. \u00c9 por isso que pedem inclus\u00e3o digital atrav\u00e9s de pol\u00edticas p\u00fablicas adequadas. H\u00e1 atualmente 20 pontos de internet instalados nas 750 comunidades da regi\u00e3o.<\/p>\n\n\n\n

Quem circula pelos locais onde h\u00e1 internet pode tamb\u00e9m baixar os boletins de \u00e1udio em podcast da Rede Wayuri, ouvir e compartilhar por bluetooth. Ou reproduzi-las nas r\u00e1dios-poste, que s\u00e3o como alto-falantes que informam ecoando as vozes pelas comunidades.<\/p>\n\n\n\n

Al\u00e9m de produzir boletins de \u00e1udio, na fase mais aguda da pandemia de covid-19, o grupo de comunicadores da Rede Wayuri viajou semanas enfrentando as corredeiras e cachoeiras dos rios da regi\u00e3o para levar informa\u00e7\u00e3o apurada e combater, de aldeia em aldeia, not\u00edcias falsas sobre a vacina\u00e7\u00e3o. Seu trabalho ganhou notoriedade e eles foram reconhecidos pela organiza\u00e7\u00e3o internacional Rep\u00f3rteres Sem Fronteiras (RSF).<\/p>\n\n\n\n

Not\u00edcias falsas e garimpo<\/h2>\n\n\n\n

Al\u00e9m de alertar sobre not\u00edcias falsas relacionadas \u00e0 vacina contra a covid-19, os jornalistas ind\u00edgenas do alto rio Negro tamb\u00e9m sabem que muitas fake news est\u00e3o relacionadas \u00e0 explos\u00e3o da minera\u00e7\u00e3o nas suas terras. Nem sempre \u00e1 f\u00e1cil provar isso. Mas sabem que n\u00e3o h\u00e1 interesse do atual governo federal em proteg\u00ea-los do avan\u00e7o do garimpo.<\/p>\n\n\n\n

Sob o presidente Jair Bolsonaro, o desmatamento da Floresta Amaz\u00f4nica alcan\u00e7ou um n\u00edvel alarmante:\u00a0de agosto de 2018 a julho de 2021\u00a0foi\u00a056,6% maior\u00a0do que no mesmo per\u00edodo trienal anterior, segundo dados recentes do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amaz\u00f4nia (Ipam).<\/p>\n\n\n\n

E o desmatamento vem muitas vezes acompanhado do\u00a0garimpo ilegal. Os ind\u00edgenas da etnia Yanomami que vivem pr\u00f3ximos ao rio Negro e \u00e0 fronteira com a Venezuela\u00a0s\u00e3o um dos tr\u00eas povos mais afetados em todo o pa\u00eds. Em 2020, segundo dados da Rede Amaz\u00f4nica de Informa\u00e7\u00e3o Socioambiental Georreferenciada (Raisg), estimou-se que cerca de 20 mil garimpeiros invadiram a\u00a0Terra Ind\u00edgena Yanomami.<\/p>\n\n\n\n

“A covid-19 e minera\u00e7\u00e3o s\u00e3o os temas mais presentes nas nossas redes sociais”, disse o jovem yanomami J. A. [identidade preservada], que saiu da comunidade ind\u00edgena de Maturac\u00e1, numa viagem de seis horas, para participar da oficina de comunicadores da Rede Wayuri, em S\u00e3o Gabriel da Cachoeira.<\/p>\n\n\n\n

O garimpo ilegal na Terra Ind\u00edgena Yanomami lembra cenas vistas em Serra Pelada, no Par\u00e1, na d\u00e9cada de 1980, com muitas crateras, acampamentos colados a aldeias e com\u00e9rcios de garimpeiros. Uma atividade que gera forte press\u00e3o e consequ\u00eancias dr\u00e1sticas para as popula\u00e7\u00f5es locais, como a contamina\u00e7\u00e3o da \u00e1gua de rios por merc\u00fario, que impacta a pesca e a sa\u00fade.<\/p>\n\n\n\n

No ano passado, Bolsonaro visitou a TI Yanomami e, na ocasi\u00e3o, as lideran\u00e7as ind\u00edgenas pediram o fim do garimpo.<\/p>\n\n\n\n

“Sabemos que o atual governo brasileiro entrou com a promessa de liberar o garimpo. Percebemos a presen\u00e7a de pessoas interessadas, principalmente manifestam-se pr\u00f3-minera\u00e7\u00e3o”, disse uma das lideran\u00e7as ind\u00edgenas locais [identidade preservada] \u00e0 DW Brasil.<\/p>\n\n\n\n

Nesse contexto, comunicadores ind\u00edgenas destacam a import\u00e2ncia de seu\u00a0papel de proteger o meio ambiente\u00a0por meio da informa\u00e7\u00e3o e\u00a0reconhecem os\u00a0desafios. Raimundo Baniwa, coordenador de comunica\u00e7\u00e3o da Foirn, diz que sua esperan\u00e7a “\u00e9 incentivar institucionalmente o combate \u00e0s fake news, porque quando elas chegam \u00e0s comunidades, \u00e9 muito dif\u00edcil combat\u00ea-las”.<\/p>\n\n\n\n

Fonte: Deutsche Welle<\/p>\n\n\n\n

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