Aprovado em 2005 na Europa, mas ainda sem aval nos EUA, o ultra-som chegou ao Brasil em outubro último e tem provocado uma verdadeira corrida de homens e mulheres às clínicas. Todos dispostos a pagar de R$ 1.200 a R$ 2.500 por sessão. Alguns locais têm fila de espera de dois meses.
A promessa do aparelho é tentadora: sem dor, corte ou anestesia, a pessoa perderia em média 2 cm de medida corporal, o que pode chegar a 300 g de gordura por sessão – o equivalente a 11 Big Macs. Cada sessão dura de uma a duas horas. O recomendável é fazer, no mínimo, três sessões, com intervalos de um mês cada uma.
O princípio da máquina é semelhante ao da litotripsia (o aparelho que quebra cálculos renais). Por meio da emissão de ondas acústicas, as células gordurosas vibram até romper-se. Depois são jogadas na corrente sangüínea, metabolizadas pelo fígado e eliminadas por meio das fezes, da urina e do suor.
Os médicos que utilizam o aparelho dizem que a quantidade de gordura despejada no sangue é segura. Porém, para endocrinologistas e cardiologistas, se a gordura eliminada por sessão atingir 300 g (segundo informa o fabricante), a pessoa pode apresentar problemas no fígado, pâncreas e pulmão.
“Não há problema [com a descarga de gordura no sangue]. É como comer uma feijoada ou uma porção de batata frita”, garante a dermatologista Shirley Borelli. Desde outubro, ela tem a agenda lotada para uso do ultra-som. São cerca de seis sessões por dia e uma fila de espera até março.
Borelli afirma que soube que o aparelho está em fase de aprovação na Anvisa e que decidiu antecipar o uso porque se sente segura com o ultra-som. “Nós trabalhamos com o Botox dez anos sem FDA [agência reguladora de medicamentos dos EUA] approval [aprovação] e sem Anvisa approval. Não quer dizer que não seja seguro”, argumenta a dermatologista. Ela contra-indica o método a pessoas com danos hepáticos e metabólicos.
Já o dermatologista Nuno Osório, que também trabalha com o aparelho, alega que não sabia da situação irregular do ultra-som. “Estou pasmo com essa história.” Ele comenta que não checou na Anvisa se o aparelho tinha aprovação porque confia no fabricante. “Existe o certificado europeu. As pesquisas mostram que é seguro.”
Na opinião do cardiologista Raul Dias dos Santos, do Incor, não há estudos científicos controlados que garantam a segurança no uso do ultra-som. Para ele, um risco teórico seria a migração de pedaços maiores de gordura para o pulmão, gerando a embolia gordurosa – uma inflamação pulmonar grave que pode matar.
“O risco de complicação depende da quantidade de gordura, do tamanho e de como ela cai na circulação sangüínea.”
Para ele, se a pessoa já tiver níveis altos de triglicérides, o excesso de gordura também pode levar a uma pancreatite (inflamação do pâncreas).
O endocrinologista Marcio Mancini, médico do grupo de obesidade do Hospital das Clínicas de São Paulo, é enfático: “[o ultra-som] não é seguro nem eficaz. As pessoas que querem perder gordura localizada são uma presa fácil. Tudo o que elas querem é alguém com uma lábia boa, que prometa milagre. Ultra-som na barriga, choquinho, injeção, nada disso resolve. O que funciona é lipoaspiração e cirurgia plástica.”
Segundo Mancini, se for verdade a promessa do aparelho de “derreter” 300 gramas de gordura por sessão, o risco à saúde é grande. “Pode levar o acúmulo de gordura no fígado, gerando a esteatose hepática.”
O cirurgião plástico Elvio Bueno Garcia, da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), endossa: “Esses modismos vendem sonhos, prometem o pedacinho do céu. E sempre terá alguém querendo comprar.”
A despeito da polêmica, mulheres que fizeram uso do ultra-som acreditam nos seus benefícios. Na última terça, a executiva Mara, 51, vibrava com a perda de 2 cm de medida corporal após três sessões. “A mudança é evidente. Desaparece aquela gordura mole.”
(Fonte: Cláudia Collucci / Folha de S. Paulo)