O Aterro Sanitário de Samambaia começou a funcionar em 17 de janeiro do ano passado e foi projetado para durar 13 anos, recebendo uma quantidade diária de 2.700 a 3.000 toneladas de lixo. Ao fim desse período, o rejeito sólido soterrado no local formará uma montanha de 45 metros e 8.130.000 toneladas. Com a destinação correta de resíduos (para cooperativas de reciclagem), o tempo de vida útil do espaço se estenderia. Porém, mesmo com o fechamento do Lixão da Estrutural e a criação de um aterro moderno e adequado, os tímidos números da coleta seletiva e o crescimento da produção de rejeitos pela população apontam um cenário pessimista para a capital federal.
A coleta de materiais recicláveis no DF caiu mais de 40% entre 2014 e 2017. Para piorar, com o aumento da população nos próximos 10 anos, a produção per capita de lixo também tende a crescer. Segundo projeções do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a população da capital federal saltará de 3,1 milhões de pessoas em 2018 para 3,7 milhões em 2028. Um levantamento da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe) confirma a tendência. De 2003 a 2015, a geração de resíduos no país cresceu três vezes mais que a população.
A lista de problemas continua. Para que o aterro funcione exatamente como foi proposto, deve receber apenas 20% do lixo produzido na capital. Esse é o percentual de resíduos sem valor econômico — o restante seria reaproveitado pelas cooperativas. “Se está recebendo mais lixo e tem um montante que pode ser recuperado (reciclado), temos uma falha do sistema”, alerta a coordenadora do departamento técnico da Abrelpe, Gabriela Otero. Mas a porta-voz da entidade elogia a criação do aterro e destaca que a responsabilidade pelo manejo de resíduos precisa ser compartilhada entre GDF, população e empresas. Ela destaca a necessidade de o Serviço de Limpeza Urbana (SLU) dispor de alternativa para que os moradores da capital possam se envolver.
“O sistema tem falhado na coleta seletiva, e é necessário muita criatividade nesse processo. O governo tem de buscar estratégias e ferramentas para descobrir onde a participação do cidadão se encaixaria melhor. É na coleta de porta em porta? É levando o lixo para um ponto específico, que economizaria na logística e diminuiria o tráfego de caminhões na cidade, por exemplo?”, questiona. De acordo com Gabriela, a maior dificuldade está sendo a transição do Lixão da Estrutural, “que durou quase 60 anos”, para uma nova realidade. “Precisamos de tempo. Mas é necessário cobrar. Não dá para só colocar os catadores em um galpão. É preciso material adequado, ampliação da coleta seletiva e envolvimento do setor privado”, recomenda.
Dúvida
Assessora especial do SLU e responsável pela fiscalização do Aterro Sanitário de Samambaia, Francisca Freire Dutra fala com otimismo da operação do local, mas admite que é preciso dar uma destinação correta aos resíduos sólidos para prolongar a vida útil daquele espaço público. O ponto fraco, claro, é a coleta seletiva. “Em 2014, o governo ampliou a coleta para várias regiões administrativas. O processo foi interrompido, pois a população não foi conscientizada da importância do trabalho. Estamos negociando com as cooperativas para também trabalharem na sensibilização das pessoas”, explica.
Questionada sobre por que a população do Distrito Federal demonstra dificuldade em aderir à coleta seletiva, Francisca explica que o problema se repete em todo o país, mas que um dos fatores que interferiram no processo na capital foi a presença do aterro. “A pessoa não entendia por que deveria fazer a separação se, no fim, tudo ia junto para o então aterro da Estrutural. Se esqueciam de que, mesmo em uma situação ruim, lá também tinham catadores coletando material reciclável. E a pessoa só precisa separar uma lixeira para o orgânico e para o reciclável”, orienta. “Com o aterro, a separação (do lixo) é ainda mais importante, para não reduzirmos a vida útil daquele espaço”, acrescenta.
Futuro
Após o encerramento das atividades no Lixão da Estrutural, o destino do lugar ainda não foi definido. Técnicos do SLU ainda trabalham no local para realizar a coleta e o tratamento do chorume, além da liberação dos gases. O órgão pediu à Secretaria do Meio Ambiente que realize um projeto de recuperação ambiental para o lugar. No último mês, o governador Rodrigo Rollemberg declarou que o espaço poderia ser transformado em um parque de captação de energia solar.
Saiba se há coleta seletiva em sua cidade
Cooperativas e empresas terceirizadas atuam nas asas Sul e Norte, Cruzeiro, Sudoeste, Octogonal, Setor de Indústrias Gráficas (SIG), Setor Complementar de Indústria e Abastecimento (SCIA), Park Way (quadra 3,4 e 5) Taguatinga, Ceilândia, Águas Claras, Vicente Pires, Guará, Lago Norte, Noroeste, Setor de Indústrias e Abastecimento (SIA), Samambaia, Brazlândia, Santa Maria, Candangolândia e Núcleo Bandeirante.
Os caminhões da coleta passam duas vezes por semana nas regiões. Os dias são alternados, mas a população pode conferir o cronograma no site slu.df.gov.br, na aba “serviços”. Após o recolhimento, os materiais são destinados aos cinco galpões alugados pelo SLU, local onde os catadores retiram seu sustento.
Cidades que ainda serão contempladas: Itapoã, Paranoá, Lago Sul, Varjão, São Sebastião, Sobradinho I, Riacho Fundo I e II, além de outra parte do Cruzeiro e Lago Norte.
Solução pode sair em breve
A diretora-presidente do Serviço de Limpeza Urbana (SLU), Kátia Campos, diz que as queixas dos catadores vão diminuir com a ampliação do recolhimento de recicláveis nos domicílios. “Assim que for concluída a análise do Tribunal de Contas, em três meses haverá coleta seletiva em todo o DF.” Com a cobertura total, os catadores poderão ter maior rendimento, diz.
Hoje, 16 das 31 regiões administrativas têm coleta seletiva. Segundo Kátia, até o fim de fevereiro, outras 10 passarão a ter recolhimento de recicláveis. “Se alguma cooperativa disser que conseguiu o caminhão, que tem como fazer a coleta, e se atender às exigências do SLU, a gente também vai fazer. Na pior das hipóteses, teremos a coleta total em três meses após a decisão do TCDF.”
A concorrência pelo serviço foi aberta em dezembro de 2016, 13 meses antes da desativação do Lixão da Estrutural. O processo foi interrompido algumas vezes, após recursos de empresas interessadas em participar do certame. “Algumas coisas não estão no nosso controle. Se uma empresa pode questionar por que uma lixeirinha exige um controle assim, ela questiona. E a gente precisa dar as explicações”, declara Kátia.
De acordo com a diretora do SLU, duas mudanças são essenciais para que o DF tenha uma “cultura da reciclagem”. Uma delas é fazer a população se conscientizar sobre a importância de se separar o lixo orgânico do reciclável. Para resolver a questão, o SLU inicia amanhã uma série de campanhas junto à população de todo o DF.
Sistemática
A outra questão é fazer os catadores entenderem que a coleta nos galpões é sistemática e que pode ser benéfica para todo o grupo. “Eles estão trabalhando como se ainda estivessem no Lixão, rejeitando material menor. No Lixão, preferiam pegar os rejeitos maiores, mais pesados, porque dava mais dinheiro. Como eles tinham que abaixar para pegar os menores, abriam mão. Nos galpões, esse material deve ser aproveitado, vai render mais para eles.”
Kátia informa que é possível o catador ganhar R$ 1,2 mil por mês, conforme foi dito pelo governador Rodrigo Rollemberg. Segundo a diretora do SLU, cada um deles pode coletar cerca de duas toneladas de recicláveis mensalmente. “Ele vai ganhar os R$ 360 da bolsa (dada pelo governo), mais R$ 300 como agente ambiental, em cada tonelada, o que dá R$ 600, e ainda o que arrecadam vendendo para a iniciativa privada. Em média, o valor é de R$ 307 por tonelada, ou seja, mais R$ 614. Aí daria R$ 1.674. Com os custos da cooperativa, a gente estimou os R$ 1,2 mil que o governador falou”, ressalta Kátia.
Fonte: Correio Braziliense