Mais da metade da população que hoje vive na Amazônia Legal é originária de outros estados, principalmente das regiões Nordeste e Sul do Brasil. Enquanto os nordestinos se concentram nas proximidades da rodovia Belém-Brasília, nas margens do rio Amazonas e no estado do Maranhão, os sulistas se fixaram nas margens da BR-364 e no norte do Mato Grosso, região da fronteira agrícola. Em Rondônia, há uma grande quantidade de migrantes capixabas e mineiros.
Esse processo de ocupação da Amazônia é apresentado nos mapas lançados nesta quinta-feira (25) pelo IBGE – Instituto Brasileiro de Geografias e Estatística. O diretor de Geociências do IBGE, Guido Gelli, destacou que por trás de cada homem que foi buscar o ouro em Carajás ou que trabalhou na construção da rodovia Transamazônica, nos anos 70, há uma família. E somente com o conhecimento desta dinâmica populacional é que as áreas com potencial para aproveitamento comercial na Amazônia poderão ser utilizadas.
Para Guido Gelli, a população amazônica é uma grande representante da força da floresta, que vem barrando o avanço do desmatamento. “A Amazônia tem essa pujança, representada pela própria ministra Marina Silva (do Meio Ambiente), pelo Chico Mendes (líder seringueiro), pelo Jorge Viana (ex-governador do Acre). Essa resistência da população é percebida mesmo com todo o avanço da pecuária, da agricultura e com a ocupação das pessoas que buscaram o Eldorado”, disse.
De acordo com os mapas, a população originária da região Norte permaneceu concentrada nas margens dos rios, principalmente na região oriental da floresta. Como explicaram os coordenadores da pesquisa, há entre os nortistas uma grande mobilidade, motivada por questões econômicas, que os levam a procurar outras cidades as quais se tenha acesso fluvial ou as grandes capitais da região.
Guido Gelli acredita que a noção de propriedade coletiva da Amazônia acabou sendo atropelada pela ocupação da área. “Chico Mendes dizia que não era socialista, que não queria distribuição de terras e nem reforma agrária, mas simplesmente o reconhecimento do direito dele, de sua família e de seus companheiros, de explorar aquela terra. Como eles, fomos acostumados a explorar. Os seringueiros saiam coletando a borracha na Amazônia sem se preocupar quem era o dono daquela terra”.
De acordo com o diretor do IBGE, a pecuária extensiva, que tem pouco retorno financeiro, e posteriormente a exploração de grãos, lucrativa, se impuseram sobre os costumes coletivistas locais. “Hoje o Brasil é um grande exportador de grãos, mas é preciso entender, conhecer um pouco mais para valorar esse nosso potencial da biodiversidade, da borracha, da castanha, das oleaginosas, antes de simplesmente destruir, alagar, ocupar e desmatar. É o banco de dados que vai permitir esse entendimento”, acrescentou.
O mapa retrata a estrutura fundiária da Amazônia, mostrando que a incorporação de terras à área de fronteira agrícola amazônica está sendo feita por um processo de reafirmação da desigualdade na distribuição de terras.
”A fronteira agrícola amazônica é caracterizada por áreas de baixas densidades demográficas, o que desmistifica a idéia de que é a povoação de forma massificada do Amazonas que gera o desmatamento. Pelo contrário, como explicaram os coordenadores do trabalho, a mecanização acaba gerando um vazio demográfico nas áreas fronteiriças. O estado do Mato Grosso, por exemplo, tem uma população rural menor do que o Amazonas”, explica Guido.
De acordo com o mapa, o nível de concentração fundiária na região é extremamente alto: 18% dos municípios da fronteira agrícola amazônica estão acima da média de concentração fundiária nacional, já considerada alta; 48% dos municípios desta fronteira apresentam média concentração fundiária e 52% atingem índices que qualificam alta concentração. (Luiza Bandeira/ Agência Brasil)