O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) está investigando o extermínio de abelhas por intoxicação por agrotóxicos em colmeias de São Paulo e Minas Gerais. Os estudos com inseticidas do tipo neonicotinóides devem estar concluídos no primeiro semestre de 2015. Trata-se de um problema de escala mundial, presente, inclusive, em países do chamado primeiro mundo, e que traz como conseqüência grave ameaça aos seres vivos do planeta, inclusive o homem.
De acordo com o coordenador geral de Avaliação e Controle de Substâncias Químicas e Produtos Perigosos do Ibama, Márcio Freitas, o órgão está reavaliando, desde 2010, vários produtos suspeitos de causar colapsos e distúrbios em colmeias paulistas e mineiras. Segundo Freitas, que integra o Comitê de Assessoramento da Iniciativa Brasileira para Conservação e Uso Sustentável dos Polinizadores, a intoxicação prejudica a comunicação entre as abelhas e isto impede que elas retornem às colmeias, levando ao extermínio dos enxames.
Proibição – Enquanto as análises dos produtos investigados não são concluídas, o órgão proibiu sua aplicação aérea (por avião) e na época da florada para não prejudicar a ação de insetos, aves e morcegos. “Interessa ao Ibama conhecer o comportamento dos polinizadores, entender seu comportamento e estabelecer medidas de mitigação para protegê-los”, explica Freitas.
Estudos em realizados em todos os continentes mostram que abelhas, marimbondos, borboletas, morcegos, formigas, moscas, vespas, além do beija-flor, estão seriamente ameaçados de desaparecer em função do uso indiscriminado de pesticidas e agrotóxicos na agricultura. É claro que o balé harmônico de polinizadores como o beija-flor em volta das flores, à procura do néctar, encanta homens e mulheres de todas as idades. Mas a maioria desconhece como eles são essenciais à existência e manutenção da vida no planeta.
Dependência – Documentos divulgados em dezembro 2013, durante a reunião da Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços de Ecossistêmicos (IPBES), em Antalya, Turquia, mostram que pelo menos três quarto (75%) das culturas do mundo dependem da polinização por abelhas e outros polinizadores para se desenvolver e gerar frutos. O evento contou com a participação de cerca de 400 delegados representantes de mais de 100 países.
Os participantes decidiram, para os próximos cinco anos, desenvolver um programa de trabalho visando preparar um conjunto de avaliações acerca da polinização e sua relação com a produção de alimentos, degradação da terra e espécies invasoras. O objetivo é fornecer aos formuladores de políticas as ferramentas destinadas a enfrentar a pressão decorrente dos desafios ambientais.
Intoxicação – Espera-se que a primeira avaliação esteja disponível em dezembro de 2015, e o foco será a polinização e a produção de alimentos. Pesquisadores vinculados à IPBES acreditam ser necessárias mais informações a fim de se compreender melhor como a polinização sustenta a produção de alimentos, e avaliar a eficácia das políticas atuais.
Cientistas de todos os continentes concordam que a intoxicação dos polinizadores por agrotóxicos representa uma grave ameaça inclusive à sobrevivência do ser humano, caso nenhuma medida seja adotada. De acordo com a analista ambiental e doutoranda em ecologia e conservação de recursos naturais do Ministério do Meio Ambiente (MMA), Ceres Belchior, esses produtos podem provocar a morte de polinizadores e aves e sugere restringir sua aplicação pelo menos durante a florada.
Como o assunto integra as políticas e ações estruturantes do MMA, o secretário de Biodiversidade e Florestas, Roberto Cavalcanti, enumerou seis eixos temáticos a serem trabalhados sobre vários eixos. Eles incluem as relações entre a polinização e a cultura agrícola; a política para apicultura no Distrito Federal, situado numa região que abriga mais de 500 espécies de abelhas nativas; a elaboração de um projeto de lei voltado ao pagamento por serviços ambientais com polinização; a conservação da biodiversidade e dos ecossistemas naturais, que, no Cerrado, somam pelo menos 12 mil espécies de plantas lenhosas da preferência das variedades de abelhas; as avaliações da política de mudanças do clima e os impactos na polinização; e uma reavaliação do licenciamento de agrotóxicos e pesticidas.
Importância econômica – A mortandade disseminada das abelhas devido ao uso de agrotóxicos foi tema de explanação de Cavalcanti, em audiência pública na Câmara dos Deputados. De acordo com o secretário, 87,5% das espécies de plantas com flores conhecidas no mundo dependem de polinizadores (insetos, aves, mamíferos) para gerarem frutos e sementes sadios.
Segundo Cavalcanti, os polinizadores são tão importantes que 75% da alimentação humana dependem, direta ou indiretamente, de plantas polinizadas ou beneficiadas pela polinização. E esclareceu: “Sem polinizadores, as plantas dependentes não se reproduzem e as populações que delas necessitam declinam e a abelha do mel (Apismellifera) é o polinizador de importância agrícola mais utilizado no mundo”.
Ele se lembrou da importância econômica dos polinizadores, que movem economia mundial. Dados de 2007 mostram que verduras e frutas lideram as categorias de alimento que necessitam de insetos para a polinização, gerando riquezas em torno de R$ 160 bilhões (50 bilhões de euros) para cada uma dessas áreas. Em 2009, o valor econômico anual total da polinização girou na cada dos R$ 489,6 bilhões (cerca de 153 bilhões de euros), o que representou 9,5% do valor da produção agrícola mundial para alimentação humana em 2005.
Frutas e verduras – A cada ano, os polinizadores naturais geram uma economia superior a R$ 483 bilhões, no caso das culturas beneficiadas pela polinização por insetos, e a quantia astronômica de R$ 2,435 trilhões quando se trata dos cultivos dependentes da ação dos polinizadores. O alerta, repassado aos parlamentares, é de que o declínio da quantidade de polinizadores pode levar à redução da produção de frutas, verduras e estimulantes (como café) abaixo do necessário para o consumo atual global.
Insetos, aves e animais polinizadores, como o morcego, estão ameaçados por causa da fragmentação dos habitats naturais, do uso indiscriminado de pesticidas, pela falta de práticas agrícolas amigáveis à sua conservação; surgimento de doenças; e mudanças climáticas inesperadas.
A Iniciativa Internacional para Uso Sustentável dos Polinizadores (IPI, na sigla em inglês), criada no ano 2000 e articulada pela Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), está empenhada em monitorar o declínio de polinizadores, suas causas e seu impacto; resolver a falta de informações taxonômicas (que define os grupos de organismos biológicos) sobre polinizadores; medir o valor econômico da polinização; e promover a conservação, restauração e uso sustentável da diversidade de polinizadores na agricultura e em ecossistemas relacionados.
Falta pesquisa – Nos Estados Unidos, a desordem e a desorientação das abelhas melíferas provocaram a perda de 90% das colmeias. Na Alemanha, França, Suíça e Península Ibérica, o desaparecimento das abelhas foi relacionado ao uso de inseticidas. O problema chegou ao Brasil e causou preocupação o extermínio de 5 mil colmeias de abelhas africanizadas no estado de São Paulo. A questão, segundo Roberto Cavalcanti, é que existem poucos estudos toxicológicos avaliando os efeitos dos pesticidas sobre outras espécies de abelhas, inclusive internamente.
No campo das políticas ambientais, o MMA está imerso em projetos e ações destinadas a evitar maiores prejuízos aos polinizadores. Nos próximos anos, os esforços também se destinam a apoiar estudos acadêmicos, como os inseridos no Projeto de Conservação e Manejo de Polinizadores para uma Agricultura Sustentável através de uma Abordagem Ecossistêmica, iniciado em 2009 e com previsão de término para 2014, mas foi prorrogado até o final de 2015.
O Projeto recebeu investimentos de R$ 67 milhões, executados pelo Fundo das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), tendo esses recursos destinados ao Brasil, Gana, Índia, Quênia, Nepal, Paquistão e África do Sul. O apoio também veio do Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF, na sigla em inglês), no valor de R$ 20,4 milhões.
Mais conhecimento – A iniciativa visa ampliar o conhecimento e oferecer ferramentas acessíveis aos profissionais que trabalham com a polinização; disponibilizar orientações e publicações sobre as limitações desta prática, manejo de serviços relacionados com agroecossistemas (que são a interpretação, avaliação e manejo do sistema agrícola, que permitem conduzir a produção com base nas inter-relações entre os elementos constitutivos desses sistemas, como homem e recursos naturais – solo, água, plantas e organismos e microrganismos – e entre outros sistemas externos, do ponto de vista econômico, social, cultural e ambiental), e valoração socioeconômica da polinização, além de fornecer ferramentas fáceis de serem utilizadas na identificação de polinizadores.
Uma das vertentes do projeto prevê a capacitação de agricultores para conservar e utilizar os serviços dos polinizadores silvestres, bem como melhorar a capacidade de pesquisa e construir ferramentas para desenvolvimento e manejo dos serviços de polinização. Várias culturas já se beneficiam dos resultados desses esforços, como é o caso da produção de melão, maracujá, melancia, abóbora, caju, castanha do Brasil, maçã, canola, tomate e algodão, entre outras.
No caso do algodão, a Rede de Pesquisas dos Polinizadores do Algodoeiro no Brasil, realizou um estudo sobre a atuação das abelhas no incremento da produção nas áreas de Cerrado, no sul da região amazônica e na Caatinga. De acordo com a pesquisadora da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia Carmem Pires, apesar de o algodoeiro não necessitar de polinização para produzir, ficou demonstrado pela Rede de Pesquisas que as flores desta cultura que recebem a visita de abelhas apresentam um aumento de 12%. (Fonte: MMA)