Ela é “roja” (vermelha) – é assim que a classe média conservadora de Madri gosta de insultar Manuela Carmena. Em 2015, a ex-juíza foi eleita prefeita da capital espanhola. Seu slogan: “Madri deve voltar a pertencer a seus habitantes.”
Em tempo recorde, a nova prefeita – pouco afeita ao glamour, a entrevistas ou recepções – transformou a cidade num reconhecido centro cultural, com concertos gratuitos e eventos artísticos quase todos os dias, além dos renomados museus.
Além disso, ela quer gradualmente livrar os habitantes da poluição e do ruído. Desde o final de novembro, o projeto Madri Central entrou em vigor. Ele estipula que, numa área de 472 hectares, haja restrições para a circulação e o estacionamento de carros.
Além disso, mais árvores e plantas devem “combater” o nitrogênio. Com esse projeto, Carmena, de 74 anos, quer ganhar as eleições municipais novamente no ano que vem.
O que muitos veem como radicalismo é, na verdade, apenas a continuação de uma política já iniciada por seus antecessores e a resposta consistente à pressão de Bruxelas. Madri ocupa o sétimo lugar no ranking de cidades mais poluídas da Europa.
Até pouco tempo, muitos espanhóis não gostavam de andar de bicicleta ou caminhar longas distâncias. Mas, nos últimos dois anos, muita coisa mudou em Madri: agora existem ciclovias, ônibus e táxis foram reequipados.
E sem um selo ambiental, carros não podem mais dirigir no centro da cidade. Na área de Madri Central, qualquer pessoa que não seja residente ou tenha uma autorização especial só pode estacionar em edifícios-garagem.
E as medidas continuam: para promover ainda mais a mobilidade elétrica, serão criados, em 2019, 20 novos postos de recarga elétrica com 100% de energia renovável.
As medidas da Carmena não só melhoram a qualidade do ar, mas também trouxeram mais dinheiro para a cidade. Assim Madri se tornou uma referência mundial da economia compartilhada. Florescem plataformas de aluguel de carros, patinetes elétricos e táxis compartilhados. A capital se tornou uma metrópole de startups.
No primeiro trimestre de 2018, os investimentos diretos em Madri aumentaram 82%, para 4,5 bilhões de euros, em comparação com o ano anterior. Assim, 77% de todo o investimento direto na Espanha recaiu sobre a metrópole.
A cidade, governada por uma “roja”, também bate todos os recordes turísticos. No primeiro semestre de 2018, Madri registrou quase 5 milhões de visitantes, 5% a mais do que no mesmo período do ano passado.
Em sua maioria, os moradores estão satisfeitos com as mudanças. “A cidade definitivamente se tornou mais atraente”, diz Sonia Pérez, de 50 anos, que há anos usa a bicicleta ou patinete elétrico para se locomover em Madri.
Mas há também vozes contrárias. Com o projeto Madri Central, Carmena atraiu a ira principalmente do comércio varejista e dos cerca de 2 milhões de passageiros pendulares, que entram e saem diariamente da capital espanhola.
Por exemplo, a principal rua comercial foi bloqueada durante vários meses pelas reformas deste ano. Isso levou à perda de receita, reclama o lobby varejista Apreca.
“Informações prévias não chegaram a tempo e foram confusas, por isso muitas pessoas de outras cidades não vieram no primeiro fim de semana de dezembro”, afirma o engenheiro eletricista Fernando Rodríguez.
Também é problemático que as lojas só possam receber mercadorias em certas horas e que a coleta de lixo não seja mais executada duas vezes ao dia, como acontece em alguns bairros, mas apenas uma vez. “O ar pode ficar mais limpo no longo prazo, mas há mais lixo em todos os lugares”, reclama Rodríguez.
“É uma loucura como as ciclovias em Madri são organizadas”, reclama, por exemplo, Gonzalo Puig, simpatizante de Manuela Carmena, “mas algumas das medidas não foram planejadas adequadamente”, diz o farmacêutico. Na maioria das vezes, a ciclovia se localiza entre a pista de táxi e de carro: “Isso é muito perigoso”, diz Puig.
Um incômodo para os motoristas também é: num único dia em dezembro, foram aplicadas 1.450 multas de trânsito – além das restrições para a circulação de carro no centro da cidade, da autoestrada municipal só ser permitida para carros com selo ambiental e do limite de velocidade ter sido limitado a 70 km/h.
A artista alemã Carolina Beyer, que vive num subúrbio de Madri, reclama que ela precisa ir frequentemente às galerias e até agora não foi estipulado como os veículos de carga e descarga podem estacionar. “Com minhas fotos de grande formato, será um pouco difícil andar de metrô”, diz Beyer. “Falta elaborar os detalhes.”
Apesar das queixas generalizadas, manifestações ou grandes protestos públicos ainda não ocorreram em Madri. “Temos que ter paciência e esperar que as coisas, que não funcionam agora, sejam resolvidas rapidamente”, diz Erika Pérez, que administra um escritório de turismo na cidade.
Segundo Pérez, Carmena está sempre aberta para ouvir as pessoas. Tal como acontece com as galerias, também não há regras claras para o embarque e desembarque de cargas no caso de seus escritórios.
Apesar das muitas queixas, já se pode identificar quem ganhou com o projeto Madri Central: o transporte público. Mais de 3 milhões de pessoas usaram o ônibus no primeiro fim de semana de dezembro, um acréscimo de mais de 7% em relação ao ano passado. E o aluguel de bicicletas públicas também aumentou 20% desde 30 de novembro.
Fonte: Deutsche Welle