Os índios Macuxi contrários à homologação da reserva Raposa Serra do Sol (RR) em área contínua não querem mais a tutela da Funai – Fundação Nacional do Índio e exigem, como condição indispensável para evitar novos conflitos, que policiais federais e funcionários do Ibama – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis deixem a área.
A libertação, ocorrida no último sábado (30), dos quatro policiais tomados como reféns, depois de nove dias de cativeiro, reduziu a tensão, mas não diminuiu a animosidade. “Se encontrarmos policiais andando pela área da reserva vamos prender de novo e amarrar”, ameaçou um dos líderes, Abel Barbosa, durante a reunião no Palácio do Governo, em Boa Vista, para discutir o pacote de medidas compensatórias para Roraima.
Os dois líderes da aldeia Flexal, Lauro Barbosa e Altevir de Souza, insistiram que, do governo federal, só querem parceria para a execução de projetos. A reunião foi presidida pelo governador Ottomar Pinto e estavam presentes o superintendente da Polícia Federal, José Francisco Mallmann e dois enviados do governo: Celso Corrêa, o assessor da Casa Civil, e Camilo Menezes, do Gabinete de Segurança Institucional. Ninguém contestou os índios.
A Polícia Federal começou a deixar a região neste final de semana. É o desmonte de uma operação anunciada pelo governo para manter a ordem e que acabou virando um conflito dentro do conflito. Os outros órgãos como Funai e Ibama já não tinham nenhuma influência sobre os índios que são contra a emancipação. “O comando lá dentro deve ser do governo do Estado”, enfatizou o cacique Lauro Barbosa. O governo federal tem um ano para retirar os brancos e implementar as medidas de substituição das ações estaduais anunciadas quando o decreto foi editado.
Uma forte divisão entre os próprios Macuxi dificulta um entendimento. Os que são a favor da homologação, reunidos em torno do CIR – Conselho Indígena de Roraima, querem os brancos fora da área. Os Macuxi ligados à Sodiur – Sociedade de Defesa dos Índios Unidos de Roraima defendem a permanência das quatro comunidades excluídas pelo decreto – Socó, Mutum, Surumu e Água Fria – e a continuidade da parceria com os arrozeiros. Num documento com doze reivindicações, pedem a inclusão da Raposa Serra do Sol, no programa Luz Para Todos do governo federal e a concessão de 250 bolsas por ano para estudantes índios nas universidades federais e linhas de crédito junto ao Banco da Amazônia e Banco do Brasil.
Com o cacife de quem garantiu a libertação dos reféns, o governador Ottomar Pinto admite que a homologação é uma decisão de Estado consumada. “Se tivesse que anular o decreto, seria melhor o presidente renunciar”, diz. Ele sugere, no entanto, que o governo seja flexível quando for definir as medidas de compensação. Entre as reivindicações do governador estão a preservação das comunidades excluídas pelo decreto e as áreas produtivas controladas pelos arrozeiros – o centro de toda a crise – e a definição da situação fundiária de Roraima, que Ottomar Pinto considera “angustiante”.
De um total de 22 milhões de hectares, o Estado tem em sua base territorial cerca de dois milhões de terras agricultáveis ou algo em torno de 7% de todas as terras, parte delas alagada na época das cheias pelo Rio Branco. Mais de 90% das terras do Estado estão sob o controle da União. São reservas indígenas ou áreas de preservação ambiental, em cujo subsolo há um verdadeiro e diversificado tesouro em minério. (Vasconcelo Quadros/ Estadão Online)