Um estudo publicado na última edição da revista científica Science afirma que a derrubada de florestas para criação de pastagens ou plantações na Amazônia tende a provocar uma elevação inicial rápida nos índices de desenvolvimento humano local, mas a vantagem desaparece na medida em que o desmatamento avança.
Para chegar a essa conclusão, os cientistas compararam os Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) de 286 municípios amazônicos em diferentes estágios de desmatamento, tendo como base o ano 2000.
O IDH é uma metodologia desenvolvida pela Organização das Nações Unidas (ONU) para medir a qualidade de vida e inclui indicadores como renda, expectativa de vida e nível de educação.
Nos municípios que estão nos estágios iniciais do desmatamento ou nos quais o ritmo de desmatamento é alto, os pesquisadores encontraram índices de desenvolvimento humano próximos aos da média nacional e acima da média regional.
Nos municípios com pouco ou nenhum desmatamento e nos municípios com taxas de desmatamentos superior a 60% da área, os índices de desenvolvimento são similares e baixos quando comparados à média nacional.
Duas velocidades – Segundo os pesquisadores, isso sugere que “a expectativa de vida, nível de educação e padrão de vida melhoram mais rápido do que a média nacional nos municípios nos estágios iniciais do desmatamento”.
Mas, em um segundo estágio, as condições de vida passam a melhorar num ritmo inferior à média nacional.
O resultado, argumenta o estudo, é que “em termos líquidos, pessoas em municípios que derrubaram suas florestas não estão melhores do que aqueles em muncipíos que não o fizeram.”
De acordo com o artigo, a explicação mais provável para o progresso inicial é que “as pessoas se beneficiam dos recursos naturais disponíveis e da melhora no acesso aos mercados oferecida por novas estradas”, assim como de investimentos públicos em infra-estrutura, educação e saúde.
A decadência nos padrões de vida “provavelmente reflete a exaustão dos recursos naturais que sustentaram o boom inicial, aliada ao aumento da população local”.
O argumento é sustentado por estatísticas que mostram não só a redução da produtividade da exploração da madeira, como também da agricultura e da pecuária – o que “provavelmente reflete a degradação em larga escala dos pastos pela perda de produtividade do solo ou alterações no uso das terras por conta de mudanças nas condições do comércio de terras”.
Medidas – Para os pesquisadores, o problema “provavelmente não tem uma solução única”.
Entre as medidas propostas, estão apoio a um uso melhor das áreas já desmatadas, restrições a novos desmatamentos e reflorestação de áreas degradadas”, além de incentivos a atividades sustentáveis, como manejo florestal e pagamento por serviços ecológicos.
O estudo é assinado por pesquisadores do Instituto Superior Técnico de Portugal, do Imazon, do Centre d’Ecologie Fonctionnelle et Evolutive, da França, e das universidade britânicas de Cambridge, Imperial College London e de East Anglia e coordenado pela pesquisadora Ana Rodrigues, do Instituto Superior Técnico de Portugal.
Um dos autores, o pesquisador Adalberto Veríssimo, do Imazon (Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia), afirmou à BBC Brasil que o estudo “mostra claramente que desmatamento não compensa, que este modelo baseado na apropriação do patrimônio público não é o caminho nem para o Brasil nem para o mundo”.
O ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, disse à BBC Brasil que o governo está fazendo a sua parte para quebrar o ciclo de expansão-colapso apontado pelo estudo.
“O que faz sair do ciclo de degradação é injetar tecnologia, recursos e pagar (a população local) para fazer a coisa certa”, disse Minc.
O ministro deu como exemplo a nova fase da Operação Arco Verde, iniciada nesta semana pelo governo federal, que deve passar pelos 43 municípios que mais registraram desmatamento, levando informações sobre desenvolvimento sustentável, títulos fundiários e linhas de crédito “verdes”.
Para Veríssimo, o ciclo é consequência do “grande dilema do modelo de desenvolvimento baseado na combinação da extração predatória de madeira, seguida pela pecuária”. E, para ele, a única forma de sufocar essa dinâmica seria o fim da apropriação ilegal de terras públicas.
“No momento em que a MP 458 está dizendo que vai regularizar as terras de quem faz este jogo (de ocupação ilegal, exploração e novas ocupações), está dando um sinal claro de que as pessoas podem continuar ocupando que o governo em algum momento vai anistiá-la. Do jeito que ela está, ela vai criar condições concretas para que o processo continue na Amazônia”, disse Veríssimo. (Fonte: Estadão Online)