O mosquito é o animal mais perigoso do mundo, carregando doenças que matam um milhão de pessoas por ano, como malária, dengue e febre amarela.
Recentemente, o zika vírus, transmitido pelo Aedes aegypti, foi associado ao aumento de casos de bebês com microcefalia no Brasil.
De acordo com o último boletim do Ministério da Saúde, foram notificados 4.180 casos suspeitos de microcefalia até o momento. Destes, 270 foram confirmados, 462 descartados e 3.448 ainda estão sendo investigados.
Há um grande esforço em curso para eliminar os criadouros do mosquito.
Mas isso significa que esses insetos – ou ao menos suas espécies mais perigosas para os seres humanos – deveriam ser totalmente exterminados?
Existem no mundo 3.500 espécies conhecidas de mosquitos, mas a maior parte deles não incomoda os humanos, vivendo de plantas e néctar de frutas.
São apenas as fêmeas de 6% das espécies que sugam o sangue de humanos para ajudá-las a desenvolver seus ovos.
Entre elas, apenas metade carrega parasitas que causam doenças em humanos. Mas o impacto dessas cem espécies é devastador.
“Metade da população global corre risco de contrair uma doença transmitida por mosquitos”, diz Frances Hawkes, do Instituto de Recursos Naturais da Universidade de Greenwich.
“Eles têm um impacto não reconhecido no sofrimento dos humanos.”
A bióloga Olivia Judson apoia o extermínio de 30 espécies de mosquitos.
Ela diz que isso poderia salvar um milhão de vidas e só diminuiria a diversidade genética da família dos mosquitos em 1%.
“Deveríamos considerar essa possibilidade”, disse ao New York Times.
Na Grã-Bretanha, cientistas da Universidade de Oxford e a empresa de biotecnologia Oxitec modificaram geneticamente os machos do Aedes aegypti, fazendo com que carregassem um gene que faz com seus filhos não se desenvolvam corretamente.
A segunda geração morre antes de se reproduzir e começar a transmitir as doenças.
Experiências – Cerca de três milhões desses mosquitos geneticamente modificados foram soltos nas Ilhas Cayman entre 2009 e 2010.
Segundo a Oxitec, houve uma redução de 96% no número de mosquitos se comparado a áreas próximas.
Uma experiência semelhante que está sendo feita na cidade de Jacobina, na Bahia, reduziu a presença do mosquito em 92%, de acordo com a empresa.
Mas existe algum efeito colateral decorrente da eliminação de mosquitos?
Phil Lounibos, entomólogo da Universidade da Flórida, acredita que sim. Para ele, um amplo processo de erradicação seria “perigoso e poderia ter efeitos indesejados”.
Primeiro, porque os mosquitos, que se alimentam principalmente de néctar de plantas, são polinizadores importantes.
Depois, porque eles também servem de alimentos para pássaros e morcegos e suas larvas são consumidas por peixes e sapos.
Por isso, sua erradicação poderia ter efeitos em toda a cadeia alimentar na avaliação de Lounibos.
Há quem acredite que esses dois papéis dos mosquitos – na cadeia alimentar e como polinizadores – poderiam ser rapidamente ocupados por outros insetos.
“Não ficamos em uma ‘terra arrasada’ toda vez que uma espécie desaparece”, diz Judson.
Para Lounibos, porém, o fato desse nicho ser preenchido por outra espécie é parte do problema.
Ele alerta para a possibilidade de os mosquitos serem substituídos por insetos “igualmente ou ainda mais indesejados do ponto de vista de saúde pública”.
E diz que, no caso, a substituição poderia até disseminar mais doenças, e de forma mais rápida do que ocorre hoje.
Conservação – Na avaliação do escritor de ciência David Quammen os mosquitos ajudam a limitar o impacto destrutivo dos homens na natureza.
“Mosquitos fazem florestas tropicais serem praticamente inabitáveis para os humanos”, diz.
Ele lembra que essas florestas, que abrigam um grande número de espécies de plantas e animais, estão sob forte ameaça de destruição.
“Nada fez mais para retardar essa catástrofe nos últimos 10 mil anos que a ação dos mosquito”, diz Quammen.
Além disso, destruir uma espécie não é um assunto apenas científico, mas também filosófico.
Há quem argumente que é inaceitável eliminar deliberadamente uma espécie apenas porque ela é perigosa para os humanos, quando os humanos são perigosos para tantas espécies.
“Nessa linha, (eliminar os mosquitos) seria moralmente errado”, diz Jonathan Pugh, do Centro Uehiro de Ética Prática da Universidade de Oxford.
Ele lembra, porém, que esse não é um argumento que possa ser aplicado a todas as espécies.
“Quando erradicamos o vírus da varíola, nós comemoramos muito. Então acho que precisamos nos questionar se ele (o mosquito) tem algum valor. Se é sensível e, por isso, tem capacidade de sentir dor. Segundo cientistas, mosquitos não têm uma resposta emocional a dor como a nossa”, diz Pugh.
“Também, (precisamos nos perguntar) se temos uma boa razão para nos livrarmos deles. Bem, os mosquitos são os principais transmissores de diversas doenças.”
Toda essa discussão hoje é hipotética, pois apesar de experiências recentes terem conseguido reduzir o número de mosquitos em algumas áreas, muitos pesquisadores dizem que eliminar completamente uma espécie seria impossível.
“Não tem solução milagrosa”, diz Hawkes. “Pesquisas de campo com mosquitos geneticamente modificados tiveram sucesso moderado mas exigiram a liberação de milhões de insetos para cobrir uma pequena área”, diz.
“Conseguir fazer com que todas as fêmeas cruzem com machos estéreis em uma grande área seria muito difícil. Deveríamos tentar combinar isso com outras técnicas.”
Outras técnicas – Há diversos projetos sendo desenvolvidos pelo mundo para reduzir a transmissão de doenças por mosquitos.
No Kew Gardens, em Londres, cientistas estão desenvolvendo um sensor que pode distinguir cada espécie de mosquito de acordo com o bater de suas asas.
Eles pretendem distribuí-los em áreas rurais da Indonésia para ajudar a detectar mosquitos transmissores de doenças.
Na London School of Tropical Medicine, cientistas descobriram como mosquitos fêmea são atraídas por certos cheiros, gerando esperanças de repelentes mais eficazes.
Outra estratégia promissora explorada por pesquisas com mosquitos geneticamente modificados é torná-los resistentes a parasitas que causam doenças.
Na Austrália, o programa “Eliminar a Dengue” está usando bactérias para reduzir a capacidade de mosquitos de passar dengue para pessoas.
“Essa é uma abordagem mais realista para diminuir a transmissão de doenças por mosquitos”, opina Lounibos.
Nos EUA, cientistas criaram um mosquitos transgênico com um novo gene de laboratório que o torna resistente ao parasita da malária.
“Estamos jogando um jogo evolucionário com os mosquitos”, diz Hawkes. “Espero que ganhemos a batalha nos próximos 10 ou 15 anos.” (Fonte: G1)