O homicídio de crianças portadoras de deficiência física, de gêmeos ou filhos de mães solteiras, praticado por algumas tribos indígenas brasileiras por tradições culturais, foi um dos temas polêmicos debatidos nesta segunda-feira (31), em Curitiba (PR), durante o Encontro Brasileiro de Direitos Humanos.
“Entre os Yanomami, o erroneamente chamado “infanticídio”, é a principal causa de morte de crianças com menos de um ano de idade. Em 2004, 68 crianças foram mortas, e em 2005 foram 98”, revelou em sua palestra “Culturalismo e Direitos Humanos”, a pesquisadora Maíra de Paula Barreto, doutoranda em Direitos Humanos pela Universidade de Salamanca, da Espanha.
“Não existem números oficiais de quantas crianças são mortas anualmente no Brasil por questões culturais, mas sabe-se que são centenas”, afirmou.
Paula Barreto questionou os participantes: o que seria correto prevalecer nesses casos, a cultura ou o direito à vida?
Segundo Paula Barreto, mesmo sendo uma tradição de longa existência, os pais sofrem quando cometem este ato. “Alguns se suicidam logo após, acometidos de tristeza e depressão”.
Há casos, segundo a pesquisadora, em que os pais desafiam a cultura de seu povo para tentar salvar a vida de seus filhos, como o de duas crianças da etnia suruwahá, do Amazonas, uma com pseudo-hermafroditismo e outra com paralisia cerebral. “Os pais pediram ajuda do governo para tentar curá-las, se negando a matá-las”, revelou.
Uma criança foi operada no final de em São Paulo e já retornou para a tribo. A outra, está internada no Hospital Sarah Kubitscheck, em Brasília (DF). “São crianças, são deficientes e são indígenas, portanto deveriam ser triplamente protegidas e amparadas legalmente”, defende Paula Barreto.
Os homicídios, segundo a pesquisadora, são por asfixia – as crianças são enterradas vivas – ou envenenamento, ou por abandono num matagal. Na opinião de Paula Barreto, governo e o povo indígena têm que discutir sobre costumes que entram em choque com o direito à vida.
Uma das alternativas propostas no encontro para resguardar a vida destas crianças seria uma política de incentivo à adoção, por meio do diálogo. “Como a criança é recém-nascida, poderá formar sua identidade em outra sociedade que a acolha”, disse.
Outra proposta é o governo providenciar tratamento médico e depois reintegrá-las às famílias. “O que não se pode permitir é que práticas culturais locais sejam desvinculadas dos princípios fundamentais dos direitos humanos universais”, afirmou a pesquisadora. (Lúcia Nórcio/ Agência Brasil)