Um conjunto de apenas quatro esqueletos, todos com idade em torno de 5.000 anos, bastou para mostrar que a agricultura surgiu no norte da Europa graças a migrações que vieram do sul.
Três dos esqueletos eram de uma população de caçadores-coletores – uma criança de sete anos, uma mulher de cerca de 45 e um homem de 25 anos. O quarto, de uma mulher de 20 anos de idade, veio de uma cultura pré-histórica que já praticava a agricultura nessa época.
Apesar da amostra pequena, a força do estudo vem da análise detalhada do material genético (DNA) do núcleo das células, em vez daquele tradicionalmente feito com o DNA de organelas (pequenos órgãos) celulares, as mitocôndrias. Entre 2% e 5% do DNA dos indivíduos foi analisado, na tática de optar por mais genes, apesar da disponibilidade de poucos indivíduos.
Milhões e milhões – “Nós obtivemos 249 milhões de pares de bases do DNA de restos escavados na Escandinávia e descobrimos que o DNA do agricultor é mais semelhante ao de populações do sul da Europa”, escreveram os pesquisadores da equipe sueco-dinamarquesa que realizou o estudo.
A equipe liderada por Pontus Skoglund, da Universidade de Upsalla, na Suécia, publicou seus achados em artigo na revista especializada americana “Science”.
Na pesquisa, eles afirmam, por outro lado, que o DNA do trio de caçadores-coletores é bem diferente. Sua assinatura genética distinta é mais semelhante à existente em europeus do norte.
“Nossos resultados sugerem que a migração vinda do sul da Europa catalisou a propagação da agricultura e que a miscigenação, na esteira dessa expansão, acabou moldando as características do genoma dos povos europeus modernos”, afirmam os autores do estudo.
O genoma dos caçadores-coletores lembra mais o dos atuais finlandeses, enquanto o do agricultor tinha semelhanças com o material genético de gregos ou cipriotas.
As amostras dos dois tipos de populações eram relativamente contemporâneas, mas elas viviam separadas por uma distância de uns 400 km.
Como os autores lembram no artigo, a agricultura teve origem no Oriente Médio em torno de 11 mil anos atrás e foi introduzida na Europa cerca de 5.000 anos depois.
Passo de tartaruga – É interessante notar que a agricultura, uma tecnologia tão vital e revolucionária, levou em torno de 3.000 anos para alcançar o noroeste da Europa quando se tem em mente a intensa aceleração do desenvolvimento tecnológico humano depois da Revolução Industrial – para não dizer no século 21.
“O que é interessante e surpreendente é que agricultores e caçadores-coletores da Idade da Pedra da mesma época tinham composição genética bastante diferentes e viveram lado a lado por mais de mil anos, até finalmente se misturarem”, declarou um dos autores do estudo, Mattias Jakobsson, também da Universidade de Upsalla.
“Ninguém hoje tem o mesmo perfil genético dos caçadores-coletores originais, embora eles continuem sendo representados na herança genética dos europeus de hoje”, declarou Skoglund.
Os resultados indicam que a expansão da agricultura não foi um processo meramente cultural (a simples disseminação da ideia de que era possível produzir alimentos plantando sementes), mas sim vinculado diretamente à migração de populações de agricultores que vieram do sul, as quais provavelmente se multiplicaram mais do que os caçadores. (Fonte: Ricardo Bonalume Neto/ Folha.com)