Acidente no Brasil resultou em variedade “assassina” de inseto

O ano é 1956. Após ganhar um prêmio em dinheiro, o geneticista brasileiro Warwick Kerr resolveu que viajaria à África para estudar abelhas. Por um pedido do governo de Juscelino Kubitschek de Oliveira, ele deveria trazer um carregamento de insetos na sua viagem de volta.

“Os fazendeiros de Goiás estavam interessados na abelha africana por causa da produção de mel, então eles me pediram para trazê-las”, lembra-se Kerr, hoje professor da Universidade Federal de Uberlândia. A viagem marcaria a introdução de uma nova subespécie no país.

Na volta, por problemas logísticos, os insetos trazidos da África – na viagem o geneticista passou por Angola, Moçambique e África do Sul -, não puderam ficar na Universidade Federal do Rio de Janeiro. “Eles foram colocados em uma mata, a 20 quilômetros de Rio Claro (SP). E, por um descuido meu, 19 abelhas, das 44 que estavam lá, enxamearam [formaram enxame]”, diz Kerr.

Em um único vôo nupcial, uma fêmea é fecundada por 18 machos. E foi o que ocorreu. “A espécie trazida da África cruzou com machos da mesma espécie, mas que haviam sido trazidos da Europa”, explica Kerr. A prole oriunda desse vôo mostrou um comportamento bem mais agressivo. Por causa disso, ela recebeu o apelido de assassina. Alguns anos depois, essa variedade se espalhou pelo resto das Américas – eliminando daqui a A. mellifera pura.

“O gênero Apis é provavelmente asiático, mas a espécie mellifera pode ter surgido na África’, explica Kerr. É exatamente essa a conclusão do trabalho realizado por Charles Whitfield, da Universidade de Illinois, e colaboradores. O artigo, publicado hoje na “Science”, aborda a migração das abelhas a partir dos dados de seu genoma.

A hipótese é que a Apis mellifera surgiu na África e teve duas ondas migratórias inicialmente. Uma para o oeste e o norte da Europa e outra para a Eurásia. A “terceira” onda ocorreu por mãos humanas e veio dar no Brasil, onde surgiu a abelha “assassina”.
(Fonte: Folha de S. Paulo)