{"id":180135,"date":"2022-10-13T20:28:08","date_gmt":"2022-10-13T23:28:08","guid":{"rendered":"https:\/\/noticias.ambientebrasil.com.br\/?p=180135"},"modified":"2022-10-13T20:28:14","modified_gmt":"2022-10-13T23:28:14","slug":"berco-do-governo-da-floresta-acre-se-volta-para-o-agro","status":"publish","type":"post","link":"http:\/\/localhost\/clipping\/2022\/10\/13\/180135-berco-do-governo-da-floresta-acre-se-volta-para-o-agro.html","title":{"rendered":"Ber\u00e7o do “governo da floresta”, Acre se volta para o agro"},"content":{"rendered":"\n
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Com quatro bois por habitante, estado amaz\u00f4nico vive alta explosiva do desmatamento e reelege governador alinhado a Bolsonaro. Rumo p\u00f5e \u00e0 prova o legado de Chico Mendes.<\/p>\n\n\n\n

Ber\u00e7o de movimentos de resist\u00eancia que ajudaram a fundar importantes pol\u00edticas ambientais, o estado do Acre, onde viveu Chico Mendes at\u00e9 ser assassinado, parece estar se afastando desse legado, segundo o resultado das\u00a0\u00faltimas elei\u00e7\u00f5es.<\/p>\n\n\n\n

Alinhado ao presidente Jair Bolsonaro, o atual governador Gladson Cameli (PP) foi reeleito no primeiro turno com ampla vantagem sobre os oponentes, com 56,75% dos votos. Jorge Viana (PT), lideran\u00e7a emblem\u00e1tica no estado e ex-governador, ficou em segundo, com 24%.<\/p>\n\n\n\n

Viana \u00e9 um dos fundadores da “florestania”, ou “governo da floresta”. O termo, criado por um grupo de pol\u00edticos que comp\u00f4s a Frente Popular do Acre (FPA) no fim da d\u00e9cada de 1990, esteve no centro de seguidas administra\u00e7\u00f5es petistas, de 1999 a 2018.<\/p>\n\n\n\n

Angela Mendes, coordenadora do Comit\u00ea Chico Mendes, que leva o nome do pai dela, se diz surpresa com esse cen\u00e1rio. “O governo atual, totalmente voltado para o agroneg\u00f3cio, n\u00e3o enxerga o\u00a0potencial da floresta,\u00a0n\u00e3o valoriza os conhecimentos tradicionais desta popula\u00e7\u00e3o”, lamenta.<\/p>\n\n\n\n

Marina Silva, ex-ministra do Meio Ambiente que iniciou sua vida pol\u00edtica no Acre\u00a0e assistiu ao nascimento da FPA, olha para o estado com preocupa\u00e7\u00e3o. “\u00c9 muito triste ver toda a luta que comecei com 17 anos, ao lado de Chico Mendes, se tornando esta terra arrasada que estamos vendo no Acre e na\u00a0Amaz\u00f4nia”, afirma em entrevista \u00e0 DW Brasil.<\/p>\n\n\n\n

Mais agro, menos floresta<\/h2>\n\n\n\n

Aos 43 anos, Cameli \u00e9 conhecido por publicar v\u00eddeos fazendo dancinhas em redes sociais e tem experi\u00eancia na vida p\u00fablica. Como deputado federal teve dois mandatos (2007 a 2015), foi eleito senador e, em 2018, concorreu e venceu como governador no estado.<\/p>\n\n\n\n

Para Israel Souza, professor do Instituto Federal do Acre (Ifac)\u00a0em Cruzeiro do Sul, Cameli “surfa” mais na onda antipetista do que na bolsonarista. “Ele \u00e9 um pol\u00edtico ‘liso’, \u2018ensaboado’. N\u00e3o tem compromisso fechado, n\u00e3o defende bandeiras, s\u00f3 quando lhe \u00e9 conveniente”, analisa Souza, que coordena atualmente o grupo de pesquisa “Religi\u00e3o e pol\u00edtica no Brasil atual” no Ifac.<\/p>\n\n\n\n

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Angela Mendes prossegue a luta do pai, Chico Mendes<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

“\u00c9 a\u00ed que reside o perigo”, comenta Angela Mendes sobre a falta de uma ideologia clara de Cameli. “Quem est\u00e1 pr\u00f3ximo dele s\u00e3o pessoas ligadas ao agroneg\u00f3cio, que ajudam a impulsionar o desmatamento, explora\u00e7\u00e3o madeireira do Acre.”<\/p>\n\n\n\n

A \u00eanfase dada ao agroneg\u00f3cio, com menor preocupa\u00e7\u00e3o com a floresta e seus povos, \u00e9 percept\u00edvel nos n\u00fameros, argumenta Souza. Desde 2018, o rebanho bovino do Acre saltou de 3,3 milh\u00f5es para mais de 4 milh\u00f5es \u2013 um crescimento de 22%, apontam dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estat\u00edstica (IBGE). O n\u00famero de cabe\u00e7as de gado \u00e9 quatro vezes maior que o da popula\u00e7\u00e3o, estimada em 906 mil.<\/p>\n\n\n\n

Desde ent\u00e3o, o\u00a0desmatamento\u00a0tamb\u00e9m subiu, e num ritmo mais intenso. O salto foi de 444 quil\u00f4metros quadrados\u00a0em 2018 para 889 em 2021, um aumento\u00a0de 100%.<\/p>\n\n\n\n

“Vemos esse avan\u00e7o [do desmatamento] com uso deste velho discurso, de que proteger a floresta \u00e9 impedir o desenvolvimento, o que \u00e9 uma inverdade. Essa vis\u00e3o de destrui\u00e7\u00e3o, da expans\u00e3o predat\u00f3ria da fronteira agr\u00edcola, est\u00e1 muito forte na Amaz\u00f4nia”, avalia Marina Silva, ex-senadora pelo Acre e rec\u00e9m-eleita deputada federal por S\u00e3o Paulo pelo partido Rede.<\/p>\n\n\n\n

“Nosso maior problema n\u00e3o \u00e9 o desmatamento”<\/h2>\n\n\n\n

Questionado, Cameli negou que a\u00a0destrui\u00e7\u00e3o da Floresta Amaz\u00f4nica\u00a0seja o principal problema ambiental no estado. “Sou contra o desmatamento e, no Acre, nosso maior problema n\u00e3o \u00e9 o desmatamento, mas as queimadas de \u00e1reas degradadas”, respondeu por e-mail \u00e0 DW Brasil.<\/p>\n\n\n\n

Indagado sobre o reflexo no estado do\u00a0desmonte das pol\u00edticas ambientais\u00a0promovido pelo governo\u00a0Bolsonaro, Cameli n\u00e3o comentou o assunto de forma espec\u00edfica. Disse que vai ampliar as a\u00e7\u00f5es de monitoramento, fiscaliza\u00e7\u00e3o e de educa\u00e7\u00e3o ambiental.<\/p>\n\n\n\n

Para ele, o sistema de\u00a0licenciamento ambiental\u00a0seria um vil\u00e3o da destrui\u00e7\u00e3o. “Hoje [o licenciamento] mais prejudica do que ajuda a preserva\u00e7\u00e3o ambiental, da\u00ed\u00a0se tem cada vez mais na Amaz\u00f4nia desmatamentos ilegais”, justifica.<\/p>\n\n\n\n

De compet\u00eancia dos estados, o licenciamento ambiental \u00e9 obrigat\u00f3rio para constru\u00e7\u00e3o, instala\u00e7\u00e3o, amplia\u00e7\u00e3o e funcionamento de empreendimentos que t\u00eam potencial para causar degrada\u00e7\u00e3o ambiental.<\/p>\n\n\n\n

O modelo da florestania<\/h2>\n\n\n\n

Quando surgiu, em 1999, a FPA se apresentava como um novo modelo de desenvolvimento sustent\u00e1vel, um contraponto \u00e0quele trazido pelos migrantes do sul do pa\u00eds a partir da d\u00e9cada de 1970, que se calcava na expans\u00e3o da pecu\u00e1ria, no desmatamento e na grilagem de terras.<\/p>\n\n\n\n

Com a promessa de implantar uma\u00a0economia de base florestal\u00a0e valoriza\u00e7\u00e3o de suas popula\u00e7\u00f5es tradicionais\u00a0\u2013 legados do l\u00edder seringueiro Chico Mendes, assassinado em 1988 \u2013, Jorge Viana foi eleito governador em 1998. Sem dinheiro em caixa, Viana recorreu a programas internacionais de cr\u00e9dito que demonstravam interesse em projetos do tipo.<\/p>\n\n\n\n

Para o pesquisador Israel Souza, os efeitos pr\u00e1ticos dessa pol\u00edtica s\u00e3o d\u00fabios. “Apenas uma Terra Ind\u00edgena foi homologada nesses anos de governo de PT. Vimos tamb\u00e9m uma intensifica\u00e7\u00e3o da press\u00e3o sobre os moradores de reservas para aderirem ao manejo madeireiro, o que era considerado danoso por muitos, que viam a impossibilidade de manterem seus modos de vida, com seus costumes e tradi\u00e7\u00f5es, apenas vendendo madeira”, critica.<\/p>\n\n\n\n

Miguel Scarcello, secret\u00e1rio-geral e cofundador da SOS Amaz\u00f4nia, lamenta que as parcerias internacionais n\u00e3o tenham dado o efeito r\u00e1pido esperado. “Seringueiros eram uma refer\u00eancia h\u00e1 30 anos, criaram todo um movimento, tinham influ\u00eancia, mas perderam essa for\u00e7a. Parece que essa tradi\u00e7\u00e3o n\u00e3o est\u00e1 sendo passada de pai para filho. N\u00e3o tem uma gera\u00e7\u00e3o que se sinta apropriada dessa heran\u00e7a”, pontua.<\/p>\n\n\n\n

Um modelo de m\u00e9dio prazo<\/h2>\n\n\n\n

Sonaira Silva, professora da Universidade Federal do Acre, lamenta que o modelo de agropecu\u00e1ria usado em outros estados amaz\u00f4nicos, como Rond\u00f4nia, seja propagandeado como bem-sucedido.<\/p>\n\n\n\n

“\u00c9 sucesso para quem? Para pouqu\u00edssimos. E o\u00a0custo ambiental\u00a0\u00e9 enorme. O rio que abastece Rio Branco chegou a sua menor cota hist\u00f3rica neste ano. A floresta preservada \u00e9 um escudo para controlar os efeitos das mudan\u00e7as clim\u00e1ticas que j\u00e1 est\u00e3o em curso na regi\u00e3o. Se continuar desmatando, queimando, fragmentando a floresta, n\u00e3o vai ter \u00e1gua para as pessoas e para o agro”, argumenta a cientista.<\/p>\n\n\n\n

Na vis\u00e3o de Marina Silva, a experi\u00eancia pregressa n\u00e3o pode ser esquecida. “A quebra da l\u00f3gica de desenvolvimento que destr\u00f3i a floresta e elimina popula\u00e7\u00f5es ind\u00edgenas e tradicionais e a implanta\u00e7\u00e3o de um desenvolvimento sustent\u00e1vel, de forma democr\u00e1tica, que respeita meio ambiente e pessoas, \u00e9 processo de m\u00e9dio e longo prazo. Afinal, esse sistema predat\u00f3rio j\u00e1 tem mais de 400 anos. E \u00e9 ele que recebe a maioria dos incentivos, est\u00edmulos, dinheiro”, comenta.<\/p>\n\n\n\n

Angela Mendes afirma que os pr\u00f3ximos quatro anos no Acre ser\u00e3o de resist\u00eancia da sociedade civil. “N\u00e3o vamos dar sossego ao governo, vamos monitorar suas a\u00e7\u00f5es. Esse \u00e9 um estado que foi uma grande refer\u00eancia e que precisa cuidar de sua hist\u00f3ria e da sua trajet\u00f3ria de evolu\u00e7\u00e3o.”<\/a><\/p>\n\n\n\n

Fonte: Deutsche Welle<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"