Há cerca de 10000000000000000000 insetos individuais vivos neste exato momento. (9999999999999999999, agora que você matou uma mosca). Eles se dividem em 2 milhões de espécies, no cálculo mais conservador – ou 30 milhões, no cálculo mais entusiasmado. Todos os artrópodes do mundo, somados, pesam 16 vezes mais que todos os seres humanos do mundo, também somados. E ainda que você prefira não comê-los, sua alimentação depende deles: algumas fontes dão conta de que 66% das plantas do cardápio humano são polinizadas por abelhas; estima-se que elas, sozinhas, movimentem US$ 20 bilhões anuais só nos EUA.
No Brasil, os polinizadores foram responsáveis por R$ 43 bilhões em 2018. A soja (60% da agricultura nacional) e a laranja (5%) ambos têm um aumento de produtividade perceptível, embora pequeno, quando recebem uma mãozinha do trabalho de transporte de pólen de animais. A maçã (4% do total nacional), por sua vez, é completamente dependente dos insetos. Segundo relatório da Plataforma Brasileira de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (BPBES), 76% das plantas cultivadas comercialmente no Brasil dependem pelo menos parcialmente dos polinizadores – 35% dependem completamente. 249 espécies brasileiras visitam flores. A maior parte são abelhas (66,3%, 165 espécies). Besouros também são importantes (9,2%, 23 espécies).
Dado que os insetos fazem a agricultura rodar, é bastante ingrato da parte do ser humano que eles sejam a classe taxonômica mais ameaçada por nossas plantações – que recobrem 12% da superfície dos continentes. Uma dupla de biólogos das universidades australianas de Sidney e Queensland passou a limpo 73 artigos científicos recentes sobre a perda de biodiversidade entre insetos. Eles concluíram que 40% dos insetos existentes hoje podem entrar em risco de extinção nas próximas décadas. Dentre elas, 23,9% estão ameaçadas pela agricultura dita intensiva; mais especificamente, 13,9% pelo uso de pesticidas e 10,1% pelo uso de fertilizantes.
Praticamente todos os aspectos da agricultura mecanizada em escala industrial são nocivos para o equilíbrio de um ecossistema. Em primeiro lugar, ela envolve recobrir um grande trecho de solo com uma planta só (monocultura). Isso significa que os insetos que polinizam essa planta específica se dão bem, mas todos os outros se dão muito mal. Arbustos e árvores pontuais – comuns em regiões de savana e cerrado como as do Centro Oeste brasileiro – são removidos para abrir caminho às colheitadeiras, reduzindo ainda mais a variedade de habitats disponíveis. O ambiente se torna homogêneo. Os agrotóxicos matam, repelem, desorientam o voo e reduzem a prole dos insetos. O traçado dos rios é alterado para permitir irrigação e drenagem.
Além da agricultura, a urbanização, as mudanças climáticas impulsionadas pelo efeito estufa e a acidificação das águas graças à atividade de mineradoras são outras ameaças.
Dentre os insetos de ecossistemas terrestres, as ordens Lepidoptera (borboletas), Hymenoptera (vespas, abelhas e formigas) e Coleoptera (besouros) são as mais afetadas. 49% das espécies de besouros estão diminuindo em quantidade, 34% já estão ameaçadas. No caso dos Hymenoptera, esses números são 46% e 44%. A tendência é que, conforme os habitats se tornam mais homogêneos, espécies generalistas, capazes de se dar bem no tédio de uma plantação, substituam as que são muito bem adaptadas às condições de um ecossistema específico.
Em resumo: quando uma floresta com milhares de espécies de plantas é substituída por uma enorme plantação de uma planta só, os milhares de insetos que viviam ali também tendem a ser substituídos por um inseto só. O problema é que nossa atividade econômica não depende de um inseto só: depende de vários. E talvez, ironicamente, a agricultura que os faz desaparecer não possa viver sem eles.
Fonte: Super Interessante