Economia de água na irrigação beneficia produtores de hortaliças

Tanta fartura de água é para irrigar a plantação de pepino de Deusvaldo de Castro. A propriedade fica em Goianápolis, a 50 quilômetros de Goiânia. A água pra irrigação é bombeada desta nascente, nos fundos da propriedade e escorre em abundância entre os talhões.

No período de seca, o Deusvaldo irriga a plantação duas vezes por semana, mas pra alcançar todos os pés de pepino, a água leva quase dez horas. É tanto tempo, que o produtor não faz nem ideia do volume de água que gasta num único dia de irrigação.

César Honório da Silva, engenheiro agrônomo e técnico da Emater, explica que este é um dos sistemas de irrigação que mais desperdiçam água. A cada cem litros que passam por um sulco, apenas 40 ficam disponíveis para a planta. “Parte da água infiltra, parte da água é escorrida, então a planta às vezes não utiliza a água toda, então é preciso um volume muito grande”, explica.

Deusvaldo está fazendo as contas para investir em outro sistema de irrigação: o gotejamento. “Tem que economizar muita coisa, a água, o óleo. E a água no Brasil tá escassa”, declara Deusvaldo de Castro, produtor rural.

Hoje já falta água na região: o Distrito Federal enfrenta uma grave crise hídrica.

Luiz Gonzaga e o sobrinho dele, Luciano Alves, já trabalham com gotejamento há mais de 20 anos. A propriedade da família fica no Núcleo Rural Rio Preto em Planaltina, a 60 quilômetros de Brasília. Eles plantam 7,5 mil pés de tomate. As mangueiras de irrigação passam por toda plantação. Cada pequeno furo libera, no máximo, um litro e meio de água por hora.

O agrônomo Márcio Meireles Machado, da Emater-DF, atende a família e explica que o gotejamento é um sistema mais vantajoso para hortaliças.

“A vantagem dele é que é o sistema mais poupador de água, a eficiência do sistema de gotejamento chega até 98%”, explica Machado.

Mesmo assim, o Luciano teimava em abusar da água, irrigando mais do que o necessário… O agrônomo não estava satisfeito. Queria mais economia. Márcio lançou um desafio no Núcleo Rural Rio Preto: reduzir o consumo de água na irrigação por gotejamento. Em 10 meses, conquistou o apoio de 25 produtores rurais e hoje o grupo conseguiu uma economia de água, em torno de 60%.

Mas não pense que foi fácil… “Eu achei loucura, mas com a insistência dele, porque aqui é campeão, viu? Ele insistiu mesmo. Se não fosse a insistência dele não tinha entrado no programa, não”, conta Luciano Alves de Sousa , produtor rural.

“Quando a gente fala em manejo de irrigação eu preciso aplicar uma lâmina de água até logo abaixo do sistema radicular. A água que passa daqui é uma água perdida, uma água que a planta não vai aproveitar, já que o sistema radicular dela está até aqui. Então o que que a gente verificou? Com a lâmina de água que eles estavam jogando aqui, eu percebi que essa água estava chegando até meio metro, ou até 70 centímetros”, explica Márcio Machado, técnico da Emater-DF.

Aos poucos, os produtores foram reduzindo a irrigação. Cada dia, cinco minutos a menos. “Às vezes eu passo até quatro dias sem molhar, molho 20 minutos. É suficiente. E a produtividade a mesma coisa, não mudou nada, de quando molhava uma hora, tá do mesmo jeitinho, produzindo bem, tudo direitinho”, declara Luiz Gonzaga de Araújo Souza, produtor rural.

Pelos cálculos da Emater, a economia no consumo de água foi de 84%. A conta de luz caiu pela metade. Márcio garante que não fez milagre. Para saber a quantidade exata de água que a planta precisa. Ele usou um equipamento, que custa cerca de R$ 40.

O aparelhinho, desenvolvido pela Embrapa, tem uma cápsula porosa, que fica enterrada, e um cilindro de plástico para fazer a leitura. Ligando as duas partes, um tubinho flexível. O produtor precisa de duas unidades: uma das cápsulas é enterrada até a profundidade da ponta da raiz e a outra mais acima, mais ou menos na metade.

A leitura é feita da seguinte maneira: o agricultor mergulha o cilindro de plástico numa cuba com água. Se o cilindro encher de água, é sinal que o solo está seco: hora de irrigar. Se não encher, o solo está com umidade suficiente.

Entenda porque isso acontece: no solo seco, a cápsula porosa enterrada fica cheia de ar e isso permite a passagem da água, por isso o cilindro de leitura enche. Em solo úmido, a cápsula porosa também fica molhada e isso impede a entrada de água pelo cilindro de leitura. E porque dois aparelhos? O que fica mais próximo da superfície indica o momento de começar a irrigação; o outro, vai determinar a hora de parar a irrigação, quando a leitura indicar solo úmido. O produtor deve fazer a leitura dos sensores pelo menos duas vezes ao dia.

Na Embrapa Hortaliças, a 35 quilômetros de Brasília, o pesquisador Carlos Eduardo Pacheco mostra outras técnicas para economia de água, como o plantio na palha. “Nós temos trabalho aqui mostrando a redução da temperatura média do solo em até quatro graus celsius, isso proporciona menor evaporação de água, maior economia também. Essa economia de água pode chegar a 30% no início do ciclo, chegando ao final do ciclo, até em torno de 20 a 25%”, explica o pesquisador.

O pesquisador da Embrapa propõe uma técnica que considera ainda mais eficiente: o mulching, um tipo de cobertura plástica do solo. “Ela evita que os raios solares incidam diretamente sobre o solo, além disso, as mangueiras da irrigação ficam no interior do plástico, o que reduz as perdas por evaporação”.

Foi o que fez o produtor rural Marco Padrão. Ele também participa do programa de economia de água do Núcleo Rural Rio Preto. O agricultor cultiva 15 mil pés de pimentão, em 20 estufas. Todos os canteiros estão com esta cobertura plástica. Um investimento de 4 mil reais para a produção deste ano. Há seis meses, o produtor incluiu as medições de umidade do solo e descobriu que mesmo com gotejamento, estava afogando os pés de pimentão.

“Eu estava com mais de quase um metro de água pra baixo do que eu precisava”, conta Marco Aurélio Padrão, produtor rural. O gotejamento passou de uma hora por dia para apenas 20 minutos. “Estou com frutos melhores, menos ataques de certas pragas”, afirma. Com todas as técnicas reunidas, o produtor alcançou uma economia que ninguém esperava: de 87%.

É o consumo consciente, sem desperdício, que garante água para o Marco, Deusvaldo, Luciano e para todos nós. “A água pra nós é tudo, nossa sobrevivência, sem ela nós não consegue produzir nada, então a água é a base de tudo aqui no nosso ramo… Quanto mais você cuidar, melhor ainda…”, diz o agricultor Luciano Alves de Sousa. (Fonte: G1)