Cientistas detectam transição de fase da luz

Quando um feixe de laser é intenso o suficiente, ele pode interagir com o ar ao seu redor de formas que geram efeitos surpreendentes.

De acordo com simulações de computador, publicadas em um artigo na Physical Review Letters, o feixe pode se comportar como um gás de partículas quânticas (férmions) ou como uma gota de líquido – e alternar entre os dois conforme sua intensidade aumenta.

A observação dessa “transição de fase da luz” em laboratório poderá ajudar os pesquisadores a confirmar seu entendimento do comportamento dos lasers de alta intensidade no ar, que eles esperam poder usar para melhorar a transmissão de sinais através de longas distâncias.

Luz autofocalizada – Uma fibra óptica confina a luz em seu interior em parte porque seu índice de refração interno – o fator pela qual ela retarda a luz em comparação com o vácuo – é maior do que o índice de refração do material do revestimento externo da fibra.

Um feixe de luz muito intenso propagando-se através de um material pode fazer algo semelhante: ele pode alinhar e distorcer as moléculas vizinhas, tornando o índice de refração maior no centro do feixe do que em suas bordas, o que impede que a luz se espalhe enquanto viaja.

A possibilidade de enviar esse tipo de pulso de laser “autofocalizado” a grandes distâncias pode ser muito importante para aplicações de sensoriamento remoto, como no LIDAR (Light Detection And Ranging), que usa a luz do laser da mesma forma que o radar usa as ondas de rádio.

Sólitons – Mas investigar os detalhes das interações entre a luz intensa e os gases atmosféricos tem-se mostrado um desafio experimental.

Em 2009 uma equipe da Universidade de Bourgogne, na França, conseguiu medir os índices de refração no nitrogênio, no oxigênio e no ar, para um laser infravermelho de alta intensidade.

Eles descobriram que, conforme a intensidade do laser aumenta, o índice de refração primeiro se eleva, mas depois diminui rapidamente acima de uma intensidade de algumas dezenas de terawatts por centímetro quadrado.

“Nós nos inspirados nesses resultados”, conta Daniele Tommasini, da Universidade de Vigo, na Espanha. Em sua pesquisa anterior, Tommasini e seus colegas mostraram teoricamente que esse tipo de dependência da intensidade levaria a algo mais do que simplesmente uma luz autofocalizada, que mantém a luz confinada em uma distância limitada.

Um pulso de luz pode manter uma forma fixa em todas as direções, como ocorre com os chamados sólitons.

Agora, as novas medições deram à equipe a chance de usar parâmetros experimentais reais em seu modelo.

Luz gasosa e luz líquida – Os cientistas ficaram surpresos ao descobrir que, dependendo da intensidade da luz, os sólitons assumem formatos absolutamente diferentes: um pulso de alta intensidade gera um sóliton com intensidade uniformemente distribuída em toda a sua seção transversal, enquanto um pulso de menor intensidade gera um sóliton com alta intensidade no centro do pulso e um gradual declínio em direção às bordas.

A equipe descreve esses estados como tendo uma “pressão” efetiva para fora – uma tendência a se espalhar por causa dos efeitos ópticos padrão – que é exatamente cancelada por sua interação com o gás.

Para os pulsos de alta intensidade, a pressão e a intensidade da luz são matematicamente análogas à pressão e densidade de uma gota de líquido.

A luz é espremida em uma distribuição uniforme com uma fronteira nítida, de forma semelhante à maneira como a tensão superficial de uma gota líquida mantém uma borda bem definida.

Por outro lado, para os pulsos de menor intensidade, a analogia matemática é com um gás de férmions sem carga. Essas partículas, ao contrário dos fótons, repelem-se mutuamente por causa do princípio da exclusão de Pauli.

A equipe já havia explorado a “luz líquida” em um trabalho anterior, mas a idéia da luz fermiônica é nova.

Transição de fase da luz – Intrigados com a possibilidade de forçar uma transição de fase entre essas duas formas estáveis de luz, eles simularam a focalização de uma grade de “filamentos Fermi de luz” em um único feixe.

Eles descobriram que os filamentos colapsam em um único sóliton “do tipo líquido”, de forma muito parecida com gotas coalescendo.

Yuri Kivshar, da Universidade Nacional Australiana, achou a previsão do comportamento de dois tipos de luz “realmente surpreendente”, embora ele saliente que observar a transição da luz fermiônica para a luz líquida pode ser algo difícil de fazer no laboratório.

Ainda assim, Bruno Lavorel, membro da equipe experimental, “concorda fortemente” com Tommasini e seus colegas que a transição prevista pode servir como um teste experimental da compreensão atual do comportamento da luz de alta intensidade no ar. (Fonte: Site Inovação Tecnológica)