A indústria madeireira na Amazônia cresceu em área e em lucros. Em cinco anos, de 1998 a 2004, dez regiões se tornaram grandes pólos madeireiros. Novas fronteiras estão sendo ocupadas pela atividade, em áreas de floresta relativamente intacta, como o sudeste do Amazonas.
Por outro lado, a indústria está mais eficiente, agrega mais valor à produção e consome menos matéria-prima: em cinco anos, 950 mil árvores foram poupadas da motosserra.
Os dados são de um novo estudo da organização não-governamental de pesquisas Imazon – Instituto do Homem e Meio Ambiente na Amazônia, obtido pela Folha de São Paulo. A pesquisa, que será apresentada nesta quarta-feira (30) na Câmara dos Deputados, em Brasília (DF), representa a segunda etapa do maior e mais completo diagnóstico do setor madeireiro já realizado na Amazônia.
O primeiro raio-X da madeira na região havia sido feito pelo Imazon em 1998. O novo levantamento traz o panorama da indústria em 2004. Juntos, os dois estudos permitem, pela primeira vez, fazer comparações e apontar tendências para essa atividade, que é a principal forma de uso da terra na Amazônia Legal.
Algumas notícias são preocupantes. Entre 1998 e 2004, a atividade madeireira se expandiu para novos eixos, como a BR-163 (rodovia Cuiabá-Santarém), no oeste do Pará, o noroeste de Mato Grosso e o sudeste do Amazonas, na região de Apuí.
As três áreas contêm vastos trechos de floresta relativamente intacta e estão ligadas por estradas – no caso do Amazonas, uma rede de estradas clandestinas – por onde a produção pode escoar. O número de pólos madeireiros, ou seja, municípios cujas serrarias produzem mais de 100 mil metros cúbicos ao ano, subiu de 72 em 98 para 82 em 2004.
“Pelo que eu entendo, está havendo uma substituição da base madeireira na Amazônia. Hoje, 25% da produção está ao longo da BR-163. A indústria está subindo, se mudando de Sinop e Guarantã (MT) e da BR-364 (RO)”, disse à Folha de São Paulo Roberto Smeraldi, da ONG Amigos da Terra, que teve acesso aos dados do Imazon.
“Se você associa isso ao fato de que caiu o consumo total de madeira, vê que em muitos pólos a produção sumiu. Isso me preocupa muito”. Segundo Smeraldi, isso pode refletir o esgotamento da matéria-prima (ou seja, da floresta) em algumas regiões.
O estudo traz também boas notícias – algo raro numa Amazônia que ainda se recupera do assassinato da freira Dorothy Stang, em fevereiro. A que mais surpreendeu os pesquisadores do Imazon foi que o consumo total de madeira em tora caiu de 28,3 milhões de metros cúbicos para 24,5 milhões, mas a produção de madeira serrada, laminados e compensados, por exemplo, se manteve praticamente constante (até subiu, mas dentro da margem de erro da pesquisa).
Commodity rara – “Até nós esperávamos que o consumo tivesse subido, para 30 milhões ou 32 milhões de metros cúbicos”, disse o engenheiro florestal Adalberto Veríssimo, do Imazon, co-autor do estudo juntamente com Marco Lentini e Denys Pereira. Mais surpreendente é o fato de que a indústria não teve nenhum ganho tecnológico no período 1998-2004.
Segundo Veríssimo, a explicação mais provável é o acirramento da fiscalização por parte do governo e o cancelamento de centenas de projetos de manejo irregulares a partir de 2003. Em 2002, havia 3.000 planos de manejo florestal na Amazônia. Em 2004, esse número havia caído para 1.186.
O Ibama – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis também deixou de aprovar projetos de extração em terras públicas, o que causou protestos de madeireiros. “A madeira legal virou uma commodity rara”, diz Veríssimo. “Quem tem um estoque legalizado passou a aproveitá-lo melhor.”
Smeraldi discorda. “A ação do governo pode influenciar os planos de manejo, que são a “elite” do setor madeireiro. Mas grande parte da madeira é oriunda de autorizações de desmatamento”, diz.
Para o ambientalista, a redução no consumo é mais uma resposta a um fator de mercado: o aumento da lucratividade das exportações, que fez com que parte do “segmento mais qualificado” se convertesse a um perfil empresarial que agrega mais valor à produção.
O aumento do valor agregado é outra boa notícia. O valor das exportações de produtos beneficiados, como portas, janelas e decks, subiu quase 15 vezes – de irrisórios US$ 1,25 milhões em 1998 para US$ 178 milhões em 2004. “O panorama é mais positivo que em 1998”, diz Veríssimo. “Mas o grande nó é fundiário. Se não houver uma solução, o setor vai continuar na ilegalidade.” (Claudio Angelo / Folha de São Paulo)