Recém-chegado de Serra Leoa, onde, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), 783 pessoas já foram infectadas com o vírus ebola, o médico carioca Paulo Reis disse, nesta quinta-feira (21), em entrevista coletiva realizada na sede do Médicos Sem Fronteiras, na Zona Sul do Rio, que o risco de importação da doença existe. Ele não considera, entretanto, que seria um problema tão grande quanto na África, devido à diferença de hábitos culturais.
“O risco de ter um caso importado sempre existe. Entretanto, na minha opinião, não considero que seria um problema mais sério. Os hábitos culturais daqui são diferentes. Aqui, certamente seria controlado rapidamente. É uma população diferente, são hábitos diferentes, é difícil convencer uma população grande de que eles têm de se prevenir. Por exemplo, nas práticas de enterro, eles têm muito contato com o corpo, coisa que não acontece no Brasil. A região em que eu estava era precária. Não tinha rede central de eletricidade, água potável. Com o ebola, o mais importante são as práticas culturais”, afirmou.
Roupa especial – Para entrar em um centro de tratamento de ebola, os médicos têm que usar uma roupa de proteção impermeável que cobre todo o corpo, inclusive o rosto. O médico diz não sentir receio para tratar da doença com equipamentos adequados e fez uma comparação com o trânsito carioca.
“Quando você tem conhecimento do problema e possui mecanismos para se proteger, não considero mais arriscado do que andar no trânsito do Rio de Janeiro, por exemplo. A gente tem uma visão bem clara e os pacientes infectados ficam em isolamento. A vestimenta é quase toda descartada e incinerada depois de usada. Somente a bota, o avental de borracha e os óculos vão para o cloro”, disse.
Para sair da África e retornar ao Brasil, Paulo veio em um voo comum e afirma que teve de responder a um questionário e sua temperatura foi aferida através de um termômetro infravermelho. O médico diz que os sintomas do ebola são muito semelhantes aos da malária, exceto pelo cansaço excessivo.
“Dificilmente alguém vai sair do país com a doença. Durante 21 dias eu continuo a ser monitorado e minha temperatura é aferida. Se eu apresentar febre, tenho que entrar em contato com a sede do Médicos Sem Fronteiras. Na minha opinião, esse controle é suficiente”, revelou.
O médico afirma que, na África, a população nem sempre responde de forma positiva à chegada dos médicos. De acordo com ele, a cultura dos povos acaba afastando os infectados do tratamento. “Muita gente acha que é mito e nem acredita que a doença existe. Você vê criança correndo para o mato quando o carro do Mais Médicos passa. Mas quando já existe paciente sendo tratado e há explicação sobre a doença, eles nos recebem bem e têm disposição para falar e escutar. Essa parte cultural é muito delicada”, afirmou.
Despreparo – O médico ressalta ainda o despreparo de equipes médicas. Segundo ele, as pessoas precisam ser treinadas e monitoradas para haver a certeza de que os procedimentos estão sendo feitos corretamente.
“Vários médicos foram infectados em Serra Leoa, mas ninguém no nosso centro. A gente encontrava muitas equipes despreparadas. Temos vários procedimentos para garantir que não há risco de contaminação. Isso tem que melhorar. Quando deixei o país, a mortalidade estava atingindo em torno de 70% dos pacientes”, concluiu. (Fonte: G1)