O primeiro relato dos geoglifos no Acre data de 1977, quando uma expedição encontrou diversos desses estranhos sinais geométricos, espécies de anéis de terra com até 100 metros de diâmetro, na Fazenda Palmares, situada ao longo da BR-317, rodovia que liga Rio Branco a Xapuri.
“A terra vem de valetas escavadas na parte interna do anel, tendo sido acumulada do lado de fora. Em largura, um conjunto valeta e muro atinge oito ou dez metros”, escreveu o pesquisador Ondemar Dias, que participou da missão na década de 1970, no livro Arqueologia Brasileira, de Andre Poirier Prous, da UFMG – Universidade Federal de Minas Gerais, publicado em 1991.
“Mas tudo isso ficou esquecido, como se fosse algo sem importância”, conta o paleontólogo Alceu Ranzi à Agência FAPESP. Em 2000, durante um vôo comercial entre Porto Velho e Rio Branco, o pesquisador, que também fez parte da expedição de 1977, voltou a observar os geoglifos. Foi então que Ranzi, atualmente ligado à Universidade Federal do Acre e à Universidade Federal de Santa Catarina, em dois programas de pós-graduação, decidiu resgatar a história.
O resultado é o livro Geoglifos da Amazônia – Uma perspectiva aérea, lançado no final de novembro e que já está com a primeira tiragem quase esgotada – uma nova deve sair em 2005. Escrito com a colaboração do antropólogo Rodrigo Aguiar, coordenador de pesquisa e extensão da Faculdades Energia, de Santa Catarina, a obra traz uma leitura nova das mais de 60 inusitadas formações. O trabalho é repleto de imagens aéreas, feitas pelo fotógrafo Edison Caetano.
“Há círculos simples, círculos duplos, quadrados, quadrados duplos, círculo com quadrado interno, quadrado com círculo interno, hexágono, octógono e quadrados em forma de U duplo e em forma de D”, conta Ranzi. O pesquisador concorda com a tese de que a revelação dessas estruturas no Acre, em 2000, apenas ocorreu porque o desmatamento na região também aumentou nas últimas décadas.
“Mas isso não significa que os construtores desses desenhos geométricos na terra – cuja idade varia entre 800 e 2,5 mil anos – desmataram a floresta”, explica. Para Ranzi, na época da construção das estruturas, a região teria sido uma savana ou espécie de cerrado. “Isso implica alterações climáticas. Também implica que a Floresta Amazônica, na região do Acre, seria muito jovem e não seria ‘virgem’, e sim uma floresta antropizada”, disse.
Interpretações – Para Rodrigo Aguiar, a descoberta dos geoglifos do Acre ajuda a sustentar ainda mais a hipótese que ele e vários outros autores internacionais defendem em relação à Amazônia. “Novos estudos arqueológicos estão modificando o panorama da arqueologia, que está se mostrando palco de importantes e revolucionárias descobertas”, afirma.
Além dos geoglifos, o achado de grandes volumes materiais (especialmente cerâmica) e de obras de engenharia (como estradas, barragens e terraplenagens) aponta para uma tendência clara. “A Amazônia foi habitada por um grande contigente populacional, podendo ainda, em algumas regiões, ter sido ocupada por estruturas civilizatórias”, acredita Aguiar.
Sobre os geoglifos do Acre, o antropólogo apresenta duas suposições interpretativas: ou as estruturas serviram para a defesa do grupo ou, então, estariam associadas a rituais religiosos ou a cemitérios.
Os geoglifos brasileiros, para Aguiar, também apresentam características bem particulares. Isso não permite, segundo ele, que seja estabelecida uma relação direta entre os desenhos brasileiros e os famosos geoglifos encontrados em Nazca, no Peru, que deram origem ao livro Eram os Deuses Astronautas?, lançado em 1968 por Erich Von Däniken, e depois transformado em filme de grande sucesso.
A edição de Geoglifos da Amazônia – Uma perspectiva aérea foi financiada pelas Faculdades Energia. A Fundação Elias Mansour, do governo do Acre, bancou a produção das imagens. Mais informações sobre o livro podem ser obtidas com Rodrigo Aguiar: rsimas@brturbo.com . (Eduardo Geraque / Agência FAPESP)