Novo convênio entre INPE e UFSM deve impulsionar o trabalho em conjunto

Instituições com um histórico de parcerias exitosas, a Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) dão início a uma nova etapa de um trabalho em conjunto que já propiciou relevantes avanços científicos e acadêmicos.

Na terça-feira (3), o diretor do INPE, Ricardo Galvão, e o reitor da UFSM, Paulo Afonso Burmann, assinaram convênio com o objetivo de conjugar esforços para o funcionamento do prédio sede do Centro Regional Sul (CRS), situado no campus de Santa Maria, e do Observatório Espacial do Sul (OES), sítio observacional localizado em São Martinho da Serra, com vistas à realização de atividades e pesquisas espaciais de forma colaborativa.

Ricardo Galvão destacou a originalidade do acerto firmado entre as instituições e o êxito de cooperações com universidades. “A colaboração entre o CRS e a UFSM é certamente a mais avançada e deve servir de exemplo paradigmático para outras iniciativas”.

“Com os custos de funcionamento do prédio CRS a cargo da UFSM, os recursos orçamentários do MCTIC destinados aos Centros Regionais do INPE viabilizarão investimentos em projetos de P&DI e melhorias laboratoriais dos centros”, destaca Fátima Mattiello, coordenadora dos Centros Regionais do INPE.

Os três centros do INPE pelo país – além de Santa Maria, os demais ficam em Belém (PA) e Natal (RN) – mantêm acordos de cooperação técnico-científica com universidades locais, de forma a sustentar parcerias em projetos de pesquisa com fomentos internos e externos, assim como a participação de pesquisadores e tecnologistas do INPE como orientadores em programas de pós-graduação nas instituições e o envolvimento de estudantes de graduação e de pós em projetos desenvolvidos no Instituto.

CRS

Segundo o pesquisador titular e chefe do CRS/INPE, Ronald Buss, cerca de 300 pessoas trabalham no local por dia, das quais entre 200 e 250 têm vínculo com a UFSM. A permanência destes pesquisadores, técnicos e alunos no CRS sempre foi embasada por convênios de cooperação técnico-científica que mantinham uma proporção de 80% dos custos a cargo do Inpe e cerca de 20% a cargo da UFSM.

Porém, entre 2010 e 2017, o orçamento do Instituto foi reduzido em cerca de 56%, com o aporte de recursos caindo de R$ 340 milhões para R$ 150 milhões neste período (dados corrigidos pela inflação). Além disso, nos últimos 10 anos o INPE perdeu cerca de 25% de seus servidores. A fusão de pastas que criou o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações (MCTIC), em 2015, com redução do orçamento pela metade, agravou a situação, assim como os constantes contingenciamentos de recursos.

Em decorrência disto, nos últimos dois anos houve cortes de serviços terceirizados, afetando a manutenção predial, secretaria, informática e transportes, com redução de pessoal terceirizado. Ronald relata casos de laboratórios inundados após chuvas e pesquisadores e alunos com problemas para acessar a internet ou a rede telefônica. Além disso, houve muitos cortes nas bolsas de estudo, gerando também a evasão de “cérebros” para outros locais do Brasil e até para o exterior. “Tudo isso fez com que o trabalho científico fosse drasticamente afetado em 2017”, afirma.

Chefe do CRS/INPE há dois anos, Ronald e seu antecessor, o tecnologista sênior Adriano Petry, buscaram sanar os problemas, mas a situação chegou a tal ponto que a solução foi recorrer à UFSM. Pelo novo convênio, a Universidade passa a assumir 80% dos custos do prédio do Centro Regional Sul, enquanto o INPE fica responsável pelos 20% restantes, aproximadamente.

Até dois anos atrás, o orçamento anual para manutenção do CRS/INPE e do Observatório era de cerca de R$ 2 milhões, suficiente apenas para a manutenção básica da infraestrutura, sem contar os gastos de pesquisa que, em geral, vinham de verba de projetos individuais. Atualmente, o valor para despesas de infraestrutura foi reduzido pela metade e está em cerca de R$ 1 milhão por ano. Para a UFSM, porém, os custos devem ser menores do que os que vinham sendo pagos pelo INPE, já que poderão ser diluídos em contratos coletivos já mantidos pela Universidade, como, por exemplo, para manutenção, limpeza predial e eletricidade.

Em contrapartida, além da manutenção e fortalecimento das cooperações científicas e da participação de pesquisadores do INPE nas pós-graduações, a UFSM poderá gerenciar o espaço físico do prédio, ocupando mais espaço –a área destinada à administração, salas dos pesquisadores e laboratórios do INPE ficou restrita ao segundo andar. A condição é que apenas projetos de áreas afins sejam transferidos para o local, que tem área de 11,5 mil m² e conta com auditório, biblioteca, laboratórios, salas de pesquisadores, setor administrativo e salas de reuniões.

Assim, resolve-se também o problema de acesso ao prédio, que, por determinação do MCTIC, era restrito. Isso dificultava o trânsito de estudantes, que realizam estágios e pesquisas, e comunidade acadêmica em geral. Ronald observa que os convênios anteriores não previam regras com relação ao uso do espaço físico, e o Ministério Público Federal (MPF) vinha pressionando para que o INPE tivesse regras claras para os termos de cooperação entre o CRS e a UFSM também para a ocupação do espaço físico.

O novo convênio, que é válido por cinco anos, também cria um comitê de acompanhamento, um colegiado composto por três membros da UFSM e três do INPE que vai decidir pela continuidade, descontinuidade ou por alterações nos projetos de pesquisa, permitindo uma decisão mais democrática.

“Há muitos pontos positivos neste convênio. Além da questão financeira, com a Universidade assumindo um encargo maior, o que vai viabilizar que pesquisas sejam feitas, também fica estabelecida uma metodologia mais transparente, com critérios para os interessados em desenvolver atividades em colaboração com o INPE, e infraestrutura mapeada para definição da ocupação”, destaca Ronald.

Chefe do CRS no período de 2013 a 2016, Adriano observa que, com orçamento insuficiente para manter a única estrutura de pesquisa do MCTIC no Sul do Brasil, a continuidade do CRS/INPE estava seriamente ameaçada. “Esse novo acordo é o que vai permitir que continuemos aqui fazendo nosso trabalho, procurando aumentar a sinergia com a Universidade, e a Universidade também se beneficiando da nossa presença, com uma relação positiva para ambas as instituições”, salienta Adriano.

Após a assinatura do convênio nesta terça (3), serão estabelecidas as novas parcerias científicas, que contemplarão projetos e a participação de cada uma das instituições em programas de interesse comum, o que já ocorre na prática.

Parceria fortalecida

Para o vice-reitor da UFSM, Luciano Schuch, o convênio com o INPE vem a fortalecer ainda mais a parceria entre as duas instituições. “Além de termos na UFSM um prédio com espaço qualificado, onde atuam pesquisadores de ponta, a presença do INPE fortalece áreas do conhecimento em nossa própria universidade, especialmente junto ao CT, ao CCNE e ao CCR”, ressalta Schuch.

O vice-reitor destaca a importância de a UFSM, a partir de agora, passar a dividir a gestão do prédio com o INPE, ocupando dois dos três andares existentes. Segundo ele, isso permitirá à UFSM alocar mais projetos e gerar mais parcerias, aproximando ainda mais os estudantes e professores da UFSM com pesquisadores do INPE. “Acredito que os próximos passos terão resultados muito profícuos para nossa Universidade, para o INPE e para a ciência brasileira”, finaliza.

Durante a solenidade de assinatura, o diretor do INPE, Ricardo Galvão, afirmou que o convênio firmado com a UFSM é adotado em muitos países da Europa e deverá ser exemplo para os demais centros regionais do INPE. Já o reitor, Paulo Afonso Burmann, destacou que o convênio vai “consolidar o que vem sendo construído ao longo dos anos” em um momento de fragilização da ciência, da tecnologia e da educação no país.

Também participaram do ato a coordenadora dos centros regionais do INPE, Maria de Fátima Mattiello-Francisco, o chefe do CRS/INPE, Ronald Buss, o vice-reitor, Luciano Schuch, além de pesquisadores, professores, servidores técnico-administrativos e alunos.

Histórico de êxitos

A história do INPE em Santa Maria está profundamente atrelada à UFSM. O Centro Regional Sul de Pesquisas Espaciais (CRS) foi implantado em 1996, graças à vinda de um pesquisador cedido pelo Instituto para trabalhar junto ao Departamento de Física da Universidade. Nelson Jorge Schuch, primeiro chefe do CRS/INPE, foi o mentor da implantação das atividades técnico-científicas e da construção do prédio sede do CRS e do Observatório Espacial do Sul, construído entre 1996 e 1998 no interior do município de São Martinho da Serra.

Pesquisador titular da área de ciência espacial, Nelson segue na ativa, sendo o pesquisador mais antigo do atual grupo do CRS/INPE. Ele orgulha-se de já ter orientado mais de 300 estudantes, sendo que destes, muitos são PhD, alguns ocupando cargos de chefia no INPE.

Aos poucos, outras áreas de estudo foram incorporadas ao CRS/INPE. Atualmente, são desenvolvidas pesquisas nas áreas de Ciências da Terra, do Sistema Solar e do Espaço Exterior; Engenharia Aeroespacial; Ciências da Computação; Observação da Terra; Tempo e Clima. Os seis grupos de pesquisa trabalham em projetos ligados ao mapeamento temático do bioma pampa e campos de altitude, computação aplicada ao clima espacial, interação oceano-atmosfera, entre outros. Desde 2007, o CRS hospeda também o Projeto Antártico do INPE.

O trabalho desenvolvido em parceria já rendeu conquistas importantes. Um exemplo é o programa de nanossatélites. O CRS/INPE montou o primeiro nanossatélite brasileiro, o NanoSatC-BR1, que entrou em órbita em junho de 2014. “Nestes quatro anos, a Agência Espacial Brasileira se interessou por este projeto e passou a fomentá-lo, porque os nanossatélites podem oferecer dados científicos a um custo infinitamente menor do que um satélite grande, além de servir de plataforma ideal para ensino. É um projeto de altíssimo sucesso que acabou ajudando a criaçãodo curso de Engenharia Espacial, porque a Universidade se deu conta de que é um recurso humano com carência no Brasil”, relata Ronald.

Outros cursos beneficiados por este trabalho em conjunto são a graduação e a pós-graduação em Meteorologia, que ocupam o prédio do CRS/INPE e vêm em constante crescimento graças também à parceria com o Instituto.

O Observatório Espacial do Sul é outro motivo de orgulho tanto para o INPE quanto para a UFSM. Inédito no país pela localização geográfica, o observatório está numa latitude de grande interesse para quem estuda fenômenos da magnetosfera. De acordo com Ronald, muitos convênios já foram feitos com órgãos internacionais, de países como Japão e China, para colocar instrumentos de medição no sítio e no campus da UFSM.

A expectativa, daqui para a frente, é de que os novos termos do convênio entre INPE e UFSM permitam um novo impulso para projetos ligados ao desenvolvimento espacial – segundo Adriano, uma fronteira do conhecimento talvez até mais importante do que foi a aviação para a humanidade. “Hoje, cada vez mais, se consegue colocar valor agregado em produtos e serviços disponibilizados através da exploração do espaço, sendo uma área essencial para o desenvolvimento e soberania do país”, afirma o pesquisador.

Graças à colaboração histórica entre as duas instituições, no passado também já estiveram na chefia do CRS/INPE os professores da UFSM Afrânio Righes e Celso Arami.

Fonte: Inpe