Quando se pede para citar um cientista, os americanos são incapazes. Em uma pesquisa recente, a principal escolha, com 47 por cento, foi Einstein, morto em 1955, e a seguinte, com 23 por cento, foi “não sei”. Em outra pesquisa, apenas 4 por cento dos respondentes conseguiram citar um cientista vivo.
Por mais que não tenham sido exercícios estatisticamente rigorosos, eles apontam para algo real: na vida pública americana, pesquisadores são extremamente ausentes. Treinados para ficarem confinados em laboratórios, eles tendem a evitar o alvoroço político, por vezes irracional.
Por exemplo, de acordo com o Serviço de Pesquisa do Congresso, pessoas com treinamento técnico entre os 435 membros da Casa Branca incluem um físico, 22 pessoas com treinamento médico (incluindo dois psicólogos e um veterinário), um químico, um microbiologista e seis engenheiros.
Agora, vários grupos estão tentando mudar isso. Eles querem encorajar cientistas e engenheiros a falar em debates públicos ou mesmo concorrer a cargos públicos. Em se tratando do aquecimento global e um grupo de várias outras questões técnicas, “há uma desconexão entre o que a ciência diz e o que as pessoas percebem que a ciência diz”, disse Barbara A. Schaal, bióloga e vice-presidente da Academia Nacional de Ciências. “Precisamos interagir com o público pelo nosso próprio bem e pelo bem público”.
Scaal lidera o novo Programa de Embaixador da Ciência, no qual pesquisadores serão recrutados e treinados para falar sobre suas especialidades. A ação começará em Pittsburgh, onde cientistas e engenheiros que se especializam em energia serão encorajados a trabalhar com agencias e organizações públicas.
“Estamos procurando pessoas que sejam especialistas em energia e que tenham um real interesse de ir além”, disse Schaal.
Separadamente, um grupo sem fins lucrativos de cinco anos, chamado Scientists and Engineers for America (‘Cientistas e Engenheiros dos Estados Unidos’, em tradução livre), ou SEA, oferece orientação e estímulo a pesquisadores que consideram concorrer a cargos públicos – de corpos docentes locais à Casa Branca e o Senado. Com mais cientistas envolvidos na agenda legislativa, sustenta o grupo, poderia haver melhores tomadas de decisão para temas como financiamentos para pesquisa, matemática e educação científica, e problemas nacionais de infraestrutura.
“Apenas se envolva, o país precisa da sua especialidade, seu pensamento analítico e sua abordagem para temas”, diz Vernon Ehlers, físico que foi ao Congresso em 1993, em um vídeo no site da SEA. “Se você consegue aprender física nuclear, pode aprender política”.
Em uma entrevista por telefone, Ehlers, republicano de Michigan que se aposentou este ano, disse acreditar que um tipo de “arrogância reversa” mantém os pesquisadores fora da vida pública.
“Existem professores que se esforçam para preencher seu formulário para a concessão de US$ 30 mil, ao mesmo tempo que há pessoas que nunca aceitariam, em seu grupo, tomar decisões de US$ 100 milhões na Fundação Nacional da Ciência ou no Ministério da Energia”, disse ele. Ele disse que foi uma “miopia” da comunidade científica e de engenharia de não apoiar “alguns de seus melhores e mais brilhantes quadros” para a vida pública.
Até este ano, Ehlers foi parte de um grupo de três físicos na Casa Branca, junto com Rush Holt, democrata e Nova Jersey, que foi eleito para o Congresso em 1998, e Bill Foster, democrata de Illinois, que ganhou seu lugar em 2008, mas perdeu este ano para um republicano apoiado pelo Tea Party.
Este ano, Ehlers e Foster formaram um comitê de ação política bipartidária, chamado Lista de Benjamin Franklin, cujo objetivo era oferecer a engenheiros e cientistas a credibilidade e o capital que precisavam para trabalhar.
“Cientista, político, patriota”, disse Foster sobre Franklin. “Está tudo na mensagem”.
A Lista de Benjamin Franklin era para ser baseada na Lista de Emily, grupo organizado em 1985 para adiantar a causa de mulheres candidatas que apoiavam os direitos do aborto. Porém, a Lista de Franklin não teria um teste de orientação ideológica.
É fato, no entanto, que o projeto está sofrendo com sua própria natureza: Foster, seu maior organizador, anunciou em maio que seria candidato ao Congresso novamente e por isso, teria de se ausentar da ação. “Não há jeito de eu gerir uma organização não-partidária ao mesmo tempo que estou concorrendo ao Congresso”, disse ele.
Foster, que já foi físico na Fermilab, disse temer que sua saída para fazer campanha pudesse ser um “golpe moral” para a Lista de Benjamin Franklin.
Porém, Ehlers não a declararia como morta, mesmo que o projeto seja mais do que ele consiga dirigir sozinho, especialmente pelo fato de ele estar fora de Washington agora. Disse que esperava que outros abraçassem a ideia.
“Estaria disposto a juntar esforços com eles”, disse ele. “Estou feliz em ajudar”.
Em geral, a esperança de um bipartidarismo técnico está parte na crença – disseminada entre pesquisadores – de que engenheiros americanos, enquanto grupo, tendem a ser republicanos e os cientistas acadêmicos tendem a ser democratas. E em teoria, conforme colocado por Foster, se pessoas em ambos os lados de uma ala podem concordar quanto a “fatos quantitativos” de um tema, diferenças de políticas não necessariamente têm de levar a um amargo conflito partidário.
Em outras ações, a Associação Americana para o Avanço da Ciência oferece parcerias que colocam novos pesquisadores pós-doutorados em escritórios do Congresso e agências federais. E o Programa de Liderança Aldo Leopold oferece treinamentos a pesquisadores ambientais de como se comunicar com o público e formadores de políticas. Um de seus fundadores foi Jane Lubchenco, cientista marinha que abandonou uma cargo de pesquisadora na Universidade Estadual de Oregon em 2008, para liderar a Administração Nacional dos Oceanos e da Atmosfera.
Às vezes, finanças são um problema. “É difícil traduzir em dinheiro algo como isto”, disse Brian D. Athey, professor de informática biomédica na Faculdade de Medicina da Universidade de Oregon e presidente do conselho da SEA. Ele também disse que a SEA não sabia quantos dos cientistas e engenheiros que frequentaram seus treinamentos se candidataram a – ou conquistaram – cargos públicos. “Precisamos de membros informados no Congresso, precisamos de prefeitos informados, precisamos de governadores que entendam a ciência e a engenharia”.
Há muitas esferas de ação para esses esforços, disse Foster, o qual citou “surpreendentes situações de ignorância técnica em ambos os lados do governo”. Ele se lembrou de um colega democrata (cujo nome ele não sabia), defendendo um maior uso de energia eólica “pois moinhos de vento conseguem bons votos” – o que não é, de acordo com Foster, uma base lúcida para a política energética. E havia também um republicano que defendia o desenvolvimento da tecnologia GPS como um exemplo de inovação sem restrições por parte do governo, aparentemente desconhecendo o fato de a tecnologia ser um produto de uma pesquisa patrocinada pelo governo.
Se essas várias ações terão sucesso, é uma pergunta aberta.
Daniel S. Greenberg, autor do livro ‘Science, Money and Politics’ (University of Chicago Press), de 2001, disse em uma entrevista acreditar que as chances de sucesso eram “razoavelmente baixas”, em parte por causa da crença disseminada que tal atividade é inapropriada para pesquisadores sérios ou corrompe sua objetividade. Ele apontou para a eleição presidencial de 1964, quando cientistas organizaram uma oposição ao candidato republicano Barry Goldwater. Goldwater foi derrotado, mas, segundo Greenberg, o esforço deixou muitos cientistas sentindo que “mancharam a ciência”.
Mesmo hoje, quando pesquisadores entram na arena política, “o coletivo da ciência joga isso contra o cientista de alguma forma”, disse Rush Holt em entrevista por telefone.
Alan I. Leshner, psicólogo que encabeça a Associação Americana para o Avanço da Ciência, concordou. Ele recorda que quando era um jovem cientista nos anos 1960, aprendeu que pessoas envolvidas em assuntos fora do laboratório “estavam desperdiçando tempo e resultados”. Ele diz que os jovens pesquisadores de hoje querem que seu trabalho seja “relevante, útil e utilizado”, mas “ainda incorporam essa mensagem de seus mentores”.
Alguns pesquisadores estão preocupados que, se deixarem o laboratório, mesmo que brevemente, nunca poderão retomar o caminho de suas carreiras técnicas.
Todavia, Foster disse que não teve uma diminuição de oportunidades de trabalho interessantes na ciência, depois de seus dois anos no Congresso e acrescentou que tais riscos são parte do serviço público.
“Se você for um executivo, seus negócios saem dos trilhos”, disse Foster.
“Se você for advogado, sua prática irá perder qualidade. Você está pedindo para pessoas fazerem um sacrifício, sem a menor dúvida”.
Em uma entrevista na semana passada, Foster comparou o que chamava de lógica política com a lógica científica, citando o debate acerca do teto da dívida.
“A lógica política é ‘do que posso me livrar dizendo que pessoas acreditarão'”, disse ele. “A lógica científica é ‘quais são as melhores estimativas para os números relevantes'”.
Quando ambas se chocam, disse ele ”a lógica política é avassaladora”.
Ainda assim, ele planeja fugir de sua campanha congressional esta semana para dirigir uma conferência na Universidade Brown, organizada pela Sociedade Física Americana, a maior organização americana de físicos. Ele elaborou o esboço de sua conversa quando estava trabalhando na Lista de Benjamin Franklin. Seu tópico: ser um cientista no Congresso. (Fonte: Portal iG)