Em meu último artigo (de 20 de fevereiro) procurei mostrar que, no Brasil, é possível fazer uma reforma tributária que simultaneamente aumente a eficiência econômica (ou seja, o potencial de crescimento do País) e melhore a distribuição de renda. Hoje vou tratar de outro possível objetivo de uma reforma tributária, que é a indução a boas práticas ambientais.
A literatura econômica mostra que é possível, e desejável, usar instrumentos tributários para onerar atividades com externalidades negativas (ou seja, aquelas em que o custo social seja maior que o custo privado, caso, por exemplo, de uma atividade poluidora) ou incentivar ações com impactos ambientais positivos. Relativamente a outros países, o Brasil está em uma posição intermediária no uso de incentivos tributários para fins ambientais, mas usa relativamente pouco a tributação para penalizar atividades com externalidades negativas (ver a respeito The KPMG Green Tax Index 2013).
O único tributo brasileiro que parece ter uma finalidade ambiental é a Cide-Combustíveis. No entanto, a Cide-Combustíveis está longe de ser um imposto sobre a emissão de carbono, por vários motivos. Em primeiro lugar porque não incide sobre todos os combustíveis fósseis, mas apenas sobre a gasolina e o óleo diesel. Em segundo lugar, porque sua alíquota tem sido gerida visando a estabilização dos preços de combustíveis ou a arrecadação, mas não o desestímulo ao consumo de combustíveis fósseis. Em terceiro lugar, porque a receita da Cide-Combustíveis tem destinações que podem ter impactos ambientais negativos, como a subvenção a preços de combustíveis fósseis e o financiamento de programas de infraestrutura de transporte, como o recapeamento de estradas, estimulando o uso de automóveis e caminhões.
É possível transformar a Cide-Combustíveis em um bom imposto sobre o carbono, ampliando sua incidência para todos os combustíveis fósseis, e corrigindo distorções na destinação de seus recursos. Uma mudança completa exigiria emenda constitucional, mas é possível introduzir aperfeiçoamentos através de legislação ordinária.
Também seria possível ampliar a tributação do carbono no Brasil, como um instrumento adicional para o cumprimento das metas de reduções de emissões do País. O mais importante é que, se a ampliação da receita com a tributação do carbono for compensada pela redução de tributos distorcivos, o impacto sobre a economia pode ser positivo.
Estudo desenvolvido pelo Instituto Escolhas, do qual participei (Taxação sobre carbono, competitividade e correção de distorções do sistema tributário: Impactos na economia brasileira), demonstrou que, se a criação de um imposto sobre o carbono no Brasil fosse compensada pela correção de distorções no PIS/Cofins, o impacto sobre o crescimento seria positivo. Tal estudo demonstrou também que, feitas compensações adequadas, a tributação do carbono complementada pela correção de distorções no PIS/Cofins teria um efeito positivo sobre a competitividade da economia brasileira (a perda de competitividade é uma preocupação comum quando se discute a tributação do carbono).
A tributação do carbono é apenas uma das possibilidades de uso de instrumentos tributários com fins ambientais. Outras possibilidades são a tributação do descarte inadequado de resíduos sólidos e de atividades poluidoras.
Também é possível utilizar instrumentos tributários como forma de indução à preservação de vegetação nativa em imóveis rurais. O Imposto Territorial Rural (ITR) pretende ter essa função, mas é extremamente ineficiente como indutor de boas práticas ambientais.
O ponto importante é que mudanças no sistema tributário que penalizem atividades ambientalmente nocivas, desde que compensadas pela redução de tributos distorcivos, podem ter um impacto positivo para o crescimento. É possível incluir objetivos ambientais no escopo da reforma tributária, sem comprometer os demais objetivos, de ampliar a eficiência econômica e reduzir as desigualdades sociais.
Fonte: Bernard Appy, O Estado de S.Paulo