{"id":180480,"date":"2022-11-04T19:29:47","date_gmt":"2022-11-04T22:29:47","guid":{"rendered":"https:\/\/noticias.ambientebrasil.com.br\/?p=180480"},"modified":"2022-11-04T19:29:53","modified_gmt":"2022-11-04T22:29:53","slug":"lotacao-de-utis-na-pandemia-gerou-surto-de-fungo-resistente-diz-estudo","status":"publish","type":"post","link":"http:\/\/localhost\/clipping\/2022\/11\/04\/180480-lotacao-de-utis-na-pandemia-gerou-surto-de-fungo-resistente-diz-estudo.html","title":{"rendered":"Lota\u00e7\u00e3o de UTIs na pandemia gerou surto de fungo resistente, diz estudo"},"content":{"rendered":"\n
\"\"<\/a>
Fungo da esp\u00e9cie ‘Candida parapsilosis’ foi cultivado no centro da placa com fluconazol, e se mostrou resistente\u00a0Reprodu\u00e7\u00e3o\/Acervo dos pesquisadores<\/figcaption><\/figure>\n\n\n\n

Um grupo de\u00a0pesquisadores brasileiros\u00a0registrou o maior surto j\u00e1 causado por uma mesma\u00a0cepa\u00a0de\u00a0Candida parapsilosis<\/em>,\u00a0fungo\u00a0que invade a\u00a0corrente sangu\u00ednea\u00a0e pode levar \u00e0 morte. O surgimento da linhagem, resistente ou tolerante a duas das principais classes de f\u00e1rmacos antif\u00fangicos, ocorreu entre 2020 e 2021 em uma unidade de terapia intensiva (UTI) de Salvador, Bahia, durante um dos picos da pandemia de\u00a0COVID-19.<\/p>\n\n\n\n

O estudo foi\u00a0publicado\u00a0na revista\u00a0Emerging Microbes and Infections<\/em>\u00a0e alerta para o poss\u00edvel surgimento de novas linhagens resistentes no futuro, bem como para a necessidade de pr\u00e1ticas que ajudem a evitar\u00a0infec\u00e7\u00f5es f\u00fangicas\u00a0nos hospitais.<\/p>\n\n\n\n

\u201cNesse estudo, 90% dos pacientes infectados por essa esp\u00e9cie de\u00a0Candida\u00a0<\/em>tinham cepas resistentes ou tolerantes a\u00a0f\u00e1rmacos\u00a0representantes das duas principais classes de medicamentos antif\u00fangicos utilizados para tratamento de candid\u00edase invasiva, o fluconazol e as equinocandinas. Dentre esses pacientes, quase 60% foram a \u00f3bito\u201d, relata\u00a0Arnaldo Colombo, professor da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de S\u00e3o Paulo (EPM-Unifesp) e coordenador do estudo,\u00a0apoiado\u00a0pela FAPESP.<\/p>\n\n\n\n

Foram isoladas 60 amostras de\u00a0Candida parapsilosis<\/em>\u00a0de 57 pacientes internados em UTI com COVID-19 grave. An\u00e1lises\u00a0gen\u00e9ticas\u00a0mostraram que 51 (85%) dos isolados resistentes a fluconazol pertenciam a um mesmo\u00a0cluster<\/em>, ou seja, tinham o mesmo ancestral comum. Uma parte deles era ainda tolerante a equinocandinas, classe de medicamento usada contra isolados de\u00a0Candida\u00a0<\/em>resistentes a fluconazol.<\/p>\n\n\n\n

O termo resist\u00eancia se refere \u00e0 capacidade do microrganismo de se multiplicar mesmo na presen\u00e7a do medicamento administrado. Por sua vez, a toler\u00e2ncia ocorre quando o antimicrobiano atua reduzindo o crescimento do microrganismo, mas n\u00e3o consegue matar o\u00a0pat\u00f3geno.<\/p>\n\n\n\n

\u201cA circula\u00e7\u00e3o da cepa resistente, provavelmente, foi facilitada por meio de algum profissional de sa\u00fade, com a higieniza\u00e7\u00e3o prec\u00e1ria das m\u00e3os, que acabou contaminando cateteres vasculares por onde s\u00e3o aplicados medicamentos e outras infus\u00f5es diretamente na corrente sangu\u00ednea. Isso \u00e9 resultado de uma UTI superlotada e muita demanda por atendimento\u201d, explica\u00a0Jo\u00e3o N\u00f3brega de Almeida J\u00fanior, pesquisador do Hospital das Cl\u00ednicas da Faculdade de Medicina da Universidade de S\u00e3o Paulo (FM-USP)\u00a0apoiado\u00a0pela FAPESP e coautor do estudo.<\/p>\n\n\n\n

Almeida J\u00fanior realizou parte do trabalho com\u00a0bolsa\u00a0de pesquisa no exterior, realizada no Centro de Descoberta e Inova\u00e7\u00e3o de Hackensack Meridian Health, nos Estados Unidos.<\/p>\n\n\n\n

Condi\u00e7\u00f5es pand\u00eamicas<\/h2>\n\n\n\n

A\u00a0resist\u00eancia\u00a0e a toler\u00e2ncia provavelmente ocorreram em decorr\u00eancia do uso indiscriminado de antif\u00fangicos em pacientes de risco, com longo tempo de\u00a0interna\u00e7\u00e3o. A pr\u00e1tica \u00e9 comum em pacientes graves que permanecem inst\u00e1veis.<\/p>\n\n\n\n

\u201cUma vez que testes de detec\u00e7\u00e3o de microrganismos levam tempo, em situa\u00e7\u00f5es emergenciais os m\u00e9dicos podem usar\u00a0antibi\u00f3ticos\u00a0e antif\u00fangicos de forma emp\u00edrica, ou seja, baseados nos agentes mais prov\u00e1veis de infec\u00e7\u00e3o. A ideia \u00e9 tratar eventual epis\u00f3dio de sepse [infec\u00e7\u00e3o generalizada] por diferentes microrganismos. A pr\u00e1tica, por\u00e9m, deve ser racionalizada, no sentido de evitar o desenvolvimento de resist\u00eancia, toxicidade e custo adicional\u201d, ressalva Colombo, que tamb\u00e9m \u00e9 pesquisador e m\u00e9dico infectologista no Hospital S\u00e3o Paulo, ligado \u00e0 Unifesp.<\/p>\n\n\n\n

No\u00a0Brasil, boa parte dos centros m\u00e9dicos n\u00e3o possui testes para avaliar a suscetibilidade dos fungos aos antif\u00fangicos, tornando mais dif\u00edcil o reconhecimento precoce de cepas resistentes. Isso pode ser um facilitador da dissemina\u00e7\u00e3o no\u00a0sistema de sa\u00fade. Da mesma forma, caso o agente n\u00e3o seja bem caracterizado antes do tratamento da infec\u00e7\u00e3o, o paciente pode ser tratado com medicamento ineficaz. Por isso, os pesquisadores ressaltam a import\u00e2ncia de um diagn\u00f3stico preciso antes de administrar antif\u00fangicos.<\/p>\n\n\n\n

Para isso, \u00e9 recomendada a realiza\u00e7\u00e3o de testes moleculares mais completos para a caracteriza\u00e7\u00e3o dos agentes resistentes. O estudo mostrou que muta\u00e7\u00f5es no gene ERG11<\/em>, normalmente usadas como indicador de resist\u00eancia ao grupo de antif\u00fangicos em que se encontra o fluconazol, estavam presentes em apenas 35,8% das amostras.<\/p>\n\n\n\n

Por outro lado, todas as amostras resistentes possu\u00edam muta\u00e7\u00e3o em outro gene, TAC1<\/em>, que por sua vez faz aumentar a express\u00e3o de CDR1<\/em>. Esse \u00faltimo \u00e9 respons\u00e1vel por um mecanismo de resist\u00eancia chamado de bomba de efluxo. Basicamente, o fluconazol consegue penetrar a c\u00e9lula do fungo, mas a cepa resistente adquire a capacidade de bombear o f\u00e1rmaco para fora, reduzindo sua concentra\u00e7\u00e3o e potencial terap\u00eautico.<\/p>\n\n\n\n

Quando essa muta\u00e7\u00e3o gen\u00e9tica surgiu em cepas de\u00a0Candida parapsilosis<\/em>\u00a0originalmente sens\u00edveis a fluconazol, elas passaram a demandar concentra\u00e7\u00f5es at\u00e9 oito vezes maiores do medicamento para poder apresentar alguma a\u00e7\u00e3o inibit\u00f3ria. Outras\u00a0muta\u00e7\u00f5es\u00a0foram encontradas no gene\u00a0FKS1<\/em>, em uma regi\u00e3o onde altera\u00e7\u00f5es desse tipo n\u00e3o s\u00e3o t\u00e3o comuns.<\/p>\n\n\n\n

\u201cElas s\u00e3o tolerantes, precisam de doses maiores para serem mortas. Isso implica que, em breve, poderemos encontrar cepas resistentes a essa classe de\u00a0medicamentos, que \u00e9 atualmente a recomendada para fungos resistentes a fluconazol\u201d, alerta Almeida J\u00fanior.<\/p>\n\n\n\n

Recomenda\u00e7\u00f5es<\/h2>\n\n\n\n

No cen\u00e1rio espec\u00edfico deste surto, al\u00e9m de refor\u00e7ar a import\u00e2ncia de realizar testes para caracteriza\u00e7\u00e3o de\u00a0resist\u00eancia\u00a0e toler\u00e2ncia de fungos em centros m\u00e9dicos de refer\u00eancia, os pesquisadores recomendam o uso de uma terceira classe de medicamentos quando forem encontradas cepas com essas caracter\u00edsticas. Trata-se da anfotericina B lipossomal, f\u00e1rmaco com maior potencial de toxicidade para humanos e mais caro que o fluconazol e as equinocandinas, por\u00e9m eficaz no tratamento de\u00a0Candida\u00a0<\/em>resistente ou tolerante.<\/p>\n\n\n\n

\u201c\u00c9 preciso estabelecer\u00a0algoritmos\u00a0decis\u00f3rios e usar biomarcadores para fazer uso de antibi\u00f3ticos e antif\u00fangicos apenas quando necess\u00e1rio, na dose e no tempo correto. Isso evita o surgimento de cepas resistentes\u201d, atesta Colombo, que trabalha junto \u00e0 Ag\u00eancia Nacional de Vigil\u00e2ncia Sanit\u00e1ria (Anvisa) para estabelecer protocolos para o Sistema \u00danico de Sa\u00fade (SUS) relacionados a infec\u00e7\u00f5es f\u00fangicas.<\/p>\n\n\n\n

O pesquisador lembra ainda que o uso indiscriminado de antibi\u00f3ticos tamb\u00e9m \u00e9 um fator de risco para a infe\u00e7\u00e3o por fungos, uma vez que, ao matar microrganismos do\u00a0intestino, o tratamento pode tornar a parede intestinal mais perme\u00e1vel e permitir que os fungos do g\u00eanero\u00a0Candida<\/em>, que vivem no trato gastrointestinal humano, entrem na corrente sangu\u00ednea. Em condi\u00e7\u00f5es normais, esses fungos n\u00e3o causam males.<\/p>\n\n\n\n

As infec\u00e7\u00f5es sist\u00eamicas por\u00a0Candida\u00a0<\/em>ocorrem sobretudo no ambiente hospitalar, onde h\u00e1 pacientes com o sistema imune comprometido e se faz uso de procedimentos invasivos, como hemodi\u00e1lise, aplica\u00e7\u00e3o de medicamentos na veia e respira\u00e7\u00e3o mec\u00e2nica, que tamb\u00e9m podem levar\u00a0Candida\u00a0<\/em>para a corrente sangu\u00ednea.<\/p>\n\n\n\n

Dentre os pacientes do estudo, 54% faziam uso de cateter quando tiveram a infec\u00e7\u00e3o diagnosticada. No total, a mortalidade em 30 dias foi de 59,6%<\/p>\n\n\n\n

Fonte: Galileu<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"