Efraim Rodrigues (*)
Esta foi a semana de se ouvir a expressão “entraves ao desenvolvimento” na mídia. A expressão, bem surrada aliás, é sempre usada quando algum interesse individual é ferido. Tão antiga quanto esta, é a sua irmã, “busca do interesse comum”. Ambas nasceram no momento em que começamos a discutir quão individualista, ou quão voltada para a comunidade, a sociedade deve ser.
Muitos de nós resolveram este caso de maneira simples. Falam como se fossem muito voltados para a comunidade, e agem como totalmente individualistas. Preservam, assim, seu instinto de auto-conservação, e sua sanidade mental, por meio de uma mentira verossímil. Para falar português claro, são preocupados com o bem comum na conversa, mas pensam em si mesmos quando agem.
Bem poucos se propõem a resolver o conflito entre o individual e o coletivo pelos meios que a sociedade oferece; da política, da exposição de idéias, da ação inovadora, entre outros meios lícitos. Dois instrumentos históricos na solução destes conflitos, são o código florestal, e o licenciamento ambiental.
Para quem não estava aqui quando o código florestal foi criado (eu estava, mas minha atuação ambiental na época se limitava a sujar fraldas), o código data de 1965 e sofreu, ao longo de seus 38 anos de vida, uma série de alterações discutidas na Câmara e no Senado, quando os mais diferentes setores da sociedade propuseram o que consideravam melhoras no seu texto. O Código Florestal é neste momento, uma síntese do esforço de todo um país para conjugar o instinto individual de auto conservação, de gerir seus negócios, ganhar dinheiro, tocar sua vida, em conjunto com os interesses ambientais, comuns de toda esta mesma sociedade, como a redução das taxas de extinção de espécies e a melhoria da qualidade da água.
Eis que, o deputado Ricardo Izar (PTB-SP), resolve fazer uma lei que tornaria inaplicável o Código Florestal em áreas urbanas. Neste momento, a balança entre o individual e o coletivo arriscou-se a pender mais para o individual, já que o interesse daqueles que comercializam imóveis em novas áreas estaria tomando vantagem sobre o interesse do resto da sociedade em ter água limpa, áreas verdes e qualidade de vida. A sociedade se organiza, em especial o segmento ambientalista, e pressiona o presidente para vetar esta lei, que poria o código florestal por terra. O Presidente afinal veta esta lei na última segunda-feira
É neste momento, que o mesmo deputado vem a público dizer que o código é um entrave ao desenvolvimento. Entrave ao desenvolvimento, meu caro colega, é querer, com uma simples lei, anular o trabalho de décadas da sociedade. Se você crê que o Código Florestal têm falhas (como eu acredito também) trabalhe para seu aprimoramento, não para sua destruição.
A segunda pérola da semana foi da ministra das Minas e Energia, Dilma Roussef, ao dizer que o licenciamento ambiental exigido das novas usinas irá causar um entrave ao desenvolvimento. A ministra com esta frase parece voltar a seus tempos de guerrilheira, que simplesmente atira no que não gosta.
Sra Ministra, a metodologia de análise de impacto ambiental começou a ser desenvolvida muito antes dos seus tempos de guerrilha, e fatalmente, queira a Sra, ou não, irão estar aqui depois do término da sua gestão à frente do ministério de minas e energia. O licenciamento ambiental existe exatamente para evitar que em face ao açodamento, a pressa de ter que fornecer energia para um país, não acabe se causando um mal maior logo a frente, envolvendo outros aspectos da vida, como água ar e solo. Alguns deles, interessantemente, também relacionados a produção de energia. Para citar uma frase bem conhecida no seu tempo, a vida não se resume em festivais (de energia, no caso).
* É Ph.D. em Ecologia pela Harvard University, professor adjunto de Recursos Naturais da UEL e autor do Livro Biologia da Conservação.