Fernando César Manosso (*)
Sabe-se que o turismo é um segmento econômico que movimenta trilhões de dólares no mundo anualmente e que esta atividade possui uma grande capacidade de gerar empregos e tributos.
No Brasil, segundo a Embratur, o turismo representa 8% do Produto Interno Bruto e, com isso, envolve 6% da População Economicamente Ativa.
É notório também dizermos que é uma atividade que tem crescido exponencialmente nas últimas décadas e que por isso tem precisado de atenções, sejam elas políticas, técnicas e econômicas.
A atividade turística possui diversos segmentos que variam conforme o tipo de atividade desenvolvida nas viagens, sobretudo o objetivo de cada indivíduo. Denomina-se esse processo de Segmentação do Turismo, como por exemplo, turismo religioso, turismo cultural, turismo de eventos, turismo histórico, turismo esportivo, dentre outros, que por sua vez não são excludentes entre si.
Devido a magnitude que o turismo conquistou no contexto socioeconômico, é considerado uma indústria “limpa”, que gera importantes divisas sem poluir ou danificar o ambiente. Afirmação que merece uma avaliação mais delicada, pois se sabe que o turismo de massa não controlado e sem planejamento é capaz de degradar a estrutura sócio-ambiental dos envolvidos de maneira bastante crítica.
Um importante segmento do turismo e que têm crescido muito rapidamente nos últimos anos é o turismo ecológico ou ecoturismo, que é popularmente conhecido como viagens à natureza, onde a paisagem encontra-se pouco alterada, muitas vezes associado à prática de alguns esportes de aventura.
Com uma propagação rápida entre os adeptos, principalmente jovens, o ecoturismo passou a ser desenvolvido de maneira muito aleatória, quase sempre utilizando as unidades de conservação brasileiras como espaço turístico, mas sem qualquer regulamentação técnica e legal, por meio de diretrizes que estabelecessem sua real função e princípios.
O ecoturismo é uma atividade ainda em formação no Brasil e por isso as regulamentações técnicas e legais que tratam desta atividade também são recentes. No entanto, diversas lacunas nesse contexto estão sendo preenchidas e merecem destaque, como as diretrizes para uma Política Nacional de Ecoturismo (Embratur, 1994), as Diretrizes e Recomendações para o Planejamento e Gestão da Visitação em Unidades de Conservação (versão em construção, 2005), o programa “pega-leve” de esportes de aventura na natureza, além de diversos trabalhos acadêmicos que multiplicam-se cada vez mais entre as instituições de pesquisa e ensino e os infinitos trabalhos das organizações não-governamentais que anseiam um ecoturismo mais saudável e mais responsável.
Considerando que o ecoturismo no Brasil, quase sempre é praticado no interior das unidades de conservação, sejam elas de uso direto ou indireto, é importante salientarmos as principais deficiências destas unidades para atender com eficácia seus visitantes. Destacam-se de um modo geral a carência de funcionários, capacitação técnica, investimento em infra-estruturas, como trilhas, centros de recepção, equipamentos de segurança e orientação, além da gestão participativa.
Frente a esta situação é importante dizer que a atividade turística no interior de unidades de conservação têm propiciado diversos impactos ambientais e socioeconômicos, principalmente no interior e entorno daquelas unidades que não possuem uma infra-estrutura adequada para visitação.
Os impactos mais comuns são a deterioração dos caminhos e trilhas através da erosão e compactação do solo, a produção de lixo, os distúrbios sonoros e os conflitos com comunidades residentes e/ou de entorno.
Para o planejamento constante desta atividade são necessários diagnósticos multidisciplinares, que por sua vez requerem dados sobre a visitação e a situação das unidades de conservação brasileiras e por isso algumas informações parecem querer surgir, como por exemplo, os dados adquiridos através de duas importantes pesquisas realizadas.
Uma refere-se à pesquisa realizada com o público visitante da Adventure Sports Fair, realizada em São Paulo e com os internautas que entram no site do Ministério do Meio Ambiente, praticantes de ecoturismo e que indiretamente possuem unidades de conservação como destino ecoturístico. E uma outra pesquisa diz respeito a um complexo questionário enviado às coordenações dos Parques Nacionais e Estaduais do Brasil, por intermédio da Diretoria do Programa Nacional de Áreas Protegidas da Secretaria de Biodiversidade e Florestas.
A pesquisa realizada junto aos visitantes da Adventure Sports Fair, mesmo atingindo uma pequena amostra dos ecoturistas do Brasil, mostrou-se importante por apontar alguns dados interessantes, como por exemplo: a faixa etária dos entrevistados está entre 25 e 34 anos em sua maior parte e destes, 59% possuem curso superior. Metade destes visitantes visita parques nacionais ou estaduais pelo menos três vezes ao ano, sendo que apenas 4% buscam excursões ou agências de viagem e só 7% consideraram a infra-estrutura dos parques excelente.
Já a pesquisa realizada pela Diretoria do Programa Nacional de Áreas Protegidas alcançou alguns dados mais complexos como, por exemplo:
Parques Nacionais
27% não possuem visitação;
44% recebem visitação;
29% não responderam (o questionário todo);
O Parque Nacional da Tijuca é o segundo mais visitado no Brasil, seguido do Parque Nacional do Iguaçu;
As principais atividades desenvolvidas nos Parques Nacionais são Caminhadas de um dia (22,4%), Banho (18,9%), Ciclismo e Caminhada (7,7%) e escalada (5,1%);
Os maiores indicadores de impactos nos Parques Nacionais são o excesso de visitantes, o fogo, a pecuária e agricultura, a presença de animais domésticos, alimentação da fauna, erosão de trilhas, veículos indevidos e o lixo.
Parques Estaduais
75% estão abertos para visitação e 25% encontram-se fechados;
As principais atividades desenvolvidas são Caminhadas de um dia, Banho, Ciclismo, Caminhada com pernoite e Escalada;
36% dos visitantes possuem acompanhamento de guias do parque, 34% sem acompanhamento de guias e 30% têm acompanhamento de guias do entorno do parque;
Os indicadores de impactos mais comuns são o desmatamento, a destruição de bens públicos, presença de gado, a extração ilegal da flora e o distúrbio da avifauna;
As principais dificuldades das coordenações são carência de recursos humanos em geral, ausência de infra-estrutura para visitação e falta de informação e orientação para o visitante.
Diante desta situação, surge, mais que em boa hora, um documento chamado “Diretrizes e Recomendações para o Planejamento e a Gestão da Visitação em Unidades de Conservação”. Este trabalho encontra-se em construção, no entanto, a Diretoria de Áreas Protegidas da Secretaria de Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente, que executa este trabalho no momento, divulgou uma primeira versão (agosto de 2005), por onde podemos identificar diversos avanços nesta questão.
O documento busca aprimorar e explicitar os princípios da visitação em unidades de conservação, além de apresentar um conjunto de diretrizes que se subdividem em: segurança na visitação; interpretação ambiental; participação das comunidades locais; desenvolvimento local e regional; gestão da visitação e unidade, atividades comerciais e concessão de serviços para visitação; condução de visitantes e diretrizes para algumas atividades específicas, como caminhadas, mergulho, canoagem, ciclismo, visita a cavernas, montanhismo, etc.
Cada unidade de conservação possui vocações específicas para cada tipo de atividade, seja ela esporte de aventura ou não, por isso, é necessário que através das regulamentações locais, principalmente por meio do Plano de Manejo de cada unidade, as coordenações regulamentem de maneira detalhada as recomendações e diretrizes para visitação, pois este documento apresentado não tem capacidade de atender as recomendações para todos os casos no Brasil de forma geral.
O ecoturismo tende a crescer bastante no Brasil nos próximos anos, pois a cada dia percebe-se que seus atrativos são realmente interessantes e merecem destaque, no entanto, espera-se que esta atividade caminhe paralelamente a um excelente planejamento, seguido de uma boa gestão e recursos financeiros necessários, para que num futuro bastante próximo, possamos contar com uma atividade ecoturística no Brasil mais responsável, envolvendo as comunidades locais/tradicionais, valorizando e respeitando seus devidos modos de vida e utilizando os recursos naturais de forma adequada, pois estes, na verdade, são os próprios atrativos turísticos do local.
Assim, estes três documentos resumidos aqui simbolizam um avanço para a atividade no Brasil, pois é desse modo que alcançaremos excelentes diagnósticos e prognósticos que irão, de certa forma, subsidiar o desenvolvimento do ecoturismo, baseado em seus reais princípios.
* É geógrafo, Mestre em Análise Ambiental pela Universidade Estadual de Maringá (PR).
Contato: fmanosso@yahoo.com.br