Donos de florestas freiam o desmatamento e podem ajudar a salvar o planeta

A família de Eve Lonnquist é dona de uma floresta nas montanhas a noroeste do estado do Oregon desde que sua avó comprou a terra em 1919. Seu pai, de 95 anos, ainda mora na propriedade de 64 hectares. E ela e a esposa costumam ir até lá com frequência quando deixam a casa nos arredores de Portland.

Ultimamente, porém, Eve, 59 anos e recém-aposentada, tem pensado no futuro das terras da família. A exemplo de muitos proprietários de pequenas florestas, eles obtêm alguma renda da extração da madeira e gostariam de continuar assim. Mas a família também gostaria de ver sua floresta, com seus abetos de Douglas, amieiros e cerejeiras, protegida do desmatamento ou de ser vendida para empreendedores imobiliários.

“Para nós, a propriedade é a história da nossa família”, diz ela.

Eve Lonnquist examina árvores em sua propriedade em Portland com Logan Sander, um engenheiro florestal
Mais da metade dos 300 milhões de hectares de florestas nos Estados Unidos são de propriedade privada, principalmente de pessoas como Eve, que são donas de até 400 hectares. De acordo com grupos ambientalistas, essas florestas familiares representam um grande e inexplorado recurso para combater os efeitos da mudança climática.

Conservar as árvores e lucrar com elas pode parecer incompatível. Mas Eve espera fazer as duas coisas tirando proveito da capacidade da floresta de limpar o ar, transformando o carbono armazenado em créditos que podem ser vendidos a poluidores que quiserem ou precisarem equilibrar sua pegada de carbono.

“As árvores são a principal maneira pela qual o carbono pode ser removido da atmosfera e armazenado na vegetação em longo prazo”, afirma Brian Kittler, diretor da regional oeste do Instituto Pinchot para a Conservação, que tem um programa no Oregon para ajudar esses proprietários a desenvolver projetos potencialmente rentáveis envolvendo carbono.

Florestas maiores no mundo inteiro já foram requisitadas como depósitos de carbono, por meio de programas como o Reduzindo as Emissões geradas com Desmatamento e Degradação Florestal da ONU, que incentivam a conservação de matas em troca de créditos que podem ser vendidos nos mercados globais de carbono.

Grandes madeireiras, como a Potlatch, também entraram nos mercados, reduzindo a derrubada de árvores a níveis abaixo dos limites legais para receber milhões de dólares em créditos.

Até agora, porém, os proprietários de florestas menores, mesmo os interessados em conservação como Eve, não foram atrás do mercado de depósito de carbono. Muitos nem sequer sabem da sua existência, e os que sabem, por vezes ficam perplexos com sua complexidade.

Alguns proprietários erroneamente acreditam que, para entrar nos mercados de carbono, precisam desistir de toda a receita provinda da extração madeireira. E alguns, relutantes em abrir mão da capacidade de transformar rapidamente árvore em dinheiro, têm se esquivado a assinar um contrato para manter a floresta em pé por um período de 15 a 125 anos.

Ainda mais intimidante, a despesa de levar uma floresta ao mercado de carbono – processo que envolve fazer o inventário das árvores, avaliar o conteúdo de carbono na floresta, estimar o crescimento futuro e se submeter a vários níveis de auditoria – tem sido tão elevada que eliminaria qualquer lucro no caso da maioria dos pequenos proprietários.

Organizações ambientais como o Instituto Pinchot e a Nature Conservancy têm procurado há anos uma maneira de superar esses obstáculos instruindo os proprietários a respeito do potencial dos mercados para gerar renda e encontrar formas de reduzir os custos.

Tradicionalmente, a única ferramenta para gerar receitas tem sido a colheita periódica de madeira. O bacana no carbono é que, em resumo, as pessoas são pagas para melhorar a gestão florestal”

Josh Parrish, diretor do programa Trabalhando com Bosques da Nature Conservancy, que atua com os donos de florestas particulares na Pensilvânia e no Tennessee.

Na verdade, se proprietários de pequenas florestas conseguirem superar os obstáculos, os mercados de carbono podem ser rentáveis, gerando uma grande quantia de dinheiro inicial e, a seguir, pagamentos anuais em valores menores.

Os créditos de carbono da floresta de Eve poderiam trazer estimados US$ 235 mil nos seis primeiros anos e perto de US$ 6 mil no ano seguinte, diz Kyle Holland, diretor da Ecological Carbon Offset Partners, empresa californiana que ajuda pequenos proprietários a entrar nesse mercado.

Eve e sua família ainda podem tirar madeira de forma limitada, desde que sigam um plano de manejo florestal e mantenham um nível estável de armazenamento de carbono por meio do crescimento contínuo da mata.

O argumento econômico para proprietários entrarem nos mercados de carbono deve se fortalecer. As florestas, principalmente em áreas como o Noroeste dos EUA, onde as árvores são altas e grossas, costumam atrair preços mais elevados do que qualquer outra medida conservacionista. E com o pacto climático de Paris do ano passado, analistas esperam o crescimento do preço do carbono, agora entre US$ 3 e US$ 12 por tonelada nos Estados Unidos.

Kittler explica que o instituto de conservação, que subsidia a preparação da floresta de Eve com o auxílio de uma verba federal, e que fez parceria com a empresa de Holland para o projeto no Oregon, diz esperar que isso incentive mais proprietários a entrar no mercado. Eve e outros donos terão a escolha de vender os créditos no mercado global ou no da Califórnia, criado segundo uma lei estadual de 2006.

Progressos recentes no manejo florestal podem ajudar a tornar a perspectiva mais atraente ao reduzir o custo inicial para os proprietários. A empresa de Holland, por exemplo, criou uma ferramenta digital – um smartphone equipado com laser para medir a distância e um inclinômetro para medir a altura – que ele acredita reduzirá enormemente a despesa da realização de um inventário florestal, que pode custar de US$ 40 mil a US$ 100 mil, ou mais, dependendo do tamanho da área.

Com o smartphone especializado, os proprietários podem fazer eles mesmos o inventário, fotografando e medindo os diâmetros e alturas de suas árvores. As fotografias e dados são enviados ao escritório da empresa na Califórnia, onde um especialista examina as imagens, identificando as espécies e procurando danos nos galhos ou na copa, entre outras coisas. Modelos de probabilidade são então utilizados para calcular a quantidade de carbono armazenado na mata.

As provas matemáticas desenvolvidas pela companhia foram submetidas a uma publicação científica, declara Holland.

Empregando métodos tradicionais, um especialista consegue avaliar de três a quatro áreas florestais por dia e pode levar meses para terminar uma avaliação ao custo de US$ 350 por área, diz ele. Mas Logan Sander, um desses especialistas que utilizou o smartphone para fazer o levantamento da floresta de Eve e o demonstrou para dois visitantes, disse conseguir concluir de 30 a 35 áreas por dia, sendo que o trabalho inteiro levava somente uma semana para terminar.

Logan Sander, um engenheiro florestal usa um aplicativo de smartphone para analisar florestas privadas
Os donos de florestas que contratam o serviço de Holland pagam US$ 75 pelo registro e recebem o smartphone. Se, após a conclusão do inventário, eles decidirem continuar com o projeto de carbono, pagam à empresa US$ 1.350 para completar o processo.

Algumas pequenas propriedades não armazenam carbono suficiente para esse trabalho valer a pena. Segundo Holland, o preço do carbono precisar ser de pelo menos US$ 10 para justificar o investimento. E os métodos novos como o seu ainda necessitam de aprovação das empresas que verificam inventários florestais ou que atuam como registros oficiais do mercado.

Já Jessica Orrego, diretora de manejo florestal do American Carbon Registry, assegurou que tais progressos podem ser decisivos para atrair os pequenos proprietários.

“Damos todo o apoio. Defendemos a inovação. Achamos que é extremamente importante entrar no mercado de carbono”, ela garante.

Eve, dona da floresta com dois irmãos e sua esposa, Lynn Baker, ainda está avaliando se entrar para esse mercado faria sentido para sua família.

O compromisso – 125 anos se os créditos forem vendidos no mercado californiano – lhe dá o que pensar.

“É muito além da nossa vida, e é um compromisso que acompanhará a propriedade”, afirma.

Mas ela é capaz de imaginar o que pode estar fazendo daqui a 20 anos.

“Talvez eu esteja cultivando carbono em casa. E talvez essa seja a melhor coisa.” (Fonte: UOL)