A areia fina faz cócegas entre os dedos, ondas acariciam suavemente a praia. Um sonho de verão que muitas pessoas querem desfrutar. Mas esse idílio não é mais uma obviedade, seja no Mar do Norte, na Sardenha, em Zanzibar ou em Cingapura. As costas são cada vez mais danificadas em todo o mundo. A razão para isso é a fome global de areia.
“Areia de construção é uma importante matéria-prima”, explica Harald Elsner, especialista em Geologia Econômica do Instituto Alemão de Geociências e Recursos Naturais (BGR), em Hannover: “Concreto pronto, pedras de concreto, material de enchimento, tijolos, asfalto, cimento – areia está por toda parte.”
Representantes do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) estimam em mais de 40 bilhões de toneladas o consumo anual de areia e brita no mundo.
A areia de quartzo ou areia industrial também é importante. Ele é utilizada na indústria do vidro, do plástico ou na indústria química: “Ou seja, para todos os fins com maior valor agregado, que são necessários especialmente nos países industrializados”, diz Elsner.
Ao contrário de alguns relatos, a areia industrial não é usada na produção de células solares ou outros eletrônicos. O silício necessário para tal é obtido a partir de cascalho de quartzo, como explica o geólogo.
“Mesmo assim, areia é indispensável”, enfatiza Elsner sobre a importância do recurso natural. Só na Alemanha, cerca de 100 milhões de toneladas da matéria-prima são extraídas anualmente. Com uma boa atividade na indústria da construção, podem ser extraídas ainda mais, acrescenta o geólogo. “Temos sorte de termos tantas fontes de areia.”
Na Alemanha, há recursos suficientes para atender às necessidades. Graças às fontes de areia, algumas das quais podem ser rastreadas até a Era do Gelo, o país não precisa importar essa matéria-prima – o que não seria apenas caro, mas também ruim para o meio ambiente.
Por quanto tempo nossas fontes de areia ainda vão ser suficientes? “Até agora ninguém conseguiu calcular isso seriamente”, responde Elsner.
Geologicamente, as reservas ainda devem durar vários milhares de anos. Devido às áreas já construídas, não conseguimos chegar a todas as fontes. Mas, de acordo com Elsner, os depósitos acessíveis também devem ser suficientes por muitas décadas, se não séculos.
Essa constatação agrada particularmente à indústria da construção, que é fortemente dependente de areia e brita. Assim, há estimativas de que a economia alemã pararia numa semana, caso a indústria da construção civil não produzisse mais areia e cascalho.
Segundo Elsner, em 2016, foram vendidas na Alemanha areia e brita no valor de 1,6 bilhão de euros. Sem contar os dez milhões de toneladas de areia industrial no valor de 212 milhões de euros – e os produtos resultantes.
China é maior consumidor
Para manter casas modernas e boas estradas, a importância da areia não deve ser subestimada. O mesmo acontece em outros lugares do mundo: constrói-se por toda parte – com mais altura, mais extensão, mais qualidade.
“Acreditamos que a China consuma, por uma margem considerável frente a outros países, a maior quantidade de areia”, estima o especialista do BGR. Em seguida, vêm os principais países industrializados: EUA, Taiwan, Hong Kong, Cingapura – e na Europa principalmente a Alemanha.
Em muitos países, no entanto, não é tão fácil obter a necessária areia de construção: por exemplo, a areia do deserto não é adequada para a construção civil. Com a ação dos ventos, os grãos são demasiadamente lisos e finos para se aglutinarem.
Embora dois empresários do estado alemão da Turíngia tenham desenvolvido um método para produzir concreto polimérico a partir de areia do deserto, que pode então ser usado para a construção de casas, o material ainda não é adequado para a produção em massa.
Assim, países como Dubai ou Abu Dhabi importam milhares de toneladas de areia todos os anos para realizar seus projetos construtivos – mesmo que estejam cercados por ela. A valiosa areia de construção é, em parte, importada por navio da distante Austrália.
Com vista a saciar a fome da indústria da construção em Cingapura e proporcionar superfície de terra suficiente para os arranha-céus, o Estado insular importa areia, por exemplo, dos países vizinhos. Até agora, as ilhas indonésias foram as mais danificadas. Mais de 20% delas já desapareceram.
Em 2007, no entanto, o governo indonésio deu um basta e parou de fornecer areia para Cingapura. Mas isso não diminuiu o crescimento da cidade-Estado. O mesmo se aplica às costas africanas: em Zanzibar, as praias paradisíacas estão desaparecendo, para que haja areia suficiente para projetos construtivos no continente.
Grãos valiosos
Até agora, as praias alemãs não foram afetadas por esse furto de areia. No entanto, há outro aspecto desse apetite mundial: a areia não é apenas um material de construção, mas também fornece habitat. E ele é ameaçado repetidamente a cada ano. Por exemplo, ilhas alemãs, como Sylt, sofrem com as tempestades de inverno. Depois de um fim de semana ventoso, podem faltar até 100 mil metros cúbicos de areia na costa oeste da ilha – isso corresponde a cerca de 725 campos de vôlei de praia.
Para proteger a ilha das forças da natureza, todos os anos após a temporada de tempestades, cerca de um milhão de metros cúbicos de areia são bombeados do leito marinho para a praia. O próprio marketing da ilha chama isso de “bizarro”. Mas o método funciona. Por cerca de 40 anos, os habitantes de Sylt, no Mar do Norte, vêm protegendo assim a sua ilha da perda de terra para o mar.
“Essa é uma questão de custo”, diz Harald Elsner, que tem certeza de que hoje, sem essas medidas, restaria apenas uma pequena parte da ilha. Em Sylt, no entanto, a terra é tão valiosa que esse esforço vale a pena – diferente das ilhas da Indonésia, que não foram protegidas da persistente fome de areia.
Na Itália, cada grão é valioso. Todos os anos, os turistas levam para casa toneladas de areia, pedras e conchas como suvenires da ilha da Sardenha. No entanto, isso é proibido por lei – além dos danos de longo prazo ao meio ambiente, a infração pode custar aos viajantes até 3 mil euros. “Então, por favor, deixe a areia no lugar dela”, diz um recente apelo da embaixada alemã em Roma.
Apesar de todos esses desenvolvimentos globais, o especialista em areia Harald Elsner acalma os ânimos. Trata-se basicamente de um recurso finito, mas ele aponta: “Espalhar o pânico em torno da areia na Alemanha não é apropriado, ainda que uma observação do mercado global de areia seja certamente de interesse”.
Fonte: Deutsche Welle