A aparição de tumores na pele de tartarugas-verdes, espécie considerada ameaçada de extinção que vive na costa brasileira, tem chamado a atenção de pesquisadores, que tentam descobrir as causas desta anomalia e como evitar uma epidemia da doença, provocada pela contaminação dos mares por reagentes químicos.
Dados coletados pelo Projeto Tamar, que trabalha com a conservação de tartarugas marinhas, aponta que cerca de 16% da população de tartarugas-verdes presente na faixa litorânea do país sofre do mal chamado fibropapilomatose, associado a um vírus que provoca o surgimento de verrugas de até 30 centímetros de diâmetro na pele dos animais.
Apesar das erupções cutâneas serem consideradas tumores benignos, pesquisadoras do Centro de Energia Nuclear na Agricultura da Universidade de São Paulo, que analisam a doença, afirmam que a queda da imunidade das tartarugas teria relação com a enfermidade e pode abrir brechas no sistema imunológico para outras doenças.
Ainda de acordo com as pesquisadoras, é preocupante a possibilidade de exemplares saudáveis contraírem os tumores devido à convivência com espécimes contaminados – o que aumentaria mais a vulnerabilidade dessas tartarugas.
Para descobrir mais detalhes a respeito, além de buscar formas de prevenção e de preservação das tartarugas-verdes, cientistas investigam como resquícios de despejos químicos podem provocam a fibropapilomatose.
De acordo a doutoranda em Ecologia Aplicada na USP, Silmara Rossi, uma das responsáveis pela análise, compostos orgânicos com cloro despejados em rios ou depositados no solo, mas que entraram em contato com cursos d’água e se encaminharam para o mar, podem ter relação com os casos de tumores nas tartarugas.
Segundo ela, pertencem a este grupo químico os pesticidas, agrotóxicos, além de materiais utilizados na produção de transformadores elétricos. “Esses compostos são persistentes no meio ambiente. Alguns deles foram utilizados na década de 1970, mas ainda tem reflexo na água e no solo”, explica a pesquisadora.
Urbanização prejudica espécie – O acelerado crescimento das zonas costeiras do país pode agravar ainda mais o problema. As tartarugas-verdes usam essas áreas e ilhas do país para alimentação. Costumam desovar na região do Arquipélago de Fernando de Noronha (PE), na Ilha da Trindade (ES) e no Atol das Rocas (RN).
No entanto, a intensificação da expansão urbana já reflete na reprodução e eclosão dos ovos em praias. A atividade pesqueira, caça predatória e a mudança climática também oferecem risco às tartarugas.
Cecília Baptistotte, da coordenação nacional de Medicina Veterinária do Projeto Tamar, afirma que a prevalência da doença é muito maior em regiões densamente ocupadas, ou seja, que registram maiores índices de lançamento de dejetos de esgoto doméstico, industrial e agrícola.
O dado é preocupante, já que de acordo com o relatório “Conjuntura dos Recursos Hídricos”, divulgado em 2011 pela Agência Nacional de Águas, o Brasil coleta 56,6% do esgoto doméstico urbano e apenas 34% deste volume passa por tratamento.
“No país temos registros [da doença] em praticamente toda a costa, menos nas ilhas oceânicas, como Atol das Rocas, Trindade e Fernando de Noronha, que são áreas mais limpas, com nenhuma ou pouca ocupação antrópica”, explica.
Entre 2000 e 2005, a maioria quantidade de casos foi registrada no estado do Ceará, seguido do Espírito Santo e da Bahia. Rio Grande do Norte, São Paulo, Sergipe e Rio de Janeiro também tiveram ocorrências de tumores em tartarugas-verdes.
Ainda é preciso pesquisa, diz especialista – Segundo Cecília, ainda que é preciso muita pesquisa para compreender melhor a enfermidade e seus aspectos epidemiológicos.
Ela afirma que o tratamento da fibropapilomatose é cirúrgico, no entanto, animais que contraem a doença encalham em praias e são resgatados debilitados e sem condições de serem submetidos aos procedimentos de anestesia e cirurgia.
Sobre a conservação dos mares, a médica veterinária afirma que apenas com a criação de políticas públicas é que será possível reduzir o nível de poluentes no mar. “Como as tartarugas-marinhas são espécies altamente migratórias, esses esforço tem que ocorrer não só em um determinado país, mas depende de um esforço global”, complementa. (Fonte: Globo Natureza)