Em um cenário contemporâneo marcado por aquecimento global e sucessivas crises hídricas, muitos são os cientistas que buscam alternativas para a obtenção de água potável. E todos são unânimes em um ponto de vista: as soluções, neste quesito, jamais são concorrentes; elas se somam e precisam ser adotadas dentro de parâmetros de consciência ambiental e uso sustentável dos recursos do planeta.
Uma novidade neste campo é a proposta apresentada nesta terça-feira (21) pelo engenheiro mecânico Shing-Chung Josh Wong, professor da Universidade de Akron, nos Estados Unidos. Em um evento promovido pela American Chemical Society, ele demonstrou a viabilidade de uma engenhoca que promete servir para “coletar” partículas de água da atmosfera. Em forma de uma mochila, seria capaz de obter até 40 litros de água limpa e potável por hora, mesmo em ambientes áridos.
“O nosso mecanismo simplesmente miniaturiza o mecanismo natural, já que partículas atmosférica de água no ar são a maior fonte de abastecimento de água fresca no planeta”, explicou o cientista à BBC News Brasil. “Graças à nanotecnologia, fornecemos uma grande área superficial por unidade de volume, coletando a água eficientemente da atmosfera com o mínimo de energia, sob diferenciais de pressão e temperatura.”
O modelo desenvolvido pela equipe de Wong, que ainda não saiu do papel, é semelhante a uma mochila. De acordo com o cientista, a inspiração veio de um curioso inseto, o besouro-da-namíbia. O bicho, que habita o hiperárido deserto do país africano que lhe empresta o nome, retira toda a água de que necessita para viver graças a um sistema de absorção de partículas do ar em sua carapaça.
“Tive a ideia quando estava visitando a China, que tem um problema de escassez de água doce. Há investimento em tratamento de águas residuais, mas pensei que era preciso somar esforços em outras frentes”, contou o cientista.
Técnica
Coletar a água do ar não é uma novidade. Milhares de anos atrás, o princípio já era utilizado pelos incas, que coletavam o orvalho das madrugadas nos Andes e o canalizavam para cisternas. Mecanismos semelhantes já eram adotados há pelo menos 2 mil anos em desertos do Oriente Médio.
O engenheiro químico Filipe Vargas Ferreira, de 32 anos, tem dedicado seu doutorado, ao desenvolvimento de uma substância com essas características: ser biodegradável, sustentável e ter alto desempenho.
“Este ano, vimos a pior seca de todos os tempos”, diz a zambiana Julliette Machona, de 35 anos. “Normalmente, os rios secam nesta parte sul da Zâmbia em julho, mas este ano eles já estavam vazios em maio. A pouca água que nos resta é suficiente para as pessoas e o gado. Não temos água para cultivar.”
Novo modelo mostra quais áreas do planeta Terra serão mais atingidas pelas mudanças provocadas pelo homem, revelando, também, possíveis soluções.
Hoje em dia, com tecnologia de ponta, há equipamentos que aproveitam a neblina da manhã sobretudo em regiões secas nos Andes e na África.
O avanço do mecanismo proposto por Wong é justamente o que permite eficiência em um equipamento relativamente pequeno: a tecnologia do material. “Usar a nanotecnologia para ‘colher’ água da atmosfera é algo que ainda está na infância”, disse. “Meu objetivo é estimular interesses nesse campo, de modo que a sociedade possa investir mais recursos nessa direção de energia renovável, em vez de usar apenas a tradicional dessalinização ou o tratamento de água de esgoto, cujos trabalhos já foram maximizados.”
O pesquisador acredita que, no futuro, um programa semelhante poderia ser uma “solução viável” para locais afetados pela seca, como o Estado americano da Califórnia, a região noroeste da China, diversas regiões africanas, partes da Austrália e do Brasil.
“Acredito que governos ou companhias possam criar algum programa para financiar tal mecanismo”, disse Wong, que está em busca de financiamento para transformar o protótipo em um produto consolidado.
O cientista não crava o valor que o produto custaria, mas acredita que a mochila coletadora, em escala, possa ser produzida a custo acessível.
Nanotecnologia
O material utilizado por Wong e sua equipe foram os polímeros obtidos a partir de eletroforese. O resultado são fibras que variam de poucas dezenas de nanômetros até um micrometro, ou seja, com entrelaçamento microscópico. Tais polímeros oferecem uma relação superfície-volume incrivelmente alta, muito maior do que as fornecidas pelos destiladores de água que existem no mercado.
Essa mochila coletadora de água, de acordo com os cientistas, funcionaria até em ambientes desérticos – justamente por conta da eficiência desse material, que ainda por cima atrai partículas de água. O consumo de energia também seria baixo. “Com os recentes avanços nas baterias de íons de lítio, penso em um dispositivo menor, do tamanho de uma mochila”, comentou.
As nanofibras absorvem a água do ar e a filtram. Para otimizar o fluxo do ar e, assim, tornar a captação mais eficiente, o projeto precia ser alimentado por uma bateria.
O consumo de energia seria baixo, faria uso de “recentes avanços nas baterias de íons de lítio”.
Graças aos poros microscópicos, até micróbios são filtrados. O mecanismo obteria, portanto, uma água limpa e livre de poluentes. “E imediatamente potável”, garantiu o cientista.
“É a primeira vez que uma coletadora portátil de água será projetada e fabricada por membranas de polímero de eletroforese, com uma abordagem bioinspirada”, resumiu.
Escassez de água
Wong aproveita sua pesquisa para fazer um alerta sobre o problema mundial da escassez de água. Conforme ele ressalta em seu estudo, de toda a água disponível no planeta, apenas 2,5% é doce. E três quartos desse total está em forma de gelo, nos polos Norte e Sul.
“A maior parte dos esforços de pesquisa sobre sustentabilidade da água são direcionados para o abastecimento, a purificação, o tratamento de águas residuais e a dessalinização”, enumerou, no estudo. “Pouca atenção ainda é dada para os mecanismos de captação de água a partir de partículas atmosféricas.”
Imitando a estrutura das antenas da mariposa da seda, os nanoporos vão ajudar a estudar uma classe de doenças neurodegenerativas que inclui o Mal de Alzheimer, Parkinson e Huntington.
Em artigo na Scientific Reports, grupo do CNPEM mostra que recobrir com ampicilina torna partículas de prata e sílica seguras para células humanas e mortais para microrganismos resistentes.