Não gosto de repercutir o que a web conta sem pesquisar muito porque, como sabemos, nem sempre aquilo que parece, é. Mas esta história que uma amiga me mandou, com várias recomendações, tem um apelo tão forte para mim, que decidi compartilhar com os leitores. Chequei algumas das informaçõese li a defesa escrita pelo próprio protagonista em sua rede oficial por conta de estar sendo atacado como golpista. Parece real, com alguns toques de emoção. Bem, vocês já devem estar curiosos, então lá vai.
O cenário é o Parque Nacional Tsavo West, que fica ao Sul do Quênia, país africano que está em 146º lugar no Índice de Desenvolvimento Humano anualmente publicado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). Ali não chove há muito tempo, a seca está castigando os animais. Só em 2010, de quando consegui os últimos dados,foram registradas 352 mortes: 104 búfalos, 61 zebras, 49 gnus, 47 hipopótamos, 36 elefantes, 26 impalas e 13 bubalús, uma espécie de antílope africano.
Impactado com esta situação, o queniano Patrick Kilonzo Mwaluadecidiu agir. Desde 2016, inicialmente com um caminhão-pipa alugado, e atualmente com vários, todos os dias ele leva 12 mil litros de água doce para acabar com a sede dos bichos. A cena, registrada no vídeo que recebi é, de fato, bem forte: quando ouvem o barulho do motor do caminhão de Patrick, os animais começam a se aproximar porque já sabem o que esperar. A água forma poças e até os búfalos vão, em grupo, para se satisfazer.
Confesso que, nesse momento do vídeo, algumas cenas me pareceram familiares, lembrando documentários produzidos por Yann Arthus Bertrand. Talvez algumas imagens possam ter sido emprestadas.
Num outro vídeo, chamado “Herói Desconhecido”, uma TV africana conta a história de Patrick de maneira mais detalhada. Ele tem 41 anos e sempre viveu perto dos animais selvagens, por isso ficou tão afetado quando percebeu a situação em que se encontram no Parque. Começou a agir sozinho, mas logo pediu ajuda e criou-se uma rede em torno dele, com doações do mundo inteiro que chegam a mais de US$ 130 mil. Por isso, hoje Patrick tem vários caminhões que, diariamente, fazem o mesmo caminho, levando água da cidade para a selva – uma viagem de cerca de 70 quilômetros – onde a seca faz com que os bichos tenham que disputar a sombra de árvores raras.
Aqui, vale lembrar que estamos falando de um produto cada vez mais raro, cada vez mais caro à humanidade, aos bichos, às matas. Segundo informações que estão no livro “Escolhas sustentáveis”, de Rafael Morais Chiaravalloti e Cláudio Pádua (Ed. Urbana), entre 2005 e 2010, o preço da água aumentou muito. Nos Estados Unidos, o aumento foi de 27%; no Reino Unido, de 32%; na Austrália, 45%; no Canadá o aumento foi de praticamente 60%. No país de Patrick, segundo ainda os registros do livro publicado em 2011, apenas 59% da população tinham acesso à água potável.
“Além de uma questão de preservação ambiental e igualdade social, a água passa por uma questão econômica muito simples. Como, basicamente, ela é fornecida pelo Estado, paga-se pelo seu consumo e, quanto mais escasso esse recurso, mais caro ele irá ficar”, diz o texto.
Haverá quem critique Patrick porque, num país tão carente de água para os humanos, escolheu matar a sede dos bichos. Não é meu caso. Penso que existem pessoas também afetadas pela adversidade dos iguais, mas a biodiversidade merece um espaço de cuidados.
Patrick criou uma página nas redes sociais, deu nome ao seu programa,criou um crowdfunding que se chama Voluntários do Tsavo para tentar arrecadar mais dinheiro para suas viagens, para comprar mais caminhões. Sabe que precisa abrir vários poços de água no Parque para que os animais consigam se espalhar e não fiquem focados num único espaço, o que pode ser perigoso para eles.
Patrick já tem vários ajudantes voluntários, e ele precisa mesmo. Tem um problema nos rins, está na fila para receber um órgão novo. Por causa disso, seus detratores dizem que o guardião do Parque Tsavo está arrecadando dinheiro para si próprio e que não o veem por lá.
“Nem todos os guardas me conhecem no parque devido ao seu grande tamanho, mas eu sou bem conhecido em tsavo West pelo trabalho que faço”, defende-se Patrick na sua rede social.
Quando recebi o vídeo do guardião do parque africano e salvador dos animais, tinha pensado em escrever um texto sobre o amor radical que alguns seres humanos têm pela natureza.E Patrick se encaixa perfeitamente neste perfil. Mas há também aqueles que se mudam para se desapegarem de tudo o que os afasta da vida natural. Aumenta o número de ecovilas no Rio de Janeiro e já há também ideia de se criar um aplicativo colaborativo Ecovilas Brasil que pretende reunir informações sobre esses lugares disponíveis no país.
“Ecovilas são comunidades urbanas ou rurais formadas por pessoas que se esforçam para integrar o ambiente social cooperativo”, diz um documentário sobre ecovilas – “Caminhando para a Sustentabilidade do Ser”, que está disponível na internet.
Há um apelo especial e forte, para quem está querendo fugir do dia a dia estressante e corrido das grandes cidades, passar a viver uma vida com ar puro, alimentação saudável, em harmonia com a natureza. No entanto, os depoimentos de quem já fez a opção mostram que nem tudo são flores também do lado de lá.
A primeira questão é a vida em grupo. Tudo precisa ser feito em conjunto e as decisões são tomadas somente depois de todos darem opiniões. Para quem está acostumado a ter tudo à mão, preparar um local para guardar as fezes, esperar que vire um adubo e replantar, pode parecer bastante enervante. E aí, todo o potencial efeito desestressante pode ir por água abaixo.
O mais interessante, para mim, é perceber que há espaço para todas as opções. O amor à natureza também pode ser demonstrado na cidade, com cuidados fundamentais que podem contribuir para que nosso espaço social de convivência possa guardar as singularidades e, ao mesmo tempo, proporcionar mais qualidade de vida para todos. Não é difícil, basta ter cuidado, fazer contato e manter um nível de respeito ao outro que as grandes aglomerações andam dificultando. Fico a fim de perseverar nesse propósito, creio nisso.
Fonte: G1 Amelia Gonzalez