A Nasa já tem mais um bom motivo para seguir em frente com seu plano de mandar humanos ao cinturão de asteroides entre Marte e Júpiter: água. A preciosa substância parece estar distribuída, na forma de gelo, por toda a superfície do asteroide 24 Têmis, apontam dois novos estudos. Pode ser um indício de que a própria água responsável pelo surgimento da vida na Terra tenha vindo do cinturão durante os primórdios do Sistema Solar.
Como a visita de astronautas ainda não aconteceu, a pista sobre a presença de água congelada é indireta. Os dois grupos de pesquisa, que incluem gente nos EUA, na Europa e no Brasil, observaram a luz infravermelha que chega até a superfície do asteroide e é rebatida por ele. Dependendo da composição do astro, a “assinatura” desse infravermelho varia, explica a astrônoma Thais Mothé-Diniz, da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). Ela é coautora de um dos estudos na revista “Nature” de quinta-feira (29).
“Esse espectro [luminoso] do asteroide é comparado com as características ópticas de uma série de materiais num modelo de computador, o que indicou a presença de água”, diz ela. O fato de muitos materiais absorverem e refletirem luz de maneira típica é uma mão na roda para os astrônomos, já que essa é uma das maneiras mais práticas para determinar de que é feito um astro distante.
A origem do gelo é mais misteriosa, porque as condições do cinturão de asteroides deveriam, em tese, fazer com que ele sublimasse (ou seja, virasse gás direto, sem passar pela forma líquida). “Achamos que há um reservatório de gelo logo abaixo da superfície, que pode ser trazido para cima, talvez pelo impacto de micrometeoritos ou pela ação do vento solar [fluxo de partículas oriundo do Sol]”, afirma a astrônoma.
Os dados podem trazer pistas sobre o próprio passado da Terra. Isso porque é consenso entre os cientistas que, durante sua formação, há cerca de 4,5 bilhões de anos, o planeta não teria como manter um suprimento considerável de água. Mas a Terra também foi bombardeada por corpos menores durante esse período, entre eles cometas, ricos em gelo, os quais poderiam ter abastecido os ancestrais dos oceanos.
“O que estamos vendo é que não só os cometas, mas também os asteroides podem ter trazido essa água”, afirma Mothé-Diniz. O complicado é saber, tantos bilhões de anos depois, qual fonte contribuiu com quanto da água que seria essencial para a evolução da vida. Aliás, os asteroides também podem ter bombardeado a Terra com suas moléculas orgânicas, “tijolos” químicos precursores dos seres vivos.
O impacto dos achados sobre futuras missões tripuladas pode ser mais direto do que se imagina. Um dos cientistas que estão ajudando a planejar a visita ao cinturão de asteroides é justamente o venezuelano Humberto Campins, da Universidade da Flórida Central, que coordenou o artigo na “Nature” também assinado pela pesquisadora brasileira. (Fonte: Reinaldo José Lopes/ Folha Online)