Um experimento recentemente conduzido na Cornell University, nos Estados Unidos, mostrou que, a despeito de serem eletricamente neutros, os fótons podem se comportar como elétrons em presença de um campo magnético. O resultado da pesquisa, da qual participou o brasileiro Paulo Alberto Nussenzveig, acaba de ser comunicado em artigo na edição on-line da revista Nature Photonics.
Nussenzveig é professor titular do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP) e participou do experimento em Cornell com apoio de uma bolsa de pesquisa no exterior da FAPESP.
Uma aplicação possível da descoberta é a construção de isoladores ópticos, que só permitiriam a passagem de luz em um sentido e não no sentido oposto. Um dispositivo desse tipo poderia ser agregado a chips de silício, combinando transmissões ópticas e processamento eletrônico, isto é, integrando comunicações e processamento computacional em um mesmo ambiente.
“O grupo liderado por Michal Lipson, que realizou o experimento, é pioneiro na área”, disse Nussenzveig à Agência FAPESP. A equipe – da qual também fizeram parte Lawrence Tzuang, Kejie Fang e Shanhui Fan – realizou um experimento análogo ao proposto na década de 1950 pelos físicos David Bohm (1917-1992) e Yakir Aharonov (1932), mas utilizando fótons em lugar de elétrons.
Um dos grandes protagonistas da construção da Física Quântica, autor de duas teorias alternativas ao modelo predominante – proposto pela chamada Escola de Copenhague, liderada por Niels Bohr –, o norte-americano Bohm residiu no Brasil e naturalizou-se brasileiro durante os anos 1950, quando foi obrigado a deixar os Estados Unidos para escapar da perseguição política promovida pelo macarthismo. Posteriormente, mudou-se para Israel, antes de fixar residência definitivamente na Inglaterra. Foi em Israel que estudou o efeito depois cunhado Aharonov-Bohm, em parceria com seu então orientando Aharonov.
“Quando um elétron se propaga em uma região do espaço em que existe um campo magnético, o campo faz com que a trajetória do elétron seja alterada. Isso é Física Clássica. O que Aharonov e Bohm fizeram foi considerar o fenômeno no contexto da Física Quântica e demonstrar que a alteração de trajetória pode ocorrer mesmo se o campo magnético for nulo”, disse Nussenzveig.
“Tal efeito quântico acontece desde que o potencial associado ao campo magnético, também chamado de ‘potencial vetor’, não seja nulo e apresente valores diferentes em dois pontos distintos”, prosseguiu.
A explicação é que a energia conferida ao elétron pelo potencial acarreta uma mudança de fase na onda associada ao deslocamento do elétron. É preciso lembrar que todos os entes materiais podem ser descritos como ondas. A constatação do caráter dual, ora corpuscular ora ondulatório, dos entes dos mundos atômico e subatômico foi exatamente um dos pontos de partida para a proposição e o desenvolvimento da teoria quântica.
“Se as variações de fase na ida e volta do elétron por um caminho fechado fossem iguais, ele regressaria ao ponto original com a mesma fase da partida, porque as mudanças ocorridas nos dois trechos se compensariam. Porém, o que acontece no caso do efeito Aharonov-Bohm é que a fase de ida é diferente da fase de volta. E isso acarreta um resultado não nulo”, comentou o pesquisador.
“O que fizemos foi replicar esse experimento, utilizando luz em vez de elétrons”, afirmou Nussenzveig. “E verificamos um deslocamento de fase não recíproco – isto é, diferente em um sentido e no outro – como se fosse induzido por um fluxo de campo magnético. O fato de o deslocamento de fase ser não recíproco significa que a fase acumulada pela luz é diferente conforme a luz é injetada por um lado ou pelo lado contrário do dispositivo.”
É esse comportamento não recíproco que possibilita construir isoladores ópticos, nos quais a luz seja integralmente transmitida em um sentido e não transmitida em outro.
“Nosso estudo partiu da proposta de um efeito Aharonov-Bohm fotônico, e não eletrônico, apresentada por dois coautores do trabalho, Kejie Fang e Shanhui Fan, na revista Physical Review Letters, em 2012.”
“Implementamos essa proposta experimentalmente, utilizando um processo de interferometria óptica conhecido como interferometria de Ramsey”, disse Nussenzveig.
“Foi aí que se deu minha principal contribuição ao estudo, que consistiu em apresentar as analogias do processo experimental com a interferometria de Ramsey. Essa analogia foi bastante útil para que se conseguisse caracterizar adequadamente o dispositivo experimental e observar o efeito”, disse.
Paulo Alberto Nussenzveig e Michal Lipson têm, por assim dizer, a Física em seus DNAs. Ele é filho de Herch Moysés Nussenzveig, nome referencial da física contemporânea no Brasil. E ela, de outro físico ilustre, Reuven Opher, professor titular do Departamento de Astronomia da USP. Nascida em Israel, Michal estudou no Brasil e iniciou sua graduação em Fìsica na USP, concluindo-a no Israel Institute of Technology (Technion), antes de fixar residência nos Estados Unidos, onde atualmente é professora em Cornell. (Fonte: Agência FAPESP)