Como as descobertas mais importantes da ciência são consequência de pesquisas de base, que muitas vezes não têm aplicações práticas nos primeiros anos, não faz sentido que os governos estabeleçam metas de resultados para direcionar os financiamentos. A reflexão crítica foi feita nesta sexta-feira pelo editor chefe da revista Science, Bruce Alberts, que deu uma palestra sobre excelência científica na Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), na capital paulista.
De acordo com Alberts, que também é professor emérito da Universidade da Califórnia e conselheiro do presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, para assuntos de Ciência e Tecnologia, todos os grandes sistemas, incluindo as universidades, “estão cheios de uma inércia irracional”, que faz os pesquisadores estudarem sempre os mesmos temas, que não levam à inovação. “Para mudar, é preciso de incentivos, e na academia, geralmente, incentivar é oferecer dinheiro às pessoas”, afirmou ele.
No início do governo do presidente Bill Clinton, em 1993, quando Alberts presidia a Academia Nacional de Ciências dos EUA, foi discutido um projeto que tornaria obrigatório aos pesquisadores, para receberem financiamento público, mostrar as aplicações práticas de seus estudos. “A academia viu isso como uma verdadeira ameaça para pesquisas de base. Sabemos que esse tipo de conhecimento leva a grandes resultados, eventualmente, anos à frente, mas nunca somos capazes de predizer quais as consequências”, disse ele.
Para impedir o governo de adotar a medida, os cientistas entregaram a todos os congressistas um estudo de caso sobre o desenvolvimento do GPS, cujas pesquisas, no começo, eram consideradas inúteis, até que muitos anos depois se chegou ao sistema de geolocalização por satélites, muito importante atualmente. Com a pressão, a medida nunca foi adotada. “São as pesquisas de base realmente o que levam, no fim, às mais importantes descobertas”, afirmou Alberts.
Inovação e ensino – Após dar atenção às pesquisas de base, continuou Alberts, o próximo passo para alcançar a excelência da ciência é investir em inovação. E a criação de coisas novas passa pela combinação de vários elementos – quanto mais distantes entre si, mais fértil pode ser a mistura. “À medida que o conhecimento cresce, fica cada vez mais difícil achar as combinações certas, porque você vai ter muitas possibilidades”, afirmou o editor. Segundo ele, é preciso estimular um ambiente de encontros entre os pesquisadores.
No campus da Universidade da Califórnia, onde Alberts dá aulas, os laboratórios são grandes e os equipamentos são compartilhados, algo indispensável para que haja evolução nas pesquisas. Outro fator essencial é promover o encontro das pessoas. “Quando eu vou de uma sala a outra nos diferentes departamentos, sou obrigado a passar em uma sala comum onde os estudantes almoçam e leem jornais”, contou o editor. “Todo mundo está colidindo com todo mundo, e disso surgem estudos e colaborações incríveis.” (Fonte: Portal Terra)